Blog do Noblat
Ricardo Noblat: A voz do dono e o dono da voz
O melhor para o PT é o pior para Haddad
É pule de dez que o ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), negará o pedido de registro da candidatura de Lula a presidente. E que a maioria ou os demais ministros da Corte o acompanharão.
Só não estava certo, pelo menos até esta madrugada, se Barroso anunciará sua decisão ainda hoje, se a tomará monocraticamente ou se a submeterá ao plenário do tribunal. Poderá fazer qualquer uma dessas coisas – ou nenhuma.
O último dia de agosto – ou parte dele – transcorrerá sob a incerteza da participação direta ou não de Lula no primeiro programa de propaganda eleitoral dos candidatos a presidente a ir ao ar, amanhã, em rede nacional de rádio e de televisão.
O pedido de registro da candidatura de Lula foi contestado por 16 pedidos de partidos, entidades e pessoas para que o TSE barre a candidatura por ser ilegal. Lula foi condenado pela Justiça a 12 anos e um mês de cadeia, e está preso em Curitiba.
A resposta da defesa de Lula às contestações só foi protocolada no tribunal às 23 horas de ontem. Com 180 páginas, começou a ser lida por Barroso. Se a decisão do ministro ficar para a próxima semana, melhor para o PT, pior para Fernando Haddad.
Para o PT, quer dizer: para seus candidatos a deputado, senador e governador. Quanto mais durar a farsa da candidatura de Lula, mais eles poderão se beneficiar da popularidade do ex-presidente. Lula é uma vaca leiteira a ser ordenhada até o seu último voto.
Mas a demora causará prejuízo a Haddad, o candidato que substituirá Lula tão logo a farsa saia de cartaz. Uma coisa seria ele aparecer amanhã como candidato a presidente no programa do PT. Outra, aparecer como falso candidato a vice.
Haddad precisa de tempo para se apresentar e ser apresentado. Pela lei, 75% do tempo de propaganda eleitoral destinado a um presidenciável deverá ser ocupado por ele. O resto poderá ser ocupado por seus eventuais apoiadores.
De todo modo, Haddad está aí para o que der e vier, disposto a enrouquecer de tanto repetir que ele é Lula e que Lula é ele. Não é não. Está escrito: ele será a voz do dono. E Lula, o dono da voz.
Marina mata no peito e chuta
O desafio de comportar-se como uma mulher forte
Marina Silva, a candidata da REDE a presidente da República pela terceira vez, deu um show na entrevista ao Jornal Nacional ontem à noite. Exorcizou a imagem de mulher frágil.
Não fugiu às perguntas. Com a mão espalmada, soube impor limite às falas dos jornalistas William Bonner e Renata Vasconcelos. Esteva todo o tempo no controle.
Ao cabo de 27 minutos de interrogatório, e de mais um para que dissesse o que deseja para o Brasil, saiu do ar como entrou – sem ter sido atingida por uma única denúncia de mal feito.
Mas não só. Também sem ter sido pega em contradições, nem hesitado nas respostas que ofereceu. Sempre haverá críticas ao seu novo penteado, mas é impossível agradar a todo mundo.
Cobrada insistentemente por não conduzir seu partido com mão de ferro, a certa altura ensinou sem perder a brandura: “Liderar não é ser dono de partido, Bonner, é ser capaz de dialogar”.
Falou para os diversos tipos de eleitores, mas especialmente para as mulheres que em sua maioria rejeitam a candidatura do deputado Jair Bolsonaro (PSL). Por fim, prometeu:
– Vou fazer um governo de transição. Durante quatro anos, eu vou governar este país para que a gente possa combater a corrupção, fazê-lo crescer e ser um país justo para todas as pessoas.
Todos os candidatos dizem coisas parecidas? Bem, mas eles não disputam prêmio de fantasia na categoria de originalidade.
Ricardo Noblat: Ciro morde e assopra
Sem outro caminho para chegar lá
Que situação, a de Ciro Gomes, candidato do PDT a presidente da República. O PT deu-lhe as costas. Nem com reza braba o apoiaria, como observou certa vez a senadora Gleisi Hoffman, presidente do partido. Na última hora, sabotou a pretensão de Ciro de unir-se ao PSB. Deu ao PSB tudo o que ele queria em troca de o PSB não dar a Ciro seu tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
Mas como precisa desesperadamente do voto de pelo menos parte do PT para disputar o segundo turno, Ciro finge não passar recibo do que lhe fizeram. Não perde oportunidade de elogiar Lula. E lamenta que a justiça o tenha impedido de visitá-lo em Curitiba. Assopra Lula e o PT dia sim e o outro também. Morde de leve seus calcanhares. Morde com gosto os de Geraldo Alckmin (PSDB).
