carros elétricos
RPD || Nelson Tavares: Múltiplas razões
Depois de derrocada no Brasil, Ford aposta seu futuro nos carros elétricos. Companhia, que fabricava veículos no país desde 1919, vinha fazendo cortes de pessoal nos últimos anos e sofrendo queda de vendas superior à do mercado
Qual a montadora de veículos de maior valor internacional?
Décadas atrás, a indústria automobilística era acompanhada, em proporções razoáveis, por parte da população. As pessoas seguiam o lançamento do modelo (o “design” do carro), a potência do motor, o volume de venda nos diversos mercados. Essa atitude se traduzia na admiração que alguns cultivavam por montadora A ou uma de suas irmãs.
Sim, todas eram consideradas “irmãs”. Tal como na indústria petrolífera, em que oito empresas forneciam o petróleo do mundo e se articulavam como um cartel, oito montadoras eram responsáveis pela produção da quase totalidade dos carros montados no mundo. A articulação que havia entre elas era menor do que a existente na área do petróleo. Concorriam no “design”, na potência dos motores e no padrão de qualidade imprimido, mas atuavam conjuntamente procurando sempre trazer “benesses” para o setor.
As indústrias petrolíferas e montadoras de veículos eram consideradas um “poder” à parte, capazes de interferir em governos de diversos países e mesmo desestabilizá-los. Nas bolsas de valores, mundo afora, estavam bem sempre bem representadas entre as maiores. No caso das montadoras, tudo com uma certa admiração de parte da população.
Respondo agora à pergunta acima feita. A maior montadora do mundo, em valor na bolsa de valores americana, é a TESLA. Foi fundada em 2003 e, em 2020, ultrapassou o valor de mercado da TOYOTA. Suas ações valem US$ 208 bi. Fabricou nesse ano pouco mais de 367 mil veículos e seus demais componentes, ao passo que a TOYOTA fabricou cerca de 10 milhões. O mercado está acompanhando a TESLA e verifica que se trata de uma empresa inovadora com lugar garantido no futuro.
A indústria automobilística está perdendo seu valor e espaço nas bolsas internacionais. Desde 1990, ocorrem fusões e aquisições entre elas, a mais recente Fiat-Peugeot. Algumas delas percorrem esse caminho da desvalorização de maneira mais rápida. A Ford internacional é uma dessas. Seus carros não conseguem atender todas as faixas de mercado. Nos EUA, seu carro mais vendido é a “EXPLORER” e suas variações, mas carros de passeio, construídos para a classe média/média e média/baixa, a FORD não consegue produzir com margens de lucro razoáveis.
As grandes montadoras têm buscado inovações no mundo inteiro, para tornar seus produtos mais atraentes. Investem alto em pesquisa de digitalização de seus veículos. Procuram se unir a empresas que complementem suas linhas de produto e de inovações. Mas têm um grande desafio pela frente: mudar sua base energética e adequar a emissão de carbono aos padrões que serão/estão sendo exigidos, à luz da proibição do uso de combustíveis fósseis nas grandes cidades, de acordo com o Tratado assinado em Paris sobre a redução da emissão de gases de efeito estufa. Algumas cidades já mencionam a possibilidade de proibir os carros que utilizam combustíveis fósseis, já em 2030.
A situação é agravada quando falamos do mercado interno brasileiro. E, mais uma vez, o exemplo é a Ford. Não foi a primeira vez que a empresa tentou sair do país. Na década de 80, entregou o design de seus veículos à Volkswagen, a quem se juntou formando a “Autolatina”.
Na década de 90, já separada da “coirmã”, sofreu dois outros golpes decisivos. No início da década, o governo federal diminuiu IPI dos motores até 1000 cilindradas, exigindo o devido repasse aos preços. Estendeu o mercado consumidor em uma nova faixa, que antes não tinha condição de comprar carro. A Fiat saiu na frente, com o carro Mille. E ocupou o devido espaço no mercado. As demais montadoras tiveram de criar produtos e adaptar suas linhas a essa nova realidade, em que o carro mais vendido estaria voltado para as classes média/média e média/baixa, com margens inferiores aos que existiam. Tanto a Ford como a Volkswagen obtiveram sucesso apenas relativo neste mercado.
A outra medida foi abrir o mercado para produtos importados, estimulando a concorrência. A alíquota de importação de veículos caiu paulatinamente de 80% para 35%, em quatro anos. A abertura do mercado foi decisiva para estimular novos investimentos. A realidade é que nesse setor vigorava certo acordo entre trabalhadores e empresários, que viam nas alíquotas maiores de importação a salvaguarda de seus empregos, ao passo que os empresários não faziam qualquer esforço de modernização de suas linhas de montagem e de seus produtos.
Na segunda metade da década de 90, novamente, o governo sinaliza para as montadoras com incentivos para fábricas novas, que deveriam ser montadas em locais diferentes das anteriores. Sem entrar em consideração sobre a política de descentralização regional promovida, a FORD montou nova unidade em Camaçari/BA, para montar um novo carro, com design brasileiro, o EcoSport. E mais uma vez obteve sucesso relativo, incapaz de remunerar de maneira satisfatória o investimento feito em seu lançamento.
