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Vera Magalhães: Rosa Weber pode frear poder de Lira

Ministra Rosa Weber é a relatora das ações que discutem a legalidade das chamadas emendas de relator

Vera Magalhães / O Globo

Com os partidos postulantes a uma cada vez mais distante terceira via despejando votos a favor de Jair Bolsonaro, o Tribunal de Contas da União “integrado” ao governo, como disse o presidente, e o orçamento secreto de Arthur Lira comendo solto, quem poderá frear o vale-tudo visto para a aprovação da excrescência batizada de PEC dos Precatórios?

Como sempre, os olhos estão voltados para o Supremo Tribunal Federal. Primeiro na análise da constitucionalidade da emenda que, numa só tacada, deu um calote no pagamento de precatórios e arrombou o teto de gastos. Ela é flagrantemente inconstitucional nessas duas pontas. A primeira já foi objeto de julgamento do próprio STF.

Mas não é essa a única providência que pode — e deve — partir do STF. Está tardando muito para que a ministra Rosa Weber, relatora das ações que discutem a legalidade das emendas do relator ao Orçamento, vulgo orçamento secreto, leve esse caso essencial para o país ao plenário da Corte.

A invenção de uma modalidade de emenda que é um fast-track de recursos orçamentários para as bases dos deputados e senadores, sem muita ingerência dos órgãos de controle e fiscalização, está não só colocando em xeque as contas públicas, como deturpando fortemente a governabilidade e, no limite, a democracia.

Se antes a sociedade se chocou quando Roberto Jefferson denunciou o mensalão, que consistia no uso de agências de publicidade para pagar a deputados em troca de apoio no governo Lula 1, que dizer de uma engrenagem que, sem intermediários, irriga prefeituras e empresas ligadas aos mesmos parlamentares, com fortes indícios de que parte desses bilhões volta para os beneméritos?

Trata-se de um modelo de cooptação de apoio no Congresso sem precedentes em matéria de volume de recursos e efetividade. Tanto é assim que a votação desta quarta-feira comprovou o que já venho escrevendo há tempos: graças ao controle que exerce sobre as emendas do relator, em que o relator é só um laranja, Arthur Lira é hoje o homem mais poderoso do Brasil.

Foi ele, e não nenhum ministro ou líder governista, que garantiu os votos necessários à aprovação da PEC dos Predatórios (não, não é um erro de digitação, trata-se de um projeto de predar mesmo o Orçamento, em que os beneficiários do Auxílio Brasil são só figurantes).

Lira faz o que faz, liberando até voto transcontinental, de graça? Certamente, não. Vem aí, tão certo quanto que o sol nascerá amanhã, um lauto aumento nas famigeradas emendas e no fundão eleitoral.

E então, ministra Rosa? É voz corrente no STF que ela se cercou de informações a respeito do caráter conspurcatório da democracia que tais emendas adquirem e de como isso representa um expediente desigual de força, até eleitoral, por parte do presidente de turno.

Mais: se não for o Judiciário a disciplinar essa imoralidade, quem mais? Algum presidente eleito na vigência de um instrumento tão caro ao Legislativo terá coragem de revogá-lo? Dificilmente.

O mal tem de ser estancado já, e pela raiz. Há diferentes apostas em Brasília quanto ao que Rosa proporá em seu voto e como votarão os demais nove ministros. Ela pode desde julgar as emendas do relator inconstitucionais e determinar sua extinção até estipular limites de valores e freios a seu caráter praticamente secreto.

Mas é urgente que ela libere essas ações para o plenário, sob pena de o consórcio Bolsolira continuar usando votações que envolvem pedaladas monumentais com recursos públicos como ferramenta para tentar viabilizar politicamente um presidente cuja popularidade precisa ser levantada à custa de tratores, escavadeiras e, se possível, até guindastes. No caso da turma que chancelou a PEC dos Predatórios, quanto mais superfaturados, melhor.

Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/rosa-weber-pode-frear-poder-de-lira.html


Câmara conclui votação de projeto que altera regras do Imposto de Renda

Faixa de isenção do IRPF passa de R$ 1.903,98 para R$ 2.500 mensais. Lucros e dividendos serão taxados em 15%

A Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto que altera regras do Imposto de Renda (PL 2337/21). A proposta, que é a segunda fase da reforma tributária, será enviada ao Senado.

De autoria do Poder Executivo, o projeto foi aprovado na forma do substitutivo do relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA). De acordo com o texto, os lucros e dividendos serão taxados em 15% a título de Imposto de Renda na fonte, mas fundos de investimento em ações ficam de fora.

No texto-base aprovado ontem, a alíquota proposta era de 20%, mas com a aprovação de emenda do deputado Neri Geller (PP-MT) nesta quinta-feira, o tributo passou para 15%.

O Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) será reduzido de 15% para 8%.

Já a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) diminuirá 0,5 ponto percentual em duas etapas, condicionadas à redução de incentivos tributários que aumentarão a arrecadação. Assim, o total, após o fim desses incentivos, será de 1 ponto percentual a menos, passando de 9% para 8% no caso geral. Bancos passarão de 20% para 19%; e demais instituições financeiras, de 15% para 14%.

Tabela do IR
Quanto à tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), a faixa de isenção passa de R$ 1.903,98 para R$ 2.500 mensais, correção de 31,3%. Igual índice é usado para reajustar a parcela a deduzir por aposentados com 65 anos ou mais.

As demais faixas terão reajuste entre 13,2% e 13,6%, enquanto as parcelas a deduzir aumentam de 16% a 31%. Deduções com dependentes e educação continuam no mesmo valor.

Todas as mudanças valerão a partir de 2022.

Desconto mantido
Depois das negociações de ontem, foi mantido o desconto simplificado na declaração de ajuste anual para todos os declarantes, no valor máximo de R$ 10.563,60.

Atualmente, o desconto é de 20% dos rendimentos tributáveis, limitado a R$ 16.754,34, e substitui todas as deduções permitidas, como gastos com saúde, educação e dependentes.

Pela proposta inicial, esse desconto somente seria possível para aqueles que ganham até R$ 40 mil por ano, limitado a R$ 8 mil (20%).

