Bolsonaro
CCJ do Senado tem maioria para aprovar indicação de Mendonça ao STF
Ao menos 15 dos 27 integrantes da comissão devem votar a favor de ex-AGU, segundo levantamento do GLOBO
Julia Lindner e Camila Zarur / O Globo
BRASÍLIA E RIO — A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado tem maioria para aprovar a indicação do ex-advogado-geral da União André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo levantamento feito pelo GLOBO, pelo menos 15 dos 27 integrantes do colegiado pretendem votar a favor de Mendonça, enquanto um é contrário e 11 estão indecisos ou não quiseram responder. A sabatina deve ocorrer na próxima semana, seguida pela votação na comissão no mesmo dia.
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A aprovação na CCJ se dá por maioria simples dos votos, número exato alcançado pelo indicado à Corte, segundo aponta o levantamento. O placar final, porém, é incerto, pois a votação é secreta e pode haver traições. A sondagem atual mostra uma pequena mudança positiva para Mendonça em comparação ao mesmo levantamento feito pelo GLOBO em agosto — na época, 13 senadores da comissão afirmaram que votariam a favor da aprovação do ex-AGU, enquanto dois disseram ser contra a indicação. Mendonça foi indicado para a vaga do ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em julho.
Entre aqueles que indicaram que vão votar a favor de Mendonça, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) preferiu não revelar seu voto à reportagem. No entanto, aliados sinalizam que a parlamentar deve apoiar a indicação do ex-advogado-geral da União. Já a senadora Eliane Nogueira (PP-PI), mãe e suplente do ministro Ciro Nogueira (PP-PI), deve seguir a posição do filho e também apoiar Mendonça, embora não tenha respondido ao levantamento.
A CCJ é a primeira etapa para a tramitação da indicação de Mendonça ao Supremo. Inicialmente, o ex-advogado-geral deve passar pela sabatina, quando os parlamentares terão a oportunidade de indagá-lo sobre diversos assuntos. Para se ter uma ideia, a última sabatina realizada pelo colegiado, do atual ministro Kassio Nunes Marques, em 2020, durou mais de dez horas.
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Uma das questões mais polêmicas para os senadores no momento envolve a abertura de inquéritos da Polícia Federal para investigar pessoas que proferiram críticas ao presidente Jair Bolsonaro. O fato ocorreu no período em que André Mendonça ocupou a cadeira de ministro da Justiça, no início deste ano.
Outro ponto que deve ser questionado são as ações da Operação Lava-Jato, que colocou na mira dezenas de políticos, entre eles membros do Senado. A fala de que Mendonça apoiou a operação também é fator de dificuldade para ele no Legislativo.
A indicação de Mendonça enfrentou uma resistência inédita no Senado, o que levou o processo a ficar parado por mais de quatro meses. Apesar de a culpa ter recaído principalmente sobre o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que é responsável pela pauta, outros parlamentares também são contrários ao nome escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro.
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Na Comissão de Constituição e Justiça, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) faz parte do grupo que quer barrar a indicação. Apesar disso, Renan não respondeu sobre a sua posição oficialmente — no levantamento feito em agosto, o senador disse ser contrário à aprovação de Mendonça. O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também tem evitado manifestar voto, mas recentemente passou a exigir a realização da sabatina com celeridade.
Parlamentares da oposição ainda não decidiram como vão se posicionar sobre a indicação. O senador Paulo Paim (PT-RS) disse que o partido vai se reunir na próxima terça-feira para chegar a um entendimento. Ele também não quis manifestar voto.
A demora para a sabatina, no entanto, fez com que alguns senadores que evitam manifestar o voto expusessem a sua posição. Um deles foi o senador Antonio Anastasia (PSD-MG), que é vice-presidente da comissão e foi cobrado na semana passada a pautar a indicação durante a ausência de Alcolumbre. Em agosto, Anastasia respondeu que não iria antecipar sua posição.
— Um caso excepcional, porque nunca faço isso, porque sempre aguardo a sabatina. Eu já me manifestei pessoalmente a favor da indicação, porque acredito que o ministro André Mendonça tem as condições de exercer as funções no Supremo. Então, já disse isso publicamente — disse Anastasia, na semana passada.
De forma semelhante, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que antes não havia definido o voto, agora informou que "provavelmente votará a favor".
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Outra mudança envolveu a composição da CCJ. Quando a indicação foi enviada à comissão, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) estava entre os membros do colegiado e indicou voto favorável ao ex-AGU. Recentemente, ele se licenciou do cargo e foi substituído por Chiquinho Feitosa (DEM-CE), que ainda não se manifestou.
O cenário para o ex-AGU é mais crítico no plenário, onde o placar deve ser acirrado. Conforme mostrou a coluna de Bela Megale, do GLOBO, no Palácio do Planalto não há certeza alguma sobre a aprovação. Nas contas de ministros que acompanham de perto o tema, a Casa está dividida com 50% dos votos a favor do indicado de Bolsonaro e 50% contra.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/ccj-do-senado-tem-maioria-para-aprovar-indicacao-de-mendonca-ao-stf-25290738
Alcolumbre cede e marca sabatina de André Mendonça, indicado por Bolsonaro ao STF
Sabatina e votação da indicação na CCJ vai acontecer na próxima semana no Senado
Renato Machado / Thiago Resende / Folha de S. Paulo
Após mais de quatro meses de resistência, o presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), marcou a sabatina do ex-ministro André Mendonça, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para uma vaga no Supremo Tribunal Federal.
A sabatina e votação da indicação na CCJ vai acontecer na próxima semana, durante esforço concentrado no Senado para a votação de indicação de autoridades.
Alcolumbre fez uma longa fala sobre o assunto, rebatendo a acusação de que havia tornado inoperante alguns órgãos justamente por não agendar sabatinas.
Citou como exemplo o Conselho Nacional do Ministério Público, afirmando que as sabatinas que lhe cabiam haviam sido feitas, mas que o plenário do Senado não realizou as votações previstas.
O senador pelo Amapá também afirmou que tinha preferência por realizar primeiramente as sabatinas para cargos com mandatos e não para vagas vitalícias, como as indicações para tribunais.
Ele citou especificamente as indicações de Mendonça, para o Supremo Tribunal Federal e também para uma vaga no Tribunal Superior do Trabalho.
"Pessoalmente se tivesse que escolher, eu optaria por colocar todos os cargos nesse momento, os cargos que dispõem de mandato e não os vitalícios", afirmou.
O agendamento da análise do nome de Mendonça acontece um dia após reunião na residência oficial do Senado entre Alcolumbre, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-PE).
Pacheco informou no mesmo dia que havia recebido uma sinalização positiva de que Alcolumbre pautaria a sabatina de Mendonça durante o esforço concentrado para a votação das indicações de autoridades, que será realizado na próxima semana.
"[Alcolumbre] sinalizou que vai fazer todas as sabatinas, todas as apreciações que precisam ser feitas pela CCJ, assim como a senadora Kátia Abreu fez em relação à Comissão de Relações Exteriores com os embaixadores que estão indicados e as demais comissões e assim sucessivamente", respondeu Pacheco, ao ser questionado sobre o que teria dito Alcolumbre ao ser cobrado para fazer a sabatina de Mendonça durante o esforço concentrado.
O senador pelo Amapá vem sendo cobrado duramente por evangélicos, por membros do STF e por outros senadores para destravar a sabatina do ex-ministro da Advocacia-Geral da União.
A cobrança acabou respingando em Pacheco, que passou a ser pressionado para levar a análise diretamente para o plenário do Senado.
Durante sessão plenária na semana passada, alguns senadores, como o líder do Podemos, Álvaro Dias (Podemos-PR), chegou a ameaçar uma grande paralisação dos trabalhos do Senado, se a sabatina de Mendonça não fosse realizado.
Nos bastidores, comenta-se que o principal motivo pelo qual Alcolumbre vinha segurando a sabatina de André Mendonça é o fato de ter perdido o controle sobre a distribuição de emendas. Além disso, também comenta-se que ele gostaria de ver substituída a indicação de Mendonça pela do atual procurador-geral da República, Augusto Aras.
Mendonça é o nome "terrivelmente evangélico" que o presidente Jair Bolsonaro havia prometido indicar para uma vaga no Supremo Tribunal Federal.
