Blog do Noblat

Ricardo Noblat: Lula sem esperança

E cada vez mais inconformado e solitário

Se mofará na cadeia como deseja o presidente eleito Jair Bolsonaro, só Deus sabe. Mas é remota a possibilidade de Lula deixar o cárcere em Curitiba tão cedo.

A 2ª. Turma do Supremo Tribunal Federal julgará, hoje, mais um pedido da defesa de Lula para que seja anulado o processo do triplex do Guarujá onde ele foi condenado a 12 anos de cadeia.

Alega a defesa que o autor da sentença inicial foi o juiz Sergio Moro. E que Moro a partir de janeiro será ministro do presidente eleito Jair Bolsonaro. Logo… Logo teria agido para beneficiar seu futuro patrão.

A alegação deveria ser tratada como uma piada. Em julho do ano passado, quando Moro condenou Lula a 9 anos e meio de prisão, Bolsonaro ainda não era oficialmente candidato. Ninguém era.

Nem em janeiro último quando os desembargadores da 8ª. Turma do Tribunal Regional Federal-4 confirmaram por unanimidade a decisão de Moro e ampliaram a pena para 12 anos.

Logo mais à tarde, os ministros Edson Fachin (relator), Ricardo Lewandowski, Celso de Mello, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes se debruçarão sobre o pedido da defesa de Lula.

Nem Lula acredita que eles lhe darão o que pede. Sequer que lhe permitirão cumprir a pena em prisão domiciliar e com tornozeleira eletrônica. Está cada vez mais inconformado e solitário.

De resto, sabe que poderá ser condenado outra vez e em breve no processo do sítio de Atibaia, reformado para seu desfrute pelas empreiteiras Odebrecht e OAS. Responde a mais quatro processos.


Ricardo Noblat: O maior desafio de Bolsonaro

Guerra à vista

Ou até o final de fevereiro próximo os Estados Unidos e a China chegam a um acordo ou a partir do primeiro dia de março o mundo sofrerá as consequências inimagináveis da guerra comercial a ser travada pelos dois países.

Juntos, eles são responsáveis por dois terços do comércio mundial. É para os dois que o Brasil vende mais ou menos dois terços do que exporta. Se a guerra não for evitada, como se comportará o governo do presidente eleito Jair Bolsonaro?

Esse será seu maior desafio inicial. Reforma da Previdência Social, relações com os partidos, combate corrupção, ofensiva contra o crime organizado, Escola sem Partido, Acordo de Paris sobre o Meio Ambiente – tudo isso pouco importará.

A Argentina, por exemplo, é o maior comprador dos produtos industrializados do Brasil. Cerca de 80% do que ela produz para exportação é comprado pela China. Numa economia globalizada, o choque entre gigantes não deixará nenhum país a salvo.

O governo do presidente Donald Trump ameaçou elevar de 10% para 25% os impostos sobre os produtos chineses comprados pelo seu país. O governo chinês reagiu dizendo que a ser assim ele faria a mesma coisa e na mesma proporção.

É de supor que o governo Bolsonaro tenha um plano para enfrentar o que possa acontecer. Ainda há tempo para providenciar um. Será um duro teste para a retórica de alinhamento radical do Brasil com os Estado Unidos e de um certo distanciamento da China.


Ruy Fabiano: O Rio é a síntese do Brasil

O Rio não é exceção; antes, é regra.

A prisão do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, em pleno exercício do cargo, reveste-se de profundo sentido simbólico.

Resume a política brasileira contemporânea, em que o Estado e suas instituições foram capturados pelo crime organizado. Ele está nos três Poderes. A Lava Jato, uma operação policial, tornou-se, por isso mesmo, estuário das esperanças nacionais. Fato inédito.

Além dos quatro últimos governadores – Garotinho, Rosinha, Sérgio Cabral e Pezão -, estão presos os três últimos presidentes da Assembleia Legislativa fluminense e todo o Tribunal de Contas do Estado (à exceção de uma ministra, nomeada ao tempo em que os outros embarcavam no camburão), além de procuradores e juízes.

O Rio não é exceção; antes, é regra. Nem é a cidade mais violenta do Brasil: no ranking nacional, é a 22ª.

