Blog do Noblat

Ricardo Noblat: Livre expressão de pensamento, desde que a favor do governo

Mordaça
O direito à livre expressão de pensamento é sempre invocado pelo presidente Jair Bolsonaro toda vez que seus seguidores nas redes sociais sentem-se ameaçados ou tolhidos. Mas é bom saber que o que ele defende para sua gente não vale para os que possam criticá-lo. Nos últimos dias, acumula-se uma série de fatos de que o negócio é diferente para uso interno do governo.

O Gabinete de Segurança Institucional da presidência da República, segundo o GLOBO, prepara norma que permitirá ao governo processar servidores públicos pelo que eles publicarem nas redes sociais em sua vida privada. Minuta da norma diz que servidores e prestadores de serviços devem compreender “que suas atividades nas redes podem impactar a imagem da organização”.

O servidor público federal poderá ser processado desde que os atos ou comportamentos praticados nas redes guardem “relação direta ou indireta com o cargo que ocupa, com suas atribuições ou com a instituição à qual esteja vinculado”. Na mesma linha, a Controladoria Geral da República baixou uma norma em que defende a punição do servidor que critique o governo nas redes.

Se o fizer, de acordo com a norma, ele terá descumprido o “dever de lealdade”, uma vez que o que disse atingiu a imagem e feriu a credibilidade da instituição que integra. Em meados do mês passado, servidores do Ministério da Saúde foram obrigados a assinar um documento em que se tornam sujeitos à Lei de Segurança Nacional caso vazem informações sensíveis.

O ministro André Mendonça jura que não sabia que a Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça monitora 579 funcionários públicos federais da área de segurança que se declararam antifascistas nas redes sociais. Não soube explicar, ou então não lhe perguntaram, por que a secretaria não faz a mesma coisa com funcionários públicos federais fascistas.

Mendonça, bom de bico, enrolou, enrolou, e tentou sair de fininho: “Tomei conhecimento desse possível dossiê pela imprensa. […] É de rotina que se produzam relatórios para se prevenir situações que gerem insegurança para as pessoas, com potenciais de conflito, depredação, atos de violência contra o patrimônio público, então não é uma atividade que surgiu agora”.

Dito de outra maneira: liberdade de expressão para servidor público só a favor do governo. Contra, a porta da rua é a serventia da casa.

Vozes

De Lula a Ricardo Vélez

  • “Eu queria ver o Moro candidato. Queria ver ele em um debate. Convidei ele pra debater comigo e ele fugiu. Não tinha coragem de me olhar nos olhos nem quando vestia a toga. Imagina agora. Fez parte de um jogo sujo que acabou sujando a história do judiciário brasileiro”. (Lula)
  • “Eu preciso ajudar o povo brasileiro a entender do que se trata. Então vamos lá. Luciano Huck, por exemplo, também é um belo de um garoto, um belo apresentador de TV. O Tiririca é um belo de um palhaço, meu queridíssimo. Agora, [eles] tão prontos para serem presidente do Brasil? Esse é o requisito?” (Ciro Gomes)
  • “Decreto para evitar queimadas tem o mesmo efeito da cloroquina pra curar covid-19. Zero. No caso da Amazônia, o ‘médico’ não está nem um pouco preocupado com o paciente, a floresta”. (Carlos Rittl, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados em Sustentabilidade de Potsdam, Alemanha.)
  • “O Brasil hoje tem 210 milhões de juízes. Já teve 100 milhões de técnicos, 150. Agora tem 200 milhões de juízes. Todo mundo quer julgar. Os analfabetos jornalistas que mal sabem versar uma palavra de Direito criticam decisões cujos fundamentos não leram”. (João Otávio de Noronha, presidente do Superior Tribunal de Justiça)
  • “Bolsonaro me perguntou: ‘Professor Vélez, você teria faca nos dentes para combater a esquerda radical no ministério?’. Respondi: ‘Claro que sim, é o que faço nas universidades há 30 anos. Agora, se tiver a caneta na mão, completo o serviço'”. (Ricardo Vélez, ex-ministro da Educação, em livro de memórias)

Ricardo Noblat: Autorizado por Bolsonaro, Augusto Aras tenta emparedar a Lava Jato

A tudo assistem os militares, impassíveis

Às escâncaras, não, porque seria arriscado e pegaria mal. Mas em conversas cifradas ao telefone, ou na privacidade dos gabinetes no Congresso ainda frequentados por alguns em plena pandemia, políticos de várias tendências comemoram com discrição a ofensiva da Procuradoria-Geral da República contra a Lava Jato.