ENTENDA TRAMITAÇÃO DAS INDICAÇÕES NO SENADO
- A avaliação sobre a nomeação é feita pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Para iniciar o processo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), deve ler o comunicado da indicação em plenário, o que já foi feito
- A principal etapa na comissão é a realização de uma sabatina do candidato pelos congressistas. Concluída a sabatina, a CCJ prepara um parecer sobre a nomeação e envia a análise ao plenário
- A decisão sobre a indicação é feita em uma sessão plenária da Casa. A aprovação do nome só ocorre se for obtida maioria absoluta, ou seja, ao menos 41 dos 81 senadores
- Depois da aprovação pelo Senado, o presidente pode publicar a nomeação e o escolhido pode tomar posse no tribunal
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/11/alcolumbre-cede-e-marca-sabatina-de-andre-mendonca-indicado-por-bolsonaro-ao-stf.shtml
Lira usa verbas do orçamento secreto para beneficiar prefeitos aliados
À frente da Codevasf em Alagoas, primo de Arthur Lira (PP-AL), é peça-chave na engrenagem montada pelo presidente da Câmara
Patrik Camporez / O Globo
BRASÍLIA — À frente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) em Alagoas, João José Pereira Filho, primo de Arthur Lira (PP-AL), é peça-chave na engrenagem montada pelo presidente da Câmara para beneficiar prefeitos aliados com verbas oriundas do orçamento secreto. O superintendente do órgão no estado administra um caixa turbinado por R$ 83,9 milhões de emendas do relator apadrinhadas por Lira — os repasses já tiveram como destino, por exemplo, Barra de São Miguel, governada pelo pai do deputado. Ao todo, o braço local da empresa pública tem um orçamento de R$ 163 milhões, em valores de outubro.
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No outro lado da equação, prefeitos de fora do círculo político do presidente da Câmara reclamam que tentam acessar os recursos para obras e compra de equipamentos em seus municípios, mas encontram as portas fechadas na Codevasf. Conhecido no meio político como Joãozinho, o superintendente foi indicado para o cargo por Lira, com a chancela do presidente Jair Bolsonaro.
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O “carimbo” de Lira na destinação aparece em documentos do Ministério do Desenvolvimento Regional, em que ele consta como autor das indicações, além de ser confirmado por declarações de prefeitos. Não há nesse tipo de emenda, ao contrário das individuais e de bancada, a possibilidade de visualizar o autor e o destinatário nos portais públicos de acompanhamento dos gastos da União.
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No início do mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a suspensão da execução do orçamento secreto, além da criação de mecanismos de transparência para a execução dos recursos.
Arapiraca, governada por José Luciano Barbosa (MDB), foi agraciada com R$ 23,8 milhões — as portarias que liberaram a verba foram assinadas pelo superintendente. Barbosa é aliado de Lira, que foi à cidade, ao lado do primo, fazer uma entrega simbólica do dinheiro.
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Em nota divulgada no dia 28 de agosto, a prefeitura confirmou que os recursos foram “conseguidos em Brasília por Arthur Lira”. No mesmo dia, Barbosa fez um discurso elogiando o parlamentar pelo “apoio” para recuperar “equipamentos e vias públicas”. A cidade é uma base eleitoral de Lira, onde ele obteve 7.072 votos nas eleições de 2018, sendo o terceiro mais votado.
O segundo maior repasse assinado por Joãozinho, de R$ 3,8 milhões, foi direcionado a Barra de São Miguel, administrada por Benedito de Lira (PP), pai do presidente da Câmara. Em terceiro lugar, com R$ 2,3 milhões, vem Canapi, cujo prefeito, Vinícius José Mariano de Lima (PP), também é próximo a Lira. Os três prefeitos foram procurados, mas não retornaram.
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As verbas para a compra de tratores, caminhões-pipa e retroescavadeiras compõem a maior parte da fatia das emendas de relator da Codevasf em Alagoas. Um levantamento feito pelo GLOBO no Diário Oficial da União encontrou 130 portarias assinadas por Joãozinho que promovem a liberação desses equipamentos. Em solenidades, o chefe da Companhia no estado costuma dizer que “80% dos recursos e equipamentos já liberados pelo órgão tem a participação do deputado Arthur Lira”.
O prefeito de Estrela de Alagoas, Mário Jorge Garrote (PP), por exemplo, foi contemplado com um caminhão-pipa comprado pela Codevasf por R$ 379 mil. Lira foi o deputado federal mais votado no município em 2018, com 41,15% dos votos.
— Aqui Arthur Lira é 100%. Foi ele quem liberou o caminhão-pipa. Claro que isso o ajuda na campanha. Ele libera tudo aqui: poço artesiano, veículos...
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O prefeito de Roteiro, Alysson Sardina (PP), onde Lira também foi o mais votado em 2018, com apoio de 34,19% dos eleitores, faz coro. A cidade de 7 mil habitantes foi contemplada com uma das 31 retroescavadeiras adquiridas — a cerimônia de entrega teve a presença de Lira.
— A gente fala com ele (Joãozinho) e sempre resolve rápido. Meu apoio é certo (a Lira) em 2022.
Nas cidades administradas por opositores de Lira, o cenário é bem distinto. Um exemplo é São Brás, onde o prefeito diz que os reparos nas estradas dependem de uma máquina “sucateada”. O último convênio da União com a cidade, segundo portais públicos do governo federal, foi firmado em 2017. Lira obteve apenas 27 votos no município em 2018.
— A cidade é banhada pelo Rio São Francisco, então as liberações da Codevasf deveriam ser automáticas, sem depender de indicação do grupo do Lira — reclama o prefeito Klinger Quirino (MDB), pontuando a necessidade de uma obra de desassoreamento.
Em Palmeira dos Índios, o prefeito Julio Cezar (PSB), que também não integra o grupo político de Lira, diz que há solicitações paradas na Codevasf. O presidente da Câmara obteve só 9,52% dos votos na cidade em 2018.
— Apresentamos à Codevasf pedidos de máquinas e equipamentos, mas estamos aguardando desde janeiro — diz o mandatário.
Lira: “toda a bancada”
Lira afirmou que os equipamentos entregues pela Codevasf em 2021 têm origem em recursos destinados “por todos os parlamentares da bancada de Alagoas, deputados e senadores, por meio das emendas de bancada”. O presidente da Câmara acrescentou que “gostaria de ter entregado o número de maquinários apontado pela reportagem, o que beneficiaria muitos municípios e associações comunitárias alagoanos”.
Procurado, Joãozinho não atendeu. Já a Codevasf disse que as contratações autorizadas pelo superintendente “servem ao interesse social e observam disposições da lei e ritos legais e administrativos aplicáveis”. O texto diz ainda que os equipamentos são comprados em pregão eletrônico e que a formalização da entrega ocorre “após emissão de pareceres, realização de visitas técnicas e produção de laudos de conveniência socioeconômica”.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/lira-usa-verbas-do-orcamento-secreto-para-beneficiar-prefeitos-aliados-25289459
Moro defende aumento de auxílio e faz aceno ao PSDB
Ex-ministro participou de reunião com a bancada do Podemos e falou sobre a PEC dos precatórios
Lauriberto Pompeu / O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O ex-ministro da Justiça Sérgio Moro (Podemos) subiu o tom do discurso de campanha ao Palácio do Planalto e criticou os governos de Jair Bolsonaro e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seus principais adversários. Moro esteve nesta terça-feira, 23, no Senado e, ao lado da bancada do Podemos, partido ao qual se filiou recentemente, defendeu a proposta alternativa à PEC dos precatórios.
“É perfeitamente possível realizar o incremento do Auxílio Brasil sem derrubar o teto de gastos”, afirmou Moro, numa referência PEC que abre caminho para a criação do novo programa social. “É possível conciliar responsabilidade social com responsabilidade fiscal.”
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Ao mesmo tempo em que atacava o governo, o ex-juiz da Lava Jato fazia acenos a outros partidos. De olho em uma aliança com o PSDB, Moro minimizou, por exemplo, os conflitos nas prévias presidenciais dos tucanos.
"O PSDB é um grande partido", elogiou. "Tem que respeitar. Eles vão tomar a decisão no tempo deles", disse. Os governadores João Doria (São Paulo), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio concorrem na eleição interna que vai escolher o candidato do PSDB ao Planalto.
