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EUA: Lei pode barrar US$ 500 milhões em exportações do Brasil por desmatamento

Itens como soja, cacau, gado, borracha, óleo de palma, madeira e seus derivados de países com índices altos de desmatamento florestal podem ser barrados

Mariana Sanches / BBC News Brasil

O projeto legislativo, batizado de Forest Act 2021, ou Lei Florestal 2021, foi apresentado na última quarta (6/10), e é o mais abrangente marco legal no tema proposto nos EUA nos últimos anos. Na justificativa do projeto, ao qual a BBC News Brasil teve acesso em primeira mão, o senador democrata Brian Schatz e o congressista democrata Earl Blumenauer, autores da peça, citam o Brasil - e seus produtos de origem bovina - como exemplo do problema.

"Em 2020, os EUA importaram carnes e couros bovinos processados avaliados em mais de US$ 500 milhões do Brasil. Ali, a pecuária é o maior impulsionador do desmatamento na Floresta Amazônica e outros biomas, e 95% de todo o desmatamento feriam a lei", escrevem os autores no projeto de lei apresentado simultaneamente à Câmara e ao Senado. Além do Brasil, apenas a Indonésia é citada nominalmente no texto.

Embora digam que a regra não tem como alvo países, e sim o aquecimento global e a devastação ambiental, os legisladores americanos reconhecem que o Brasil deve ser afetado caso a lei passe, o que eles esperam que ocorra até novembro de 2022.

Em 2021, o Brasil deverá se consolidar como o quarto maior exportador de carne bovina congelada aos EUA e atualmente já é o maior fornecedor de material bruto para fabricação de assentos de couro de automóveis. Esses seriam os mercados em maior risco. A BBC News Brasil entrou em contato com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC), mas a entidade afirmou que não se manifestaria.


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"A aprovação da lei vai ser uma oportunidade para o Brasil (mudar), já que até agora o país está tratando com deboche seus compromissos ambientais. O atual governo tem agido de forma descuidada em relação ao desmatamento, não tem sido particularmente sensível aos direitos dos povos indígenas. Isso fere os interesses do Brasil", afirmou Blumenauer à BBC News Brasil.

Biden e o aquecimento global

A proposta da Lei Florestal é a primeira grande ameaça de punição dos EUA ao Brasil em relação ao comportamento do país em um tema prioritário para a Casa Branca: o aquecimento global. Segundo Rick Jacobsen, chefe de políticas para o Brasil na ONG Environmental Investigation Agency (EIA), sediada em Washington, "não há dúvida de que a destruição da floresta amazônica é uma grande motivação dos legisladores americanos" para propor a nova lei.

Em agosto de 2021, o presidente Bolsonaro admitiu o desafio que o assunto representava na relação bilateral com os EUA. "Da minha parte, o Brasil está de portas abertas e pronto para continuar a conversa com o governo americano. Obviamente, o governo Biden é um governo mais de esquerda e um governo que tem quase uma obsessão pela questão ambiental, então isso atrapalha um pouquinho a gente", afirmou o mandatário brasileiro.

O democrata Joe Biden se elegeu à presidência prometendo retornar ao Acordo de Paris e retomar o protagonismo americano no combate às mudanças climáticas. Ele chegou a citar o desmatamento da Amazônia em um debate presidencial, ainda em 2020, como exemplo de situações nas quais ele acreditava poder liderar o mundo em busca de soluções.

Amazonia com queimadas
egenda da foto,Em 2020, Biden citou o desmatamento da Amazônia como exemplo de situações nas quais ele acreditava poder liderar o mundo. Foto: Getty

Por isso mesmo, o projeto de lei se encaixa com precisão à pauta de Biden. De acordo com Schatz e Blumenauer, se o desmatamento global fosse considerado um país, ele seria o terceiro maior emissor de gases do efeito estufa do mundo, atrás apenas da China e dos EUA. Especialistas afirmam que a devastação da cobertura vegetal do planeta responde por cerca de 10% das emissões globais. Diante do problema, a solução estaria em mirar o motor para a derrubada das matas.