Quem diria, hein? Quem diria que o candidato a presidente da República que mais se beneficiou do combate à corrupção, logo ele seria o responsável indireto pela saia mais justa aplicada à Lava Jato desde o seu nascimento em 2014, a poucos meses das eleições gerais daquele ano, as últimas a serem vencidas pelo PT?

Augusto Aras, na prática, tem se comportado menos como Procurador-Geral da República, e mais, muito mais como procurador de Bolsonaro. É a ele que deve o cargo que seus colegas jamais lhe dariam. Aras não procuraria motivos para pôr em xeque a Lava Jato sem a prévia autorização do presidente.

Procuraria se Sérgio Moro ainda fosse o ministro da Justiça indemissível como pareceu um dia? Da Operação Mãos Limpas, na Itália, emergiu o governo de extrema-direita de Berlusconi, um empresário riquíssimo e corrupto. Da Lava Jato, o governo de extrema-direita de Bolsonaro, parceiro de milicianos.

Berlusconi tentou cooptar para servi-lo como ministros os dois juízes que encabeçaram a Operação Mãos Limpas, mas eles se recusaram. Sem constrangimento, Moro deixou-se cooptar, inebriado pelo sucesso. Acreditou na promessa de Bolsonaro de que seria promovido a ministro do Supremo Tribunal Federal.

Acabou usado por Bolsonaro, como disse outro dia, e deixou-se usar, como nunca dirá, para fortalecer a impressão de que este seria um governo com gosto de sangue na boca e decidido a pôr um freio na corrupção. Aí os filhos Zero caíram nas malhas da Justiça. Aí Bolsonaro quis intervir na Polícia Federal. Ai Queiroz…

Quando Queiroz foi preso em uma das casas do advogado da família Bolsonaro, Moro havia tascado fora. Hoje, aposentado, resta-lhe sonhar em ser candidato a presidente em 2022. Ou a governador do seu Estado. Ou a Senador, deputado federal, sabe-se lá. Fez pior negócio de sua vida e corre atrás do prejuízo.

A operação de desmanche da Lava-Jato deixa satisfeitos os políticos ficha suja, os que já pecaram e os que se animam a pecar. Reforça, por tabela, a ainda capenga base de apoio ao governo no Congresso que se sente protegida. Mas, em contrapartida, deixa mal os militares dentro ou fora do governo.

Recorde-se que eles gozam da fama de serem ferozes inimigos da corrupção. Exaltaram a Lava Jato por todos os meios ao seu alcance e homenagearam Moro com todas as medalhas em estoque no almoxarifado das Forças Armadas. E, no entanto, assistem impassíveis à tentativa de destruição de sua obra.

A vida tem lá dessas coisas. Selva!

Representante do Ministério da Saúde em Pernambuco é do balacobaco

Amigos para sempre
Ela chama o hotel Copacabana Palace de sua casa no Rio de Janeiro, e ali já posou para fotos muito à vontade. Refere-se à Itália como o país dos seus sonhos que visita com frequência.

Ama de paixão maquiar-se, ir a festas da alta sociedade do Recife e vestir-se com roupas de grifes, de preferência as mais caras. Seus críticos dizem que em certas ocasiões ela ostenta em demasia.

Uma amiga da praia de Boa Viagem, que a admira e inveja, cita em sua defesa um colunista social que já morreu: “Os cães ladram e a caravana passa”. E pergunta: “Como era mesmo o nome dele?”

Ibrahim Sued, o pai do moderno colunismo social brasileiro, que em sua coluna, publicada durante 41 anos no GLOBO, criou e absorveu termos que entraram para o vocabulário popular.

Paula Amorim, de idade incerta, não é uma pantera, nem mesmo uma locomotiva, mas costuma estar onde possa ser vista e reconhecida como uma mulher atraente e simpática.

Não é uma mulher evento. Recife já teve os “Irmãos Eventos”, eram dois, que não perdiam uma festa, um coquetel, uma exposição, enfim uma boca livre, fossem convidados ou não.

Curadora da própria imagem, Paula vai de leve. O que não a impede de, em certas ocasiões, roubar a cena. Tornou-se inesquecível sua aparição no velório do governador Eduardo Campos.