Em um eventual segundo turno contra Alckmin ou o ex-capitão Jair Bolsonaro (PSL), Ciro aposta que o PT cairá de graça no seu colo. De graça é exagero.
Algum preço ele terá de pagar.
A volta dos aloprados do PT
É assim a cada eleição
A contratação de internautas para elogiarem o governador do Piauí, candidato à reeleição, é o primeiro ato conhecido nesta eleição dos aloprados do PT, encarregados do trabalho sujo.
Foi Lula que batizou de aloprados seus companheiros de partido como se nada tivesse a ver com eles. Em 2006, quando tentava se reeleger, gente de sua campanha forjou um dossiê contra o PSDB.
Com ele pretendia-se ligar bandidos que superfaturavam os preços de ambulância a Geraldo Alckmin (PSDB), candidato a presidente, e a José Serra (PSDB), candidato a governador de São Paulo.
A Polícia Federal prendeu militantes do PT e uma mala de dinheiro que pagaria pela confecção do dossiê. Como sempre, Lula mostrou-se indignado e surpreso. O caso deu em nada.
Em 2010, nova patifaria foi descoberta, dessa vez envolvendo gente ocupada em eleger Dilma Rousseff. Abortou-se a tempo mais um golpe contra Serra, então candidato a presidente.
Uma coisa é dispor de elementos para investigar a vida dos adversários – todo candidato dispõe. Outra bem diferente é dispor de elementos para falsificar fatos e influir no resultado das urnas.
As redes sociais estão repletas de mentiras. Mas em tempo de eleição, a lei proíbe que propaganda a favor de candidatos seja apresentada como se propaganda não fosse.
Internautas receberam dinheiro para fazer de conta que elogiavam espontaneamente o governador do PT no Piauí. Ele mesmo declarou que isso fora iniciativa “da moçada da direção do PT”.
Os aloprados da estrela voltaram. Ou melhor: eles jamais saíram de cena.
Ricardo Noblat: Outra ameaça a Bolsonaro
Réu em duas ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF) por crimes de injúria e incitação ao estupro, o deputado Jair Bolsonaro (PSL) corre o risco de tornar-se um tríplice coroado.
Amanhã, a Primeira Turma do STF deverá decidir se recebe ou não denúncia de racismo contra Bolsonaro apresentada pela Procuradoria Geral da República.
Se receber, ele passará à condição de réu outra vez. Isso não o impedirá de ser candidato, mas bem não fará à sua pretensão de se eleger presidente da República.
Comece a pensar no que vai ouvir
Fatos e versões
O PSDB de Geraldo Alckmin apoiou o impeachment de Dilma Rousseff – ou o golpe, como prefere o PT. Certo ou errado?
Certo. Mas Dilma caiu porque gastou além do que estava autorizada a gastar pelo Congresso, perdeu autoridade política e, sem ela, não se governa.
O PSDB apoiou o governo de Michel Temer até um dia desses, e o governo foi incapaz de tirar o país da crise econômica. Certo ou errado? Certo.
Mas quem inventou Temer presidente foi o PT que, por duas vezes, o indicou para vice de Dilma.
Temer é responsável pela crise econômica que devastou o emprego de 17 milhões de brasileiros – ou de 30 milhões, a levar-se em conta o número daqueles que desistiram de procurar emprego. Certo ou errado? Errado.
O responsável foi Dilma, que legou a Temer uma herança maldita. Quem inventou Dilma foi Lula, que a apresentou como melhor gestora do que ele.
Alckmin é investigado pela Lava Jato. Certo ou errado? Certo.
Lula foi condenado e está preso por crime de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Certo ou errado? Certo.
(Prepare-se para ouvir essas coisas e muito mais a partir da próxima sexta-feira quando começa a propaganda dos candidatos no rádio e na televisão.)
Ricardo Noblat: A última de Dilma
Desrespeito à inteligência alheia
Que Dilma carecia de qualidades para governar o país, ninguém mais duvida disso. Nem mesmo seus companheiros de partido. Ela encarregou-se de provar. Lula já despediu desculpas por tê-la escolhido. Não foi nem será desculpado.