Mas, como cidade-síntese da nacionalidade – foi capital em suas três fases históricas (colônia, império e república) -, é um retrato do país, que tem hoje um ex-presidente (Lula) preso e os dois que o sucederam (Dilma e Temer) já na condição de réus.

O presidente que, dentro de um mês, sai se empenha em conceder um indulto a amigos, políticos que incidiram no crime de corrupção – o mesmo de que é acusado -, com plena recepção do STF (que já contabilizou os seis votos necessários para aprová-lo).

A eleição de Jair Bolsonaro, um deputado que por quase três décadas integrou o chamado baixo clero da Câmara, decorre desse quadro moralmente devastado. Bolsonaro concentrou sua atuação parlamentar, sempre vista como irrelevante, quando não caricatural, na denúncia do crime e da corrupção generalizada.

Fez dessas questões, negligenciadas por todos os governos da chamada Nova República, a bandeira de sua candidatura presidencial vitoriosa. Expressou numa linguagem que alguns consideram tosca o que todos identificam na realidade mais imediata da vida.

As chamadas grandes questões – na economia, na organização do Estado, no campo ideológico – perdem relevância diante do cotidiano infernal que o cidadão enfrenta. E é simples entender: para discuti-las, é preciso estar vivo. E as cidades brasileiras tornaram-se sucursais da Faixa de Gaza. Quem quer investir num lugar assim?

A partir do óbvio, consolidou-se a candidatura Bolsonaro, que, partindo de aliados simplórios, agregou apoios mais graduados e hoje transcende o seu ambiente de origem. O desafio que se impõe é o de transformar o ecossistema político brasileiro. Nada menos. E isso o torna persona non grata de todo o establishment.

Essa, na verdade, foi a promessa que o PT, na sua origem, fazia ao eleitorado. Prometia um mundo novo, livre da corrupção.

No poder, repetiu (e levou ao paroxismo) os erros que sempre denunciou, transformando-se de partido político em “organização criminosa que se apoderou do Estado brasileiro”, nas palavras do ministro Celso de Melo, do STF, quando do julgamento do Mensalão.

A montagem do Ministério, feita às claras – e por isso mesmo tendo suas divergências e contradições expostas ao público -, desafia o chamado presidencialismo de coalizão (ou de cooptação), ao minimizar a consulta aos partidos.

O risco é que derive para o tecnocratismo, que, ao prescindir da política, se distancia também da realidade.

*Ruy Fabiano é jornalista


Ricardo Noblat: Bolsonaro sai em defesa do filho

Não pode ficar por isso mesmo

Depois da facada que Jair Bolsonaro levou em Juiz de Fora em 6 de setembro último, o Ministério da Segurança Pública abriu dois inquéritos para apurar se o agressor Adélio Bispo de Oliveira agira sozinho, por conta própria, ou se a mando de alguém.

O primeiro inquérito concluiu que ele agira sozinho. Adélio foi apontado como um homem mentalmente desequilibrado, que se opunha a Bolsonaro pelo que o então candidato a presidente dizia, e também porque supunha que ele era apoiado pela Maçonaria.

Sobre o segundo inquérito, nunca mais se ouviu falar. Dele se encarrega a Polícia Federal. Em outubro, foi prorrogado sem que se definisse uma data para seu termino. É preciso que chegue ao fim. Enquanto não chegar dará margem a todo tipo de especulação.

A polícia pretendia analisar mais de 6 mil conversas de Adélio no celular, e mais de mil e-mails disparados por ele em seu laptop. Bolsonaro, ontem, voltou a referir-se ao episódio – no caso, em uma tentativa canhestra de aliviar a barra do seu filho Carlos.

“Minha morte interessa a muita gente”, afirmou o presidente eleito. Quando lhe perguntaram por que Carlos, no Twitter, escrevera que pessoas próximas a ele desejam sua morte, se possível depois da posse, Bolsonaro desconversou.

Imagine se Ivana, filha do presidente Donald Trump, tivesse postado em uma rede social que gente ligada ao seu pai desejava a morte dele… O mundo desabaria sobre sua cabeça. Ou ela pediria desculpa pelo que havia postado ou seria intimada a confessar o que sabia a respeito.