Enfim, atualmente a FORD tem cerca de 7% do mercado, muito pouco para uma empresa que sempre se situou em torno do patamar de 20%. Diante das mudanças no mercado internacional e, após uma “década perdida”, na economia brasileira, e das perspectivas de crescimento modesto, tanto do mercado automobilístico interno, como das exportações, a empresa decidiu retirar-se do país. E tudo indica que irá fazê-lo em ritmo acelerado.
Investir em transporte movido a energia limpa é essencial no combate às Mudanças Climáticas
Usar carros elétricos compartilhados, andar de bike, caminhar a pé em pequenos percursos são atitudes que podem fazer diferença na queda de emissões de gases de efeito estufa.
Já pensou morar em uma cidade onde o transporte público é sustentável e funciona de verdade? Imagine as pessoas se deslocando, com facilidade, para vários bairros de metrô ou de bonde elétrico interligados – veículos que não emitem gases de efeito estufa, causadores do aquecimento global e das Mudanças Climáticas. Ou então pegar um ônibus movido a biogás ou dirigir um carro que funciona à base de biocombustíveis, que emite uma fumaça que agride menos o meio ambiente. Para aqueles que optam por pedalar, estão à disposição mais de 700 quilômetros de ciclovias espalhadas por todos os cantos. Tudo isso parece utopia, mas não é. Essa cidade existe e se chama Estocolmo, a capital da Suécia, que ganhou o prêmio de Cidade Verde Europeia em 2010. Ela apresenta a maior percentagem de veículos não poluentes na Europa e 75% da rede de transportes públicos recorre a energias renováveis. Até 2050, o governo planeja ficar completamente livre de combustíveis fósseis, o que significa que todas as emissões relacionadas ao aquecimento público e privado, aos veículos e ao uso da eletricidade serão reduzidos a zero.
No Brasil, ainda há um longo caminho a ser percorrido quando o assunto é mobilidade. Principalmente por causa da prevalência do transporte rodoviário em todo o país, o setor de transporte de passageiros e de cargas é responsável pela maior fatia das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. De acordo com o relatório Estimativas Anuais da Emissão de Gases de Efeito Estufa para o Brasil, do Observatório do Clima, mais de 92% da energia usada na mobilidade é consumida em estradas, ruas e avenidas. E 66% dessa energia é usada por automóveis e motocicletas. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), a frota brasileira chegou a 90,9 milhões de veículos em janeiro deste ano.
No balanço total das emissões do setor de transportes de passageiros, 80% saem dos escapamentos de carros e 20% vêm dos sistemas de transporte coletivo, principalmente ônibus. O documento do Observatório do Clima ainda faz um alerta sobre as emissões de dióxido de carbono vindos de veículos, mostrando que, em uma década, o número mais que duplicou: “As emissões de CO2 passaram de 84 milhões de toneladas em 1990 para 204 milhões em 2012”.
De forma geral, as emissões de gás carbônico estão diminuindo no Brasil, mas isso não está ligado diretamente à queima de combustíveis fósseis e, sim, principalmente, pelo combate ao desmatamento. De 2005 a 2010, o país chegou a reduzir o volume de CO2 liberado na atmosfera de 2,73 bilhões para 1,27 bilhão de toneladas. A queda representa um decréscimo de 53,5%, de acordo com um estudo feito pelo próprio governo federal em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A baixa é considerada uma conquista positiva para a meta do país em diminuir suas emissões de gases do efeito estufa em até 38,9%, até 2020. Esse compromisso foi firmado durante a COP-21, a conferência de clima das Nações Unidas realizada em dezembro de 2015, em Paris, na França. Além do Brasil, outros 195 países se comprometeram a reduzir suas emissões de gases causadores do efeito estufa como contribuição a buscar manter o aquecimento do planeta abaixo dos 2 graus Celsius acima do registrado no período pré-industrial. Enquanto essa meta não é atingida por aqui, ainda é necessário muito trabalho para que a mobilidade contribua para esse avanço.
Compartilhamento de carros
Uma ideia que pode contribuir para melhorar a mobilidade urbana e combater a produção de gases de efeito estufa é o compartilhamento de carros, especialmente os elétricos, que não soltam fumaça. Recife foi a primeira cidade brasileira a oferecer esse tipo de serviço. Essa iniciativa faz parte do projeto Porto Leve, um programa de ações focadas em mobilidade urbana do Porto Digital. A ideia é ofertar à população o aluguel de carros sustentáveis, que funcionam à base de energia elétrica, sem uso de combustíveis. Essa foi uma forma encontrada para evitar a alta emissão de gases de efeito estufa por veículos automotivos, contribuindo assim para o combate ao aquecimento global. O sistema é inspirado em projetos existentes na França, na China e nos Estados Unidos. A primeira fase do projeto começou no final de 2014. Hoje o sistema tem cinco estações espalhadas pela cidade. E estimula o uso compartilhado. Quem quiser dar carona a outras pessoas tem desconto no aluguel.
