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Roberto Freire: Governo de transição segue mesmo sem Temer
Para o deputado, ex-ministro de Temer, caso o presidente seja afastado, processo deverá seguir dentro do que determina a Constituição
Mariana Araújo, do Jornal do Comércio
Ex-ministro da Cultura de Michel Temer (PMDB), o deputado federal Roberto Freire (PPS-SP), afirmou que o processo de um governo de transição no Brasil independe da permanência de Temer no poder. "Na minha compreensão, a transição não é as pessoas. Nós estamos nas vésperas de talvez acontecer isso. Você pode ter na Presidência da República uma outra pessoa que represente a própria transição de acordo com a Constituição", afirmou o deputado, em entrevista à Rádio Jornal, na manhã desta quinta-feira (6).
Freire entregou o cargo em maio deste ano, após a divulgação da delação do empresário Joesley Batista, da JBS, denunciando que Temer teria concordado com a manutenção do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) através do pagamento de propina.
"Vamos admitir que a Câmara aprove o pedido de licença que foi feito pela Procuradoria Geral da República. Assume o presidente da Câmara, de acordo com a Constituição. E continua o processo de transição para 2018, quando se admite a retomada e a superação da crise com eleições gerais no País", acrescentou Freire.
Para Freire, caso Temer saia do poder, o quadro de ministros deverá sofrer poucas alterações. "A transição continua e eu acredito, até, que esse próprio ministério, com algumas mudanças pequenas, vai dar continuidade. Até porque, é bom salientar, em relação a esse governo, fora a delação que foi feita pelos irmãos da Friboi envolvendo o presidente Temer, você não tem nenhum ministério, nenhuma estatal com denúncia de corrupção", disse. Em abril deste ano, quando foi divulgada a "Lista de Fachin", com nomes de 83 investigados na Lava Jato, oito ministros foram citados.
Freire também saiu em defesa de Geddel Vieira Lima, ex-ministro de Temer detido nesta semana. "Quando se diz ex-ministro de Temer, é verdade. Mas ele está sendo processado não é por nenhum ato que ele praticou como ministro de Temer e sim como ministro de Lula ou como diretor da Caixa do governo Dilma", declarou.
Questionado sobre a divulgação do voto do deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB), que apoiou o presidente Michel Temer e, nesta quarta (5), declarou que votará favorável à investigação da denúncia de corrupção contra o presidente, Freire não antecipou o seu voto. "Como presidente do partido, estou querendo discutir com a bancada para saber se tem uma posição de consenso. Não estou querendo de antemão estar definindo. Mas posso talvez dizer a você que há um sentimento de que é difícil impedir processo de investigação", afirmou.
"Não está se condenando ninguém, está, talvez, abrindo a possibilidade de que esse processo corra sobre o comando do Supremo Tribunal Federal", acrescentou.
Sem caos
Freire disse, ainda, que não enxerga a existência de um "caos" no governo. "Se tivesse um casos, estaria com um problema na economia mais grave ainda do que nos foi legado no governo anterior", afirmou, citando o crescimento recente do setor industrial. "A política está vivendo uma dificuldade, mas volto a repetir, é dentro da Constituição. Se vier o afastamento de Temer, vai vir um presidente que não tem nada que indique que vai dar a chamada estabilidade e a continuidade das reformas", pontuou.
"A confusão é geral diante do ponto de vista da política", disse, em outro trecho da entrevista. Para o deputado, o momento do País apresenta "surpresas" a cada momento. No entanto, Freire destaca que, apesar da crise, o Brasil está conseguindo vencer o "obstáculo da Constituição, mantendo as liberdades democráticas", além da economia apresentar sinais de recuperação. Na opinião do deputado, o momento é de atropelos, mas que será vencido dentro do que determina a Constituição.
O deputado atribuiu os problemas de corrupção enfrentados pelo País ao governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). "Não significa dizer que neste governo não está tendo problemas. Tem. Tem problemas estacionários que vieram de lá, do governo anterior, que foi o grande responsável por tudo isso que estamos passando. E veio de lá até o vice-presidente, que, de acordo com a Constituição, era o vice-presidente de Dilma. É bom a gente ter clareza disso para poder superar todos os obstáculos que essa crise nos coloca", declarou.
Quem manda no Rio de Janeiro?
O transcurso da campanha eleitoral no Rio de Janeiro revelou a variedade de poderes paralelos que convivem – nada pacificamente – na cidade
O transcurso da campanha eleitoral no Rio de Janeiro revelou a variedade de poderes paralelos que convivem – nada pacificamente – na cidade. Em plena batalha eleitoral do segundo turno, um dos candidatos à Prefeitura, Marcelo Crivella (PRB), recebeu o apoio público da ex-vereadora Carminha Jerominho, filha e sobrinha de dois políticos vinculados às milícias. Jerominho e Natalino Guimarães comandavam, até serem presos em 2007 e 2008, respectivamente, a principal milícia da Zona Oeste carioca, território ainda submetido extraoficialmente às ordens e armas de grupos paramilitares formados não por narcotraficantes, mas por agentes corruptos do Estado que oferecem aos moradores inúmeros tipos de serviços que não lhes corresponderiam, de segurança à Internet.
Crivella não desprezou o apoio de Carminha, pelo contrário. Disse que todo voto é importante: “Sem voto, ninguém ganha eleição”, disse aos jornalistas.
Foi justamente num restaurante da Zona Oeste, uma das áreas mais povoadas de Rio e onde Crivella é o candidato mais votado, que um guarda-costas dele admitiu a este jornal, ainda no primeiro turno, que para algum candidato fazer comício ali precisaria pedir autorização da milícia. “É assim que funciona, eles mandam aqui. Todo mundo precisa pedir autorização, não só nós”, contava, com naturalidade.
Além de dar sua bênção aos candidatos, o crime também os extorque: os milicianos cobraram até 120.000 reais para que os candidatos pudessem distribuir sua propaganda nos territórios sob seu controle, conforme revelou o jornal O Globo. A taxa imposta pelos milicianos, que já participaram ativamente da política e hoje optam por apoios nos bastidores para perpetuar seu poder, garantia aos aspirantes certa exclusividade frente a outros políticos.
Foi também durante esta campanha eleitoral que, a 55 quilômetros do restaurante da Zona Oeste, um grupo de narcotraficantes desceu um morro encravado num bairro de classe média alta e obrigou dezenas de comerciantes a fecharem suas portas. É assim que, em pleno 2016, o narcotráfico impõe o luto pela morte de algum de seus chefes. Todos os comerciantes fecharam sem pestanejar, apesar de a polícia ter reforçado sua presença no bairro. “Obedecemos ao poder paralelo. Prefiro ter prejuízo a sofrer represálias”, dizia o gerente de uma loja de tintas, com uma viatura em frente às portas abaixadas do seu estabelecimento. É o mesmo discurso do cidadão submetido aos milicianos.
Naquele mesmo dia, um ex-policial, candidato a vereador e presidente de uma das mais tradicionais escolas de samba do Rio – que se abastecem com recursos de origem duvidosa – era executado com 15 tiros em seu comitê de campanha. Para investigar sua morte, a polícia abriu várias frentes, praticamente uma para cada poder paralelo que atua no Rio: as rivalidades que sua candidatura pode ter despertado, sua suposta relação com os milicianos e seus vínculos com os bicheiros e donos de caça-níqueis que, num país onde o jogo é ilegal, são tão ricos e temidos como os traficantes e as milícias, só que ainda mais invisíveis.
Fonte: elpais.com