O que escreveu Carlos, vereador no Rio desde 2011, é muito grave. Ou ele então foi leviano. Não deveria ficar por isso mesmo.


Ricardo Noblat: Cheiro de naftalina

Por ora, sem razão para susto

Depois dos 21 anos da República dos Generais de 64, nada haverá de mais falsamente parecido com um governo militar do que o próximo do capitão Jair Bolsonaro a ter início daqui a exatos 33 dias.

O último governo dos generais foi presidido por João Baptista de Oliveira Figueiredo, um cavalariano esforçado, namorador, briguento, mas frouxo quando a linha dura do regime o encarou.

Figueiredo contou com 9 ministros militares da ativa e da reserva, incluídos nessa conta os do Exército, Marinha e Aeronáutica, e o chefe do Gabinete Militar da presidência da República.

Ou seja: dos nove, quatro deveriam ser militares dada à natureza das funções que exerceriam. Militares da reserva cuidaram da Casa Civil, da Educação, Interior, Previdência Social e Minas e Energia.

Bolsonaro, ontem, indicou mais um militar como ministro de governo, Tarcísio de Freitas. Ele já foi engenheiro do Exército. Abandonou a farda quando era capitão.

Os outros: Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e Fernando Azevedo e Silva (Defesa)

São cinco até aqui, fora o presidente e o vice-presidente. Bolsonaro não descarta a possibilidade de recrutar mais militares para ministérios ou cargos de segundo e terceiro escalões.

“É possível. Quando o PT escalava terrorista, ninguém falava nada”, comentou o presidente eleito, que por ora insiste em não descer do palanque de uma campanha encerrada há um mês.

Lula governou com uma dezena de ex-sindicalistas. Empregou-os porque era sua turma. Bolsonaro emprega a dele. Ex-sindicalista e militar da reserva têm algo em comum: carecem de tropas.


Ricardo Noblat: Como fazer os eleitores de idiotas

Pode isso?

Em vídeo postado no Youtube, André Marinho, filho do empresário Paulo Marinho, por sua vez suplente de Flábio Bolsonaro eleito senador pelo PSL do Rio de Janeiro, confessa que distribuiu “mihares de áudios imitando e se fazendo passar pelo presidente Jair Bolsonaro durante a recente campanha eleitoral.

Foi na casa dos Marinhos, no alto Leblon, que Bolsonaro passou a gravar parte dos seus pronunciamentos veiculados nas redes sociais e na televisão depois de ter-se recuperado do atentado a faca em Juiz de Fora. No vídeo, André parece ao lado dos amigos Kim Kataguiri e Arthur do Val, representante do Movimento Brasil Livre.

Fux mata no peito
Barganha quase completa

Uma vez que o presidente Michel Temer sancionou a decisão do Senado de aumentar de R$ 33,7 mil para R$ 39 mil o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em troca o ministro Luiz Fux revogou a liminar de sua autoria que garantia o pagamento de auxílio-moradia a juízes de todo o país.

Mas como o aumento só cairá no contracheque dos ministros a partir de janeiro, Fux teve a cautela de determinar que só a partir daí seja suspenso o pagamento do auxílio-moradia. A assinatura de Temer no ato de sanção não bastou, pois. Em janeiro, o presidente da República será outro. Vai que ele dá o dito pelo não dito…

A liminar de Fux data de 2004. Ele a justificou à época com o argumento que o benefício estava previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional Ao revogá-la, o ministro ressaltou que o benefício era justo, mas que o magistrado precisa “levar em conta a situação econômica do país.” Um drible de corpo…

Se o benefício era justo e estava previsto em lei, não deveria ser retirado. A ser retirado, que jamais fosse em troca de um aumento de salário para os servidores mais bem pagos da República. Quando nada porque há um rombo bilionário nas contas públicas, a situação econômica do país é péssima e cobra sacrifícios de todo mundo.