"Já temos uma lei federal que tenta garantir que não importemos madeira originária de desmatamento ilegal, mas o fato é que muito do desmatamento está sendo impulsionado pelas commodities que são cultivadas nas áreas após o corte da floresta tropical. E então nosso problema é garantir que nenhum dos produtos que chegam aos nossos portos são resultado de desmatamento ilegal", afirmou Schatz à BBC News Brasil. Além de barrar os produtos, a lei também prevê a possibilidade de que a importação irregular desses itens seja incluída no hall de crimes financeiros no país.

Embora não esconda as divergências em relação ao governo brasileiro, Biden tem optado por um tratamento discreto e diplomático em relação ao Brasil. O mandatário americano convidou Bolsonaro para a Cúpula de Líderes que tratou de clima em abril (embora tenha deixado a sala virtual do encontro no momento em que o presidente brasileiro falou) e, até maio, a equipe de seu Enviado Climático, John Kerry, mantinha contatos semanais com o Itamaraty e o Ministério do Meio Ambiente sob Ricardo Salles.

Mas a percepção de que o governo brasileiro apenas pedia por recursos financeiros, sem entregar resultados concretos, e o fato de o próprio Salles ter passado a ser investigado em processos por suposto envolvimento com desmatamento ilegal - o que ele nega - azedaram o clima com os americanos.

A retomada do diálogo entre as partes aconteceu um pouco antes da última Assembleia Geral da ONU, em setembro, na qual Bolsonaro tentou mostrar que cumpria as promessas que fez na Cúpula de Biden. Ele citou em seu discurso o aumento do orçamento de órgãos de fiscalização, como o Ibama, e a redução nos índices de desmatamento medidos em agosto, além de ter elogiado o Código Florestal brasileiro, o mesmo que seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, tentou afrouxar via projeto de lei ainda em 2019. Reservadamente, integrantes do primeiro escalão do governo brasileiro disseram à BBC News Brasil que o discurso foi elogiado tanto por Kerry como pelo secretário de Estado dos EUA Antony Blinken.

Perguntado pela BBC News Brasil, porém, sobre se acreditava nas palavras de Bolsonaro na ONU, o congressista Blumenauer deu uma gargalhada. "Estamos vendo índices históricos de desmatamento. É risível. Até agora não vimos evidências de mudança. Ele diz que vai mudar e terá ocasião de provar isso, mas até agora, não. E não conseguiremos colocar as coisas nos eixos na América Latina, especialmente em relação às ameaças climáticas, sem o Brasil", disse Blumenauer.

Embora o governo brasileiro comemore em setembro o segundo mês consecutivo de queda de desmatamento na Amazônia, os índices seguem em patamares elevados e o acumulado do ano de 2021 até setembro é quase o dobro do registrado no mesmo período de 2018, antes da chegada de Bolsonaro ao poder.

A Casa Branca ainda não se manifestou publicamente sobre a Lei Florestal mas está ciente do projeto, segundo os dois parlamentares. "Vai ser uma ferramenta para a administração Biden promover seus interesses. O presidente é bastante diplomático e normalmente preferiria a cooperação. Mas ele não teve que apresentar isso, nós apresentamos, e eu acho que ele vai nos apoiar. E é algo que o ajuda a administrar a relação com o Brasil", afirma Blumenauer, para quem é importante ter também "instrumentos de punição" em uma "política diplomática de incentivos e punições".

A própria proposta de lei contempla os dois aspectos. Por um lado, deixa aberta a possibilidade de que países com desmatamento persistente sofram ações diretas da presidência - o que poderia incluir sanções. Por outro, preveem a criação de um fundo pelos EUA para financiar a conservação dos biomas em territórios alheios.

"O fundo vai exigir bilhões de dólares, e, obviamente, isso ainda precisa ser negociado. Mas sabemos que os países desenvolvidos precisam ajudar aqueles que ainda têm economias em desenvolvimento a fazer uma série de escolhas certas para o planeta, e essa ajuda não pode vir só na forma de conselhos ou pedidos. Muitos desses países precisarão de ajuda financeira. E estamos preparados para ajudar desde que haja seriedade no tratamento do problema", afirma Schatz.

Protecionismo

O Itamaraty reconhece que o Brasil tem um problema de imagem internacional na questão ambiental e tem havido por parte do órgão um esforço para mudar a posição desfavorável do país no debate.