Em sociedade, tudo se sabe. Tanto mais em cidade de muro baixo. O velório foi no Palácio do Campo das Princesas. Então candidato a presidente da República, Campos morreu na queda de um avião.

De repente, entrou no palácio aquela mulher elegantemente trajada toda de preto. Pelo menos duas coisas a destacavam, além da expressão compungida: a altura dos saltos e o chapéu.

Não era qualquer chapéu – embora nenhuma das mulheres que por ali circulou tivesse sido vista usando um. Era “o chapéu”, enorme, desses que aparecem em filmes sobre enterros de gente rica.

Seria exagero dizer que, por um momento apenas, ela tenha eclipsado o morto. Mas eclipsou as demais mulheres presentes, sim. O alvoroço entre os políticos foi notado.

Cunhada do ex-deputado federal João Fernando Coutinho, presidente estadual do PROS, irmã de um militar que já foi segurança da primeira-dama Marcela Temer, Paula é solteira.

Aos que privam da sua intimidade, ela conta que sua renda decorre basicamente da compra de joias penhoradas pela Caixa Econômica que ela revende a uma clientela especial.

Há meses que se ouvia em Brasília que uma pernambucana era muito influente no Ministério da Saúde. Bingo! Paula foi nomeada representante do ministério em Pernambuco.

Sem experiência em Saúde ou gestão pública, ela é amiga há mais de 30 anos do general Eduardo Pazuello, o ministro interino. Substituirá uma enfermeira. Ganhará 10 mil reais por mês.

Segundo a assessoria de Pazuello, ele e Paula foram apresentados “por conhecidos em comum”, e a nomeação se baseou na “relação de confiança e amizade” entre ambos.

Está bem. É suficiente. Gigi chegou lá. Ademã. Vamos em frente.


Vera Magalhães: Antes de 22 vem 21

Sucessão no Congresso é lance vital para a eleição presidencial

Não adianta nada nomes como Luiz Henrique Mandetta queimarem a largada especulando sobre candidatura presidencial a essa altura do campeonato. Não bastasse haver um vírus à solta que terá matado 100 mil brasileiros até o início de agosto, ceifado milhões de empregos, virado o programa econômico de Paulo Guedes de cabeça para baixo e transformado as eleições municipais em nota de rodapé, isso para ficar só nos efeitos domésticos, outros acontecimentos em Brasília são pressupostos fundamentais para posicionar os corredores na linha de largada.

Eles começam agora, nesse segundo semestre que inicia oficialmente em agosto. Não à toa Rodrigo Maia saiu do silêncio que vinha mantendo para comandar uma dissidência no “blocão” de partidos da Câmara que deu suporte à sua presidência nesses quatro anos. Maia sabe que é vital não apenas para sua sobrevivência como líder político relevante, mas para a construção de qualquer projeto de centro dissociado do bolsonarismo e minimamente competitivo, manter o comando da Câmara no último biênio do governo.

Não que o Congresso tenha sido o protagonista nos atos de contenção a Bolsonaro nesse 2020 em que o presidente resolveu rasgar a fantasia. Esse papel, como se sabe, tem sido exercido pelo Supremo Tribunal Federal.

Mas é ali, na Câmara, que pode nascer um dos temores maiores da existência do presidente, maior que acabar a cloroquina no meio da noite: a abertura de um processo de impeachment, algo que Maia evitou alimentar nesses dois anos de convivência tensa, mas que é um trunfo à mão de qualquer presidente da Casa, a depender do impulso das ruas, de um motivo jurídico e de combustível dos setores econômicos.

Por ora nenhum desses fundamentos está dado. A pandemia tira a possibilidade de grandes manifestações de rua, Bolsonaro se segura ali no limiar dos 30% de aprovação, com um público que está trocando de pele da elite agora horrorizada com seus descalabros para as classes D e E conquistadas à base de auxílio emergencial. E o ainda bagunçado apoio do que restou do Centrão ao presidente pode lhe dar os votos necessários para evitar ter o mesmo destino de Dilma Rousseff.