Que Dilma queira ser senadora, ela tem esse direito. Foi-lhe concedido pelo Senado, à época sob o comando do ministro Ricardo Lewandowski, quando cassou seu mandato e, em seguida, rasgou a Constituição para preserva-lhe os direitos políticos.
Nem por isso Dilma deveria se permitir dizer barbaridades como a que serviu ontem aos eleitores de Contagem a pretexto de defender Lula. Em ato de campanha, ela afirmou que Lula foi preso apenas para não se eleger presidente em outubro próximo.
Quando um eleitor gritou “Lula ladrão”, ela respondeu: “Esse pessoal é o pessoal do ódio, o pessoal da intolerância, o pessoal que quer o Lula preso porque não conseguem ganhar no voto, tentam ganhar na violência”.
À parte o português como sempre mal tratado, e quando nada em respeito ao cargo que ocupou, Dilma deveria sentir-se obrigada a respeitar a inteligência alheia. Lula está preso e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. Ponto.
Boa parte dos brasileiros que desejam votar nele sabe disso, mas não liga porque acha que todos os políticos roubam, mas que pelo menos Lula fez algo por eles. O que dirá Dilma quando se esgotarem todos os recursos judiciais para libertar Lula?
Por ora, ela, Lula e sua turma atacam o juiz Sérgio Moro e os desembargadores de Porto Alegre que por duas vezes confirmaram a sentença de Moro. Mais tarde atacarão o Supremo Tribunal Federal cuja maioria de ministros foi indicada por eles?
Em telefonema gravado e que se tornou público, Lula já chamou o Supremo de “Corte acovardada”. Para ele que se diz democrata e respeitador de leis, o Supremo só deixará de ser uma casa de covardes se o absolver e soltar.
A lei pode ser para todos, menos para Lula.
A arte de enganar o eleitor
Trump sabe. Bolsonaro aprende
Eleitor ama ser enganado, e os políticos sabem disso. Depois fica furioso quando descobre que foi enganado – os políticos também sabem disso, mas não ligam desde que se elejam.
Fernando Collor era candidato a presidente em 1989 e acabara de sair de um comício no interior do Ceará onde usara um discurso em tudo semelhante ao que faz hoje Jair Bolsonaro.
Entrou no carro que o aguardava na companhia do seu aliado Tasso Jereissati (PSDB), governador do Estado, e começou a gargalhar do que dissera. Foi Jereissati que me contou à época.
Como é fácil enganar eleitor! Primeiro você diz um monte de coisas que pensa e que imagina que ele possa pensar. Se vir que não é bem assim, você nega o que disse e muda de assunto. Funciona.
Se ainda assim lhe cobrarem pelo que disse, não se preocupe. Responda que foi mal interpretado. Ou culpe a mídia por tirar do contexto algumas de suas frases. Costuma dar certo.
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, é um craque nisso e dá um passeio nos seus adversários, incluindo a mídia. Mais tosco do que Trump, Bolsonaro ainda tenta aprender. É um bom aluno.
Diga-se a favor dos dois que eles não são os únicos a procederem dessa maneira. Está para nascer um candidato que só defenda o que fato acredita, sem ligar para o que o eleitor pense a respeito
Talvez eu exagere. Lembro-me de um assim que conheci de perto: o jurista baiano Josaphat Marinho. Foi senador duas vezes, eleito por obra e graça de Antônio Carlos Magalhães.
Ricardo Noblat: Operação Segura Tropa
Bolsonaro radicaliza para não perder votos
Há menos de um mês, o deputado Jair Bolsonaro (PSL) concluiu que estava na hora de tentar avançar sobre fatias do eleitorado que resistem aos seus encantos. A melhor maneira para isso seria suavizar seu perfil de líder duro e repleto de ideias extremas.
Assim tentou se apresentar em sabatinas e nos dois primeiros debates de televisão entre candidatos a presidente da República. Não gostou dos resultados. Menos ainda de ter sido alçado pelas pesquisas à condição de o candidato mais rejeitado.
Então com medo de que parte do seu eleitorado cativo desertasse, deu meia volta volver. É o que se vê desde o início da semana. Voltou a radicalizar seu discurso. Pior do que simplesmente não crescer seria começar a diminuir de tamanho.