Consultada pela BBC News Brasil, a Embaixada Brasileira em Washington D.C. afirmou em nota que "monitora todos os projetos que tramitam no Congresso americano com consequências potenciais para as relações entre o Brasil e os EUA" e que "mantém interlocução permanente com parlamentares americanos dos dois partidos". "O compromisso do governo e do setor agropecuário brasileiros com a sustentabilidade é tópico prioritário nesses contatos", conclui a nota.

Os diplomatas brasileiros e os setores produtivos nacionais, no entanto, sempre relembram que, a despeito da propalada preocupação ambiental, apertar as restrições aos produtos brasileiros também serve aos interesses de agricultores dos Estados Unidos e da Europa, competidores diretos do Brasil em uma série de mercados internacionais.

"Essa proposta legislativa dos EUA confirma a tendência de implementação no mundo de medidas com um duplo fundamento. O primeiro é ambiental e climático. Já o segundo é eminentemente econômico, de concorrência. E por isso é necessária uma atenção do Brasil ao tema, para tentar se resguardar dessas medidas. O Brasil precisa trabalhar para preservar o meio ambiente e preservar também o seu comércio internacional", afirma Abrão Arabe Neto, vice-presidente executivo da Amcham Brasil, a Câmara de Comércio Americana no país, e ex-secretário de comércio exterior.

Neto aponta que uma proposta muito semelhante - e tendo como alvos de restrições potencialmente o mesmo conjunto de produtos e de países, como Brasil e Indonésia - está em fase de finalização pela União Europeia.

Gado em area desmatada
União Europeia tem proposta semelhante para limitar compra de produtos de países onde pode estar ocorrendo desmatamento. Foto: Reuters

E embora essas medidas possam levar meses ou anos até a completa implementação, seu impacto pode ser significativo para a economia desses países, analisa Rick Jacobsen.

"Com o desenvolvimento de regulamentações sobre desmatamento nos EUA e na Europa, os dois maiores mercados do mundo, junto com o Reino Unido, há uma sinalização desse bloco de países de que não querem participar da destruição da floresta amazônica e do Pantanal. Este deve ser mais um alerta para o governo brasileiro de que suas exportações agrícolas se tornarão uma marca cada vez mais tóxica nos mercados globais se o desmatamento não for controlado", diz Jacobsen.

Neto lembra, no entanto, que, depois de aprovadas, as regras ainda poderão ser contestadas nos âmbitos multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio, caso os países afetados as considerem protecionistas ou abusivas. Isso porque, mesmo produtores que já satisfaçam as condições de produção podem ter um aumento de custo de produção por ter que comprovar o rastreio das cadeias produtivas e emitir a documentação necessária, o que poderia, por exemplo, impactar na competitividade da mercadoria brasileira.

Questionado sobre se o seu projeto de lei tem um caráter protecionista e pretende, portanto, beneficiar os agricultores americanos, o senador Schatz afirmou à BBC News Brasil que "a razão pela qual trabalhei nessa legislação é porque ela é importante para o planeta. E nem uma única empresa americana veio até mim e pediu por isso".

Seu colega Blumenauer, no entanto, afirma que "produtores que desmatam são pessoas que têm uma vantagem comercial injusta, que trapaceiam e estão ameaçando o planeta, por isso têm que ser punidas". O congressista afirmou ainda que questionar a norma a partir desse ponto de vista "enfraquece o Brasil no cenário econômico global. Tomar medidas ambientais trapaceiras e imprudentes não vão garantir desenvolvimento econômico. E não são uma saída sustentável".

Blumenauer e Schatz esperam que o arcabouço ambiental legal recém apresentado por eles no legislativo americano possa ser exposto na COP-26, a Conferência da ONU para o Clima, que acontece em Glasgow, no Reino Unido, em novembro, e que outros países considerem seguir a mesma ideia.

Domesticamente, a Lei Florestal ainda precisa cair nas graças dos Republicanos - na Câmara, apenas um dentre os 212 congressistas do partido expressou publicamente interesse em bancar a lei. No Senado, ainda não há adesões oficiais da oposição. Mas, como os republicanos possuem uma base eleitoral composta por produtores rurais que teriam interesse na aprovação da norma, não é improvável que o projeto conquiste apoio bipartidário.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-58826789


NY Times: Comitê da Câmara dos EUA aprova projeto que pode levar a reparações a negros por escravidão

Proposta, porém, pode emperrar, pois nem Câmara nem Senado se comprometeram a levá-la a voto

Nicholas Fandos, THE NEW YORK TIMES

Um comitê da Câmara dos Representantes votou nesta quarta-feira (14) por recomendar, pela primeira vez, a criação de uma comissão para estudar a possibilidade de oferecer reparações a afro-americanos pela escravidão nos Estados Unidos, além de um “pedido nacional de desculpas” por séculos de discriminação.