Mas não é esse o único poder que emana dos comandantes da Câmara e do Senado. Bolsonaro não teve êxito até aqui em avançar com sua pauta reacionária no Legislativo. O que conseguiu para “escancarar a questão das armas”, por exemplo, fez via decreto. Alguns foram, inclusive, derrubados pelos parlamentares. A tentativa de aprovar pautas obscurantistas como a tal Escola sem Partido nunca foi adiante, e os vetos do presidente a projetos aprovados ou alterados pelos deputados e senadores podem ser derrubados a qualquer momento.

Sem o controle da pauta dificilmente o presidente terá mais sorte nos dois últimos anos de seu mandato. Isso além dos obstáculos institucionais que enfrentará em outras searas, como o Supremo e o Tribunal Superior Eleitoral.

Por tudo isso, para chegar competitivo a 2022 Bolsonaro tem de sobreviver não só ao 2020 do vírus e do desastre econômico como a dois últimos anos com atores no comando que ainda não estão em cena. Dois deles são escolhas de deputados e senadores, mas outros dependem da caneta do próprio Bolsonaro, que vai indicar, entre outros postos, um ministro do STF, Corte hoje hostil a ele e unida como poucas vezes, em novembro.

Ignorar essas variáveis e como a economia vai se comportar só fará com que eventuais postulantes à Presidência se exponham ao sol sem protetor. Mandetta não é o único a se arriscar a uma queimadura. Deveriam ficar mais embaixo do guarda-sol organizando os exércitos, como Maia está fazendo, e procurar algum grau mínimo de coesão.


Ricardo Noblat: O congestionamento de candidatos do centro poderá marcar a eleição

A esquerda agradece. Bolsonaro se preocupa

No primeiro momento, a saída do DEM e do MDB do conglomerado de partidos conhecido pela alcunha de Centrão tem a ver com a eleição do próximo presidente da Câmara dos Deputados, em fevereiro do próximo ano.

Indica que DEM e MDB pretendem formar um bloco junto com o PSDB e partidos de oposição ao governo para eleger o sucessor de Rodrigo Maia. Ou reeleger Maia, caso se aprove uma emenda à Constituição para tornar possível o que hoje não é.

O Centrão aliou-se ao governo atraído pela oferta de cargos, liberação de dinheiros e outras sinecuras que o presidente Jair Bolsonaro dizia antes abominar. Conversa para enganar eleitor. Bolsonaro já foi filiado a quase todos os partidos do Centrão.

Está interessado, agora, em valer-se dos votos do Centrão para barrar a abertura de um processo de impeachment contra ele, aprovar projetos do governo e pôr no lugar de Maia um presidente da Câmara mais confiável. Foi aí que o bicho pegou.

Num segundo momento, o racha do Centrão tem a ver com a sucessão do próprio Bolsonaro. É remota a possibilidade do DEM e do MDB apoiarem a reeleição do presidente. É mais do que provável que se unam ao PSDB para bancar outro nome.

O governador João Doria (PSDB), de São Paulo, quer ser esse nome. O combate à pandemia do coronavírus ofereceu-lhe a oportunidade de se apresentar como um candidato de centro-direita capaz de enfrentar Bolsonaro daqui a dois anos.

A eleição presidencial de 2022 poderá assistir a um congestionamento de candidatos do centro – Doria, Sergio Moro, Ciro Gomes que parece caminhar nessa direção, e quem mais aparecer. O PT agradece desde já. Bolsonaro se preocupa.

Quanto aos partidos do Centrão de raiz, para esses tanto faz como tanto fez. O imediato é o que importa. De resto, são sensíveis à direção dos ventos. Sabem tirar vantagem de tudo. E, ao fim e ao cabo, sempre estarão com o governo, qualquer um.

A boiada de Ricardo Salles passou sobre a política ambiental

Bolsonaro deu ouvidos ao ministro
Resta comprovado que o presidente Jair Bolsonaro seguiu o conselho de Ricardo Salles, seu ministro do Meio Ambiente, e aproveitou os meses iniciais da pandemia do coronavírus para reforçar os maus tratos à natureza, marca do seu governo até aqui.

Um levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo em parceria com o Instituto Talanoa mostra que, entre março e maio deste ano, o governo publicou 195 atos no Diário Oficial, todos ligados ao tema ambiental. Nos mesmos meses de 2019, foram apenas 16.

Na reunião ministerial de 22 de abril último, Salles sugeriu a Bolsonaro que aproveitasse o momento em que a imprensa estava ocupada com a pandemia para “passar a boiada”, mudando “todo o regramento e simplificando normas” na área do meio ambiente.

