Blog do Noblat

Ricardo Noblat: Quem tem medo de CPI

A nova família imperial tem

Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é instrumento a serviço de minorias garantido pela Constituição. Para que uma CPI seja criada, segundo o artigo 58 da Constituição, parágrafo 3º, basta que:

+ um terço dos membros da Câmara ou do Senado assine o pedido:

+ haja fato determinado a ser investigado;

+ e definição de prazo para a conclusão dos trabalhos.

Satisfeitas tais existências, a lei deve ser cumprida. Argumentos do tipo “é uma sandice”, “no momento não é conveniente”, “pode comprometer a harmonia entre os poderes” e que tais, não merecem ser levados em conta. É pura retórica.

Há dois pedidos de CPI que desataram uma barulheira infernal no Congresso, mas não só ali. Um para apurar supostos crimes cometidos por ministros de tribunais superiores. O outro, a conduta de procuradores e do ex-juiz Sérgio Moro à frente da Lava Jato.

O presidente do Senado é contra investigar juízes. Recurso de um grupo de senadores impetrado para que a CPI seja instalada será julgado em breve pelo Supremo Tribunal Federal. Ali, ministros poderiam se tornar alvo de investigações.

O presidente da Câmara recebeu, mas ainda não despachou o pedido de instalação da CPI da Lava Jato. Quando o presidente de uma das Casas não quer, dificilmente uma CPI vai adiante. A CPI da Lava Jato parece ter mais chances do que a outra, batizada de Lava Toga.

Os bolsonaristas no Senado defendem a CPI da Lava Toga, mas o presidente Jair Bolsonaro, não. Ele não quer encrenca com o Supremo. Deve ao ministro Dias Toffoli, presidente do tribunal, a suspensão do processo contra seu filho Flávio, o Zero Um.

Na Câmara, os bolsonaristas querem enterrar o pedido da CPI da Lava Jato para poupar Moro e os procuradores de Curitiba de embaraços. A iniciativa de pedido da CPI foi da esquerda que faz oposição ao governo e de partidos do chamado Centrão.

Criada e instalada, a CPI Mista das Fakenews avança aos trancos e barrancos. É a que mais assusta os bolsonaristas, especialmente o deputado Eduardo, o Zero Três. Ele teme que ela chegue à central de distribuição de notícias falsas que ajudou a eleger seu pai.

Ali, o jogo está pesado. O senador que preside a CPI já recebeu ameaças de morte. Um dos autores das ameaças foi preso. O vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, será convocado a depor. A nova família imperial do Brasil sente-se em perigo. E com razão.

Bolsonaro venceu os médicos

O gosto por viver perigosamente
Bem que o presidente Jair Bolsonaro havia dito antes de ser operado pela quarta vez que viajaria para discursar na abertura de mais uma Assembleia Geral da ONU “mesmo que fosse de cadeira de rodas”.

Não precisará de cadeira. Ontem, pela primeira vez em mais de 15 dias, ele participou de uma solenidade no Palácio do Planalto. Está mais magro e, por enquanto, menos falante.

Se não tivesse condições para viajar, naturalmente os médicos o impediriam. Se não eles, os assessores de Bolsonaro. Se não esses, os filhos e a mulher dele. Com saúda não se brinca.

Isso não quer dizer, contudo, que Bolsonaro viajará com pleno aval dos médicos. Se de fato os escutassem, ele não viajaria tão cedo para arte alguma, e para seu próprio bem.

Foi alertado para o risco de um problema vascular bastante comum no caso de viagem longa logo após uma cirurgia. Por isso tomará injeções anticoagulantes e foi orientado a viajar deitado.

Até segunda ordem, usará uma espécie de colete que cobrirá o abdômen e parte do tórax como se fosse uma segunda pele. E deverá voltar ao Brasil imediatamente depois do discurso.

Nada de reuniões com outros chefes de Estado. A esticada ao Texas para encontro com militares americanos foi cancelada. Bolsonaro diz que jantará com Donald Trump em Nova Iorque. A conferir.


Ricardo Noblat: Por que não se acaba logo com a Lava Jato?

Em xeque, o combate à corrupção

É tão ruim o clima de desconfiança dentro do governo que uma operação corriqueira da Polícia Federal só serviu para agravá-lo. Dentro do Congresso, serviu para acirrar ainda mais os ânimos contra a Lava Jato, tida como algoz da política e dos políticos.

Não é todo dia que policiais apreendem documentos e computadores em gabinete de senador. Mas ontem não foi a primeira e nem será a última vez. De resto, ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, que tudo avalizou, tinha e tem poder para isso.

O alvo foi o senador Fernando Bezerra Coelho (PMDB-PE), líder do governo, suspeito de ter embolsado R$ 5,5 milhões em propina quando era ministro da presidente Dilma. O senador pôs seu cargo de líder à disposição do presidente Jair Bolsonaro

Antes de Bezerra Coelho, os então senadores Delcídio Amaral (PT-MS) e Aécio Neves (PSDB-MG) passaram por igual constrangimento. No caso deles, pior. Amaral depois foi preso e cassado. Aécio ficou em prisão domiciliar por algum tempo.

David Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, prometeu bater às portas do Supremo contra a decisão de Barroso, e toscamente lamentou: “Diante de tudo o que o Senado tem feito” pelo Judiciário, como o Supremo foi capaz de fazer uma coisa dessas?

Alto lá! Que favores o Senado tem prestado ao Judiciário? Certamente Alcolumbre quis se referir ao seu empenho pessoal para barrar a criação da CPI da Lava-Toga destinada a apurar denúncias de prevaricação contra ministros de tribunais superiores.

Os requisitos para a criação de uma CPI estão no artigo 58, parágrafo 3º da Constituição: requerimento assinado por um terço dos membros da Câmara ou do Senado; fato determinado a ser investigado; e definição de prazo para a conclusão dos trabalhos.

É o que basta. Satisfeitas tais exigências, a CPI deverá ser instalada e começar a trabalhar. Não interessa que ela desagrade aos presidentes dos três poderes da República, muito menos a um deles particularmente. Cumpra-se o que manda a lei, e ponto.

O fato é que a Lava Jato está no banco dos réus pelo que fez de bom e pelo que fez de ruim. De bom ao desvendar o escândalo do petrolão, mandando para a cadeia políticos de todas as cores. De ruim ao cometer grossas irregularidades na condução de processos.