A votação antecipada no Comitê Judiciário da Câmara representou um marco histórico para os proponentes de reparações, que lutam há décadas para angariar apoio amplo para a proposta de indenizações pelos efeitos persistentes da escravidão. Parlamentares democratas do comitê aprovaram por 25 a 17 votos a legislação que cria a comissão, passando por cima das objeções de republicanos.

Intitulado HR 40 devido à promessa feita na época da Guerra Civil americana e nunca cumprida de dar “40 acres de terra e uma mula” aos ex-escravos, o projeto de lei ainda não tem grandes chances de virar lei.

Com a oposição de alguns democratas e dos republicanos unificados, que argumentam que os americanos negros não precisam de uma esmola do governo para compensá-los por crimes cometidos no passado distante, nem Câmara nem Senado se comprometeram a levar o projeto de lei a voto.

Mas no momento em que o país volta a encarar o racismo sistêmico exposto pela pandemia de coronavírus e pelas mortes de George Floyd e outros homens negros pela polícia, a medida está recebendo o apoio dos democratas mais poderosos do país, incluindo o presidente Joe Biden, a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e o senador Chuck Schumer, líder da maioria democrata na Casa. Pesquisas indicam que o apoio público à proposta também vem crescendo, embora ainda esteja longe de ser amplo.

“Estamos pedindo às pessoas que entendam a dor, a violência, a brutalidade do que sofremos, o modo como fomos tratados como propriedade privada”, disse a deputada democrata Sheila Jackson Lee, do Texas, durante debate do comitê na noite desta quarta. “E, é claro, estamos pedindo harmonia, reconciliação, razões para nos unirmos como americanos.”

O interesse renovado por reparações ocorre enquanto Biden tem posicionado a questão da correção das desigualdades raciais no centro de sua agenda política doméstica, propondo bilhões de dólares de investimentos em agricultores, empresários, bairros, estudantes e pobres afro-americanos. A Casa Branca disse que a agenda de empregos de Biden de US$ 4 trilhões (R$ 22,5 trilhões) tem por objetivo em parte “combater o racismo sistêmico e reconstruir nossa economia e nossa rede de segurança social de modo a possibilitar que todos na América alcancem seu potencial pleno”.

A questão das reparações a antigos escravos e seus descendentes é uma que divide e aflige políticos há gerações, envolvendo questões mais amplas sobre o legado do racismo na América e a negação branca dos efeitos deletérios da economia escravista. Ela também encerra problemas práticos espinhosos, tais como quem deveria se beneficiar, que forma as reparações poderiam assumir e como seriam financiadas.

O general do Exército da União William Tecumseh Sherman fez a primeira tentativa ampla de oferecer reparações em 1865, com uma ordem especial dada no campo de batalha de confiscar 400 mil acres de terras costeiras e doá-la em lotes a antigos escravos. Mas após a morte do presidente Abraham Lincoln, mais tarde nesse ano, seu sucessor, Andrew Jackson, prontamente rescindiu a medida. Nenhum plano subsequente jamais chegou perto de colocá-la em prática.

Parlamentares negros no Congresso começaram a trazer a questão à tona outra vez três décadas atrás, quando primeiro propuseram uma comissão para analisá-la.

O projeto de lei submetido ao Comitê Judiciário nesta quarta propõe a criação de um órgão para estudar os efeitos da escravidão e das décadas de discriminação econômica e social que se seguiram a ela, frequentemente com envolvimento do governo, e sugerir maneiras possíveis de corrigir o abismo de riqueza e oportunidade entre americanos negros e brancos. Também propõe a possibilidade de um “pedido nacional de desculpas” pelo mal causado pela escravidão.

Os proponentes de reparações por parte do governo federal divergem quanto à forma precisa que estas poderiam assumir. Alguns defendem pagamentos diretos de valores diferentes em dinheiro. Outros propõem que o ensino universitário seja gratuito para afro-americanos, e a concessão de empréstimos, sem juros para afro-americanos que querem comprar casa própria.