Deputados reunidos com o presidente da Casa, Arthur Lira, durante a votação. Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados

Impacto orçamentário
Apesar das mudanças no projeto original do Executivo, o relator afirmou que não haverá impacto na arrecadação inicialmente projetada pelo governo. "Impacto zero. Não vamos ter contribuição alguma para o aumento do déficit fiscal. Pelo contrário, acreditamos que as medidas de desoneração do capital produtivo vão impulsionar a economia, que vai gerar mais arrecadação", disse Celso Sabino.

Ele afirmou que já previa a redução da alíquota para distribuição de dividendos, por isso aumentou a alíquota das empresas, inicialmente prevista em 6,5%, para 8%.

Apesar de ser neutra para o governo, a reforma vai atingir alguns contribuintes, conforme reconheceu o relator. "A ampla maioria vai pagar menos, mas o indivíduo que receba R$ 70 milhões de renda por dividendos vai pagar mais imposto", comentou.

Pontos rejeitados

Na votação em Plenário, foram rejeitadas as seguintes emendas:

  • - emenda do deputado Aelton Freitas (PL-MG) previa um escalonamento na cobrança do imposto sobre lucros e dividendos, de 3% a 15% ao longo de cinco anos;
  • - emenda do deputado Bohn Gass (PT-RS) pretendia impor alíquota de 25% para lucros e dividendos mensais acima de R$ 40 mil;
  • - emenda da deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) pretendia submeter os lucros e dividendos à tabela progressiva do IRPF;
  • - emenda do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) pretendia isentar da tributação os lucros e dividendos distribuídos a sócios de escritórios de advocacia;
  • - emenda do deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP) pretendia estender a isenção atual sobre os lucros ou dividendos para aqueles distribuídos até 31 de dezembro de 2022 com base nos resultados apurados até 31 de dezembro de 2021;
  • - emenda do deputado Eduardo Cury (PSDB-SP) pretendia fixar o IRPJ em 6,5% durante 2022 e em 5,5% a partir de 2023;
  • - emenda do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) pretendia permitir a apuração e o pagamento consolidados do IRPJ e da CSLL pelas empresas controladoras e controladas;
  • - emenda do deputado Bohn Gass pretendia reajustar os valores da tabela do IRPF em 47%;
  • - emenda do deputado Wolney Queiroz (PDT-PE) pretendia reajustar, no mesmo índice do projeto, as deduções de despesas com instrução e por dependentes;
  • - destaque do PSL pretendia manter o desconto simplificado na declaração de ajuste do IRPF em R$ 16.754,34;
  • - emenda do deputado Wolney Queiroz pretendia retomar a permissão de desconto, na declaração de ajuste anual, dos valores pagos pelo empregador à Previdência Social a título de contribuição patronal do empregado doméstico;
  • - emenda do deputado Danilo Cabral (PSB-PE) pretendia impedir o fim do voto de qualidade do presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em caso de empate em julgamentos administrativos;
  • - emenda do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) pretendia retomar a isenção, para o período de 2022 a 2026, do imposto de renda retido na fonte a incidir sobre remessas ao exterior de pagamentos por arrendamento mercantil de aeronaves;
  • - emenda do deputado Vinicius Carvalho (Republicanos-SP) pretendia isentar investimentos em debêntures de infraestrutura do pagamento do adicional de IRPJ de 10% previsto na legislação;
  • - emenda do deputado Pedro Cunha Lima (PSDB-PB) pretendia permitir às instituições financeiras deduzirem da base de cálculo do IRPJ e da CSLL as reservas feitas para créditos a receber cujo pagamento esteja atrasado por 90 dias ou mais.

Fonte: Agência Câmara de Notícias
https://www.camara.leg.br/noticias/802838-camara-conclui-votacao-de-projeto-que-altera-regras-do-imposto-de-renda/


Câmara rejeita distritão, mas aprova retorno das coligações proporcionais

Deputados entraram em entendimento após duas reviravoltas em votação na noite desta quarta-feira

Bruno Góes e Evandro Éboli / O Globo

BRASÍLIA — Após mudança de última hora, em sessão conturbada, a Câmara dos Deputados aprovou, em primeiro turno, a reforma política com o retorno das coligações proporcionais.

Em sessão tensa, com duas reviravoltas, líderes de partidos decidiram excluir o distritão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O acordo envolveu ampla correlação de forças e promessa de apreciação também no Senado. O texto principal foi aprovado por 339 votos a favor e 123 contra. Deputados ainda analisam destaques ao texto, e o segundo turno deve ser votado amanhã.

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No distritão, seriam eleitos os candidatos a deputado mais votados em cada estado, sem levar em conta o peso de cada legenda. Com as coligações proporcionais, duas ou mais siglas podem somar seus votos para atingir o quociente eleitoral e, assim, ocupar melhores posições no cálculo de divisão de cadeiras.

A sessão da noite desta quarta-feira começou com uma surpresa quando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pautou o assunto que estava previsto para análise só na quinta-feira.

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No início da deliberação, apoiadores do distritão achavam que teriam maioria para aprovar o modelo de votação. A partir do momento em que o apoio foi minguando, sem a certeza de que havia o quorum mínimo, ou seja, 308 votos para aprová-lo, a relatora, Renata Abreu (PODE-SP), fez um aceno aos contrários e se reuniu com líderes de oposição e do Centrão para encontrar um meio termo.

— Somos contrários ao distritão, é a derrota ao distritão.  Mas as coligações são o mal menor — disse o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), após reunião de 30 minutos enquanto a sessão se desenrolava.

A partir do acordo, outras legendas defenderam a volta das coligações, para vigorar em 2022. Foi o acordo que envolveu a grande maioria dos partidos com representação na Câmara, que incluiu do DEM ao PT. Já PSD e Cidadania ficaram de fora do acordo, pois rejeitaram qualquer um dos modelos.

Levado a toque de caixa, o texto foi negociada no varejo pela relatora. Antes de o distritão ser descartado, levantamento feito pelo GLOBO junto às lideranças e dirigentes de partidos apontava que só cinco siglas, que somam 122 parlamentares, decidiram orientar a favor do novo sistema de votação para o Legislativo. 

Em compensação, nove legendas não haviam definido posição ou iriam liberar os seus filiados para votarem como bem entenderem, um total de 220 deputados. Já 170 se posicionariam de forma contrária.

Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/reforma-politica-camara-rejeita-distritao-mas-aprova-retorno-das-coligacoes-proporcionais-25151889


Flordelis é cassada pela Câmara por 437 votos e perde imunidade

A perda do mandato de deputada federal já tinha sido aprovada pelo Conselho de Ética da Casa, de forma quase unânime, por 16 votos a um

Camila Turtelli / O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Quase um ano após o Ministério Público aceitar denúncia contra a deputada Flordelis (PSD-RJ), acusada de mandar assassinar o marido, a Câmara decidiu cassar o mandato da parlamentar, por quebra de decoro, por 437 votos favoráveis. Houve 7 votos contrários à cassação e 12 abstençõesCom a decisão, ela perde a imunidade parlamentar

Flordelis ainda tentou se segurar no cargo. "Vocês colocarão a cabeça no travesseiro e vão se arrepender por condenar uma pessoa que não foi julgada", afirmou a deputada no plenário nesta quarta-feira, 11, antes do início da votação. "Ainda dá tempo de fazer justiça. Não me cassem."

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Os votos contrários à cassação foram dados pelos deputados Carlos Gaguim (DEM-TO), Dimas Fabiano (PP-MG), Fausto Pinato (PP-SP), Glauber Braga (PSOL-RJ), Jorge Braz (Republicanos-RJ), Leda Sadala (Avante-AP) e Maria Rosas (Republicanos-SP). As abstenções foram dadas por Tiririca (PL-SP), Dulce Miranda (MDB-TO), Eli Borges (Solidariede-TO), Gutemberg Reis (MDB-RJ), Haroldo Cathedral (PSD-RR), Hugo Leal (PSD-RJ), Jefferson Campos (PSB-SP), Laerte Bessa (PL-DF), Márcio Labre (PSL-RJ), Paulo Ramos (PDT-RJ), Marco Feliciano (Republicanos-SP) e Stefano Aguiar (PSD-MG).

A perda do mandato de Flordelis já tinha sido aprovada pelo Conselho de Ética da Casa, de forma quase unânime, por 16 votos a um. O relator, deputado Alexandre Leite (DEM-SP), determinou que Flordelis violou o Código de Ética e Decoro Parlamentar e se contradisse sobre fatos envolvendo o crime. “As provas coletadas tanto por esse colegiado quanto no curso do processo criminal são aptas a demonstrar que a representada tem um modo de vida inclinado para a prática de condutas não condizentes com aquilo que se espera de um representante do povo", escreveu o relator.

Flordelis é acusada de ser a mandante do assassinato de seu marido, o pastor Anderson do Carmo, ocorrido em 16 de junho de 2019, na porta da casa onde os dois viviam com os filhos, em Niterói (RJ). O casal havia conquistado notoriedade por ter criado 55 filhos, a maioria adotada.

Ela, que sempre negou ser a mandante do crime, é ré na Justiça e responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada. Flordelis não podia ser presa até agora por causa da imunidade parlamentar. Ela tem sido monitorada por tornozeleira eletrônica, desde o ano passado.

Nesta quarta-feira, 11, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu levar o caso ao plenário em um formato de “projeto de resolução”, o que permitiu aos parlamentares apresentarem destaques, ou seja, adendos à proposta original. Desta forma, a decisão poderia ser adaptada a uma pena mais branda e não apenas se resumir a sim ou não sobre a cassação, caso fosse essa a vontade do plenário.

“Alterei a regra de discussão de cassação de parlamentar no plenário desta Casa por um entendimento da presidência, no sentido de que o plenário é soberano e órgão maior de decisão na casa Legislativa”, justificou Lira no plenário. “Como projeto de resolução e não como parecer, se 103 parlamentares individualmente acharem que a sua cliente [Flordelis] merece em vez de uma cassação ou absolvição uma suspensão de seis meses”, afirmou o presidente da Câmara aos advogados de defesa de Flordelis. Apesar da nova possibilidade, a deputada foi cassada e não houve apoio suficiente para abrandar a pena.

Durante a votação, que durou mais de duas horas, Flordelis passou a maior parte do tempo sentada sozinha no fundo do plenário da Câmara, na companhia de seus advogados.

Nesta terça-feira, 10, um dia antes de ter seu destino político decidido pelos seus 512 colegas, ela enviou uma carta, pedindo "uma chance", a todos os parlamentares. “Uma chance para que eu possa me defender de um processo injusto de homicídio do meu próprio marido. Uma chance para que eu possa cumprir o mandato que eu fui legitimamente eleita. Uma chance para que minha dignidade seja, um dia, restabelecida”, escreveu na mensagem encaminhada por e-mail.

Os advogados de Flordelis defenderam no plenário que ela tivesse a mesma pena dada ao deputado Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar foi suspenso por seis meses, no caso em que ele é acusado de fazer ataques aos ministros do Supremo, mesmo motivo pelo qual o parlamentar foi preso em flagrante em fevereiro.

Foram mais de 11 meses para o parlamento decidir o destino político da deputada desde que o deputado Léo Motta (PSL-RJ) apresentou um requerimento à Mesa Diretora da Casa pela perda do mandato. O processo começou a tramitar no Conselho de Ética apenas em fevereiro deste ano, depois de um hiato do colegiado que ficou suspenso em decorrência da pandemia.

O suplente de Flordelis é o vereador do Rio de Janeiro Jones Moura (PSD), autor de um projeto que autoriza o uso de armas de fogo por agentes da Guarda Municipal carioca. Ele deve assumir o posto em breve.

Antes de Flordelis, a última cassação aprovada pelo plenário da Câmara foi a de Eduardo Cunha, ex-presidente da Casa, com um placar de 450 votos favoráveis e 10 contrários. 

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,cpi-da-covid-decide-propor-indiciamento-de-bolsonaro-por-charlatanismo,70003807803


Vale trocar o certo pelo duvidoso?

Os potenciais ganhos do semipresidencialismo apresentam custos não triviais

Carlos Pereira / O Estado de S. Paulo

Qualquer sistema político possui um arcabouço institucional multifacetado e complexo de várias dimensões tais como regras eleitorais, sistema de governo, estrutura federativa ou unitária, número de câmaras legislativas, poderes constitucionais do Executivo, nível de independência das organizações de controle etc., que devem estar em relativo equilíbrio para dar funcionalidade ao sistema.