É necessário armar as crianças e ensiná-las a atirar, pregou no interior de São Paulo. Quem reagir a assaltos será condecorado se ele for eleito. Rasgue-se o Estatuto da Criança e do Adolescente. Confine-se em campos especiais quem peça refúgio ao Brasil.
Sabatinas? Nunca mais. Bolsonaro “está de saco cheio com elas” e tem mais o que fazer. Debates? Irá a mais três, se tanto. Depois, só se disputar o segundo turno. É pau, é pedra, bateu, levou. Não bateu? Mesmo assim poderá levar.
Bolsonaro de raiz na veia para quem gosta dele.
Que país será esse?
Pergunta que não quer calar
Eleitor capaz de acreditar que Lula é candidato, Jair Bolsonaro não é político e Michel Temer é o principal culpado pela herança maldita que recebeu de Dilma Rousseff, que Brasil de fato ele quer?
Ricardo Noblat: Eunício Oliveira derrota Ciro no Ceará
Com a ajuda do governador do PT
Foi infernal o último fim de semana do candidato Ciro Gomes (PDT). Sem sucesso, ele tentou até o último momento desmontar a coligação do seu partido com o PT do governador do Ceará Camilo Santana e com o PMDB do senador Eunício Oliveira.
O problema de Ciro é com Eunício. Ele o detesta e não o quer no seu palanque. Ocorre que Cid Gomes, ex-governador do Ceará e irmão de Ciro, é candidato ao Senado e ocupará uma das vagas na chapa de Camilo, candidato à reeleição. Eunício ocupará a outra.
Foi com a autorização dos irmãos Gomes que Camilo, sucessor de Cid no governo, atraiu Eunício para sua chapa. Depois disso, Ciro deu para trás. Cid não deu para não se arriscar a perder uma eleição tida como certa. Então Ciro ficou sozinho na sua rejeição a Eunício.
No último sábado, Ciro ficou indignado ao saber que na convenção do PMDB havia dois enormes retratos – um do irmão Cid, outro de Eunício. No domingo, na convenção do PT, mais dois retratos gigantes – um dele, Ciro, o outro de Lula.
Na ocasião, Camilo exaltou as qualidades de Lula e não se referiu a Ciro. Eunício, que apareceu por lá, desfilou com um adesivo de Lula – e desde então tem repetido diariamente que apoia Lula para presidente e que espera vê-lo livre antes das eleições.
A vida de Ciro está difícil até mesmo no seu Estado.
Ciro cumpre tabela
É de desânimo e muita confusão o clima dentro do alto comando da campanha de Ciro Gomes (PDT) à presidência da República. A amigos próximos, Cid, irmão do candidato e coordenador de sua campanha, admite que Ciro perdeu a chance de disputar o segundo turno quando os partidos que se abrigam sob a sigla do Centrão preferiram apoiar Geraldo Alckmin (PSDB).
Essa foi a maior de todas as perdas. A perda da companhia do Partido Socialista Brasileiro (PSB), que se declarou neutro na eleição presidencial, representou apenas 44 segundos de tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão que seriam acrescentados ao tempo do PDT. Lamentável. Não foi, porém, uma perda tão ruinosa, na avaliação dos que cercam Ciro.
O PSB jamais iria por inteiro com Ciro. Sua face nordestina é lulista. E a do sudeste e sul está mais próxima de Alckmin. Se tivesse fechado com o Centrão, não só Ciro ocuparia uma fatia expressiva do tempo de propaganda no rádio e na televisão como ganharia uma estrutura partidária com raízes em todas as regiões do país. O apoio eventual do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) só serviria para que Ciro dissesse que conseguira isolar o PT à esquerda.
O que fazer daqui para frente? Cumprir tabela. Na esperança que por artes da política e da sorte os ventos acabem soprando a seu favor.
Ricardo Noblat: Lula pede para ficar preso
Deixar de ser candidato, jamais!
Onde se lê coisas do tipo: “Lula retira pedido de soltura no STF para impedir discussão sobre elegibilidade”. Ou: “Com medo de ter candidatura impugnada, Lula desiste de pedido de liberdade”.Ou ainda: “Temendo inelegibilidade, Lula retira recurso do STF”. Leia-se simplesmente: Lula prefere ficar a preso a ter sua candidatura barrada pela Justiça. Pois foi isso o que se tratou.