Dito de outra maneira: o combate à corrupção está em xeque. Por razões sobejamente conhecidas, o presidente Jair Bolsonaro não quer que ele vá em frente, nem o Congresso quer, e parte do Judiciário teme seja atingido se mesmo assim ele prosperar.

O que se ficou sabendo com a revelação das conversas entre procuradores de Curitiba e o ex-juiz Sérgio Moro fragilizou a Lava Jato e provocou sérios danos à sua reputação. Os que a ela sempre se opuseram sentem-se à vontade para tentar enterrá-la.

Não seria tão difícil assim. No passado, o Congresso cogitou aprovar uma anistia para beneficiar quem roubou, quem deixou roubar, e quem apenas fosse suspeito de ter feito uma das duas coisas. Por que não retomar a ideia e, mais tarde, sair por aí pedindo votos?

Por que Bolsonaro simplesmente não demite o ministro Moro que deixa a Polícia Federal ir atrás do que não devia? Diga-se que Moro, mesmo que quisesse, não poderia suspender uma operação da Polícia Federal autorizada por um ministro do Supremo.

Mas até as garças que frequentam os jardins do Palácio da Alvorada comentam que Bolsonaro, se pudesse, já teria se livrado de Moro. A recíproca não é verdadeira porque Moro não poderia livrar-se de Bolsonaro a não ser que ficasse desempregado.

A hipótese, porém, não deve ser descartada. Bolsonaro recuou do propósito de degolar o Diretor-Geral da Polícia Federal. Foi exigência de Moro para seguir ministro. Se mais adiante recuar do recuo como já fez, Moro pedirá as contas. A ver. A ver.


Ricardo Noblat: Derrota à vista para o Zero Um

O pai tenta tirar o seu da reta

Pela segunda vez em 48 horas, o senador Flávio Bolsonaro, presidente do PSL do Rio de Janeiro, deu um ultimato aos seus colegas de partido: serão expulsos aqueles que continuarem a apoiar o governador Wilson Witzel (PSC).

Por ora, os 12 deputados estaduais do PSL resistem à ordem do Zero Um e debocham da ameaça. Não querem perder os cargos que Witzel lhes deu em troca do apoio. Duas secretarias de Estado são ocupadas por filiados ao PSL.

O presidente Jair Bolsonaro mandou um emissário ao governador para dizer que ele nada tem a ver com a decisão tomada por Flávio. Witzel fingiu acreditar, como se fosse possível ao filho, a qualquer um deles, contrariar a vontade do pai capitão.

Witzel é candidato declarado à sucessão de Bolsonaro em 2022. Bolsonaro acha que ele está por trás da investigação aberta pelo Ministério Público do Rio contra Flávio e que foi suspensa por uma especial gentileza do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo.

O que mais irritou Bolsonaro ultimamente foi ver Witzel em cima de um tanque do Exército na abertura do desfile militar de 7 de setembro último. Foi uma desfeita ao capitão. As Forças Armadas são reduto eleitoral dele, e assim devem se manter.

Lambança com as digitais da Câmara dos Deputados

Caixa 2, dinheiro para a compra de imóveis, drible na Lei da Ficha Limpa...

O presidente da Câmara pode muito, mas não pode tudo. E foi mais ou menos envergonhado que o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) comentou depois da sessão onde a maioria dos seus pares aprovou uma escandalosa reforma da legislação eleitoral:

– A Câmara tem convicção do que aprovou. Votamos aquilo que entendemos que é o melhor para o processo eleitoral e partidário.

Noves fora nada, Maia serviu uma platitude ao invés de um juiz de valor convincente. Sua força política repousa nos partidos que o sustentam no cargo. A maioria deles é de centro-direita, mas Maia tem bom trânsito nos partidos de esquerda.

A lambança promovida pela Câmara foi aprovada na semana passada sem que ninguém fora dali tivesse notado. Despachado para o Senado, o texto do projeto desatou uma barulheira infernal e acabou castrado em seus pontos mais aberrantes.

De volta à Câmara, em menos de 24 horas foi restaurado. Alguns dos pontos vetados pelo Senado, vetados estão, mas outros não. Restaurou-se a possibilidade de Caixa 2 por meio do pagamento direto de serviços contratados a advogados e contadores.

Os partidos poderão usar dinheiro público do fundo partidário para a compra de imóveis ou a construção de suas sedes, e também para pagar o impulsionamento de conteúdos do seu interesse nas redes sociais. Ou seja: para comprar likes.

Os bancos terão que tratar os partidos da mesma maneira que tratam os demais correntistas, sem taxas diferenciadas. E a partir de 2020 estará de volta o tempo de propaganda dos partidos para além do horário de propaganda dos candidatos em ano de eleição.

Se a Justiça eleitoral tinha um prazo curto para aferir se uma candidatura atendia aos critérios de legalidade, agora terá até a posse dos eventuais eleitos. Isso abre a possibilidade de eleição de políticos que antes seriam barrados pela Lei da Ficha Limpa.

A cada dois anos, desde o fim da ditadura militar de 64, o Congresso muda a legislação eleitoral e partidária na véspera de nova eleição. No próximo ano, o país voltará às urnas para eleger vereadores, prefeitos e deputados estaduais.

Caberá ao presidente da República sancionar com ou sem vetos o que a Câmara aprovou. Se vetar algum artigo, a Câmara poderá derrubar o veto se quiser. A aposta da maioria dos deputados é que o eleitor não liga para assuntos como esse.


Ricardo Noblat: A palavra de ordem do guru

Esqueçam tudo mais

Guru da família Bolsonaro, inimigo dos militares que a cercam, o autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho postou um novo vídeo nas redes sociais onde instrui os devotos do capitão, parte deles atônita com o que anda acontecendo.

Esqueçam tudo mais – agenda de costumes, ideologia, combate à corrupção, armas para todos. O que importa, o que só importa neste momento, é apoiar o presidente Jair Bolsonaro. A política, segundo Olavo, não é uma briga de ideias, mas de pessoas, de grupos.

Logo, a hora é de cerrar fileiras. Nada de discussões sobre isso ou aquilo. Deixam as dúvidas para lá. A esquerda continua forte. Ela domina a imprensa, a principal inimiga de Bolsonaro que deve ser enfrentada. Disciplina! Firmeza!. Coesão! Avante!

(Faltou “Anauê“.)

A nova encrenca do capitão

Viajar ou não? Sentado ou deitado?
Se dependesse dos médicos que cuidam dele, o presidente Jair Bolsonaro cancelaria sua viagem a Nova Iorque na próxima sexta-feira para discursar na abertura de mais uma Assembleia Geral da ONU. Bolsonaro teima em viajar assim mesmo.