Muitos têm argumentado que o sistema político brasileiro, por ser “hiperpresidencialista”, isto é, com concentração excessiva de poderes no Executivo, tem sido fonte incessante de crises. Reformas de toda sorte têm sido propostas de tempos em tempos como “soluções milagrosas” para gerar a tão sonhada eficiência que o presidencialismo multipartidário supostamente não teria condições de ofertar.

A “bola da vez” parece ser o semipresidencialismo, regime no qual um presidente, eleito pelo voto popular, exerceria funções de chefe Estado, e um primeiro-ministro, escolhido pela maioria do Parlamento, exerceria funções de chefe de governo. 

A grande promessa do semipresidencialismo seria uma maior flexibilidade de substituir governos que perdem maioria parlamentar, sem abalar o mandato presidencial. Essas mudanças ocorreriam, supostamente, sem grandes traumas ou conflitos tão característicos da rigidez de presidencialismos puros, que requerem processos de impeachment muitas vezes traumáticos e polarizados para se livrar de presidentes durante seus mandatos. 

Mas o semipresidencialismo também apresentaria desvantagens, especialmente quando implementado em um sistema político com características marcadamente consensualistas, como o brasileiro, pois a entrada de um primeiro-ministro representaria um ponto de veto adicional num sistema que já possui inúmeros, tais como representação proporcional, federalismo, bicameralismo, fragmentação partidária, Judiciário independente etc.

Portanto, a suposta eficiência de uma maior flexibilidade de mudanças de governos teria que ser confrontada com a potencial perda de eficiência governativa gerada pela entrada de mais um ponto de veto no jogo. Além do mais, regimes semipresidencialistas, que conferem substanciais poderes legislativos ao presidente, tendem a aumentar conflitos com o primeiro-ministro, o que pode acarretar maiores instabilidades ao governo, especialmente se esses atores pertencerem a partidos políticos ideologicamente opostos. 

Em estudo que analisa 72 democracias no mundo, que acaba de ser aceito para publicação na revista Government & Opposition, os colegas André Borges e Pedro Ribeiro mostram que enquanto os poderes legislativos do presidente em regimes presidencialistas puros, como o brasileiro, estimulam a coordenação por meio do aumento da coesão e da disciplina partidária, em regimes semipresidencialistas teriam o efeito inverso. Ou seja, diminuiriam a coesão e disciplina enfraquecendo assim os partidos. 

A almejada eficiência do semipresidencialismo é, portanto, condicionada à existência de presidentes fracos, sem poderes legislativos formais e sem condições de desafiar políticas consideradas indesejáveis que o primeiro-ministro queira implementar. Só nestas condições é que presidentes teriam incentivos para cooperar com o primeiro-ministro e, como consequência, níveis mais elevados de unidade e disciplina partidária poderiam ser observados. 

Ainda que de forma não linear, tem sido por via do presidencialismo multipartidário que o Brasil tem vivido em relativa estabilidade macroeconômica, responsabilidade fiscal, inclusão social e racial, diminuição de pobreza e desigualdade, combate à corrupção etc.

Considerando que todo sistema político tem ganhos e perdas e que o modelo atual tem gerado estabilidade democrática de forma sustentável e a custos relativamente baixos quando bem gerido, a pergunta que fica é se vale a pena correr os riscos das incertezas do regime semipresidencialista.

*Cientista político e professor titular da escola brasileira de administração pública e de empresas (FGV EBAPE)

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,vale-trocar-o-certo-pelo-duvidoso,70003804621


Bolsonaro reconhece que voto impresso pode ser derrotado

Presidente já ameaçou não haver eleições em 2022 caso a medida não seja adotada. Lira diz que chefe do Executivo garantiu que irá respeitar o resultado do plenário da Câmara

André de Souza e Evandro Éboli / O Globo

BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro avaliou nesta segunda-feira que a proposta de emenda constitucional (PEC) do voto impresso pode ser derrotada no plenário da Câmara caso não haja negociação e acordo. Defensor da medida, ele vem atacando o sistema eletrônico de votação, lançando suspeitas de fraude. Em julho, ele prometeu apresentar provas, mas, numa transmissão ao vivo em suas redes sociais, disse ter apenas indícios. O presidente também já ameaçou não haver eleições em 2022 caso o voto impresso não seja adotado.

Contexto: Decisão de Arthur Lira de levar voto impresso a plenário afaga Bolsonaro e divide líderes

Também sem provas, Bolsonaro voltou a atacar o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, que também é integrante do Supremo Tribunal Federal.

Orientação dos partidos sobre voto impresso Foto: Editoria de arte
Orientação dos partidos sobre voto impresso Foto: 

— Se não tiver uma negociação antes, um acordo, vai ser derrotada a proposta, porque o ministro Barroso apavorou alguns parlamentares. E tem parlamentar que deve alguma coisa na Justiça, deve no Supremo, né. Então, o Barroso apavorou. Ele foi para dentro do Parlamento fazer reuniões com lideranças e praticamente exigindo que o Congresso não aprovasse o voto impresso — disse Bolsonaro em entrevista à Brado Rádio, de Salvador.

Como O GLOBO adiantou mais cedo, 15 dos 24 partidos se declaram contrários a PEC do voto impresso. Os partidos declaradamente contrários à proposta somam 330 deputados, segundo um levantamento feito pelo GLOBO com dirigentes e líderes das legendas com assento na Casa. Das 22 bancadas consultadas, apenas duas, com 86 parlamentares no total, confirmam apoio ao projeto que é pivô da atual crise institucional entre o Judiciário e o Palácio do Planalto.

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O presidente também lembrou que o Congresso já aprovou antes o voto impresso, medida que foi derrubada pelo STF. Em 2018, por oito votos a dois, a Corte suspendeu a medida para a eleição daquele ano, por entender que a impressão deixa margem para a violação do sigilo e da liberdade de voto dos eleitores. Em setembro de 2020, por unanimidade, o STF declarou inconstitucional a impressão do voto eletrônico.

— Foi quase unanimidade. Aprovamos. Depois o Supremo, sempre o Supremo, disse que é inconstitucional. Não tem cabimento o que o Supremo fez — disse Bolsonaro.