Outras cidades brasileiras oferecem o serviço. Começou, neste mês, a primeira fase da operação em Fortaleza, com um projeto-piloto chamado VAMO (Veículos Alternativos para Mobilidade). Nessa fase haverá demonstração do sistema com três veículos 100% elétricos, percorrendo alguns bairros que poderão ser potenciais estações. A prefeitura também realizará um cadastro dos futuros usuários.
Mais corredores de ônibus
Em várias cidades brasileiras, há iniciativas para melhorar a mobilidade e combater o efeito estufa. Uma delas é a construção de corredores e faixas de ônibus. Um bom exemplo é Curitiba, capital do Paraná, onde surgiu a ideia dos corredores de ônibus para viagens rápidas – o sistema BRT (Bus Rapid Transit), na década de 1970. Esse sistema de transporte público serviu de modelo para mais de 80 países. Ele tem algumas características básicas: faixas separadas dos carros (pelo menos duas delas, para permitir ultrapassagens); os pontos devem funcionar como estações, com pagamento antecipado, o que evita filas no embarque; e os veículos devem ser maiores e articulados, para transportar até 270 pessoas, com controle de horários. De acordo com um levantamento da URBS – Urbanização de Curitiba S/A, atualmente os seis eixos de linhas transportam diariamente cerca de 543 mil passageiros. Nesses últimos 40 anos, muitas pessoas deixaram de usar carros para andar de ônibus na cidade, o que diminuiu muito a emissão de CO2 na atmosfera curitibana. Hoje o sistema precisa de melhorias, como investimentos em pavimentações e estações, mas, mesmo assim, ainda continua servindo de modelo a ser seguido.
Outra cidade que investiu pesado em corredores de ônibus e faixas exclusivas para os coletivos nos últimos anos foi São Paulo. Em abril, a capital paulista chegou a 500 km de faixas exclusivas ao transporte público, segundo dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). As faixas reduziram o tempo gasto nos transportes em até quatro horas por semana, de acordo com dados da Secretaria Municipal de Transportes. Os paulistanos gostaram da ideia. Uma pesquisa encomendada pela Rede Nossa São Paulo e a Fecomercio SP sobre Mobilidade Urbana (e realizada pelo Ibope) em 2014 mostrou que 90% dos moradores da capital paulista aprovaram a medida, e 83% deles disseram estar dispostos a deixar o carro em casa se houvesse uma alternativa de transporte público eficiente. Outro dado interessante: a pesquisa também revelou que o número de moradores de São Paulo que usam carro diariamente caiu de 56% para 45%. Uma contribuição significativa para a melhoria da mobilidade paulistana e do meio ambiente.
Vamos de bike?
A bicicleta é um dos melhores meios de transporte quando o que está em pauta é reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Além de não poluir e não liberar GEE, pedalar é um hábito saudável para o praticante. No Brasil, essa modalidade vem crescendo progressivamente. Em todas as capitais, a soma da estrutura cicloviária chega a 2.090 quilômetros, segundo um levantamento feito pela União dos Ciclistas do Brasil. No primeiro lugar do ranking está Brasília, com 440 km de extensão em ciclovias. E a ideia é expandir mais ainda. Em maio, foi lançado pelo governo o Programa de Mobilidade Urbana do Distrito Federal, que prevê a construção de 277 quilômetros de rede integrada de transporte público no geral, incluindo a ampliação da rede cicloviária e o estímulo ao uso compartilhado de bicicletas.
Em segundo lugar no ranking vem o Rio de Janeiro, com 374 km de estrutura cicloviária, dos quais quase a metade está localizada na orla. A Zona Oeste da cidade é a que concentra o maior número de ciclovias, com mais de um terço delas pavimentadas. A Prefeitura incentiva bastante esse meio de transporte e disponibiliza, em 60 estações, o aluguel de bicicletas pelo sistema Bike Rio. E a população carioca aderiu com tudo. De acordo com dados divulgados pela ONG Transporte Ativo, o uso das bicicletas na cidade aumentou 300% entre 2002 e 2012.
O que pensam as novas gerações
Andar de bike parece ser uma tendência forte entre os jovens. Já o carro não é mais visto como um objeto de status e poder, idolatrado pelas gerações anteriores. Segundo o estudo “O Sonho Brasileiro”, produzido pela agência de pesquisa Box1824, milhares de millenials (geração de 18 a 24 anos de idade) enxergam o carro como um vilão que polui e tira espaço da cidade e acredita que a solução está em investimento em transporte público de qualidade. A pesquisa também mostra jovens consumidores mais conscientes. Eles têm uma visão mais crítica das empresas e cobram um papel social delas. Eles não esperam empresas que se posicionem pelo discurso, mas que ajam com ética e transparência. Será que essa nova geração terá mais consciência sobre o consumo sustentável? Tudo indica que sim.
Matéria originalmente publicada no portal do Instituto Akatu
Fonte: cidadessustentaveis.org.br