Mas a ter que ir, os médicos querem que ele viaje deitado na cama que o Boeing presidencial oferece ao seu ocupante mais ilustre. É aí que o bicho pega. Bolsonaro quer viajar sentado como geralmente faz, com direito de convocar quem quiser para uma conversa.

Como se trata de uma longa e cansativa viagem, e como Bolsonaro ainda não se recuperou por completo, os médicos são contra seu desejo. Ou viaja deitado ou eles não se responsabilizam pelo que possa acontecer. É a mais nova encrenca do capitão.

Assessores e familiares de Bolsonaro estão divididos quanto à viagem. Uma parte desaconselha, e não só por causa da saúde, mas porque ele será alvo de protestos dado ao fogo que queima a Amazônia. A parte favorável acha que ele não pode se acovardar.

Golpista acidental

A dupla face de Michel Temer
Um ato falho repetido muitas vezes em curto período de tempo não é um ato falho, mas proposital. Em entrevista na última segunda-feira no programa “Roda Viva”, da TV Cultura, o ex-presidente Michel Temer chamou de golpe quatro vezes o movimento que depôs a ex-presidente Dilma Rousseff, e somente uma vez de impeachment.

Da vez que chamou de impeachment foi para explicar que a Constituição não prevê golpe. E que, portanto, ao assumir a presidência na condição de vice-presidente eleito, ele o fez depois de um processo de impeachment que seu deu nos termos previstos na Constituição e sob o controle da Justiça.

Então por que quatro vezes falou em golpe? Porque em Temer convivem o jurista que ele é, autor de livros sobre o Direito Constitucional, e o político que sempre foi e que continuará a ser. Sem que ninguém lhe perguntasse, o político contou uma história a título de curiosidade, mas que nada tinha de curiosa.

Contou que um dia procurou Dilma no Palácio do Planalto e lhe disse que Eduardo Cunha (PMDB-RJ), então presidente da Câmara dos Deputados, recebera seis pedidos de impeachment contra ela, sendo que dois eram bastante complicados. Mas que ouvira dele que rejeitaria os seis. Dilma comemorou a informação.

O que Temer, o político, quis dizer com isso? De passagem, como se tratasse de uma mera recordação inocente, quis dizer que Cunha também o enganara. A culpa do impeachment – ou do golpe – deve ser debitada na conta de Cunha, não na dele. Temer sequer “conspirou um pouquinho” para derrubar Dilma, como garantiu…

Jair Bolsonaro é um presidente acidental. Foi eleito por uma conjuntura que jamais se repetirá. Michel Temer foi um golpista acidental. Nada teve a ver com o golpe ou o impeachment, como preferirem. Estava ali como vice-presidente observando tudo à distância quando foi chamado a suceder Dilma. Fazer o quê?


Ricardo Noblat: Bolsonaro à caça do traidor

Reforma ministerial adiada

O presidente Jair Bolsonaro desembarcou, ontem, em Brasília furioso com a informação de que encomendou aos auxiliares que o cercam mais de perto o esboço de uma ampla reforma ministerial que pretende fazer em breve. Está à caça da fonte, ou das fontes, que vazaram a informação para as jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros, editoras do boletim TAG Reporter. Este blog obteve a mesma informação.

Recomenda-se ao presidente que amplie a investigação que pretende fazer em busca do que chama de “traidor” infiltrado entre as pessoas de sua confiança. A quem poderia interessar o vazamento da notícia? Resposta óbvia: a quem desejasse abortar o que estava sendo estudado. Ou porque seria prejudicado com a reforma ou simplesmente porque discordava dela a essa altura. O governo passaria cedo demais o recibo de que vai mal.

O episódio da reforma negada por Bolsonaro, especialista em se desdizer e em desmentir o que com frequência acaba se confirmando adiante, lembra episódio parecido que ocorreu em 1984 quando a eleição de Tancredo Neves para presidente era dada como certa. Em um esforço desesperado para vencer, Paulo Maluf, candidato do regime militar, convenceu o presidente João Figueiredo a fazer uma reforma ministerial a seu favor.

A informação vazou para Tancredo. Então pela primeira e última vez na sua vida, ele deu uma entrevista coletiva em “off”. Repassou a informação para um grupo de repórteres dos maiores jornais da época mediante a condição de não ser citado. Deu o nome dos ministros que seriam demitidos e dos que entrariam com a missão de ajudar Maluf. Ao ver a informação publicada no dia seguinte, Figueiredo desistiu da reforma.

Não se cobre a Bolsonaro conhecimentos históricos nem sabedoria política em excesso, apanágio de figuras que existiram no passado e de raras que ainda vivem. Bolsonaro é binário – preto ou branco, terra ou ar, amigo ou inimigo. É da sua formação. Paraquedista faz parte das chamadas Forças Especiais do Exército. O governo está repleto deles. Não é estimulado a pensar muito e tampouco a discutir. Ordem é ordem. Quando acionado, cai atirando para matar ou morrer. Selva!

Fora do hospital antes da hora

Tudo bem
Seria um exagero dizer que o presidente Jair Bolsonaro se deu alta do hospital onde foi internado em São Paulo para mais uma operação por conta da facada que levou há um ano em Juiz de Fora.

Mas se tivesse dependido unicamente dos médicos que cuidam dele, Bolsonaro ficaria por lá mais alguns dias. Sua recuperação foi boa e não há indicação de retrocesso.

Bolsonaro voou de volta a Brasília porque, na sua paranoia, enxerga perigos por todos os lados e não confia em ninguém – salvo na mulher e nos seus filhos.

Está disposto a fazer o que disse – comparecer à abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, nem que seja em cadeira de rodas. Um bom paraquedista não foge ao combate.

Os médicos acham cedo demais para que ele viaje – mas que médicos dizem não a um presidente da República? Está para nascer o primeiro. Não disseram não a Tancredo Neves e foi o que se viu.

O racha em meio aos bolsonaristas preocupa Bolsonaro e os garotos. Aumenta entre os devotos do capitão a desconfiança de que esfriou seu compromisso com o combate à corrupção.

E tudo por causa do envolvimento de Flávio com desvio de dinheiro público, do acordo entre Bolsonaro e o ministro Dias Toffoli para salvar Flávio, e, por consequência, o enfraquecimento de Moro.

A viagem a Nova Iorque foi esvaziada. Descartaram-se encontros com Bolsonaro pedidos por chefes de Estado. O presidente preferiu se reunir com generais americanos no Texas.