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Em entrevista à rádio CBN, o presidente da Câmara, Arthur Lira, disse que Bolsonaro lhe garantiu que respeitará o resultado. Lira também disse pensar que "as chances de aprovação podem ser poucas". Por outro lado, caso seja confirmada a rejeição do voto impresso, acredita que a situação atual não pode continuar igual e que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Supremo Tribunal Federal (STF) terão que fazer algumas concessões.

— Tem que respeitar o resultado. O presidente Bolsonaro, no âmbito da relação com a Câmara dos Deputados, ele tem sido muito cordato com relação às coisas como acontecem. Nós sempre agimos com bastante clareza. Eu falei com todos os chefes de poderes, com Bolsonaro. Eu relatei que, embora não usual, para ter um ponto final, traria a PEC para o plenário. Depois de ouvir algumas pessoas e refletir sobre o assunto, eu me convenci de que era a decisão mais acertada. O presidente Bolsonaro, numa ligação telefônica, me garantiu que respeitaria o resultado. Eu confio na palavra do presidente da República ao presidente da Câmara — disse Lira.


Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/bolsonaro-reconhece-que-proposta-do-voto-impresso-pode-ser-derrotada-na-camara-1-25147361

*Título do texto original foi alterado para publicação no portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)


Lira diz que mantém dedo no botão amarelo, que detona impeachment

Arthur Lira se pronuncia sobre a proposta rejeitada na comissão especial que a analisou, e manda recados. Além de dizer que a decisão do conjunto de parlamentares será "inquestionável", alerta que mantém o dedo no botão amarelo

Jorge Vasconcellos

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), anunciou, ontem, em pronunciamento, que decidiu levar para a análise do plenário da Casa a PEC 135/19, que torna obrigatório o voto impresso. Rejeitada na última quinta-feira, por 23 votos a 11, na comissão especial da Casa que a analisa, a proposta está no centro da grave crise entre Jair Bolsonaro e a cúpula do Judiciário. O deputado também criticou a forma como o assunto está sendo discutido e disse que “o botão amarelo continua apertado”, repetindo um alerta que já havia feito sobre a possibilidade de vir a autorizar a tramitação de um processo de impeachment contra o presidente da República.

“Pela tranquilidade nas próximas eleições, e para que possamos trabalhar em paz até janeiro de 2023, vamos levar, sim, a questão do voto impresso para o plenário, onde todos os parlamentares eleitos legitimamente pela urna eletrônica vão decidir. E eu friso: foram eleitos pela urna eletrônica”, disse Lira.

O parlamentar acrescentou: “Para quem fala que a democracia está em risco, não há nada mais livre, amplo e representativo que deixar o plenário manifestar-se. Só assim teremos uma decisão inquestionável e suprema porque o plenário é nossa alçada máxima de decisão, a expressão da democracia. E vamos deixá-lo decidir. Esta é a minha decisão”.

O deputado informou, ainda durante o pronunciamento, que discutirá o encaminhamento da PEC 135/19 ao plenário com os líderes partidários, em reunião marcada para a próxima segunda-feira. Na noite de ontem, após o pronunciamento de Lira, a comissão especial recomendou que o plenário rejeite o texto. Parecer nesse sentido, elaborado pelo relator, deputado Raul Henry (MDB-PE), foi aprovado por 22 votos a 11 no colegiado.

Tensão
Bolsonaro tem dirigido ofensas a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e afirmado que não haverá eleições em 2022 caso o Congresso não aprove a PEC do voto impresso. Aliado do Planalto, Lira tem sido muito pressionado, já que cabe a ele autorizar a tramitação dos mais de 130 pedidos de impeachment contra Bolsonaro protocolados na Casa. Ontem, o deputado enviou um recado ao chefe do Executivo, afirmando para não contarem com ele em nenhum projeto autoritário.

“Repito, não contem comigo com qualquer movimento que rompa ou macule a independência e a harmonia entre os Poderes, ainda mais como chefe de Poder que mais representa a vontade do povo brasileiro”, disse Lira, acrescentando: “Esse é o meu papel e não fugirei jamais desse compromisso histórico e eterno. O botão amarelo continua apertado. Segue com a pressão do meu dedo, 24 horas atento. Todo tempo é tempo. Mas tenho certeza de que continuarei pelo caminho da institucionalidade, da harmonia entre os Poderes e da defesa da democracia. O plenário será o juiz dessa disputa, que já foi longe demais”.

O presidente da Câmara lamentou que a questão do voto impresso esteja no centro das atenções no momento em que o país tem outras prioridades. “O Brasil tem enormes desafios, como as reformas tributária, administrativa, questões ambientais, o combate à pandemia com o avanço da vacinação, além da criação de condições sócioeconômicas para a geração de emprego e renda. O voto impresso está pautando o Brasil. Não é justo com o país e com o que a Câmara tem feito para enfrentar os grandes problemas do Brasil desde que assumi a presidência desta Casa”, disse.

Pacheco: PEC será derrotada

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse que a proposta de emenda à Constituição (PEC) que quer instituir o voto impresso nas eleições do país já em 2022 não deve ser aprovada pelo Congresso. Segundo ele, a tendência é de que o plenário da Câmara siga a mesma linha do que foi decidido na última quinta-feira pela comissão especial que analisou o tema, que rejeitou o parecer do deputado Filipe Barros (PSL-PR) favorável à aprovação da matéria.

Pacheco comentou, contudo, que caso o tema passe na Câmara e siga para apreciação do Senado, a matéria será analisada com responsabilidade e que valerá a decisão da maioria. De todo modo, o parlamentar acredita que a maioria dos deputados estão propensos a arquivar a PEC.

“Essa parece que já é a tônica ou o encaminhamento dado pelo Congresso Nacional, um movimento em que os parlamentares já compreendem que o sistema eletrônico é confiável, sobre o qual as especulações de alguma dúvida não se confirmaram”, disse o senador, ontem, em entrevista à GloboNews.