Evanston, no estado de Illinois, um subúrbio de Chicago, reservou US$ 10 milhões (R$ 56,3 milhões) neste ano para reparações, sob a forma de subsídios habitacionais para afro-americanos que possam comprovar que eles ou seus ancestrais foram vítimas de negação sistemática de bens ou serviços do governo ou setor público ou de discriminação habitacional de outro tipo. Mas qualquer programa nacional seria muito maior, com custos projetados para alcançar bilhões ou trilhões de dólares.

Embora sua administração não use o termo “reparações”, Biden tem abraçado versões de muitas dessas propostas em seus esforços para combater a pandemia de coronavírus e recolocar a economia americana em andamento. Por exemplo, sua lei de estímulo para combater os efeitos do coronavírus, o Plano de Resgate Americano, prevê investimentos de dezenas de bilhões de dólares em programas de assistência alimentar, pagamentos diretos a americanos e ajuda mensal a crianças —programas que se aplicam independentemente da raça dos beneficiados, mas que darão assistência importante a afro-americanos.

O plano também prevê US$ 5 bi (R$ 28,1 bi) em auxílio e alívio de dívida para ajudar agricultores negros para mitigar anos de discriminação nas políticas de crédito agrícola a subsídios a agricultores negros.

“Entendemos que não precisamos de um estudo para adotar ações agora, já, contra o racismo sistêmico”, disse em fevereiro a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki. “Então, enquanto isso, o presidente quer adotar ações dentro do próprio governo.”

As propostas de Biden para os empregos e a infraestutura, que agora estão no topo da pauta do Congresso, preveem ir além, alocando centenas de milhões de dólares para negros, pardos e outras “comunidades carentes” por meio de formação profissional, investimentos em escolas, subsídios a financiamentos imobiliários, crédito a empresas, substituição de tubulações de chumbo e limpeza de resíduos tóxicos.

Uma medida proposta prevê US$ 20 bilhões (R$ 112,5 bilhões) para reconectar bairros, muitos deles historicamente negros, destruídos por rodovias interestaduais; outra prevê a alocação de US$ 20 bilhões para aprimorar as capacidades de pesquisa de faculdades e universidades historicamente negras.

Os republicanos rejeitaram muitos dos programas, tachando-os de desnecessários, impopulares ou caros demais, e parecem estar se mobilizando para fazer oposição direta a eles no Congresso, a não ser que os democratas concordem em reduzi-los substancialmente.

Mesmo que os programas sejam promulgados em lei, acadêmicos que se destacaram na discussão sobre reparações insistem que os planos de Biden não constituem um substituto para reparações. William Darity, da Universidade Duke, professor de políticas públicas e autor de um livro sobre reparações, disse que propostas como as de Biden não enfrentam o problema diretamente.

“Se estamos falando das consequências plenas sobre a riqueza afro-americana, sobre a destruição de empresas ou bairros inteiros, sobre a miséria e a perda de terras, estamos falando em cifras que estão muito além do alcance dessas iniciativas programáticas de âmbito relativamente restrito”, falou Darity.

Sua visão de reparações foca em primeiro lugar a redução da disparidade de renda entre afro-americanos e brancos, algo que ele estima que exigiria US$ 10 trilhões (R$ 56,3 trilhões) ou mais em fundos governamentais —um valor enorme que é rejeitado por parlamentares de ambos os partidos.

“A reparação é divisiva. Ela indica que seríamos uma raça infeliz e sem esperança que nunca fez nada senão esperar que brancos viessem nos ajudar —e isso é uma falsidade”, disse durante o debate nesta quarta o deputado republicano Burgess Owens, de Utah, que é descendente de escravos. “É degradante para a geração dos meus pais.”

Owens comparou a ideia de reparações a “uma redistribuição de riqueza ou socialismo” e argumentou que o que os afro-americanos precisam é que o governo saia de seu caminho enquanto eles se esforçam para subir na vida com seu próprio trabalho, como fizeram gerações anteriores.

Alguns democratas compartilham essa visão. Outros hesitam em apoiar um projeto de lei que temem que os republicanos possam usar como arma contra eles, retratando-o como um esforço radical para usar o governo para implementar uma agenda politicamente correta.

Tradução de Clara Allain