Não é só a insensibilidade social da toga que espanta, embora não surpreenda. É a barganha conduzida pela mais alta corte de justiça do país e a maneira como a lei é interpretada de modo muitas vezes a favorecer hoje o que se contraria amanhã. Isso explica porque está em queda a confiança dos brasileiros na justiça.


Ricardo Noblat: Por que não te calas, general!

Para atiçar os radicais

A essa altura, no limiar de um governo de ultradireita comandando por um capitão cercado por fardas da reserva e eleito com grande apoio dos quartéis, a quem pode interessar a ordem dada pelo Comandante do Exército, o general Eduardo Villas Boas, para que seus subordinados façam uma reanálise da Intentona Comunista que aconteceu há 83 anos?

Porque é disso que se trata. O Exército já estudou à exaustão o movimento deflagrado pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1935 para depor o presidente Getúlio Vargas que chegara ao poder cinco anos antes por meio de uma revolução, e que logo em seguida se transformaria em ditador, assim governando até 1945. A Intentona é uma página virada da história. Os culpados foram punidos.

A ditadura militar de 1964, que durou 21 anos, é outra página virada, com a diferença de que os culpados por ela jamais foram punidos. Pelo contrário: beneficiaram-se de uma anistia para os chamados crimes de sangue. Os que à ditadura a se opuseram, esses foram presos, cassados, torturados e até mortos. Muitos acabaram proibidos de trabalhar. Outros escaparam para o exílio.

Villas Boas está a 40 dias de deixar o posto. Seu substituto já foi escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro. A desculpa que ofereceu para justificar seu ato bizarro foi o de evitar o derramamento de “sangue verde e amarelo” em “nome de uma ideologia diversionista”. Ideologia, por sinal, sepultada no berço onde nasceu, e que na China deu lugar a um capitalismo de Estado.

De onde o comunismo ainda pode se espraiar? Da Coreia do Norte? De Cuba que clama por uma reaproximação com os Estados Unidos? Da Venezuela bolivariana quebrada? O ato de Villas Boas, se não esconde outros objetivos, só servirá para acirrar o ânimo dos que enxergam fantasmas onde eles não existem, uma parcela tresloucada dos eleitores de Bolsonaro que defendem um Estado autoritário.


Ricardo Noblat: Evangélicos derrotam Bolsonaro

Sinais. Fortes sinais!

A bancada dos deputados evangélicos da Câmara celebrou, ontem, sua primeira vitória sobre o presidente eleito Jair Bolsonaro. Ele havia convidado Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna, para ser o próximo ministro da Educação.

Como Mozart, aos olhos dos evangélicos, é um educador liberal a ponto de ser elogiado pela esquerda, o nome dele foi vetado. O que fez Bolsonaro? Trocou Mozart pelo colombiano Ricardo Vélez Rodríguez, professor emérito da Escola de Comando e estado Maior do Exército.

Fogos de artifício espocaram no Rio onde mora o pastor Silas Malafaia, que se revoltara com a escolha de Mozart. E em Richmond, no estado norte-americano de Virgínia, onde mora o ensaísta de direita Olavo de Carvalho, padrinho da indicação de Vélez Rodríguez.

O ensaísta e o futuro ministro têm pelo menos duas coisas em comum. Primeira: Olavo foi comunista por dois anos no final dos anos 60 do século passado, e Vélez Rodríguez de esquerda no seu país. Segunda: os dois migraram para a direita tão logo se viram em apuros.

Para quem se apresentou durante a campanha como não político apesar de ser deputado há 30 anos, disposto, uma vez eleito, a enfrentar as pressões dos seus pares por cargos aqui e acolá, Bolsonaro demonstrou que não será bem assim.

Prometeu fazer um governo “sem concessões a ideologias” para se contrapor a quase 14 anos de governos do PT marcadamente ideológicos. Era conversa para enganar eleitores, e deve ter enganado muitos deles, talvez o suficiente para vencer.

Inexiste governo ideológico porque é impossível encarar as questões sem partir de um ponto de vista. A visão do PT sempre foi de esquerda. A de Bolsonaro, de extrema direita com um viés militarista. Nada a ver apenas com o conservadorismo que é outra coisa.

A democracia restaurada por aqui desde 1985 passará por seu mais estressante teste a partir de janeiro de 2019. Deus é Pai!


Ricardo Noblat: O risco que corre o capitão

Oposição ameaça aderir sem dizer

Uma coisa é o que diz a oposição ao futuro governo para consumo externo – diz que irá para cima dele sem dó nem piedade. Outra, o que ela começa a fazer no escurinho dos gabinetes do Congresso e mesmo fora dali.

A chamada oposição de raiz se resumirá ao PT, PC do B e PSOL. Pois bem: sob o manto do silêncio, parte dela negocia já com interlocutores do capitão cargos de segundo e terceiro escalões em ministérios.

O resto do que se autonomeia de “oposição crítica” não cansa de repetir que aprovará tudo que lhe pareça positivo para o futuro do país. O PSDB está nessa toada, mas não só ele.
O risco que corre o capitão e presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) é o de acordar um dia e constatar que a oposição aderiu ao seu governo.

Sem reformas
Empurrando com a barriga

Por mais que o mercado cobre e que os chamados formadores de opinião também, são remotas as chances de o Congresso no próximo ano aprovar qualquer proposta de reforma da Previdência Social.

A avaliação, unânime, foi feita ontem por cinco cabeças coroadas da Câmara dos Deputados e do Senado, cada uma de um partido diferente, naturalmente sob o compromisso de não serem identificadas.

Não querem ser apontadas como adversárias da reforma. Reconhecem que ela será inevitável. Mas não veem entre seus pares, os atuais e os que estão por chegar, a menor disposição em aprová-la.

Nem a reforma da Previdência, nem a reforma tributária, nem a reforma política. O custo eleitoral seria muito grande. Calcula-se que pelo menos cerca de 100 deputados federais serão candidatos a prefeito em 2020.

Onyx ou Oníx
Picuinhas do poder

Onyx Dornelles Lorenzoni é o nome dele, deputado federal pelo DEM do Rio Grande do Sul, futuro chefe da Casa Civil da presidência da República, de bola cheia depois de ter emplacado, ontem, mais um ministro do seu partido no governo Bolsonaro, o da Saúde. Para desgosto do PP do senador Ciro Nogueira (PI) que ambicionava o cargo.

Mas para o capitão, sempre que se refere a ele em público, Onyx sempre será Oníx. É assim que pronuncia o nome do deputado em particular e em público. E tem pelo menos uma razão de proceder assim: é para não encher ainda mais a bola de Onyx e incomodá-lo um pouco. Onyx sabe disso e não liga. É o membro do seu partido mais influente junto a Bolsonaro.

O DEM já tem três ministros no governo, mas sua direção se queixa de não ter indicado nenhum deles. Quer mais. Quer, principalmente, que Bolsonaro apoie a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para presidente da Câmara. Por ora, Bolsonaro diz que não apoiará ninguém. Mas, em cima da hora, se for o caso, apoiará. A vida do governo não será fácil sem um aliado na presidência da Câmara.


Ricardo Noblat: Mudar para não mudar

A linha frouxa de corte do capitão

À vontade até então entre lutadores de jiu-jítsu que disputavam uma competição no Parque Olímpico da Barra, na zona oeste do Rio de Janeiro, o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) foi importunado por um repórter que lhe perguntou sobre a situação da futura ministra da Agricultura, a deputada Tereza Cristina (DEM-MS).

Quando foi secretária do agronegócio do Mato Grosso do Sul, a deputada concedeu incentivos fiscais ao Grupo JBS apesar de ser sua parceira em negócios de pecuária. O grupo processa Tereza por ter-se sentido lesado por ela. Quer ser ressarcido em um total de R$ 14 milhões, em valores atualizados.

A resposta de Bolsonaro: “Eu também sou réu no Supremo, e daí?”. De fato, Bolsonaro responde no Supremo Tribunal Federal a ação por incitação ao estupro. E acrescentou: “Afinal de contas sou um ser humano, posso errar, e, se qualquer ministro tiver uma acusação grave e comprovada, a gente toma uma providência. Neste momento, ela goza de toda a confiança nossa”.

Se a condição de réu na mais alta corte de justiça do país não impedirá Bolsonaro de assumir e exercer as funções do seu cargo, é legítimo supor que ele não terá motivos para afastar ministros que porventura sejam denunciados e virem réus. Assim, a regra de corte de Bolsonaro que se ofereceu para “mudar tudo o que está aí” dificilmente mudará grande coisa.

Em fevereiro do ano passado, o presidente Michel Temer anunciou que afastaria do governo qualquer ministro que fosse denunciado pela Lava Jato. O afastamento seria provisório se o ministro fosse apenas denunciado pela Procuradoria Geral da República ao Supremo. Mas se a denúncia fosse aceita, o que transformaria o ministro em réu, o afastamento seria definitivo.

Menos de sete meses depois, Temer deu o dito pelo não dito. Dois de seus ministros foram denunciados e continuaram onde estavam. Temer alegou que a denúncia se baseava em “delações fraudadas”. Por duas vezes, ele mesmo foi denunciado, virou réu e o Supremo pediu licença à Câmara dos Deputados para processá-lo. A Câmara negou sob a intensa pressão de Temer.

O presidente que se elegeu faz pouco prometendo “quebrar o sistema” acabará sendo obrigado a engolir o que dizia.


Ruy Fabiano: A reinvenção da esquerda

O PT desgastou-se demais

A esquerda quer se reinventar (o termo é o que tem sido usado por ela própria). O primeiro passo é descolar-se de Lula e do PT, providência já em curso, sob a batuta de Ciro Gomes, do PDT.

Frustrado em seu sonho de encabeçar, nas eleições de outubro passado, uma chapa única das esquerdas, tendo o PT como vice, Ciro não se cansa de acusar Lula de “traição” – e burrice.

O acordo chegou a ser selado verbalmente, na cadeia, mas, na hora H, Lula, temendo o protagonismo de Ciro, optou por Haddad.

Muita gente na esquerda (até no PCdoB), chocada com a vitória acachapante de Bolsonaro – e com a perspectiva de longo jejum de poder -, subscreve a análise de Ciro, que, para além da mágoa, age pragmaticamente. Tanto assim que já baixou o facho de sua retórica.

O raciocínio é simples: o PT desgastou-se demais, associou-se de modo irreversível a corrupção e incompetência e não tem mais condições de cobrar do governo (qualquer governo) o que quer que seja. Pior: perdeu seus quadros principais.

Seu líder, Lula, está preso, ao lado de outros protagonistas do partido – e outros mais, como José Dirceu, devem lhes fazer companhia em breve. A Lava Jato, fortalecida com a presença de Sérgio Moro no Ministério da Justiça, deve expor mazelas ainda ocultas dos 13 anos em que o partido reinou sobre o país.

Resumindo: o desgaste da sigla tende apenas a aumentar. O PT que hoje sobrevive é uma caricatura do original. O partido que, na sua origem, reunia a elite do sindicalismo e intelectuais da USP, Unicamp e PUC, hoje se vê reduzido a um baixo clero iletrado, que busca compensar suas limitações com pantomimas e insultos.

De Sérgio Buarque de Hollanda, Florestan Fernandes, Hélio Bicudo, Paul Singer, entre outros, o partido desembocou em Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias, Maria do Rosário e Dilma Roussef.

A decomposição qualitativa deu-se no curso do exercício do poder, em que o partido pôs em prática tudo o que condenara, com veemência, em mais de duas décadas de oposição: aliança com as oligarquias mais atrasadas e corrupção, muita corrupção.

O país que recebeu dos tucanos estava bem melhor que o que entregou a Temer, que, apesar de todos os pesares, conseguiu reduzir danos e o repassará a Bolsonaro em melhores condições que as em que o recebeu. A reinvenção parte deste princípio: é preciso mudar a fisionomia da esquerda, torná-la propositiva e idônea – tarefa gigantesca, para dizer o mínimo.

Não basta insultar os adversários, como o próprio Ciro tem o hábito de fazer. José Dirceu, esta semana, constatou que não será curta a passagem de Bolsonaro (e do que genericamente chama de direita) pelo poder. Reconheceu que o novo presidente tem base social e meios para pôr em cena os dois compromissos centrais de sua campanha: combate à corrupção e ao crime.

É cedo para saber a eficácia da estratégia da esquerda. O próprio Ciro, sem mandato, pode vir a ser ultrapassado por outras lideranças. O certo é que o primeiro passo – o descolamento de Lula e PT – indica que já está em curso um processo de autocrítica, indispensável à sobrevivência de quem sai politicamente nocauteado.

*Ruy Fabiano é jornalista


Ricardo Noblat: Bolsonaro preside e Guedes governa

De um único posto a uma rede de postos

Nem Delfim Netto em certo período da ditadura militar de 64, ou talvez somente foi ou aparentou ser mais poderoso do que será a partir de janeiro próximo o economista Paulo Guedes, que de uma só tacada acumulará os ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio do governo do presidente eleito Jair Bolsonaro.

A confirmar-se o que ontem foi anunciado, Bolsonaro presidirá o país – para isso se elegeu no último domingo com expressiva votação. Mas quem governará será Guedes, o Posto Ipiranga ungido por Bolsonaro, que de simples posto não terá nada. Guedes estará mais para uma rede de postos, a única do mercado, da qual dependerá tudo mais.

Será um tremendo desafio para um economista que nunca serviu a governos em cargos executivos, não tem experiência em lidar com políticos e nem mesmo é reconhecido como uma sumidade por seus pares. Eles reverenciam sua inteligência e seu reconhecido dom para a polêmica, e é só. Caberá a Guedes provar as demais qualidades que imagina ter.

Os ministérios da Fazenda e do Planejamento já foram um só no passado. Deixaram de ser quando o conhecimento avançou e a administração pública se tornou muito mais complexa. A fusão dos dois é considerada um retrocesso por economistas de grosso calibre. Juntá-los com Indústria e Comércio, uma temeridade. Mas vamos que vamos. Bolsonaro tem muitas fichas para gastar.

Se a experiência, afinal, for malsucedida como se teme, ou se o temperamental Guedes acabar se desentendo no futuro com parte dos demais ministros, Bolsonaro sempre poderá dizer que tentou o que lhe parecia o melhor para o Brasil, que não tem e jamais terá a obrigação de entender de tudo, engatando em seguida uma meia volta, volver.

Moro, o Pelé de Bolsonaro
Jogada brilhante
O juiz Sérgio Moro já deu todas as indicações possíveis de que aceitará o convite do presidente Jair Bolsonaro para ser ministro da Justiça e daqui a dois anos ou menos ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga a ser aberta com a aposentadoria compulsória do ministro Celso de Mello.

Se o convite para ministro da Justiça não trouxesse embutido o acerto para que dali ele saltasse para o STF, até que Moro o recusaria. Mas esse não é o caso. Um lugar na mais alta corte de justiça do país é o sonho de qualquer juiz. Moro acha que sua obra como juiz federal está completa. E sua mulher também concorda.

Quem o suceder no comando do braço original da Lava Jato no Paraná estará obrigado a ser tão rigoroso quanto ele tem sido. E Moro considera que seu trabalho ali está praticamente concluído. Pouco se lhe dá que o PT possa aproveitar sua entrada no governo Bolsonaro para tentar desacreditá-lo. Ele se acha blindado.

Um amigo de Moro, que ainda duvida que ele aceite o convite, lembrou ontem à noite que Fernando Henrique Cardoso, no seu primeiro governo, teve Pelé como ministro dos Esportes. Moro seria o Pelé do governo Bolsonaro. Só que Pelé não desfalcou a Seleção para ser ministro, ele já aposentara as chuteiras.

Moro desfalcará o combate à corrupção como seu líder inconteste. Enfraquecerá a operação da qual se tornou um símbolo. Porá em dúvida sua imagem de juiz isento de paixões políticas. E dará forte munição para que desafetos tentem desqualificar suas decisões. Um prato cheio a ser devorado por um PT faminto.

Quanto a Bolsonaro, será aplaudido pelos seus devotos e também por aqueles que sempre quiseram ver Moro removido de onde está. Uma jogada brilhante de um político que muitos ainda subestimam.