Até lá, deverá estar se alimentando normalmente. No momento, alimenta-se de coisas cremosas. Evoluirá para as pastosas. Está proibido de falar muito. Mas como forçá-lo a obedecer?

Resta aos devotos e às pessoas de bom coração torcerem para que tudo dê certo. Selva! Ou melhor: Amém!

No meio do caminho tinha um tanque

Witzel invadiu os domínios do capitão
Anteontem, ainda hospitalizado, o presidente Jair Bolsonaro negou que tivesse ordenado ao PSL carioca a retirada do apoio ao governador Wilson Witzel (PSC). Ontem, o PSL carioca anunciou que seus 12 deputados estaduais deixarão de apoiar Witzel.

Nada de mais. Nada de original. Bolsonaro não tem compromisso com o que diz. E por não ter, orientou seus correligionários a dizerem que o rompimento se deve ao fato do governador do Rio ter revelado que será candidato a presidente em 2022.

Não foi por isso. É fake! Bolsonaro foi o primeiro a saber que Witzel pretende se candidatar à sua sucessão. Mas desde que ele, Bolsonaro, não seja candidato. Como Bolsonaro soube disso? Ouviu do próprio governador ao sobrevoar o Rio em um helicóptero ao lado dele.

Testemunhas da confissão de Witzel: agentes de segurança de Bolsonaro e o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Bolsonaro ouviu a confissão calado, e não gostou. Ela serviu para aumentar sua desconfiança e antipatia pelo governador.

O copo d’água transbordou quando Bolsonaro assistiu Witzel pontificar no desfile militar de 7 de setembro a bordo de um tanque de guerra do Exército. O que é isso? Witzel quer fazer média com os militares, reduto eleitoral de Bolsonaro? Pode parar!

E o PSL desembarcou


Ricardo Noblat: Vem por aí uma ampla reforma ministerial

Começar de novo

Antes de se internar para ser operado, o presidente Jair Bolsonaro autorizou ministros que o cercam mais de perto a esboçarem uma ampla, geral e irrestrita reforma ministerial que ele quer deflagrar logo depois da aprovação pelo Senado da nova Previdência e do nome de Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República.

Nem Bolsonaro está satisfeito com o governo, e ao fraco desempenho da equipe atribui sua queda nas pesquisas de opinião. Aqueles tidos no passado como superministros, Paulo Guedes e Sérgio Moro, poderão escapar da degola, mas nem mesmo eles têm lugar garantido. Vai depender de acertos que fizerem com o capitão.

Guedes não entregou o que prometia – sinais convincentes de recuperação da economia. Ela patina. E Moro… Sabe como é. Bolsonaro está convencido de que Moro quer sucedê-lo. Ficará no governo se não resistir a mudanças na Polícia Federal. Do contrário, Bolsonaro já tem um general para substitui-lo.

O ministro da Educação tem tudo para ir dançar na chuva longe de Brasília. Bolsonaro admite que errou ao escolhê-lo, como antes havia errado na escolha do ministro que o antecedeu. Por mais que goste de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, Bolsonaro acha que ele já deu o que poderia dar.

É o caso também de Onyx Lorenzoni, o chefe esvaziado da Casa Civil da presidência da República. Ele poderá voltar para a Câmara dos Deputados como líder do governo. Ao general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, talvez uma embaixada caísse bem.

Osmar Terra, ministro da Cidadania, Desenvolvimento Social, Esporte e Cultura, é outro que perderá com a reforma. Se não deixar de ser ministro, perderá a Cultura para o Ministério da Economia, e o comando do programa Bolsa Escola para a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. Damares segue firme como uma rocha.

As informações são do TAG Reporter, relatório semanal das jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros.

A incerta viagem do capitão a Nova York

Saúde acima de tudo
Antes de ser operado mais uma vez, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que iria a Nova Iorque “nem que seja de cadeira de rodas” para falar no próximo dia 24 em nome do Brasil na abertura de mais uma Assembleia Geral da ONU.

Na semana passada, depois de uma visita relâmpago a Bolsonaro no hospital, o general Hamilton Mourão Filho, no exercício da presidência da República, assegurou que o capitão estaria em perfeitas condições para viajar.

Não é bem assim. Segundo os médicos que cuidam dele, embora sua recuperação seja boa, Bolsonaro só será liberado para viajar em cima da hora. Eles não querem que o presidente corra risco algum. A viagem para Bolsonaro não é questão de vida ou morte.

Ele sabe que enfrentará um clima hostil na Assembleia depois que atacou o presidente francês e sua mulher e se desentendeu com outros presidentes europeus por conta da Amazônia. Teme uma retirada em massa de diplomatas durante seu discurso.

De resto, militantes da questão ambiental estão nos cascos para recepcioná-lo com faixas, cartazes e muito barulho. Só com a saúde tinindo ele enfrentará o que lhe aguarda.


Ricardo Noblat: É a lei, estúpidos!

O que Deltan Dallagnol e Sérgio Moro esqueceram

Alguns pontos chamam atenção na entrevista por escrito dada por Deltan Dallagnol, chefe da Força-Tarefa da Lava Jato em Curitiba, ao jornal Correio Braziliense, e publicada no último fim de semana.

Sobre as mensagens trocadas por ele com seus colegas procuradores e com o ex-juiz Sérgio Moro, e divulgadas pelo site The Intercept, disse Dallagnol que elas foram “descontextualizadas e até mesmo editadas”. Recomenda a leitura dos diálogos como a melhor forma para se concluir que nada revelam de criminoso.

Quer dizer: ele se nega a confirmar a autenticidade das mensagens quando acompanhadas de comentários a respeito, mas os diálogos em estado bruto, e somente eles, não. Foram tantas as mensagens divulgadas até aqui que Dallagnol poderia ter apontado uma, pelo menos uma, que tenha sido editada ou manipulada. Não o fez.

A Polícia Federal ainda investiga se os hackers de Araraquara, que capturaram as mensagens e as repassaram ao The Intercept, foram pagos ou não pelo serviço. Eles negam que tenham sido pagos. Mas Dallagnol, que condena a interpretação apressada que se dá às mensagens de sua autoria, logo se apressa em sugerir:

“Um dos presos tem longa ficha criminal que aponta a prática de crimes por dinheiro. Um dos envolvidos chegou a dizer que o plano era de vender as mensagens. É razoável supor que ele possa ter recebido para passar minhas mensagens adiante. Até porque ele teve movimentações de ordem milionária (…)”.