Em junho último, a defesa de Lula entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal pedindo que ele fosse solto e autorizado a disputar as eleições de outubro próximo. Agora desistiu do recurso com medo de que o Supremo declarasse desde já que ele não poderá ser candidato. Em resumo: a tirar a fantasia de candidato a presidente, Lula escolheu manter a fantasia de preso político.
O pedido de desistência do recurso será examinado pela ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no tribunal. Ele poderá aceitá-lo, negá-lo ou submetê-lo ao julgamento dos seus colegas em plenário. Está chegando a hora da Justiça decidir o futuro de Lula. E a Lula só interessa atrasar o relógio. Desistiu há muito tempo do papel de mediador de conflitos. Quer mais é agravá-los.
O que o general acha dos brasileiros
Preconceito e ignorância
Imagine ter como presidente da República ou como vice, o substituto, portanto, do titular do cargo, alguém que pense assim sobre os seus governados: os brasileiros herdaram dos índios a indolência (preguiça), dos negros a malandragem e dos povos ibéricos (portugueses, de preferência), a tendência a querer privilégios.
Se o deputado Jair Bolsonaro (PSL) se eleger presidente, fique desde já sabendo que o vice dele, o general da Antonio Hamilton Mourão, pensa assim de nós. Foi o que ele mesmo disse ontem em sua primeira aparição pública como vice em uma reunião na Câmara de Indústria e Comércio (CIC) de Caxias do Sul, na serra gaúcha.
Por que o general não disse, por exemplo, que os brasileiros herdaram dos índios o amor pela natureza? E dos negros o amor pela liberdade? E dos portugueses o amor pela aventura? Porque ele não pensa assim, ora bolas.
Repetindo, pensa que os índios foram ou ainda são preguiçosos, que os negros foram ou são sujeitos repletos de artimanhas para extrair vantagens, e que os portugueses foram ou são gente que gosta de desfrutar o direito concedido a poucos em detrimento da maioria.
Em tempo: o general comentou que não é racista. Preconceituoso e ignorante, ele é.
Ricardo Noblat: Lula em estado de desespero
Há mais de 100 dias, quando se entregou à Polícia Federal, Lula foi para o cárcere de Curitiba com duas certezas: não ficaria preso por muito tempo, e ainda teria chances de disputar a sucessão do presidente Michel Temer. Havia advogados que diziam para ele que isso seria possível, embora outros mais realistas pensassem o contrário, mas preferissem se calar.
A liberdade tão esperada por Lula não veio, e tão cedo virá ao que tudo indica. Todos os recursos impetrados pela defesa de Lula para soltá-lo foram derrotados nos tribunais superiores. Salvo o inesperado, a Justiça Eleitoral negará em prazo relativamente curto o pedido de registro da candidatura dele a ser apresentado até o próximo dia 15.
A ficha de Lula finalmente caiu. Foi por isso que nas últimas horas ele tomou decisões que dão uma ideia do seu estado de desespero. Mandou rifar em Pernambuco a candidatura de Marília Arraes (PT) ao governo do Estado. Para em seguida oferecer ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) o que ele pedia e o que nem imaginava pedir para deixar de apoiar a candidatura de Ciro Gomes (PDT).
Os advogados de Lula, ontem, o aconselharam a escolher seu vice para que a chapa chegasse pronta à convenção do PT marcada para logo mais. É o que manda recente resolução do Tribunal Superior Eleitoral. Lula recusou o conselho. O vice, seja qual for, só será escolhido a poucas horas do fim do prazo para o pedido de registro da sua candidatura.
Manuela d’Ávilla, candidata a presidente pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), Fernando Hadadd ou Jaques Wagner, ambos do PT, e quem mais possa vir a ser vice de Lula terão que se conformar com a espera. Lula sabe que tão logo se anuncie quem será seu vice, ele começará a sair de cena. Todos os holofotes se voltarão para o vice no pressuposto de que ele será de fato o candidato do PT.
É tudo o que Lula não quer – perder o protagonismo dentro do PT e da esquerda, perder espaço na mídia, sentir-se, enfim, cada vez mais só. Ele tudo fará para que isso não aconteça, não importa o preço que possa custar ao PT e aos seus antigos aliados.
Ricardo Noblat: Envergonhado, o PSB se cala sobre acordo com o PT
“O jogo só termina quando acaba”
Desde que o ex-ministro Joaquim Barbosa desistiu de disputar a sucessão de Temer, o presidente do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Carlos Siqueira, esgoelou-se de tanto repetir que caberia ao seu partido apoiar algum candidato, mas jamais ficar neutro.