Pacheco ainda destacou que a decisão do Congresso terá de ser respeitada, seja pela aprovação ou rejeição da matéria. “Temos que ser obedientes ao que é o Estado Democrático de Direito. Quem decide é o Congresso, a partir do critério de maioria, e que se avizinha a uma solução. A tese do presidente da República e de muitos apoiadores é uma tese que, a princípio, será vencida. E aí, todos que forem vitoriosos e derrotados haverão de respeitar os resultados das eleições de 2022”, observou

O presidente do Senado reclamou de quem tenta desmerecer o sistema eleitoral sem apresentar provas de que o modelo é frágil. Ele também criticou o presidente Jair Bolsonaro por ameaçar não permitir eleições em 2022 caso não haja voto impresso.

“Todo aquele que pregar algum tipo de retrocesso democrático ou de que não haverá eleições de 2022 será apontado pelo povo como inimigo da nação. Temos compromisso com a democracia, com a realização de eleições periódicas, que é a expressão mais pura da soberania popular e da vontade do povo, do sufrágio universal, do voto direto e secreto. Não vamos admitir retrocesso”, afirmou, acrescentando que a derrota da PEC na comissão especial serviu como uma resposta do Congresso à crise institucional entre os Poderes por conta do tema.


Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4942316-lira-diz-que-mantem-dedo-no-botao-amarelo-que-detona-impeachment-de-bolsonaro.html


Maria Cristina Fernandes: Calamidade Pública S.A.

Bolsonaro faz escola com propostas que se desviam da covid

A publicidade da nova transação imobiliária do senador Flávio Bolsonaro não estava no roteiro com o qual o presidente Jair Bolsonaro se preparava para enfrentar o momento mais dramático da pandemia.

A ideia era não mexer em time que está ganhando, o do presidente, claro, capaz de manter inertes as instituições contra seu desgoverno na pandemia. E repetir a estratégia do ano passado, no recrudescimento da covid-19, quando jogou o verbo e a Polícia Federal pra cima dos governadores.

Desta vez, parecia óbvio que a nova travessura do primogênito dificultaria sua tentativa de demonstrar que o desespero dos governadores vem do desvio de recursos. A nova morada do senador, no entanto, não foi capaz de baixar o tom do presidente. É assim que ele desvia do assunto. Puxando uma briga ruidosa com os governadores.

Encontrou em João Doria o parceiro ideal para a encenação. Sem espaço no seu próprio partido, o governador de São Paulo investe na polarização com o presidente, mimetizando-o. Endurece o isolamento para cativar os insatisfeitos com o bolsonarismo, mas excetua os cultos religiosos para cativar a mesma plateia do presidente.

A entrada dos presidentes da Câmara e do Senado na mediação com os governadores é útil para Bolsonaro porque canaliza parte das insatisfações. Na carona da mediação, amaciou-se a resistência à fila dupla na vacinação. No mesmo projeto do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) com o qual foi reapresentada a prerrogativa de Estados e municípios de comprar vacina, abriga-se a aquisição pelo setor privado depois de esgotada a vacinação de grupos prioritários.

A mediação com os governadores também amplia os aliados com os quais o presidente da Câmara espera contar para forçar o teto de gastos para além do auxílio emergencial.

Bolsonaro faz escola. Se baixa decreto para ampliar a posse de armas, Lira cria grupo de trabalho para mudar a legislação eleitoral. Ambos têm em comum a capacidade de se valer de um país em choque pelas quase 2 mil mortes diárias para propor temas que nada têm a ver com a urgência do país.

As iniciativas de Lira obedecem a três grandes eixos: aumentar o controle parlamentar sobre o Orçamento, reduzir a competitividade eleitoral e mitigar o controle sobre a atividade parlamentar.

A investida tem método. A começar pelo próprio projeto pessoal de Lira. O deputado renovou seu mandato graças a liminar que o blindou da Lei da Ficha Limpa. Reeleito, trabalhou na adesão do seu bloco a Bolsonaro com o mesmo afinco dedicado ao desmonte do entulho lajavatista.

Avançou uma casa ao conseguir que Augusto Aras desfizesse a denúncia que o próprio procurador-geral da República havia feito. E andou mais duas com o arquivamento de uma das denúncias no STF. Mas a luta continua.

Ainda lhe resta mudar a Lei da Ficha Limpa e a da Improbidade. Para isso, ganham celeridade no Congresso tanto o grupo de trabalho que revisará a legislação eleitoral, comandado pelo PP, quanto o projeto de lei que suaviza a lei da improbidade administrativa, relatado pelo PT.

Uma das opções do deputado em 2022 é a disputa pelo governo de Alagoas. Para isso, precisa limpar seu nome. Se largar o mandato para disputar uma eleição majoritária, o foro dos crimes pelos quais hoje responde como deputado desce para a primeira instância em Brasília, onde subsistem juízes como Vallisney Oliveira.

A sorte de Lira é que ele não está só. Uma das missões do PL, por exemplo, aliado de primeira hora de Lira e partido do indefectível ex-deputado Valdemar Costa Neto, é recuperar a elegibilidade do ex-governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, condenado em duas instâncias por esquema de distribuição de propinas, e marido da nova presidente da Comissão Mista de Orçamento, Flávia Arruda (PL-DF).

O fracasso na PEC da Impunidade não desanimou Lira. Tem à mão uma pauta ecumênica, capaz de ampliar seu apoio na Casa. Basta ver o que está em curso com as tentativas de jogar o maior número de despesas possíveis para fora do teto de gastos. Ao tirá-las do teto, sobraria espaço para aumentar os valores das emendas com as quais os parlamentares esperam se reconduzir em 2022.

Se não for bem sucedido no aumento das dotações para emendas, Lira tem uma carta na manga para aumentar a execução daquelas que o Congresso conseguir aprovar. O presidente da Câmara investe no fim da intermediação das emendas pela Caixa Econômica Federal. É uma das demandas mais ecumênicas da Casa.

Até 2019, todas as emendas tinham a intermediação da CEF. No fim daquele ano, foi aprovada uma emenda constitucional que nasceu pelas mãos da então senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) em 2015 e foi relatada pelo deputado Aécio Neves (PSDB-MG) na Câmara.