Como é um bom moço, preocupado antes de tudo em fazer justiça, tem o cuidado de acrescentar:

“Mas é preciso aguardar o desfecho das investigações para saber exatamente o que ocorreu. Confiamos na PF.”

Houve exageros na divulgação das operações policiais ao longo da força-tarefa da Lava-Jato? – perguntou o jornal. Os crimes praticados é que foram exagerados, respondeu Dallagnol. “Prestamos informações públicas para a imprensa porque respeitamos sua importância na democracia”, justificou-se.

A imprensa tem a obrigação de transmitir ao distinto público tudo o que possa lhe interessar – de informações oferecidas pelos procuradores da Lava Jato a informações descobertas sobre o modo como eles se conduziram à frente da operação. Erraria gravemente se transmitisse umas e escondessem outras.

Dallagnol queixou-se da imprensa:

“O que vemos é o enfraquecimento do direito à privacidade e ao sigilo profissional para viabilizar a divulgação de fofocas, opiniões pessoais, cogitações e mesmo de estratégias, planos e atos de investigação legítimos. Isso tem prejudicado investigações em curso que tramitam sob sigilo. Não há interesse público nisso”.

Ao vazar para a imprensa conversas particulares de Lula que apenas mostravam o quanto ele é desbocado, telefonemas da ex-primeira-dama Marisa Letícia para seus filhos onde ela dizia palavrões, e comentários chulos feitos por líderes do PT, Dallagnol se preocupou com o “enfraquecimento do direito à privacidade” dessas pessoas?

“Nunca ultrapassamos a linha da lei e da ética”, afirmou Dallagnol. Foi ético escolher para divulgação apenas um dos 22 diálogos grampeados de Lula no dia em que ele fora convidado para ser ministro de Dilma? O diálogo escolhido deixou a impressão de que ele aceitara o convite só para escapar da Lava Jato.

Se tornados públicos, os demais diálogos deixariam a impressão contrária – e por isso foram guardados. Dallagnol e Moro respeitaram “a linha da lei e da ética” ao procederem assim? O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, que barrou a nomeação de Lula, está convencido de que não respeitaram.

Um procurador da Lava Jato, à época estarrecido com o vazamento do diálogo matador entre Dilma e Lula, obteve de Dallagnol a seguinte explicação: “Mas a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior que é político”. Quantas vezes na história da Lava Jato o “contexto político” não se impôs ao contexto jurídico?

É a lei, seus estúpidos. Ela é que deveria prevalecer sempre.

O desconforto da ministra

Bombeira
A deputada Teresa Cristina, ministra da Agricultura, uma das poucas peças que de fato funcionam no governo Bolsonaro, começa a sentir-se desconfortável onde está.

Além de fazer o que lhe cabe, ainda tem de se ocupar em apagar incêndios ateados pelo presidente e os que lhe são mais próximos. Não está sendo fácil evitar perdas para o país com a crise ambiental.

A ministra embarcou para uma visita de cinco dias a três países árabes que ameaçavam comprar menos ao Brasil.


Ricardo Noblat: As CPIs que assombram o governo Bolsonaro

É no que dá querer mandar sozinho

Fora a dificuldade que enfrenta no Congresso para aprovar o que lhe interessa e derrotar o que lhe criaria problemas, um novo fantasma ali passou a assombrar o governo do presidente Jair Bolsonaro – as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs).

E tudo porque o capitão, cercado por auxiliares sem voto e militares sem tropas, insiste em governar sozinho e se recusa a compartilhar o poder com os partidos. Em uma democracia, em qualquer parte do mundo, é algo que ninguém jamais conseguiu.

Foi aberta a CPI das Fake News para apurar o uso de notícias e perfis falsos que possam ter influenciado o resultado das últimas eleições. Ela já se reuniu duas vezes. E seu presidente, o senador Ângelo Coronel (PSD-BA), já recebeu ameaças de morte.

Os Bolsonaro dizem que jamais distribuíram noticias falsas. No entanto, ninguém mais do que eles estrilaram quando o Congresso criminalizou a distribuição em períodos eleitorais. Bolsonaro, o pai, vetou o projeto. O Congresso derrubou o veto.

Foi protocolado na Câmara na última quinta-feira o pedido de instalação da CPI da Vaza Jato para apurar possíveis ilegalidades reveladas na troca de mensagens entre procuradores da Lava Jato em Curitiba e o ex-juiz federal Sergio Moro.

Sob a pressão do governo, deputados que assinaram o pedido de criação da CPI recuaram e querem retirar suas assinaturas. Só que o regime interno da Câmara diz que isso não é possível. Uma vez assinado o pedido, assinado fica.

Poderá ser criada no Senado a CPI da Lava Toga para investigar o “ativismo judicial” de autoridades de tribunais superiores, especialmente ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Essa seria a mais explosiva de todas na avaliação do governo.

Sem dispor ainda do número suficiente de assinaturas para ser criada, a CPI da Lava Toga desatou uma crise no PSL, partido de Bolsonaro, o único que apoia o governo. O senador Flávio Bolsonaro (RJ) tudo faz para impedir sua criação.

“Vocês querem me foder e foder o governo?” – ele berrou em ligação para a senadora Juíza Selma (PSL-MT) que assinou o pedido de criação da CPI. Ao Major Olímpio (PSL-SP), líder do governo no Senado, Flávio disse poucas e boas.

Flávio acha que a CPI despertaria a fúria de ministros do STF e que isso poderia lhe prejudicar diretamente. Foi uma liminar concedida pelo ministro Dias Toffoli que suspendeu o processo a que Flávio responde por desvio de dinheiro público.

Bolsonaro, o pai, quer ouvir falar de tudo – menos de uma CPI que comprometa o pacto firmado por ele com Toffoli em nome da estabilidade institucional. Dito de outra maneira: o governo não mexe com juízes e os juízes não mexem com o governo.

Está difícil para o clã dos Bolsonaro explicar aos seus devotos que o compromisso de lutar contra a corrupção tem limites. E este seria um: proteger Flávio para evitar que a acusação que pesa contra ele atinja por tabela a nova família imperial do Brasil.

David Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, é contra a CPI da Lava Toga. Se depender dele, não será criada nunca. Em julho último, um processo a que Alcolumbre respondia foi arquivado pelo STF. Ele é grato ao tribunal.

