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O Estado de S. Paulo: Cartório oculta dados de Flávio Bolsonaro em escritura pública da casa de R$ 6 milhões
Titular do estabelecimento admite ao ‘Estadão’ ser a primeira vez que esconde informações que deveriam ser públicas; advogada afirma que ato descumpre a lei
Breno Pires e Rafael Moraes Moura, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – O cartório onde o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) registrou a compra de uma casa de R$ 6 milhões em Brasília escondeu informações da escritura pública do imóvel, documento com os dados do negócio que deveria ser acessível a qualquer pessoa que o solicitar. O ato, do 4.º Ofício de Notas do Distrito Federal, contraria a prática adotada em todo o País e representa tratamento diferenciado ao filho do presidente Jair Bolsonaro, segundo especialistas consultados pelo Estadão. As leis que tratam da atividade cartorial não preveem o sigilo.
Na cópia da escritura obtida pela reportagem no cartório, que fica em Brazlândia, região administrativa a 45 km de Brasília, há 18 trechos com tarjas na cor preta. Foram omitidas informações como os números dos documentos de identidade, CPF e CNPJ de partes envolvidas, bem como a renda de Flávio e da mulher, a dentista Fernanda Antunes Figueira Bolsonaro.
Para comprar o imóvel, o filho “01” de Bolsonaro financiou R$ 3,1 milhões no Banco de Brasília (BRB), com parcelas mensais de R$ 18,7 mil. Como revelou o Estadão, as prestações representam 70% do salário líquido de Flávio como senador – R$ 24,7 mil. Outras duas escrituras de imóveis em nome da família Bolsonaro obtidas pela reportagem no mesmo dia, mas em cartórios distintos, foram fornecidas sem qualquer tarja. Uma delas do próprio presidente da República.
Procurado, o titular do cartório, Allan Guerra Nunes, disse ao Estadão que tomou a medida para preservar dados pessoais do casal. Em um primeiro contato, ele não soube explicar em qual norma embasou sua decisão. Mais tarde, em nota, Nunes afirmou que as informações são protegidas pela Lei 105/2001, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras. A regra, porém, não se aplica a cartórios de notas. “Ele (Flávio) não me pediu nada. Quem decidiu colocar a tarja fui eu. Quando eu fui analisar o conteúdo da escritura, acidentalmente tem essa informação da renda”, disse Nunes.
Ele não explicou a razão de também ter omitido números de documentos de identificação pessoal. “Se hoje me pedirem cópia de escritura com financiamento bancário eu vou omitir os dados da pessoa”, afirmou o cartorário, que admitiu nunca ter incluído tarja em escrituras públicas antes. “Não há nenhum tratamento privilegiado, de maneira alguma.”
Nos 299 artigos da Lei de Registro Público, não há previsão de sigilo de informação, seja pessoal, bancária ou fiscal. A advogada Ana Carolina Osório, especialista em direito imobiliário, vê tratamento privilegiado a Flávio neste caso. “Não existe embasamento para se colocar tarja nessas informações. A publicidade é um dos princípios basilares do direito registral. O cartório tem o objetivo claro de proteger, digamos assim, os dados do Flávio Bolsonaro, porque é um documento público e as informações ali são de interesse de quaisquer interessados”, avaliou. “Diferente seria se estivéssemos divulgando a informação de renda prevista no Imposto de Renda, por exemplo.”
O tabelião Ivanildo Figueiredo, titular do 8º Tabelionato de Notas do Recife e professor de Direito Notarial na Faculdade de Direito do Recife, disse ao Estadão que a Lei nº 6.015, de 1973, que trata dos registros públicos, prevê a publicidade de todos os atos, como escrituras. "O tabelião não tem nenhuma função de censura", afirmou Figueiredo ao Estadão.
"Se a parte vai ao cartório e faz um ato público, esse ato é público. Qualquer pessoa pode pedir cópia desse documento. Qualquer pessoa pode ter acesso ao conteúdo desses atos. O dever é entregar a certidão como está no livro, não pode censurar", disse ao Estadão. "O único ato que tem alguma restrição são testamentos", ressalvou. Ainda segundo o tabelião, deixar de prestar as informações integrais pode configurar violação aos deveres funcionais dos notários e dos oficiais de registro. Pela lei, entre as punições para violação ao dever funcional estão a aplicação de multa, suspensão, e até a perda da delegação, nos casos mais graves.
Em outra medida que contraria a norma vigente, o 4.º Ofício de Notas ainda requisitou que o pedido da cópia da escritura fosse formalizado por e-mail com a informação sobre o motivo da solicitação do documento. Pela Lei de Registros Públicos, isso não é necessário. “Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”, diz o trecho da lei.
Questionado sobre a omissão das informações, a corregedoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, a quem cabe fiscalizar a atividade dos cartórios, não se manifestou. Em nota, a Associação dos Notários e Registradores do Brasil afirmou ser “responsabilidade do notário/registrador avaliar no caso concreto os preceitos legais de acesso à informação”.
Nesta semana, Flávio disse que o negócio foi “transparente” e que usou “recursos próprios” e um financiamento para comprar a casa.
Maurício Huertas: Lava Jato - Cumpra-se a lei; punam-se os culpados!
Mal comparando – e vai aí uma explicação bastante simplista e simplificada da Teoria Geral da Relatividade de Einstein, buracos negros são regiões que possuem uma quantidade tão grande de massa concentrada, maciça e compacta que nada consegue escapar da atração da sua força de gravidade, nem mesmo a luz. No coração de um buraco negro, o tempo para e o espaço deixa de existir. Em resumo, seria o estágio final de uma estrela após o seu colapso gravitacional.
A publicação das delações dos executivos da Odebrecht mostra, com todos os detalhes sórdidos e uma crueza deprimente, o colapso do nosso sistema político-partidário dominado por uma organização mafiosa que se apoderou do Estado. Por outro lado, a Operação Lava Jato é o foco de luz que desafia as leis do crime e da Física: conseguiremos escapar desse buraco negro?
O escárnio dos delatores narrando a compra de políticos com seus codinomes ridículos (mas apropriados), o envolvimento de legendas à esquerda e à direita, no governo e na oposição, tudo isso regado com o derramamento de dinheiro público para manter essa estrutura putrefata mostra que, não por acaso, chegamos à fase decisiva das investigações no clima que justamente se apelidou de “fim do mundo”.
Agora, neste momento apocalíptico, ou nos perdemos todos na implosão que engole tudo que parecia sólido em nosso universo político (naves, sondas, asteroides, luas, planetas e até resquícios de vida inteligente) após a falência da última missão tripulada do partido da estrela e de seus satélites em governos de coalizão que nos deixaram perdidos no tempo e no espaço, ou nos reinventamos e partimos verdadeiramente para a construção de um novo mundo, com princípios éticos, democráticos e republicanos.
Da suspeita generalizada e empírica de que no Brasil existia uma corrupção empresarial e política sistêmica, arraigada há décadas, partimos para a certeza comprovada da podridão como única regra do jogo, com o mau cheiro típico e o transbordamento de um esgoto a céu aberto que exige saneamento urgente.
O que fazer, então, a não ser defender que se cumpra a lei e punam-se os culpados? Doa a quem doer, sem protecionismo, corporativismo ou partidarismo. Não podemos ser cúmplices, já que fomos todos omissos ou negligentes – para dizer o mínimo – diante dos sinais cada vez mais evidentes da necrose que tomava conta do tecido social, político e institucional que protege a nossa frágil democracia.
Ou reagimos permanentemente, com o máximo rigor, à máfia instalada na máquina estatal, ou damos por barato que todos são venais na sociedade e tudo tem seu preço: das medidas provisórias, licitações, leis, tempos de TV, alianças partidárias, perguntas em debates eleitorais, notícias, fim de greves, impeachments etc. até o pastor, o sindicalista, o servidor, o índio, a polícia, o promotor, o delegado, o juiz, o candidato, o político eleito e o eleitor.
Que sejam punidos exemplarmente corruptos e corruptores, políticos e empresários, delatores e delatados, partidários do campo azul ou do campo vermelho do nosso mapa tão fortemente polarizado mas que – chegamos à triste conclusão – não se diferenciam tanto assim na hora e nos métodos da pilhagem dos cofres públicos para se manterem no poder.
Bandido é bandido, seja rico ou pobre, culto ou ignorante, amigo ou inimigo. Não há como compactuar com esse sistema. Não há como ser condescendente com a corrupção. Que as investigações, apurações e o julgamento das denúncias vá às últimas consequências, com celeridade, independência e responsabilidade. Todo apoio às ações saneadoras do STF, da Procuradoria Geral da República, do Ministério Público e da Polícia Federal. Que se resgate no Congresso Nacional o mínimo de pudor e de espírito público para fazer avançar as reformas estruturais e profiláticas.
Passar o Brasil a limpo deixou de ser força de expressão. É uma necessidade vital. Ou, do contrário, abriremos caminho para salvadores da Pátria que, a pretexto de sanear o País, atendendo aos anseios difusos da turba que se manifesta nas ruas e nas redes contra a corrupção e a imoralidade, descambem para atalhos autoritários e desprezem as conquistas do nosso valoroso Estado Democrático de Direito. A saída, ainda que traumática e tortuosa, é pela Política. Vamos traçar o nosso rumo.
* Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira) e apresentador do #ProgramaDiferente
** Foto: Agência Brasil/EBC
Herança Maldita: Mais de 50% da população na faixa dos 30 anos estão inadimplentes
Brasileiros na faixa dos 30 anos são os que mais atrasam contas, diz SPC.
50,19% da população nesta faixa etária terminou o semestre no vermelho.
Total de pessoas com contas em atraso aumentou 3,21% em junho.
Mais da metade dos brasileiros com idade entre 30 e 39 anos tem contas em atraso, segundo dados divulgados nesta segunda-feira (11) pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL).
De acordo com a pesquisa, 50,19% da população nesta faixa etária terminou o último semestre com o nome inscrito em alguma lista de devedores, totalizando aproximadamente 17,0 milhões de inadimplentes em número absoluto.
“Geralmente, nessa idade as pessoas já são chefes de família e têm um número maior de compromissos a pagar, como aluguel, água, luz, entre outras despesas domésticas. Todos esses fatores aliados à falta de planejamento orçamentário e os efeitos da crise econômica, impactam negativamente na capacidade de pagamento”, explicou em nota a economista-chefe do SPC Brasil Marcela Kawauti.
A proporção de inadimplência entre as pessoas com idade de 25 a 29 anos também chama atenção. Segundo a pesquisa, 48,58% das pessoas dessa faixa etária está negativada, o que representa 8,3 milhões de consumidores.
Entre os mais jovens, com idade de 18 a 24 anos, a proporção cai para 22,14% – em número absoluto, são 5,29 milhões de inadimplentes. Na população idosa, considerando-se a faixa etária entre 65 a 84 anos, a proporção é de 28,89%, o que representa, em termos absolutos, 4,39 milhões de pessoas que não conseguem honrar seus compromissos financeiros.
Aumento da inadimplência
O número de pessoas com contas em atraso aumentou 3,21% em junho na comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo o SPC Brasil e a CNDL. Já na comparação com maio, o número de inadimplentes caiu 0,77%.
Em números absolutos, o SPC Brasil estima que aproximadamente 59,1 milhões de pessoas físicas terminaram o primeiro semestre de 2016 inscritas em cadastros de devedores – o que representa 39,76% da população com idade entre 18 e 95 anos. Em maio, esse número era um pouco maior, estimado em 59,25 milhões.
Alta menor
O aumento no número de devedores na comparação anual foi o menor em seis anos, desde o início da pesquisa. Mas, para o presidente da CNDL, Honório Pinheiro, a desaceleração do indicador não pode ser interpretado como um sinal de que os consumidores com contas em atraso estão quitando suas dívidas, mas como um reflexo do crédito mais restrito.
“Os juros elevados, a inflação corroendo o poder de compra e a perda de dinamismo do mercado de trabalho tornam os bancos e os estabelecimentos comerciais mais rigorosos e criteriosos na política de concessão de financiamentos e empréstimos, o que implica em uma menor oferta de crédito na praça. Por sua vez, essa menor oferta de crédito funciona como um limitador do crescimento da inadimplência”, explicou o presidente em nota.