Por esta mudança constitucional, o parlamentar pode optar por mandar os recursos de suas emendas individuais pela Caixa ou diretamente para os municípios. Mas os parlamentares querem mais. Pretendem estender a possibilidade de mandar diretamente para a prefeitura também para as emendas de bancada e de comissão.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021 foi aprovada com este dispositivo. O presidente o vetou e agora o Congresso se prepara para derrubá-lo. Os parlamentares alegam que a burocracia da CEF é gigantesca e retarda a liberação.

Como se trata do primeiro Orçamento pós-eleições municipais de 2020, os parlamentares estreitaram laços com prefeitos que ajudaram a eleger e que, agora, se arregimentarão para a renovação dos mandatos dos deputados e senadores em 2022. Por isso, quanto menos travas, melhor.

Nos cálculos da própria Associação dos Engenheiros e Arquitetos da CEF, leva seis anos entre a aprovação de uma emenda e total liberação pelo banco, o que ultrapassa o mandato parlamentar.

Quando o dinheiro vai diretamente para o município fica mais difícil mapear o destino da verba que hoje deixa rastros nas plataformas do Ministério da Economia ou do Senado. No lugar da tríade de instituições que fiscaliza a aplicação dos recursos (Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal e Controladoria-Geral da União) entrariam combalidos tribunais estaduais de contas.

É esse o pulo do gato da execução das emendas ao Orçamento em 2021, ano que será atravessado de cabo a rabo pela pandemia. É a sociedade anônima da calamidade pública que dá as cartas.


Bruno Boghossian: Versão original de Bolsonaro ficou mais perigosa na pandemia

Presidente continuará a fazer estragos enquanto estiver ali

No dia em que o Brasil registrou 1.840 mortes em 24 horas, o presidente da República começou a manhã com seu esporte favorito: dar de ombros para a pandemia. “Criaram pânico, né? O problema está aí, lamentamos. Mas você não pode viver em pânico”, disse a apoiadores, no Palácio da Alvorada.

O discurso é o mesmo do início da crise do coronavírus. Em março do ano passado, em seu primeiro pronunciamento na TV para falar da doença, Jair Bolsonaro disse que não havia “motivo para pânico”. Nas semanas seguintes, vieram a “gripezinha”, o “e daí?” e o “não sou coveiro”.

O Brasil descobriu cedo o tamanho do estrago que um presidente poderia fazer numa pandemia mortal. Desde o início, Bolsonaro incentivou aglomerações, fez campanhas de desobediência a medidas de proteção, divulgou informações falsas sobre a Covid-19, distribuiu remédios ineficazes contra a doença e atrapalhou a aquisição de vacinas.

Nada mudou no curso da tragédia. O vírus se espalhou, e o país conheceu uma nova onda de colapso dos sistemas de saúde, mas o presidente continuou o mesmo. A diferença é que a atitude desumana e a incompetência absoluta dos integrantes do governo tornaram o avanço da doença cada vez mais dramático.

O atraso na imunização e a constante sabotagem às medidas de restrição implantadas nos estados sufocaram as redes hospitalares e deixaram o ambiente livre para o surgimento de variantes que podem ser ainda mais perigosas do que a versão original do vírus.

Também ficou mais perigosa a versão primitiva de Bolsonaro, que insiste em propagar mentiras para desencorajar o uso de máscaras e investe contra governadores que tentam amenizar o desastre.

Ninguém deveria esperar outro comportamento do presidente. Por 12 meses, autoridades aceitaram suas delinquências e se limitaram a corrigir seus erros ou obrigar o governo a cumprir suas funções. Foi pouco. Enquanto estiver ali, Bolsonaro continuará a fazer estragos.


Mariliz Pereira Jorge: Impeachment ou morte

Bolsonaro segue seu roteiro de morte sem ser perturbado.

Bolsonaro segue seu roteiro de morte sem ser perturbado. Na terça (2), ofereceu um almoço no Palácio do Planalto a autoridades. Talvez para celebrar o recorde de óbitos em um dia pela Covid-19. "Estava alegre e descontraído", contou o deputado Fabio Ramalho (MDB-MG). Tirou foto do convescote. Só faltou soltar um "foda-se a vida", como já fez uma blogueira, e postar nas redes sociais.

O prato principal foi leitão, embora saibamos que o que Bolsonaro têm servido numa bandeja diariamente é o pescoço do brasileiro. Nesta quarta, o presidente voltou a debochar da catástrofe que vivemos. Disse a apoiadores que a imprensa o considera "o vírus", que os veículos de comunicação criaram "pânico".

O "pânico", eu digo a Bolsonaro, é este: vacinamos menos de 4% das pessoas, as filas nas UTIs, desastre no PIB, intervenção nas estatais, brasileiros mais pobres, ministros fantoches, 260 mil mortes, um país sequestrado por um delinquente.

O Brasil definha a cada dia que Bolsonaro permanece como líder. Uma bússola quebrada que nos jogou num precipício no qual não paramos de despencar. Parlamentares batem na tecla de que não há clima para o afastamento do presidente. Quantas vidas serão perdidas até que o Congresso sinta o cheiro de mortandade que assola o país?

Mudam os presidentes da Câmara e do Senado, renovam-se as notas de repúdio. Para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a conduta nefasta de Bolsonaro são "exageros retóricos", "comportamentos pessoais condenáveis". Para Arthur Lira, que comanda a Câmara, nem isso. Está mais preocupado em garantir imunidade para a classe.

Ou as instituições afastam Jair Bolsonaro da Presidência ou condenarão um país inteiro à morte: uma parte do país pela devastação que a Covid-19 deixará, mas uma parte ainda maior que herdará terra arrasada pela incompetência e arrogância de Jair Messias Bolsonaro.


Maria Hermínia Tavares: A farra do centrão

Arthur Lira deve pensar que é um bom momento para passar a sua boiada

Na hora em que a morte é mais rápida que as vacinas, o presidente da Câmara e chefe do centrão, deputado Arthur Lira (PP-AL), decidiu trazer a reforma política de volta à agenda do Congresso.

Talvez imaginando que este seja um bom momento para passar a sua boiada, criou duas comissões destinadas a produzir uma pretensiosa revisão da legislação eleitoral e partidária, com mudanças na forma de escolha dos representantes, na propaganda e financiamento de campanhas e no papel da Justiça Eleitoral.