Mr. Simpatia

O general que agrada, mas não resolve
É quase unânime a opinião de deputados e senadores: de longe, o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo da presidência da República desde a demissão do general Santos Cruz, é, disparado, o mais simpático e gentil auxiliar de Jair Bolsonaro.

Uma doce figura, dona de um papo ótimo e que sorri com facilidade. Transita com desenvoltura no Congresso. Não discrimina ninguém. Tem amigos por toda parte – até mesmo no PT dada à experiência do tempo em que foi assessor parlamentar das Forças Armadas.

Mas não resolve nada. Quer apoio ao governo, mas em troca carece do que oferecer. Cobra fidelidade, que não se traduziria apenas em votos para aprovar projetos do governo, mas também em elogios por meio das redes sociais. E fica só nisso.

Os partidos querem cargos no governo e dinheiro para a construção de pequenas obras em seus redutos eleitorais. Nada disso seria ilegal. É assim que se governa. Mas tudo continua emperrado. E a culpa não é do general. É de mais de cima.


Ricardo Noblat: Resposta ao ventríloquo

E segue o baile

Em tempos normais, o comentário de um vereador jamais chamaria atenção para além dos limites da Câmara Municipal onde ele tivesse assento. Se fosse muito estridente e original, talvez ganhasse um registro de pé de página na gazeta local.

Mas os tempos que correm são estranhos como repete o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. E por estranhos, o comentário poderá ser respondido pelos principais líderes políticos do país, entre eles o vice-presidente da República.

Foi o que aconteceu, ontem, para satisfação do vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ), sempre à procura de holofotes, que na véspera escrevera no Twitter que por vias democráticas jamais será possível apressar as mudanças de que o Brasil tanto precisa.

De fato, ninguém respondeu ao Zero Dois. Os que o fizeram valeram-se do filho para responder ao pai desde domingo calado e preso a um leito de hospital. Como os irmãos, Carlos é um boneco de ventríloquo que vocaliza o que o pai pensa ou manda que diga.

A ele e aos demais Zeros falta cultura para proporem ideias a ser aproveitadas pelo país. Também falta ao pai, um insignificante deputado federal do baixo clero por quase 30 anos que trocava de partido como um bebê troca de fraldas. Trocou oito vezes.

Bolsonaro em nada evoluiu durante todo esse tempo. Foi o país que andou para trás e então os dois se encontraram. Os garotos são um espelho do pai que os criou com mão de ferro à sua imagem e semelhança. Natural que quando falem, seja o pai que fala por eles.

O deputado que sempre defendeu a ditadura militar de 64 e que certa vez disse não confiar na força do voto para mudar coisa alguma, é o presidente que há pouco tempo ameaçou usar a borduna se for impedido de governar ao seu gosto.

Se não houver forte reação ao que prega de viva voz e ao que defendem os filhos quando ele finge estar mudo, sua tarefa ficará mais fácil. Não há, pois, reação exagerada aos desvarios de uma família que marcha unida “com Deus pela liberdade”.

Esse filme já passou. Não vale a pena assisti-lo outra vez. A produção é péssima, o roteiro uma porcaria e os atores medíocres.

Chance zero de uma nova CPMF
Jogo de cena
A proposta do ministro Paulo Guedes de criação de uma nova CPMF ou de algo parecido tem chance zero de ser aprovada pelo Congresso. Mais de uma vez, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, já disse que, ali, não deixará que ela sequer seja votada.

Se ele não mudar de opinião, assim será. O que dará oportunidade para que Guedes e o presidente Jair Bolsonaro possam dizer mais adiante que o Congresso teima em boicotar as iniciativas do governo, e justificar dessa forma as dificuldades que enfrentam.

Queixam-se senadores, principalmente eles, que Guedes quando comparece ao Congresso é quase sempre para discursar, aparecer bem na televisão, mas que costuma ir embora sem dar respostas às dúvidas que ficam e sem explicar direito coisa alguma.


Ricardo Noblat: O embaixador pistoleiro e o guerrilheiro Carlos

Boletim sobre os intrépidos garotos

Com o pai preso a um leito de hospital e impedido por ora de dizer ou de cometer sandices, os garotos Carlos e Eduardo Bolsonaro voltaram a pontificar em grande estilo nas redes sociais.

Haveria melhor momento para chamar atenção e aumentar o número dos seus seguidores, sejam eles devotos mansos ou adversários indignados? Não resistiram, pois.

À caça de votos para ser nomeado embaixador do Brasil em Washington, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) postou no Instagram uma foto sua ao lado do pai convalescente.

Detalhe que o aspirante a diplomata fez questão de mostrar: na cintura, uma pistola Glock 9mm de cor preta. É a arma padrão usada pelos policiais federais. Eduardo é escrivão licenciado.

Pode uma visita entrar armada em um hospital e circular por ali? A direção do Hospital Vila Nova Star, em São Paulo, respondeu que cabe à presidência da República cuidar da segurança do enfermo.

E da segurança dos outros enfermos e funcionários do hospital, quem cuida? E se Eduardo sacasse a arma para reagir ao desacato de um eventual inimigo com quem cruzara pelos corredores?

O Zero Três gosta de armas, de praticar tiro ao alvo e de falar grosso quando pode. Não foi ele que deu a receita para fechar o Supremo Tribunal Federal? Bastariam um cabo e dois soldados.

Ultimamente discreto no Twitter, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) voltou com a corda toda. Em meio aos elogios de praxe ao pai e ao governo, postou um comentário que logo bombou.

“Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos… e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!”

Se por vias democráticas o Brasil não mudará na velocidade desejada por ele e os que pensam como ele, o que sugere o Zero Dois? Pegar em armas? Aplicar um golpe? Instalar uma ditadura?

Convenhamos: isso não seria um comportamento típico da esquerda que os Bolsonaros acusam de antidemocrática, autoritária e golpista? Não teria mais a ver com Cuba e Venezuela?

É fato que uma fatia da esquerda pegou em armas duas vezes com a promessa de mudar o Brasil: em 1935 e no final dos anos 60. Foi esmagada pelas ditaduras de Getúlio Vargas e dos militares.

Os garotos estão preocupados com a queda de popularidade do pai e do seu governo, e com a ameaça de voltarem a ser investigados pelo Ministério Público no caso de rolos fiscais (alô, alô, Queiroz!).

De resto, têm colecionado más notícias. Uma delas, a derrubada pelo Congresso do veto do seu pai ao projeto de lei que aumentou a pena para quem distribuir notícias falsas nas redes sociais.

Eduardo protestou. Disse que o projeto só beneficia a esquerda que dispõe de “melhores advogados”. O pai o apoiou. Os dois negam que distribuam notícias falsas. (kkkkkkkkkkkkkkkkk)

Tirar dos Bolsonaros seu principal instrumento de fazer política é desarmá-los por completo, é deixá-los expostos à sua falta de ideias construtivas, é reduzi-los à sua magnífica insignificância.

O aspirante a diplomata bem que poderia se ocupar fritando hambúrguer para os amigos em Washington. Mas, e o guerrilheiro de fancaria? Com o que iria se ocupar?

Huck quer um lugar no caldeirão de 2022

Te cuida, Doria!
Foi o discurso possível que a essa altura alguém se arriscaria a fazer como aspirante a candidato à sucessão do presidente Jair Bolsonaro. Se lhe perguntarem se será, negará. É de praxe.

Em seminário promovido pela revista Exame, em São Paulo, diante de uma plateia de executivos de empresas, o apresentador do Caldeirão do Huck falou como se só pensasse naquilo.

Descreveu-se como uma pessoa “com a cabeça aberta”. Disse que o Brasil precisa se debruçar sobre problemas urgentes como a falta de mobilidade social e o atraso na educação.

Contou histórias sobre pessoas que conheceu ao viajar pelo país para as gravações do seu programa na Rede Globo de Televisão, e afirmou que “se a gente não fizer nada, este país vai implodir”.

Explicou: “Eu não convivo bem com a polarização. Eu não sou um cara do grito, de falar alto. Eu não enxergo as pessoas que pensam diferente de mim como inimiga”.

Parte da plateia agitou-se ao ouvir: “A gente não acha que vai discutir redução de desigualdade ou solução para favela com um monte de gente branca, rica, sentada numa mesa na Faria Lima”.

E convocou o que chamou de elite a abandonar a indiferença e “colocar a mão na massa” para buscar uma transformação no país. Advertiu, cuidadoso, como quase todo político costuma fazer:

– Isso não é um projeto pessoal, isso não é um projeto de poder, isso não é um projeto político. É um projeto de país.

Sobre o governo Bolsonaro, só uma frase: “A agenda econômica deste governo é correta”. Mas não se recusou a alfinetar Lula e o prefeito Marcelo Crivella, do Rio.

“A gente precisa de uma narrativa conciliadora no Brasil. Não dá para ficar brigando com todo mundo, discutindo, iludindo as pessoas. E, olha, não é de hoje. Já usaram muito a retórica do ‘nunca antes na história deste país’. Não é verdade.”

“De coração, acho que o povo para valer não está preocupado com como é que é o desenho do casal que está no gibi da Marvel. As pessoas querem saber como a vida delas pode melhorar de verdade. É só isso”.

Arderam as orelhas do governador João Doria (PSDB-SP) que sonha em ser o candidato da direita para desbancar Bolsonaro na eleição de 2022.


Ricardo Noblat: É dando que se recebe

O sonho do filho custará caro

A aprovação da reforma da Previdência Social pelo Senado são favas contadas. Mas a aprovação ao nome de Eduardo Bolsonaro para embaixador do Brasil em Washington custará caro.
Davi Alcolumbre, presidente do Senado, já informou a Bolsonaro que há votos bastante para aprovar a indicação do Zero Três, tanto na Comissão de Relações Exteriores quanto no plenário.

Mas… Mas Bolsonaro, segundo Alcolumbre, não deve esperar tanta boa vontade dos senadores se não lhes der algo em troca. Cargos no governo até que seria bom, mas tem coisa melhor.

Os ministérios não se queixam – e com razão – que seus orçamentos para este ano serão pequenos, mas que os do próximo serão ainda menores? E então? É por aí.

Que Bolsonaro peça ao Congresso a aprovação de um crédito suplementar e que parte do dinheiro seja destinada ao atendimento das emendas parlamentares ao Orçamento da União.

São dessas emendas que vivem senadores e deputados. Precisaram que sejam pagas para irrigar suas bases eleitorais com pequenas obras. Haverá eleições municipais em 2019.

Velha ou Nova Política, é dando que se recebe.

Os erros que Bolsonaro quer corrigir

Cabeças a prêmio
Quando Lula foi eleito presidente em 2002, pediu conselhos a José Sarney. Com mais de 50 anos de poder, o ex-presidente respondeu que presidente da República não precisa de conselhos, mas lhe deu um:

– Há três cargos nos quais você não pode errar de jeito nenhum: o diretor da Polícia Federal, o secretário da Receita e o procurador-geral da República.

Tempos depois, Lula desabafou com Sarney:

– Aquela nossa conversa não me sai da cabeça. Errei nos três.

(A informação está na mais recente edição do TAG Reporter, das jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros.)

Bolsonaro já errou em dois: na escolha do Diretor da Polícia Federal que deixou a cargo do ministro Sérgio Moro, e na escolha do Secretário da Receita que deixou a cargo do ministro Paulo Guedes.

A cabeça do Diretor e a do Secretário está a prêmio.

Só o futuro dirá se ele acertou ao indicar Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República. Parte dos seus devotos acha que Bolsonaro errou.

Um Rivotril para Paulo Guedes

Arrogância no calçadão
Conta o jornalista Ancelmo Gois, em sua coluna desta segunda-feira no jornal O Globo, que o ministro Paulo Guedes, da Economia, passeava ontem à tarde no calçadão do Leblon, no Rio, quando uma pessoa de um grupo gritou, referindo-se ao comentário dele sobre a aparência da primeira-dama francesa Brigitte Macron:

– Que feio, hein, ministro. Que vergonha!

Guedes juntou-se ao grupo e disse:

– Foi muito feio. Na verdade, coisa de brasileiro.

Conversa vai, conversa vem, e antes de afastar-se do grupo, o ministro ameaçou:

– Na terceira abordagem como essa, eu largo tudo e vou embora. E aí vocês vão ver o que é bom, como é que fica.

Guedes errou duas vezes. A primeira ao atribuir a “coisa de brasileiro” seu comentário grosseiro e machista sobre Brigitte. A maioria dos brasileiros é diferente dele.

O segundo erro foi o de julgar-se insubstituível no governo. Sem ele, as coisas ficariam mal. Nem o presidente da República é insubstituível, como provam os fatos conhecidos.

Guedes se comporta como se fosse o único bombeiro capaz de apagar os incêndios que Bolsonaro tenta atear quase diariamente. Há outros bombeiros no governo – e todos malsucedidos.

O Posto Ipiranga que Guedes pareceu ser um dia está mais para uma lembrança do passado.