Siqueira viajou, ontem, às pressas a Belo Horizonte para comunicar a Márcio Lacerda (PSB) que ele não poderá ser mais candidato ao governo de Minas Gerais como pretendia. A cúpula do PSB, pressionada pelo PT, afinal decidira pela neutralidade do partido.
Que cúpula? – quis saber Lacerda. Siqueira enrolou-se para explicar, uma vez que não houve reunião de cúpula alguma. O PSB tem convenção marcada para o próximo domingo. E a maioria de suas seções estaduais não foi consultada sobre o acordo com o PT.
De volta a Brasília, Siqueira calou-se. Os principais líderes do PSB também se calaram à espera que o partido nos Estados engula ou regurgite o acordo. “O jogo só termina quando acaba”, comentou irônico o presidente do PDT, Carlos Lupi.
PDT e PSB se coligaram em 13 Estados para concorrer aos governos. Em seis deles, o PDT apoia candidatos do PSB. Esse número ainda poderá crescer a depender do que aconteça nas próximas horas.
A marcha da insensatez do PT em Pernambuco
A lição esquecida de Tancredo Neves
Do alto de uma sabedoria acumulada ao longo de décadas, o presidente da República que morreu antes de tomar posse costumava ensinar aos jovens: “O natural na política é muito forte”.
O mineiro Tancredo de Almeida Neves, no ramo da política há mais de 50 anos, queria dizer simplesmente o seguinte: contra o natural, não insista. Se insistir, no mais das vezes perderá.
Era natural, por exemplo, que o deputado Ulysses Guimarães, líder da oposição nos anos 80, fosse o candidato do PMDB a presidente da República se as eleições diretas acabassem restabelecidas.
Como não foram, a candidatura de Tancredo tornou-se natural. Tanto que ele se elegeu em um colégio formado por deputados, senadores e delegados estaduais onde o governo tinha maioria.
A candidatura de Marília Arraes ao governo de Pernambuco era o natural até ontem. Neta de Miguel Arraes, ela empolgou o PT no Estado e lidera todas as pesquisas de intenção de voto. Mas aí…
Interessado em impedir que o PSB apoie Ciro Gomes (PDT), a Executiva do PT vetou a candidatura de Marília para facilitar a reeleição de Paulo Câmara (PSB), governador de Pernambuco.
Não sairá barato para o PT. Hoje, 320 delegados do PT pernambucano se reunirão no Recife para decidir se o partido deve ou não ter candidato próprio ao governo.
E se decidirem que o partido deve ter? Então no próximo domingo aclamarão Marília como candidata. E como ficará a direção nacional do partido? E como ficará o PSB que recuou do apoio a Ciro?
A candidatura de Marília já foi longe demais para que o PT possa rifá-la sem que o partido imploda no Estado. Ali, antes de Marília, o PT se tornara irrelevante apesar de toda a força de Lula.
Ricardo Noblat: Por Lula, o PT ficou só
Resultado até aqui da estratégia do PT de manter a candidatura de mentira de Lula para mais adiante trocá-la por um avatar: o partido ficou isolado, e isolado deverá disputar o primeiro turno da eleição presidencial de outubro próximo.
O PDT deu-lhe as costas e irá com Ciro Gomes. O PSOL, com Guilherme Boulos. Hoje, a convenção do PC do B lançará a candidatura de Manuela d’Ávila. O PV deverá ir com Marina Silva. O PSB está cada vez mais distante do PT.
Nos Estados, o PT enfrenta sérias dificuldades para fechar coligações. E por causa disso, admite compor-se até mesmo com quem acusou de ser golpista. Rendeu-se a Renan Calheiros (PMDB) em Alagoas, por exemplo. E a Ciro Nogueira (PP) no Piauí.
No Ceará, foi obrigado a rifar a candidatura à reeleição do senador José Pimentel (PT) para aliar-se ao senador Eunício Oliveira (PMDB). A revolta por lá foi tão grande que a direção nacional do PT passou a renegar a aliança que, por ora, permanece de pé.
Entre os deputados federais e os senadores do PT, o clima é de aflição com o possível enfraquecimento do partido no Congresso. Senadores como Gleisi Hoffman (PR), Lindberg Farias (RJ) e Humberto Costa (PE) pensam em disputar uma vaga na Câmara.