O resultado das prévias estava previsto para ser divulgado no domingo, 21. Problemas no aplicativo de votação, porém, obrigaram o partido a suspender a consulta. A intenção é que as eleições sejam concluídas até o próximo domingo, 28.
Após se reunir com integrantes do Podemos, Moro destacou que a proposta alternativa da PEC dos precatórios, de autoria dos senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), José Aníbal (PSDB-SP) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE) permite a criação do Auxílio Brasil "sem rombo" nas contas públicas.
"O Podemos não pode compactuar com o desemprego dos trabalhadores brasileiros e gerar situações ainda mais difíceis, sob o argumento de que isso seria necessário para combater a pobreza", observou o ex-ministro.
Não faltaram críticas ao PT. “O teto de gastos, quando foi criado, em 2016, resultou em uma imediata queda dos juros. Isso impulsionou a recuperação da economia que vinha da recessão criada pelo governo do Partido dos Trabalhadores", afirmou Moro.
A entrada do ex-ministro na pauta econômica marca a estratégia de sua pré-campanha para evitar sua associação somente com o combate à corrupção. Recentemente, Moro anunciou que o economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, é seu conselheiro econômico.
Quando era juiz da Lava Jato, Moro personificou o discurso antipolítica. Agora, ele tenta equilibrar sua atuação no julgamento de casos de corrupção com a recente entrada na vida partidária. O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou Moro parcial na condenação do ex-presidente Lula.
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Merval Pereira: Bolsonaro, refém do Congresso
Com as emendas impositivas, inclusive as de relator, o Congresso faz uma espécie de autogestão
Merval Pereira / O Globo
O presidente Bolsonaro chegou a uma encruzilhada na sua relação com a base parlamentar, em especial com os partidos do Centrão, mas também com o PSD de Gilberto Kassab, que trabalha para montar um partido tão forte que seja impossível ignorá-lo na composição de um futuro governo, que, ele garante, não será de Bolsonaro.
Um exemplo recente do desentendimento com o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, ainda está na retórica, mas pode ser pólvora no relacionamento. Lira foi a um seminário em Lisboa organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), idealizado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, e aderiu à tese do semipresidencialismo, que Gilmar defende há muito tempo.
Nesse tipo de governo, o presidente da República, eleito pelo voto direto, compartilha o governo com o primeiro-ministro, eleito pelo Congresso. Disse Lira numa palestra: “A previsão de uma dupla responsabilidade do governo, ou de uma responsabilidade compartilhada do governo, que responderia tanto ao presidente da República quanto ao Parlamento, pode ser a engrenagem institucional que tanto nos faz falta nos momentos de crises políticas mais agudas”.
Na primeira afirmativa, não houve a definição de um marco temporal para a eventual adoção do novo sistema de governo, e Bolsonaro sentiu cheiro de queimado. Lira, mais adiante, contemporizou, explicando que, se aprovado, o semipresidencialismo só poderia entrar em vigor na eleição presidencial de 2026. Nem precisava, pois já passou o prazo de um ano antes da eleição para mudar regras eleitorais.
Mas Bolsonaro não engoliu e até hoje reclama. Disse a seus seguidores ontem: “É uma coisa tão idiota que não dá nem para discutir”. Mas estava tão irritado com a ideia, mesmo para seu sucessor, que a comparou a “jogar fora das quatro linhas” e ameaçou combater os defensores da ideia, “o mesmo grupo de interesseiros de sempre”, na mesma medida, isto é, fora da Constituição.
O episódio, mesmo sem consequências concretas, demonstra que o presidente é refém do Centrão, em especial do presidente da Câmara, Arthur Lira, que faz o que quer. As críticas que Bolsonaro recebe são de outras vias — a sociedade protesta, a imprensa denuncia —, mas os políticos estão todos alinhados. Com o Centrão majoritário, Bolsonaro não tem lugar de fala, tem de aceitar o que o grupo quer e recebe favores quando os interesses coincidem.
O Congresso está muito independente do governo, não no sentido de defender teses e de se posicionar autonomamente em relação aos grandes temas nacionais, mas no de ter decisões próprias em vários assuntos. A situação piorou com a atuação mais destacada do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, potencial candidato a presidente do PSD de Kassab.
Agora, Bolsonaro nomeou um ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Raimundo Carreiro, para a embaixada em Portugal, abrindo no tribunal uma vaga para a indicação do Senado. Bolsonaro quer um aliado a mais no TCU e pretende nomear seu líder do governo, Fernando Bezerra. Mas o presidente do Senado tem outro candidato, o senador mineiro do PSD Antonio Anastasia. A senadora Kátia Abreu, do PP, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, também está na disputa, mas Bolsonaro não quer nenhum dos dois.
O presidente, no entanto, não controla esse processo, assim como não consegue obrigar a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) a sabatinar André Mendonça, seu indicado para o STF. Pacheco, que pressionava o presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre, a marcar a sabatina, agora tem uma razão também para boicotar Bolsonaro, que realmente está refém de deputados e senadores.
Sempre o governo controlou o Congresso por meio dessas verbas secretas e otras cositas más. Mas, com as emendas impositivas, inclusive as de relator, o Congresso faz uma espécie de autogestão. Mesmo que ele esteja bem posicionado nas pesquisas eleitorais, a expectativa de poder de Bolsonaro vem caindo na visão dos políticos. Por isso, a dificuldade para conseguir a décima legenda é grande. Ele faz exigências como se fosse o Bolsonaro de 2018, mas o de 2022, no momento, não está bem na foto.
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Na coluna de domingo, sobre a diversidade na Academia Brasileira de Letras, não citei um registro histórico importante: entre 2016 e 2017, a ABL teve seu segundo presidente negro, o professor e escritor Domício Proença Filho.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/merval-pereira/post/refem-do-congresso.html
Brasil é a democracia com mais aspectos em declínio do mundo
País teve piora em oito indicadores como liberdades civis e liberdade de expressão, segundo relatório do IDEA
DW Brasil
O Brasil é a democracia que registrou piora no maior número de fatores que medem a qualidade do regime democrático nos último cinco anos. Foram retrocessos em oito aspectos, entre eles liberdades civis, independência do Judiciário, integridade da imprensa e liberdade de expressão.
Os dados estão em relatório divulgado ontem (22/11) pelo Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA, na sigla em inglês), sediado em Copenhague. O IDEA é uma organização intergovernamental apoiada por 34 países e dedicada ao estudo e à avaliação da democracia. O relatório se baseia no acompanhamento de 16 fatores relacionados ao funcionamento adequado de regimes democráticos.
Segundo os pesquisadores do IDEA, o Brasil teve melhoria consistente de seus indicadores nas décadas de 1990 e "sobretudo" na de 2000, tendência que começou a apresentar sinais de desgaste em 2013, quando houve as Jornadas de Junho, e entrou em queda em 2016, ano do impeachment de Dilma Rousseff. O relatório afirma que a piora dos indicadores foi "exacerbada" com a posse de Jair Bolsonaro, em 2019.
O documento dá destaque a iniciativas e declarações de Bolsonaro que questionaram o sistema eletrônico de votação e a atuação do Supremo Tribunal Federal. O relatório diz que o presidente "testou explicitamente as instituições democráticas brasileiras, acusando ministros do Tribunal Superior Eleitoral de se prepararem para conduzir atividades fraudulentas relacionadas às eleições de 2022 e atacando a mídia".
Queda começou em 2016 e se exacerbou com Bolsonaro, mas instituições mostraram resiliência, diz instituto.
O IDEA registra ainda que o presidente "alegou que as eleições poderiam ser canceladas a menos que ele fosse alterado" e "declarou que não iria obedecer determinações do Supremo Tribunal Federal, que conduz um inquérito contra ele por espalhar notícias falsas sobre o sistema eleitoral no país."
Ao lado de Polônia, Benin e Iêmen
O relatório informa que o Brasil foi um dos quatro países monitorados que teve declínio na qualidade do controle do seu governo, um dos quesitos importantes para o bom funcionamento de democracias, que reúne os fatores "efetividade do Parlamento", "independência do Judiciário" e "integridade da imprensa". Além do Brasil, tiveram piora nesse quesito a Polônia, o Benin e o Iêmen.
O texto ressalta que diversos fatores democráticos do Brasil ainda estão em nível superior ao da média da América Latina, devido aos esforços do país para consolidar sua democracia nas décadas passadas. "Seu bom desempenho anterior torna possível que a qualidade democrática do país se reduza sem que ele perca seu status de democracia. Isso demonstra, por um lado, que a democracia brasileira, apesar de ter sofrido anos de retrocesso democrático e queda acentuada em seus indicadores, é resiliente em muitos aspectos, o que é essencial para a reversão do processo atual", afirma o texto.
O relatório também aponta melhoria em alguns aspectos, especialmente em termos de inovações democráticas no Brasil, e cita como exemplo a criação de observatórios para monitorar as compras e ações do governo relacionadas ao enfrentamento da pandemia de covid-19.
Tendência mundial de retrocesso
O processo de erosão democrática enfrentada pelo Brasil é compartilhado por diversas outras nações, em meio ao aumento da desigualdade, da crise de representação partidária e da difusão de notícias falsas em redes sociais.
Desde 1975, quando o IDEA começou a monitorar esses fatores, a década passada foi a que teve o maior de número de países sofrendo deterioração democrática, e a lista de países inclui potências geopolíticas e econômicas como os Estados Unidos e a Índia.
Em 2020, pela segunda vez em vinte anos, o número de países que registrou declínio da qualidade de sua democracia foi maior do que os que registraram melhora.
Um dos aspectos do declínio democrático é o questionamento cada vez maior da lisura de processos eleitorais. As acusações infundadas do então presidente dos Estados Unidos Donald Trump de que as eleições americanas de 2020 teriam sido fraudadas influenciou comportamentos semelhantes em líderes do Brasil, México, Mianmar e Peru, entre outros países, segundo o relatório.
Na União Europeia (UE), três países-membros registraram declínio na qualidade da sua democracia em 2020: a Hungria, comandada pelo primeiro-ministro ultranacionalista Viktor Orbán, a Polônia, governada pelo partido populista Lei e Justiça, que está contestando princípios básicos da UE, e a Eslovênia, cujo primeiro-ministro Janez Janša tem tendências crescentemente autocráticas.
Desde 2015, cinco países perderam o status de democracia, segundo o IDEA: Benin, Costa do Marfim, Honduras, Sérvia e Turquia.
A entidade afirma que "os últimos dois anos desde nosso último relatório não foram bons para a democracia" e que as conquistas alcançadas quando a democracia tornou-se o regime de governança predominante no mundo "agora estão em uma situação precária como nunca antes". "Esta é a hora para as democracias serem ousadas, inovarem e se revitalizarem", disse o secretário-geral do IDEA, Kevin Casas-Zamora, em um comunicado.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/brasil-%C3%A9-a-democracia-com-mais-aspectos-em-decl%C3%ADnio-do-mundo/a-59903888
Alessandro Vieira: Precisamos falar do Orçamento
Quadro atual traz dilemas que persistem desde a redemocratização
Alessandro Vieira / O Globo
Às vésperas da votação da PEC dos Precatórios no Senado, precisamos falar sobre o verdadeiro problema que ela traz à tona. Não é a PEC, muito menos o auxílio social que ela — em tese — torna possível. Não é só o orçamento secreto, ou as emendas distribuídas a alguns parlamentares “coincidentemente” próximo a votações importantes. A verdade é que precisamos falar sobre o Orçamento federal.
O Orçamento no Brasil não tem passado de uma peça de ficção. Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA), em tese, deveriam servir como norte para um planejamento de país: da Educação à Saúde, da Infraestrutura à Agricultura. No entanto o que temos visto governo após governo é um jogo de quebra-cabeça em que as peças não se encaixam e acabam por formar uma imagem turva do que gostaríamos de ser.
A ideia do ciclo de planejamento é bonita: começa com o PPA, quando o presidente eleito tem a missão de desenhar o país que pretende conduzir pelos próximos quatro anos. Ali, os ministérios descrevem suas diretrizes, objetivos e metas para aquele ciclo, que se inicia no segundo ano de cada mandato e se encerra no primeiro ano do mandato seguinte, trazendo o senso de continuidade. Seus programas e ações devem orientar a LDO, em que serão elencadas as políticas públicas a ser priorizadas para que as metas sejam cumpridas. A LOA completa o quadro. Ali se demonstra como o governo pretende pagar por aquilo que foi planejado para o ano seguinte.
O problema é que a teoria tem se mostrado ineficiente na prática, especialmente quando o governo se exime de qualquer responsabilidade sobre presente e futuro. Uma das principais alterações feitas por Bolsonaro na estrutura administrativa foi a incorporação do Ministério do Planejamento ao Ministério da Economia, uma estrutura que se tornou grande demais para a pequena capacidade de gestão deste governo. Em certa medida, perdeu-se a visão estratégica da economia e do próprio planejamento. Talvez tenha sido uma mostra do que se podia esperar.
No entanto o quadro atual traz dilemas que persistem desde a redemocratização. Por vezes, não é possível compreender os confusos Projetos de Lei do Congresso (PLNs) que buscam alterar a colcha de retalhos que virou o Orçamento público federal. A atenção de todos acaba se voltando mais para o não previsto, e o recurso discricionário (livre de definições prévias) se torna objeto principal, seja como RP2 (emendas discricionárias), RP9 (emendas de relator) ou a manobra orçamentária que surgir. Ocupam-se mais com o recurso que deveria apenas corrigir distorções do que com o que deveria balizar o funcionamento do país.
Então tem-se uma bola de neve: processos nada transparentes geram execuções obscuras, dificultam a fiscalização da execução e permitem o surgimento de esquemas que só mudam de nome, independentemente de qual partido esteja no poder. No passado, Anões do Orçamento, mensalão. Atualmente orçamento secreto (ou bolsolão). E nos atemos mais aos nomes que às soluções.
Especialmente no pós-pandemia, precisamos de governantes que compreendam a importância do ciclo: planejar, executar, fiscalizar. Precisamos nos concentrar no que é essencial para garantir um mínimo de dignidade à população mais carente e criar as condições necessárias para que a nossa economia seja reconstruída. Precisamos de processos transparentes, de um Orçamento que possa ser revisto, mas que sirva como norteador real, e não fictício, de um projeto de país.
Com parlamentares mirando na poupança eleitoral e um presidente preocupado em manter seu poder de compra sob o Centrão, dificilmente teremos o melhor resultado. Ou começamos quanto antes a construir um país em bases verdadeiramente sólidas, ou tudo que teremos será uma nação sempre prestes a ruir.
*Senador (Cidadania-SE)
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/precisamos-falar-do-orcamento.html
Pandemia fez mortes dispararem em 15% no Brasil, mostra IBGE
De 2018 para 2019, por exemplo, o aumento do número de mortes foi de 2,6%
Maria Eduarda Cardim / Correio Braziliense
O cenário atual da pandemia da covid-19 é outro, mas, no ano passado, o número de mortes causadas pelo novo coronavírus impactou vertiginosamente os índices de óbitos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados ontem. Pelos registros civis em cartórios, o Brasil teve a maior alta de mortes desde 1984, na comparação com o ano anterior. De 2019 para 2020, o número de mortes no Brasil aumentou praticamente 15%, enquanto que os registros de nascimentos e casamentos despencaram de um ano para o outro.
A gerente da pesquisa do IBGE, Klívia Brayner, explicou que a alta no número de óbitos, observada no ano passado, é fora do comum quando se observa os movimentos dos anos anteriores. De 2018 para 2019, por exemplo, o aumento do número de mortes foi de 2,6%.
“Olhando desde 1984, mesmo que as séries mais antigas não sejam comparáveis com as atuais, pois o índice de sub-registro era muito alto, é possível observar que nunca antes tivemos uma variação acima de 7% de um ano para outro. Em geral, o incremento ficava abaixo ou em torno de 3%. De 2010 a 2019, a média de variação foi de 1,8%”, observou.
Mais de 99% da variação vista nos óbitos registrados em 2020 ocorreu nas mortes por causas naturais, classificação que inclui o óbito decorrente de doenças como a covid-19. “Houve um crescimento relevante das mortes por causas naturais, o que é condizente com o cenário de uma epidemia. Por outro lado, o fato de as crianças e os adolescentes terem ficado em casa parece ter reduzido expressivamente os óbitos até os 15 anos, talvez pela menor exposição a agentes patógenos, em geral, ou a riscos de causas externas”, comentou Klívia.
A pandemia influenciou não só no aumento do número de registros de óbitos, mas, também, nos registros de nascimentos, que caíram pela segunda vez consecutiva. De 2019 para 2020, houve queda de 4,7% — de 2018 para 2019, houve queda de 3%. No ano passado, ao todo, 2.728.273 de nascimentos foram registrados. Reduções foram observadas em todas as regiões do país, mas foi acentuada no Norte (-6,8%) e no Nordeste (-5,3%).
Outro ponto indicado pelos registros é o fato de que as mulheres estão adiando a maternidade. Em 2000, os registros de crianças nascidas, cujas mães tinham menos de 30 anos, eram 76,1% do total. Em 2020, esse número chegou a 62,1%. Já os dados de nascimentos, em que as mães têm de 30 a 39 anos, subiram de 22% em 2000 para 34,2%, no ano passado.
Casamentos
Além disso, de 2019 para 2020, houve uma redução de 26,1% no número de casamentos civis no Brasil, a maior queda da série histórica. Os registros desceram de 1.024.676 para 757.179. entre 2019 e o ano passado.
“O movimento de queda vem sendo observado, anualmente, desde 2016, mas em 2020 essa variável foi afetada pelo isolamento social em decorrência da pandemia”, observou o IBGE.
O recuo no registro de casamentos nos cartórios brasileiros foi visto em todas as regiões, mas Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste foram as que apresentaram maior queda.
(Colaborou João Vítor Tavarez, estagiário sob a supervisão de Fabio Grecchi)
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2021/11/4964267-pandemia-fez-mortes-dispararem-em-15-no-brasil-mostra-ibge.html
Amazônia: Desmatamento é o maior em 15 anos; governo teria 'escondido' dados
Dados estavam prontos no final de outubro, mas só foram divulgados ontem (18), dias depois do final da COP26, a cúpula do clima
Naiara Galarraga Gortázar / El País
A Amazônia brasileira perdeu 13.235 quilômetros quadrados de árvores em um ano, de acordo com o último balanço anual, divulgado nesta quinta-feira com enorme discrição pelo Governo de Jair Bolsonaro. A cifra indica que o desmatamento ilegal entre agosto de 2020 e julho de 2021 aumentou 22% em relação ao período anterior, quando somou 10.851 quilômetros quadrados. É a maior registrada nos últimos 15 anos. Este balanço anual, elaborado com medições de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), é o mais esperado por todos os envolvidos na proteção e preservação da maior floresta tropical do mundo. É como uma prova final, a medida do sucesso ou do fracasso.
É também o parâmetro pelo qual o mundo mede o desempenho ambiental do país que abriga a maior parte da maior floresta tropical do mundo. Neste ano, a nota aponta um fracasso clamoroso.
O expressivo aumento registrado pelo sistema Prodes contribuirá para agravar a crise climática, mas é também um problema diplomático para o presidente brasileiro. O desaparecimento acelerado da vegetação na Amazônia representa uma ameaça para o futuro do Brasil e do planeta. À medida que a área arborizada da Amazônia diminui de tamanho, a floresta perde biodiversidade e a capacidade de refrescar o planeta e desacelerar o aquecimento global. O sistema Prodes contabiliza áreas desmatadas de mais de 6,25 hectares, o que o torna o mais preciso entre os utilizados pelo Brasil.
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O saldo foi conhecido quando o Governo o disponibilizou na internet, sem anúncio ou apresentação, por meio de uma nota. A declaração não está datada desta quinta-feira, mas do último dia 27 de outubro, portanto antes do início da cúpula do clima COP26, em Glasgow. Cientistas e ONGs ambientalistas acusaram o Executivo e o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, de terem ocultado as informações de que dispunham durante as negociações nas quais o Brasil se comprometeu a eliminar completamente o desmatamento até 2028. Também acusam as autoridades brasileiras de ter enganado o restante dos participantes da cúpula ao apresentar os resultados de outra medição, a dos alertas do sistema Deter, que é menos precisa e rendeu dados muito mais positivos.
O Observatório do Clima afirma que esses 13.235 quilômetros quadrados desmatados ilegalmente em um ano revelam “o triunfo do projeto ecocida de Bolsonaro”. Para o Greenpeace, “o governo tentou lavar sua imagem em Glasgow sabendo que havia quebrado um recorde de desmatamento”. A organização alertou que o cerco ao Brasil está se estreitando porque, por exemplo, a Comissão Europeia propôs impedir a entrada nos mercados da União Europeia de soja, cacau, café, óleo de palma, carne bovina, madeira e seus derivados caso venham de áreas de desmatamento.
A extração ilegal de madeira tem aumentado desde 2017, mas desde que a extrema direita e os negacionstas da ciência chegaram ao poder, em 2019, o crescimento da área devastada se acelerou, impulsionado por vários fatores. Sua política ambiental tem consistido em enfraquecer as estruturas de fiscalização e vigilância, além de dar asas a quem explora a floresta contornando as leis. Bolsonaro demitiu ambientalistas veteranos de seus cargos para substituí-los por policiais militares encarregados dos órgãos responsáveis pela proteção do meio ambiente, dos povos indígenas e da biodiversidade.
O presidente cumpriu a promessa de não demarcar mais um centímetro de reservas ecológicas ou terras indígenas e o Congresso está trabalhando em um projeto de lei para legalizar a mineração em terras que hoje são legalmente intocáveis para exploração comercial.
A imposição de multas por crimes contra o meio ambiente despencou nos últimos anos. As medidas que o Governo tem adotado, face às pressões de outros países, investidores e ONGs, não surtiram efeitos significativos. O envio de milhares de soldados foi caro e ineficaz para conter o aumento do desmatamento, como indica o balanço. O ministro do Meio Ambiente sustenta que os números divulgados nesta quinta-feira “não refletem a ação do Governo nos últimos meses” com o destacamento, por exemplo, de integrantes da Guarda Nacional. O Governo Bolsonaro insiste em proclamar que não tolerará ilegalidades na Amazônia, mas a verdade é que basta ir lá para testemunhar a velocidade com que o desmatamento, a ocupação de terras por gado e as invasões de garimpeiros em terras indígenas estão avançando.
Em intervenção inédita, gestão Bolsonaro faz seleção de questões do Enem
Desde a eleição, presidente busca controlar conteúdo, por meio de impressão prévia da prova, análises e até comissões externas ao Inep
Renata Cafardo e Júlia Marques / O Estado de S.Paulo
O governo Jair Bolsonaro tem usado diversas estratégias, como a impressão prévia de provas e a análise do banco de questões por comitês externos ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), para tentar controlar o conteúdo do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Servidores que pediram exoneração do órgão federal falam em pressão para trocar questões e o Estadão apurou que já houve supressão de itens "sensíveis" na prova que será aplicada nos dias 21 e 28 de novembro.
Segundo relatos à reportagem, 24 questões foram retiradas após uma “leitura crítica”, sob o argumento de serem “sensíveis”. Depois, 13 delas voltaram a ser incluídas e 11 foram definitivamente vetadas.
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Para essa análise das questões, servidores do Inep tiveram de imprimir a prova previamente dentro da sala segura do órgão, em um procedimento não adotado em anos anteriores. A sala segura é um ambiente criado para manter o sigilo absoluto da montagem das provas, com detector de metais e senhas nas portas. Quem examinou uma primeira versão do Enem deste ano foi o diretor de Avaliação da Educação Básica do Inep, Anderson Oliveira – que está no cargo desde maio.
As comissões de montagem da prova sugeriram outras perguntas para substituir as 24 retiradas, mas o Enem acabou descalibrado – o exame tem uma quantidade de questões consideradas fáceis, médias e difíceis. Por isso, algumas tiveram de ser reinseridas no teste. Procurado, Oliveira não quis dar entrevista.
Em 2020, segundo apurou o Estadão, um dos que entraram na sala segura para ver as questões foi o general da reserva Carlos Roberto Pinto de Souza, ex-comandante do Centro de Comunicação do Exército, que ocupava o mesmo cargo de Oliveira. Ele morreu de covid e foi substituído pelo tenente-coronel-aviador Alexandre Gomes da Silva.
Neste mês, houve 37 pedidos de exoneração de servidores do Inep, que denunciaram a pressão interna e a “fragilidade técnica” da cúpula da autarquia responsável pelas avaliações do governo. O presidente Jair Bolsonaro afirmou na segunda-feira, 15, que o Enem começa agora a “ter a cara” do governo. Acrescentou que “ninguém precisa estar preocupado com aquelas questões absurdas do passado”.
O vice-presidente Hamilton Mourão, porém, negou interferência, com a alegação de que esse era o jeito de o presidente falar. Já o ministro da Educação, Milton Ribeiro, inicialmente, afirmou que teria acesso prévio às perguntas. Depois, recuou: disse na terça-feira que “não houve interferência”.
As questões do Enem são feitas por professores contratados pelo Inep há anos. Depois, comissões técnicas do órgão montam a prova de cada uma das quatro áreas, seguindo a metodologia de Teoria de Resposta ao Item (TRI), que calibra a dificuldade do exame.
Segundo servidores, porém, o atual presidente do órgão, Danilo Dupas, deixou claro que a prova não poderia ter perguntas consideradas inadequadas pelo governo. Essa pressão era entendida por servidores como um assédio moral e fez parte das denúncias. De acordo com eles, Oliveira também era pressionado e chegou a divulgar um documento dizendo que apoiava o pedido de exoneração dos seus subordinados. Eles afirmaram ainda que o clima de pressão atual já levou a uma autocensura dos grupos que escolhem as questões. Temas como sexualidade e ditadura militar, por exemplo, deixaram de ser sugeridos.
A intenção do governo de mexer no Enem paira no Inep desde a eleição de Bolsonaro, em 2018, quando ele criticou uma questão que mencionava um dialeto de gays e travestis. A então presidente do Inep era Maria Inês Fini, que criou o exame no governo Fernando Henrique Cardoso e voltara ao órgão na gestão Michel Temer. Ela conta que sempre leu o Enem antes porque esse era o seu papel, mas no computador e em “um trabalho técnico e não fiscalizador”.
“Essa coisa de considerar questões sensíveis nunca existiu”, diz. “Hoje, quem está lendo não entende nada de avaliação.” A reportagem consultou outros ex-presidentes e todos afirmaram nunca analisar a prova previamente. Procurado sobre o assunto na terça-feira, o Inep não se manifestou.
Comissão para avaliar Banco Nacional de Itens do Enem
No primeiro ano do governo Bolsonaro, uma comissão foi criada para avaliar a pertinência do Banco Nacional de Itens do Enem com a “realidade social” do Brasil. O ministro da Educação à época, Abraham Weintraub, afirmou que as questões não viriam carregadas “com tintas ideológicas”. Essa comissão chegou a desaconselhar, em 2019, o uso de 66 questões por promover “polêmica desnecessária” e “leitura direcionada da história” ou ferir “sentimento religioso”.
Neste ano, houve nova tentativa de criar comissão para avaliar as questões. O Inep preparava uma portaria para formar um grupo permanente que deveria barrar “questões subjetivas”. A ideia era que se abstivesse de “itens com vieses político-partidários e ideológicos”. O caso foi levado ao Ministério Público Federal, que recomendou, em setembro, que o Inep desistisse dessa comissão. Em resposta, o órgão afirmou que a recomendação foi atendida.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,gestao-bolsonaro-ja-cortou-questoes-do-proximo-enem,70003900649
Maioria dos autocratas precisa de dois mandatos para destruir democracia
Casos da Hungria, Venezuela, Turquia e Nicarágua mostram que escalada autoritária se radicaliza a partir da reeleição
Oliver Stuenkel / El País
No começo dos anos 1990, um outsider de currículo irrisório conseguiu chegar à presidência do Peru com um discurso vago e antiestablishment. Em menos de dois anos no cargo, articulou um golpe de Estado que lhe renderia quase 10 anos no poder e uma ficha criminal enciclopédica. Em tempo recorde, a ditadura de Alberto Fujimori suspendeu o Congresso e a Constituição, acabando com a independência do Judiciário e do Ministério Público. Desde então, seu regime de perseguições, supressão da liberdade de expressão e abusos sistemáticos dos direitos humanos é o sonho de consumo de autoritários de todas as partes do mundo não apenas pela virulência, mas sobretudo pela agilidade.
O que torna o caso de Fujimori tão peculiar é a rapidez com a qual o peruano conseguiu efetivar sua passagem de presidente eleito a ditador, concentrando todo o poder no Executivo e corroendo a ordem democrática logo no primeiro mandato. Essa eficiência é motivo de admiração e inveja entre políticos com ambições autoritárias até hoje. Isso porque a maioria dos autocratas costuma demorar bem mais tempo para atingir seus objetivos, perdendo anos preciosos de poder absoluto e arriscando-se a ter seus planos interrompidos por um eventual fracasso em se reeleger. Casos como o de Hugo Chávez na Venezuela, de Daniel Ortega na Nicarágua, de Viktor Orbán na Hungria e de Tayyip Erdogan na Turquia mostram que, na maior parte das vezes, o autoritário precisa se reeleger ao menos uma vez para conseguir afundar o sistema democrático. Em todos esses exemplos, as ações do primeiro mandato já disparavam os alarmes dos observadores internacionais, mas foi a partir do segundo que o autoritarismo tirou a luva de pelica e mostrou suas garras.
As tendências autoritárias de Hugo Chávez já eram perceptíveis muito antes de ele assumir a presidência, em 1999. Afinal, sete anos antes, o então tenente-coronel já tinha feito uma tentativa de golpe contra o presidente Carlos Andrés Pérez. Mesmo assim, medidas claramente ditatoriais como não renovar licenças de canais de TV críticos ao Governo, enfraquecer a assembleia nacional e prender e intimidar juízes só começaram a ser implementadas após sua primeira reeleição, em 2006. No caso de Daniel Ortega, as coisas começaram de um jeito ainda mais sutil. Logo após sua primeira eleição, em 2006, o país sofreu uma ligeira melhora na análise do Índice Democrático da revista britânica The Economist, alcançando uma pontuação melhor que a de vários países da região, inclusive Equador e Honduras. No entanto, a partir do segundo mandato, em 2011, a democracia nicaraguense entrou em declínio permanente, com ampla cooptação do judiciário e das autoridades eleitorais. O resultado é que a eleição de fachada que lhe garantiu o terceiro mandato, em 2021, terminou com sete pré-candidatos presos a poucos meses do pleito.
O quadro se repete mesmo em países onde a democracia parecia mais consolidada. Quando Viktor Orbán assumiu o comando da Hungria, em 2010, o país se encontrava várias casas à frente da maior parte da América Latina no Índice Democrático da The Economist. Durante seu segundo mandato, porém, Orbán conseguiu enfraquecer as instituições húngaras de tal forma que hoje o país está com pontuação pior no Índice Democrático do que o Brasil, a Argentina e até mesmo a combalida Filipinas, cuja democracia vem sofrendo golpes consecutivos nas mãos do populista Rodrigo Duterte.
É por isso que impedir a reeleição de um autoritário é ainda mais importante do que barrar sua chegada ao poder. Na República Tcheca, a oposição entendeu o recado e tomou uma postura inédita para evitar a reeleição de Andrej Babis ao cargo de primeiro-ministro. Juntas, as três maiores frentes opositoras do país passaram por cima de discordâncias ideológicas basicamente inconciliáveis e uniram-se em uma ampla coalizão cujo único objetivo era derrotar o incumbente. Contra todas as chances e previsões de analistas políticos, a frente opositora derrotou o projeto autoritário armada apenas com a certeza de que a democracia tcheca dificilmente sobreviveria a outros quatro anos sob as rédeas de Babis. Nesse sentido, uma ajuda fundamental foi fornecida pelo próprio Babis, que deixou claro quais seriam seus planos para o segundo mandato e, na reta final da campanha, convidou Viktor Orbán para participar de seus comícios.
É verdade que cada líder autoritário segue sua própria receita, mas um ingrediente indispensável a quase todas elas é o tempo. Para implementar um regime autoritário, é preciso reduzir a independência do Congresso e do poder judiciário, e isso costuma ser um processo mais demorado. A maioria das constituições limita o poder do Executivo em nomear juízes, o que significa que o incumbente precisa de mais de um mandato para fazer alterações expressivas na composição da casa. Trump, por exemplo, conseguiu nomear 3 juízes de um total de 9 na Suprema Corte, onde o cargo é vitalício. Já Bolsonaro encerrará o primeiro mandato com 2 nomeações de um total de 11 membros do Supremo. Caso seja reeleito, nomeará ao menos outros três, já que Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber se aposentarão até 2023. Isso fora a possibilidade de utilizar artimanhas como aumentar o número de juízes, como foi feito na Venezuela em 2004, ou baixar a idade de aposentadoria para expulsar desafetos, como foi feito recentemente na Polônia e em El Salvador. Foi nesse intuito que a deputada Bia Kicis propôs, em 2019, uma PEC para reduzir a idade de aposentadoria de juízes do STF de 75 para 70. Caso a PEC seja aprovada, Bolsonaro poderia nomear seis juízes em seu segundo mandato.
Porém, há outro fator que explica por que a reeleição de um autoritário geralmente representa o começo do fim para os regimes democráticos. A primeira eleição de um candidato com retórica autoritária muitas vezes ocorre durante profundas crises econômicas, no embalo de uma retórica antiestablishment que costuma atrair eleitores. Muitos deles podem até discordar dos comentários mais radicais de um Trump, Duterte, Orbán, Babis, Erdogan ou Chávez, mas, naquele momento, não enxergam outra alternativa. Ironicamente, boa parte dos eleitores que concedem ao autoritário esse primeiro mandato pecam justamente por um excesso de confiança de que as regras do jogo político acabariam moderando seus excessos. É como se esse voto não tivesse sido no autoritário e em suas propostas, mas contra o establishment e a sensação de inação passada pelos outros candidatos. Esse voto sem grande apoio faz com que muitos desses eleitores rapidamente vivenciem um sentimento de vergonha de sua própria escolha. Do ponto de vista do autoritário, essa falta de convicção impõe certa moderação nos primeiros anos.
Uma vez reeleito, o autoritário ganha confiança. Enquanto a primeira vitória de um líder extremista pode ser vista como acidental, a reeleição tem um profundo impacto empoderador sobre o autocrata, permitindo uma escalada autoritária mais explícita. Mesmo um país com instituições tão resilientes quanto os Estados Unidos correria sérios riscos nessa segunda rodada. Durante a corrida de 2020, Thomas Wright, diretor do Centro de Estudos Americanos e Europeus do Instituto Brookings, escreveu que o Trump do segundo mandato seria ainda mais perigoso que o do primeiro. Após romper com o antigo chefe, seu ex-assessor, John Bolton, alertou para o fato de que a reeleição produziria um “Trump sem freios”.
Além de inflar o ego do incumbente, a reeleição de um líder com tendências autoritárias costuma abalar a oposição e a sociedade civil, dificultando qualquer tipo de reação. Diante da perspectiva de amargar oito anos na geladeira, parte dos opositores simplesmente se deixa cooptar pelo Governo. Outros perdem as esperanças e se retiram da vida pública. Foi isso que aconteceu na Venezuela, quando a segunda vitória de Chávez gerou um desânimo sem precedentes entre os opositores. Àquela altura, eles sabiam muito bem que o presidente ou seu sucessor provavelmente se perpetuariam no poder. Na Hungria, a reeleição de Orbán deu início à perseguição no mundo acadêmico, levando ao fechamento de uma das principais universidades do país.
O caso dos países que sofreram uma guinada autoritária, mas não repetiram o erro na eleição seguinte, costuma ser bem menos grave. Quase um ano após a saída de Trump, a democracia americana ainda apresenta sequelas de seu flerte autoritário, mas saiu dessa experiência relativamente ilesa. Com poucos meses da derrota de Babis, a República Tcheca ainda não deixou completamente a zona de risco, mas há grandes esperanças de que a aliança opositora leve o país a mares mais amenos. Em ambos os casos, a população soube aproveitar sua segunda chance e evitar o abismo.
Oliver Stuenkel é professor adjunto de Relações Internacionais na FGV em São Paulo. É o autor de O Mundo Pós-Ocidental (Zahar) e BRICS e o Futuro da Ordem Global (Paz e Terra). Twitter: @oliverstuenkel
O que alcançaram os movimentos anti-Bolsonaro?
Lideranças consideram que movimentos antigoverno que floresceram em 2020 contribuíram para desgaste de Bolsonaro
Malu Delgado / DW Brasil
George Floyd acabara de ser assassinado nos Estados Unidos, e a primeira onda da pandemia atingia seu pico no Brasil, entre devaneios antidemocráticos do presidente Jair Bolsonaro e a falta de compromisso federal com o combate à covid-19. Ao final do primeiro semestre de 2020 floresceram no país os primeiros movimentos sociais mais organizados contra Bolsonaro.
Mais de um ano depois, alguns deles se desintegraram e não sobreviveram às dificuldades de manter uma coesão durante a pandemia. Ainda assim, lideranças que ajudaram a formar frentes de resistência a Bolsonaro consideram que importantes vozes da sociedade ecoaram mais claramente e se fortaleceram, conseguindo ao menos deter absurdos extremos do atual governo e contribuindo para o desgaste e aumento da rejeição ao presidente.
"Não tenha dúvida de que o índice de rejeição que Bolsonaro tem hoje diz respeito fundamentalmente à ação dos movimentos. Se não fosse toda essa mobilização geral, prevaleceriam só as fake news de Bolsonaro, para quem todas as desgraças brasileiras são responsabilidade de outros", disse à DW Brasil Douglas Belchior, liderança da UNEafro Brasil e membro da Coalizão Negra Por Direitos, criada ao final de 2019. Para Belchior, os movimentos sociais resistiram, cada um a seu modo, e agiram dentro de seus limites.
Ações, unificadas, segundo ele, ajudaram a combater a tese antivacina que prosperava no governo Bolsonaro, intensificando a pressão internacional. Foram também essas vozes da sociedade civil, em especial a da Coalizão Negra, que forçaram a manutenção do auxílio emergencial em 2021, evitando que a miséria e a fome se alastrassem ainda mais pelo país.
"Esses movimentos sociais atuaram e pressionaram a opinião pública e as mídias. Não haveria o desgaste nacional e internacional de Bolsonaro sem isso", sentencia Belchior.
"Com racismo, não haverá democracia"
Estamos Juntos, Somos 70% e Basta! são exemplos de movimentos que surgiram com uma bandeira comum, a luta em favor da democracia numa reação contra atos do atual governo que esses segmentos consideraram atentados contra contra direitos, civilidade e tolerância. No entanto, para Belchior, a morte de George Floyd acendeu também o alerta no país contra o racismo.
O manifesto da Coalizão Negra Por Direitos, escrito em 2020 em paralelo a esses outros movimentos que se expandiam, adotou a seguinte frase como lema: "Enquanto houver racismo, não haverá democracia".
"Uma das primeiras ações do governo Bolsonaro foi tentar derrubar a lei de cotas raciais. O movimento negro fez uma atuação em conjunto", lembra Belchior.
"Para o maior segmento da sociedade brasileira [a população negra], o risco à democracia não é novo. Onde é que tem democracia com a polícia estourando as quebradas e as favelas como sempre fez? Onde é que tem democracia com 800 mil pessoas presas, 40% delas sem julgamento?", questiona Belchior.
Ele considera que a Coalizão Negra talvez seja o único movimento social hoje no Brasil com atividade orgânica – ou seja, organizado na ponta, pela população diretamente atingida –, algo que talvez só se assemelhe ao Movimento dos Sem Terra (MST) da década de 90.
"A gente surge [após a eleição de Bolsonaro] para fazer uma dinâmica política que os brancos sempre fizeram em nosso nome. Onde o movimento negro era a ausência? Nos espaços de poder, no parlamento e em fóruns internacionais. Eram sempre os brancos falando em nosso nome. Mas a história dá uma pirueta e nos obriga a usar essa força de rede também na ponta."
Fim da espiral do silêncio da maioria
Ex-banqueiro e empresário, Eduardo Moreira é um dos nomes mais conhecidos do movimento Somos 70%. Ele enfatiza, no entanto, que nunca alimentou o próprio ego, evitando se colocar como dono do movimento ou utilizá-lo como instrumento de poder. "Sou apenas um dos 70%", pontua.
O empresário considera que o movimento foi extremamente bem-sucedido e ainda tem ecos. O objetivo do Somos 70% era extremamente simples, e muitas vezes não foi compreendido, diz.
"Vivemos no Brasil a espiral do silêncio durante um tempo. As pessoas ouviam 30% [da população que apoia Bolsonaro] falando e se intimidavam. Não só por serem a única voz que aparecia, mas por ser também uma voz muito ameaçadora, que difamava. A ideia dos Somos 70% foi só lembrar as pessoas de que podem falar, e lembrar que elas eram a maioria. Tentavam me botar numa saia justa e perguntavam: mas o [Sergio] Moro faz parte dos 70%? Se ele não é favorável a Bolsonaro, faz. Isso é simplesmente uma estatística. Não é abaixo-assinado. Ninguém pode escolher ser contra Bolsonaro e não estar nos 70%", afirma.
Para Moreira, as atuais pesquisas de intenção de votos confirmam o desgaste de Bolsonaro e são resultado da expressão da maioria. Influente nas redes sociais, o empresário postou recentemente fotos ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Ciro Gomes, que é pré-candidato à Presidência pelo PDT.
"O Somos 70% tinha esse poder de não estar vinculado a nenhum partido político e não ter um compromisso de uma aliança. Normalmente, quando uma pessoa acaba se envolvendo em um movimento específico, se ela conversa com o Lula não pode falar com o Ciro, porque escolheu um lado. Eu sempre defendi a arena do debate. Luto pelo direito de debater. Luto pelo direito de discutir."
A voz minoritária e agressiva que calou a maioria sucumbiu, e agora a percepção geral no país é outra, diz Eduardo Moreira. O movimento, diz ele, "tomou vida própria" e o conceito de Somos 70% foi incorporado pela sociedade. Algumas estatísticas revelam isso, aponta, como o fato de 70% dos brasileiros rejeitarem a flexibilização do porte de armas; 67% acreditarem que a corrupção vai aumentar, e os mesmos 67% rejeitarem a aproximação de Bolsonaro ao Centrão. Além disso, 75% dos brasileiros acham que a democracia é o regime mais indicado, e 78% afirmam que o regime militar foi uma ditadura – todos esses dados de pesquisas recentes feitas pelo Instituto Datafolha.
O ex-banqueiro acredita que o cenário econômico caótico desmascarou a incompetência do ministro da Economia, Paulo Guedes. No entanto, Moreira não crê que haverá impeachment de Bolsonaro, por falta de interesse de grupos políticos à esquerda e à direita. A despeito da acomodação da classe política, ele vê o "antibolsonarismo consolidado".
Resposta da classe artística, Estamos Juntos perdeu fôlego
"No mesmo dia eu recebi um telefonema do Douglas Belchior, da UNEafro, e outro do Luciano Huck. Se os dois enxergaram naquele movimento um ponto de encontro, era sinal de que muita gente cabia ali", relata o escritor e roteirista Antonio Prata, um dos que ajudaram a organizar o movimento Estamos Juntos.
A principal ação do movimento em 2020 foi publicar um enorme
manifesto nas páginas dos principais veículos de imprensa do país, fortalecendo princípios democráticos. O Juntos reuniu assinaturas de intelectuais e políticos de diferentes espectros ideológicos em favor da democracia.
Antonio Prata considera que naquele momento, maio do ano passado, reunir assinaturas de economistas à direita e à esquerda num mesmo manifesto foi um feito relevante. Segundo ele, no auge da pandemia era impossível colocar as pessoas nas ruas, mas havia um forte sentimento, sobretudo entre setores culturais, de que era necessário formular uma ação rápida e contundente contra o atual governo, que flertava com a ideia de golpe institucional.
O movimento Estamos Juntos ganhou adesão significativa da classe artística e se espalhou como rastro de pólvora. Foram criados milhares de grupos de WhatsApp por todo o país. No entanto, hoje, os criadores do Juntos já nem fazem mais parte desses grupos, e a discussão se perdeu. Ainda assim, o escritor considera que o movimento teve um significado relevante na conjuntura de 2020.
Prata pondera que há dificuldades quase intransponíveis quando se reúnem pessoas com pensamentos muito divergentes num único movimento, como foi o caso do Juntos. Além disso, a pandemia dificultou uma organização mais efetiva, acrescenta.
"Mas pra mim deu muito mais a ideia de que é possível fazer coisas do que é impossível", sintetiza. "Não tentaria reavivar aquilo. É muita gente diferente, cabeças diferentes. Não é a turma de ninguém. Não tem um grupo com pensamento e origem parecidas. Há outros caminhos [de resistência ao governo], mas foi ótimo, abriu muitas portas, contatos", acrescenta o escritor.
"Movimentos sofrem síndrome da paixão", diz filho de Herzog
Filho do jornalista Vladimir Herzog, morto na ditadura militar, o engenheiro Ivo Herzog também aderiu à onda de protestos contra Bolsonaro, mas tem uma visão bastante crítica, e amarga um pessimismo diante da apatia da sociedade brasileira.
"Eu realmente me engajei no Estamos Juntos, em meados de maio. Acho que esses movimentos sofrem da síndrome de paixão. É muito fácil se apaixonar, só que paixão tem data de validade. Não perdura. O que perdura é o amor. A paixão a gente mergulha, para de fazer tudo o que está fazendo, mas passa. Isso explica muitoesses movimentos, de maneira geral", diz.
Segundo ele, esses movimentos ganharam fôlego a partir de uma sequência de eventos negativos para o governo no ano passado, como a saída de Sergio Moro do governo, as trocas sucessivas no Ministério da Saúde, a falta de respostas na pandemia e a "flagrante intenção de Bolsonaro de atentar contra a democracia".
Para ele, o movimento Estamos Juntos cresceu muito rapidamente, o que desestrutura qualquer iniciativa. Além disso, pontua, por envolver muitas "celebridades", houve uma guerra de egos nos bastidores do movimento que prejudicou as articulações. "É isso. Perdeu o foco, se perdeu nas discussões, se queimaram pontes. Foi uma paixão avassaladora. Normalmente paixão dura dois anos. Aquela durou dois meses."
Herzog afirma que os pressupostos do movimento eram interessantes e que ele sempre insistiu na necessidade de manter uma ação suprapartidária. Defender nomes e partidos, sustenta, gera distanciamento, e não aproximação. "Nossa luta é contra esse obscurantismo, todo esse processo em que começamos a andar para trás, desde o governo Temer, na verdade", completa.
Empobrecimento democrático
Para Herzog, é pouco provável que a sociedade civil consiga se articular de forma efetiva em 2022 contra Bolsonaro.
"Estou muito descrente. O que vai acontecer é que vamos entrar em 2022 gastando 10% do nosso tempo brigando com Bolsonaro e 90% brigando entre a gente, para ver quem vai ser o cara [candidato à Presidência]. E não vai se discutir conteúdo."
Ainda assim, Ivo Herzog acha que Bolsonaro não se reelegerá, mas o Brasil perderá a chance de debater coletivamente uma proposta de país.
"Não existe uma casa no Brasil para se debater as ideias. Os partidos políticos não são mais isso. Estão atrás de pessoas que tragam votos. Não interessa se o cara usa suástica ou a estrela de Davi. É uma loucura, e o eleitor com um mínimo de consciência se afasta deste processo", lamenta.
Para ele, o fato de o ex-presidente Lula ser "a mesma solução política há 30 anos" é sinal do empobrecimento democrático do Brasil.
"Claro que o Lula de 1989 não é o Lula de hoje, mas é uma loucura você pensar que é o mesmo cara. É desanimador. E olha as alternativas postas... Não dá para pensar no PSDB que faz Bolsodoria. O braço direito do [Geraldo] Alckmin em São Paulo era o [ex-ministro do Meio Ambiente] Ricardo Salles", critica.
Há décadas, conclui Herzog, "o Brasil normaliza o absurdo". "Não vejo ninguém fazendo uma reflexão bem estruturada para esse país."
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/o-que-alcan%C3%A7aram-os-movimentos-anti-bolsonaro/a-59837165