Ricardo Noblat: A nova versão humilde e frágil de Bolsonaro

É temporária, não se enganem

A indicação de Augusto Aras para o cargo de Procurador-Geral da República rachou a base de apoio ao presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais, onde ele costuma nadar de braçada, e repercutiu mal dentro do seu partido, o PSL.

Nada, de alguns meses para cá, deixou Bolsonaro mais assustado. A ponto de ele ter suplicado por compreensão e paciência no seu programa semanal ao vivo no Facebook da última quinta-feira, e de ter repetido a súplica ontem.

Pela primeira vez, na nova versão de “presidente humilde e frágil”, Bolsonaro pareceu emocionado e declamou sem elevar o tom da voz, quase chorando: “Reconheço as minhas limitações, a minha incompetência em alguns momentos”.

Esqueceu a advertência que fizera na véspera de que não deve “lealdade cega” nem mesmo aos que o elegeram, e de que o eventual insucesso do seu governo poderá resultar na volta do PT ao poder com todos os males que isso significaria.

Amigo do senador Jaques Wagner (PT-BA), com bom trânsito entre petistas cinco estrelas, Aras foi alvo de um dossiê entregue por deputados do PSL a Bolsonaro que eram contra sua a indicação para a Procuradoria Geral da República.

Notícias sobre o dossiê ganharam as redes sociais impulsionadas por bolsonaristas sinceros, porém radicais. Junto com o alerta de que se ele fosse escolhido, o combate à corrupção perderia força e o PSL poderia cindir-se de vez e para sempre.

A suspeita foi reforçada com manifestações de procuradores ligados à Lava Jato que recomendaram a Bolsonaro a escolha de outro nome – de preferência, um dos três sugeridos pela massa de procuradores em votação direta. Foram ignorados.

O Procurador-Geral da República pode muito, mas não pode tudo. Em matéria de importância, o cargo só perde para os de presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. É mais importante que o cargo de vice-presidente.

Difícil que Aras vá se empenhar em enfraquecer o combate à corrupção. Não combina com o seu perfil e lhe faltaria apoio entre os colegas. Desconfia-se é que Bolsonaro pessoalmente já não esteja mais tanto assim comprometido com o combate à corrupção.

O ministro Sérgio Moro caiu em desgraça junto a Bolsonaro por tentar reverter a decisão do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, que, atendendo a um pedido do senador Flávio Bolsonaro, brecou investigações sobre a corrupção com base em dados fiscais.

Foi deslealdade de Moro na opinião de Bolsonaro, afinal a decisão solitária de Toffoli, que em breve será referendada ou não pelos seus pares, beneficiou não só Flávio como por tabela toda a sua família que corria o risco de ser também investigada.

A vida de Aras na Procuradoria Geral da República não será fácil. Como, de resto, não foi a dos seus antecessores.

Foi a facada que elegeu o capitão?

A pergunta que ainda se faz

A essa hora, há exato um ano, Jair Bolsonaro, o candidato azarão à presidência da República, estava entubado em estado grave na UTI da Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora, Minas Gerais, depois de ter sido esfaqueado na véspera pelo pedreiro Adélio Bispo. Perguntava-se: se sobrevivesse, continuaria candidato?

Uma vez eleito, a pergunta que se fez e que muitos hoje ainda se fazem é: Bolsonaro teria vencido aquela eleição se Adélio não tivesse cruzado o seu caminho? Ou: a facada foi decisiva para que ele se elegesse? A pergunta jamais terá uma resposta satisfatória porque o momento ainda está impregnado de paixões.

Na noite do dia 6 de setembro do ano passado, a menos de 12 horas de ser esfaqueado, Bolsonaro tinha 21% das intenções de voto na pesquisa feita por telefone pelo Instituto Ideia BigData. No dia 10 saltou para 24%. No dia 18 para 27%. No dia 25 para 31%. E no dia 5 de outubro para 33%. Seu crescimento foi constante.

Recuemos pouco mais de um ano. Entre abril de 2017 e novembro daquele ano, o voto espontâneo em Bolsonaro quase dobrou de tamanho. Foi de 6% para 11%. O que se passou no período? Aécio Neves (PSDB) foi flagrado pedindo dinheiro ao empresário Joesley Batista, e Joesley gravou o presidente Temer no Palácio do Jaburu.

Políticos e empresários foram presos. Um ex-deputado, assessor de Temer, foi filmado carregando uma mala estufada de dinheiro no centro de São Paulo. A Lava Jato estava a pleno vapor. A imprensa só falava disso. E a indignação dos brasileiros com a corrupção só fazia aumentar. O desemprego também aumentava.

Sim, a facada deu a Bolsonaro uma cobertura midiática que ele jamais teria. Seu tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão era insignificante. Fora o minúsculo PSL, nenhum outro partido quis juntar-se a ele. A facada liberou Bolsonaro para que faltasse aos debates com os demais candidatos. Sim, mas…

Mas o candidato que até agosto liderava todas as pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Lula, estava preso e condenado por corrupção. Em junho de 2018, a uma pergunta feita pelo BigData, 57% dos eleitores entrevistados haviam respondido que “não votariam em um candidato do PT de jeito nenhum”.

O PT fizera pelo menos três apostas erradas. A primeira: Lula poderia ser solto a tempo de disputar a eleição. A segunda: se não fosse, transferiria seus votos para Fernando Haddad. A terceira: Bolsonaro seria o candidato mais fácil para derrotar. Haddad não herdou todos os votos de Lula, mas herdou toda a rejeição ao PT.

O voto útil manifesta-se no segundo turno de uma eleição quando o eleitor vota em um candidato para impedir que o outro ganhe. No primeiro turno da eleição de 2018, diante da fraqueza dos demais candidatos, o voto útil por pouco não elegeu Bolsonaro. Ele obteve 46,3% do total dos votos válidos, e Haddad, 29,8%.

O eleitorado cavalgou Bolsonaro para votar contra tudo o que rejeitava. Nisso, a eleição de 2018 foi parecida com a de 1989, a primeira depois do fim da ditadura militar. Em 1989, foram para o segundo turno os dois candidatos que se apresentavam como contrários a tudo – Fernando Collor e Lula.

O pragmatismo do eleitor é conhecido. Ele não tem compromisso com o erro. Collor governou por menos de três anos dos quatro a que tinha direito. Começou a cair quando pediu às pessoas que fossem às ruas vestidas de verde e amarelo para apoiá-lo.