Assim reassume o seu lugar à mesa de debates o fim do sistema de voto proporcional de lista aberta, que distribui as cadeiras no Legislativo entre as legendas segundo a proporção de votos recebidos por elas, uma a uma, respeitada a preferência do eleitor pelos candidatos que compõem as listas partidárias. Em seu lugar, entraria o "distritão", apelido dado ao sistema que os especialistas denominam, com uma ponta de pedantismo, "voto único não transferível". Nele, as cadeiras nas Câmaras e Assembleias iriam para os mais votados, em seus distritos eleitorais, cujos limites, aqui, coincidiriam com os estados da Federação.

Forma raramente adotada de sistema majoritário, hoje, existe apenas na Jordânia, no Afeganistão e em paragens exóticas como Vanuatu e Ilhas Pitcairn. Seus efeitos mais notórios são limitar a representação das minorias e estimular os partidos a apostar em candidatos com grande potencial de votos: pastores, celebridades de TV e formadores de opinião nas redes sociais.

Além disso, o pacote representa um robusto retrocesso nas regras recém-aprovadas para reduzir o número de partidos representados no Legislativo. Pois propõe a revogação da cláusula de desempenho, pela qual cada legenda deve obter ao menos 2% dos votos em nove estados —ou eleger 11 candidatos—, e a volta das coligações nos pleitos para a Câmara e Assembleias Legislativas. Uma e outra coisa estimulam a multiplicação de legendas, fazendo do Brasil um caso extremo de fragmentação partidária.

Finalmente, muitas propostas intentam enfraquecer a Justiça Eleitoral, guardiã eficiente e indispensável da integridade do processo, sem a qual a democracia desaba.

Propostas de reforma política foram recorrentes no país. Por discutíveis que fossem, sempre miraram a melhoria da competição eleitoral e da capacidade de governar. A iniciativa do presidente da Câmara só pretende favorecer os interesses miúdos dos partidos idem que sustentam um governo de ainda mais baixa estatura. É a farra do centrão, que debilita a ordem democrática enquanto a Covid faz a sua parte.

*Maria Hermínia Tavares, professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap


Marcus Pestana: Controles, corrupção e eficiência

Para cumprir seus objetivos, os governos erguem uma estrutura burocrática, leis e normas, processos, instrumentos de gestão. Projetos e programas são implantados combinando recursos humanos, orçamentários, físicos, tecnológicos e parcerias.

É um grave equívoco comparar linearmente a gestão privada e a pública. Na esfera de mercado, os recursos envolvidos são privados, e o empresário pode escolher livremente a aplicação de seus fundos financeiros, e, em caso de ineficiência, ser punido pela falta de competitividade, podendo ser excluído do mercado através de concordata e falência. No setor público é diferente. Os recursos orçamentários são de toda a sociedade que os prove através do pagamento de tributos. O gestor público enfrenta uma série de restrições e limites para que os recursos sejam bem aplicados. Daí a necessidade de concursos públicos, licitações, transparência e controles internos e externos.

A corrupção existe desde que o primeiro balcão público foi montado na Grécia Antiga ou no Império Romano. No Brasil, chegou a limite insuportável como demonstraram recentes acontecimentos. Isso impõe a necessidade de boas práticas administrativas, de transparência total e acompanhamento dos órgãos de controle internos e externos. Devemos ter tolerância zero com a corrupção. Mas hoje, estou convicto, a administração pública brasileira está sufocada na sua criatividade, capacidade inovadora e eficiência pelo excesso de controles exercido pelos tribunais de contas, controladorias e ministério público. Os servidores públicos tendem a ficar inertes, não ousar, não produzir, com receio de no futuro responder a processos com repercussões financeiras e pessoais muito além de sua capacidade de resposta. O conceito de improbidade ficou elástico. Há estudos que indicam que 95% dos processos nos tribunais de contas não envolvem dolo, prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito.

Vamos à vida como ela é. Fui por 16 anos gestor público. Em 05/01/2020 paguei uma multa de quase três mil reais aplicada pelo TCE/MG por emissão do ato de nomeação das comissões de inventário fora do prazo, falhas na gestão do patrimônio da secretaria de saúde e ausência de formalização dos procedimentos no gerenciamento de almoxarifados. Não fui ouvido e recebi o boleto para pagamento da multa. Paguei, já que contratar um advogado ficaria mais caro. Imagina um secretário de saúde que lidera milhares de servidores em centenas de estruturas setoriais, conseguir “abraçar o mundo com as pernas” e cuidar do detalhe do detalhe. Só se for um super-homem.

Recentemente, recebi outro comunicado do TCE/MG sobre um novo processo relativo a convênio com um consórcio intermunicipal do norte de Minas dentro do reconhecido e premiado programa de Transporte Sanitário, cuja prestação de contas não foi feita, embora a secretaria tenha cobrado e aberto tomada de contas especial. Valor histórico, R$ 250 mil, isto 13 anos atrás. Eram milhares de convênios e parcerias, ao secretário estadual de saúde caberia conferir recibos e notas fiscais de cada parceria empreendida para melhorar a saúde da população?

A auditoria do Ministério da Saúde também nos notificou para devolvermos 8 milhões de reais de um convênio de 2005 para fornecimento de equipamentos a vários hospitais de Minas Gerais, por, principalmente, não localizarem os equipamentos. Isto, dez ou doze anos depois dos fatos. Ao verificarmos o item de maior valor (R$ 1.298.000,00), um tomógrafo para o Hospital São João de Deus, de Divinópolis, obtivemos toda a documentação de que o aparelho foi entregue em 28/04/2010 e prestou excelentes serviços ao SUS no centro-oeste mineiro.

São apenas três em dezenas de casos. Orgulho-me da equipe que liderei e que construiu uma das mais admiradas experiências de gestão regional do SUS. Hoje ninguém mais, honesto e movido pelo interesse público, quer aceitar cargos. Os salários são baixos e os riscos enormes. Se não acharmos um novo ponto de equilíbrio vamos matar a administração pública. Tenho ex-assessores honestos, dedicados, excelentes servidores, modestos, que tiveram suas vidas arrasadas, sua imagem comprometida, problemas financeiros inacreditáveis e também de saúde, pelos múltiplos processos que enfrentaram. A eles dedico este artigo como pequena forma de homenagem. 

*Marcus Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG)