Casa da Moeda
Bernardo Mello Franco: Alguns benefícios da nota de R$ 200
Se a nota de R$ 200 tivesse chegado antes, o ex-deputado Rocha Loures não precisaria ter corrido com uma mala de rodinhas. Bastaria uma discreta mochila para transportar a propina
O governo anunciou mais uma medida inadiável. Vai lançar uma nota de R$ 200 em plena pandemia do coronavírus. Até o fim de agosto, a nova cédula deve começar a chegar às mãos dos brasileiros. Ou de alguns deles, é claro.
A diretora de administração do Banco Central, Carolina de Assis Barros, atribuiu a novidade ao entesouramento. O fenômeno ocorre quando a população passa a guardar mais dinheiro em casa.
Com a quebradeira e a redução de salários, milhões de famílias limitaram o consumo a itens essenciais. Quem não perdeu o emprego tenta cortar despesas e seguir adiante. Ainda que a luz no fim do túnel pareça vir de um trem na contramão.
O auxílio emergencial também aumentou a demanda por papel moeda. Isso elevou o gasto federal com impressão e transporte de valores. Até aqui, o governo precisava de ao menos seis notas para pagar os R$ 600. Agora só precisará de três — e os beneficiários que se virem para arrumar troco na quitanda.
Os economistas explicaram que o lançamento da cédula de R$ 200 não significa a volta da inflação. Mesmo assim, quem viveu no Brasil antes do Plano Real pode ter sentido um frio na espinha. Em 1993, o país chegou a rodar uma nota de meio milhão de cruzeiros. Ela estampava o rosto do poeta Mário de Andrade, que nada tinha a ver com aquela desordem monetária.
Ontem o BC anunciou que a nova cédula vai trazer a imagem do lobo-guará. A escolha decepcionou quem preferia homenagear o vira-lata caramelo ou a ema que bicou o presidente Jair Bolsonaro.
Para alguns setores da classe política, a novidade chega com atraso. Se a nota de R$ 200 já existisse em 2017, o ex-deputado Rocha Loures não precisaria ter corrido com uma ostensiva mala de rodinhas. Bastaria uma discreta mochila para transportar a propina até o táxi.
O assessor que abastecia a conta do senador Flávio Bolsonaro também teria poupado tempo diante do caixa eletrônico. A cada depósito de R$ 2.000 em espécie, ele era obrigado a contar e separar 20 cédulas. Agora só precisaria de dez.
Helena Chagas: As privatizações do PMDB
Nada como não ter votos. Só mesmo um presidente que não foi eleito, sabe que não tem a menor chance de sê-lo no futuro e não tem qualquer compromisso com programas aprovados nas urnas para fazer tudo o que Michel Temer está fazendo. Sob o argumento do rombo estratosférico nas contas públicas, vamos vender a Eletrobras, a Casa da Moeda, os aeroportos - incluindo a jóia da coroa, Congonhas - e até abrir parte do setor de tráfego e segurança aéreos ao capital privado.
Nada a observar sobre o cavalo-de-pau privatista do Executivo peemedebista se, em algum momento, esse programa tivesse sido apresentado e discutido com o país - como normalmente se faz em campanhas eleitorais, debates, entrevistas, programas de TV. Há sentido, do ponto de vista fiscal e da própria eficiência do Estado, na privatização de algumas empresas. Há fartas razões a justificar a concessão de certos serviços à iniciativa privada.
Só que o distinto público não pode ir dormir um dia num país cheio de estatais, ainda que ineficientes, e acordar no outro com todas elas na prateleira do supermercado. É preciso ter um modelo pronto, detalhado e amplamente discutido. É necessário haver regras que dêem segurança aos compradores e novos investidores - que, obviamente, querem o lucro - mas, sobretudo, garantam ao consumidor que ele será beneficiado com serviços melhores e não terá que pagar mais.
É o mínimo que se espera para assegurar que não haverá privatização feita na bacia das almas, enchendo o bolso de todo mundo, menos daqueles que pagam as contas. É na forma como essas coisas são feitas que mora o perigo.
Há muitos e muitos anos não se falava em privatizar a Eletrobras, e o anúncio da decisão de vender a combalida empresa pegou todo mundo no susto. Não ficou bem explicado nem quando e nem como as coisas vão acontecer. Políticos desconfiados de Minas e do Nordeste correram para tirar do pacote Furnas e Chesf. Então para elas não vale?
A oposição, meio apática, pouco reagiu - a não ser pela ex-presidente Dilma Rousseff, que virou alvo por causa da mudança de regras que promoveu no setor e apanhou sozinha.
Mas mercado e investidores, ávidos pelos novos negócios em meio ao deserto em que vivem hoje, entraram em estado de euforia, mesmo sem dados mais concretos sobre a privatização da gigante do setor elétrico. As ações da empresa subiram 49% e o valor da estatal na Bolsa cresceu R$ 9 bilhões num dia.
Sucesso total!, festejaram os peemedebistas. E resolveram repetir a dose no dia seguinte, botando aeroportos, Casa da Moeda e mais cinco dezenas de ativos estatais no balaio das privatizações. Na mesma pressa, no mesmo improviso, no mesmo açodamento. Sem a perspectiva de que os processos estarão concluídos daqui a um ano e cinco meses, quando, na melhor das hipóteses, Temer descerá a rampa do Planalto.
Vai deixar, em janeiro de 2019, alguma dessas privatizações concluída com sucesso, revertendo em benefícios para o país e sua população?
Aí é que está: isso pouco importa para o grupo de peemedebistas que está hoje no governo. Seus objetivos parecem ser bem mais imediatos: passar a idéia de que vão tapar o rombo no caixa e dar assunto para a platéia se distrair. Quem sabe, discutindo essa ou aquela venda, ela se esquece de assuntos mais explosivos que devem pipocar nos próximos dias, como o conteúdo da delação do operador Lúcio Funaro e a nova denúncia do PGR Rodrigo Janot?
Depois, seja o que Deus quiser. Sobretudo se, nesse depois, os peemedebistas tiverem tido, no limite da irresponsabilidade, oportunidade de tratar de outras razões e interesses que cercam os processos de privatização no Brasil.