Enquanto isso, no cárcere de Curitiba, escasseia as esperanças do preso mais ilustre do país de ser mandado para casa antes da chegada do Ano Novo.
Ricardo Noblat: Ciro, biruta de aeroporto
O maior adversário dele é ele mesmo
Mal o bloco dos partidos mais fisiológicos do Congresso bateu o martelo em torno da candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) à presidência da República, Ciro Gomes, que hoje será indicado oficialmente pelo PDT como candidato à vaga de Temer, deu meia volta volver. Nem esperou o anúncio oficial do apoio a Alckmin.
Primeiro fez uma autocrítica: “Eu não sou o dono da verdade, não sou poupado do erro, eu cometo erros. Eu cometo erros e não me custa nada reconhecer erros”. Depois, um aceno ao PT: “O Brasil nunca será um país em paz enquanto o companheiro Luiz Inácio Lula da Silva não restaurar a sua liberdade. Eu luto por isso”.
A favor de Ciro, diga-se que ele suou a camisa para ser o candidato da esquerda a presidente. O PT refugou-o: “Nem com reza braba” ela seria, anunciou a senadora Gleisi Hoffman, presidente do partido. O PC do B lançou Manuela d’Ávila candidata de olho na vaga de vice de Lula. O PSOL, Guilherme Boulos.
Desprezado pela esquerda, Ciro passou a cortejar a direita que queria distância da candidatura de Jair Bolsonaro. Chegou a conquistar o apoio do PP e do Solidariedade. Sonhou com a adesão do DEM e do PR do ex-mensaleiro Valdemar da Costa Neto. Acabou também desprezado pela direita.
Como das outras duas vezes em que foi candidato a presidente, Ciro derrapou mais pelo que disse do que pelo que fez. Para atrair a esquerda, radicalizou seu discurso. Para mais recentemente atrair a direita, suavizou-o no que pode. Não despertou confiança em nenhum dos lados. Moveu-se como uma biruta de aeroporto.
Em certo momento, disse que se eleito revogaria a reforma trabalhista aprovada pelo Congresso. Para depois afirmar que não seria bem assim. Prometeu anular a eventual fusão da Embraer com a Boeing. Corrigiu-se mais adiante. Chamou um vereador negro de “capitão do Mato”. E uma promotora de filha-da-puta.
Seguirá no jogo e, ao cabo, poderá perder para ele mesmo.
Ricardo Noblat: Chapa de farda
O que dirá Jair Bosonaro (PSL) em 11 míseros segundos quando tiver início no próximo dia 31 de agosto o período de propaganda no rádio e na televisão dos candidatos às eleições gerais de outubro?
(A leitura em voz alta das linhas acima consome 14 segundos. A leitura silenciosa, pouco mais de seis.)
Foi por isso que ele correu atrás do apoio do Partido da República (PR) que lhe acrescentaria mais 45 segundos. Correu e perdeu. Queria o senador Magno Malta (PR-ES) como candidato a vice. Ficará com o general da reserva Augusto Heleno Ribeiro Pereira.
O general disse que está pronto para enfrentar sua nova missão. Ex-capitão do Exército, Bolsonaro não precisa de um general que lhe bata continência para se tornar confiável à gente que usa farda ou que gosta de uma mesmo sem usá-la. Confiável ele já é.
Precisava de mais tempo de propaganda. E também de um contingente de vereadores, deputados estaduais e federais espalhados pelo país capazes de ajudá-lo na caça ao voto. Diz que 240 deputados federais de vários partidos o apoiam. A ver depois.
Se ele antes cogitou de não comparecer a debates eleitorais no rádio e na televisão para escapar a críticas dos seus adversários, agora não poderá perder um só deles. As redes sociais não lhe bastarão. Como, de resto, a nenhum dos candidatos.
Nas eleições de 2014, ao virar candidata do PSB a presidente da República, a ex-ministra Marina Silva disparou nas pesquisas de intenção de voto. Dilma e Aécio Neves se juntaram para massacrá-la. Era mínimo o tempo de Marina no rádio e na televisão.
Desta vez também será mínimo. Como Bolsonaro, Marina é candidata de um partido minúsculo. Como ele, não atraiu outros partidos – sequer tentou. Bolsonaro é o segundo colocado nas pesquisas. Hoje, só Marina o derrotaria no segundo turno.