E foi isso o que Bolsonaro autorizou que se fizesse como aponta a análise inicial das principais portarias, instruções normativas, decretos e outras normas baixadas ou alteradas. O processo de desmonte das políticas ambientais ganhou celeridade.

A instrução normativa 4/2020 do Ministério do Meio Ambiente (MMA), por exemplo, que trata da priorização de indenização para populações tradicionais em reservas ambientais, criou uma brecha para facilitar a expulsão de índios e quilombolas dessas áreas.

A portaria 432/2020 permitiu ao ICMBio centralizar a gestão de duas unidades de conservação em Roraima, cancelando a criação de mais duas bases avançadas. Ali, há registros recentes de invasão de garimpeiros e de aumento da derrubada de árvores.

Os defensores do meio ambiente estão furiosos com o que aconteceu. E com razão.


Ricardo Noblat: O mistério que cerca a fuga de Weintraub para os Estados Unidos

Trama com as impressões digitais do Itamaraty

O que fez Abraham Weintraub sair do Brasil às carreiras quando sua demissão do cargo de ministro da Educação sequer tinha sido consumada? Foi o medo de ser preso de uma hora para outra por decisão do Supremo Tribunal Federal?

No dia 22 de abril último, durante a reunião ministerial que selaria o seu destino, Weintraub chamou os ministros do Supremo de “bando de vagabundos” que mereciam estar presos. Começou então a ser processado e até depôs à Polícia Federal.

No dia 18 de maio, em vídeo gravado ao lado do presidente Jair Bolsonaro, anunciou que acabara de pedir demissão, mas que participaria “nos próximos dias” do ato de transmissão do cargo para o novo ministro que ainda não fora escolhido.

Aqui começa a trama da qual participou o Itamaraty, que não chama de trama o que trama foi. O Itamaraty informa que naquele mesmo dia Weintraub ligou para o embaixador Ernesto Araújo dizendo que gostaria de viajar “rapidamente” a Washington.

No telefonema, contou a Araújo que assumiria o cargo de diretor do Banco Mundial destinado ao Brasil. De imediato, Araújo pediu à embaixada americana um visto de entrada para que Weintraub realizasse o seu desejo. Não se sabe se o visto foi concedido.

Sabe-se, agora, que o Itamaraty não registrou a devolução do passaporte diplomático a que Weintraub tinha direito como ministro. À época, devido ao agravamento da epidemia, os Estados Unidos fecharam seus aeroportos a brasileiros. Seguem fechados.

No dia 19, à noite, Weintraub voou para o Chile e, de lá para Miami, onde desembarcou sem embaraço na manhã do dia 20. Uma vez que estava seguro em território americano, no mesmo dia uma edição extra do Diário Oficial publicou sua demissão.

Weintraub não participou do ato de transmissão do cargo como havia dito que faria. E não assumiu ainda o cargo de diretor do Banco Mundial porque seu nome depende da aprovação por nove países. Por que a pressa em deixar o Brasil? O mistério continua.

O complô para destruir a imagem do youtuber Felipe Neto

Gabinete do ódio em ação
Engana-se quem acha que o gabinete do ódio vai acabar. Não acaba porque, na prática, é um “modus operandi”, não são pessoas. Um “modus operandi” criado para assassinar reputações nas redes sociais. E apesar das investigações patrocinadas pelo Supremo Tribunal Federal, o mecanismo de proliferação de mentiras e de teorias absurdas segue operando normalmente.

O alvo da vez é o youtuber @felipeneto. Desde que deixou claro que faz oposição ao governo, os ataques à sua imagem aumentam a cada dia. Nas últimas duas semanas, após vídeo divulgado pelo site do jornal The New York Times, e o anúncio de uma live junto com o ministro Luís Roberto Barroso marcada para a próxima quinta-feira, a situação do youtuber só se agravou.

Nas últimas 24 horas, diversos perfis bolsonaristas/conservadores tentaram publicar mais de 600 vídeos contra Felipe Neto no Facebook e no Instagram. Acusam-no, sem provas, de estimular a pedofilia. Além dos vídeos, postagens fakes atribuem a ele frases que nunca disse. Uma delas: “Criança é que nem doce, eu como escondido”. Não há limites para essa gente!

Com um público de quase 39 milhões de assinantes em seu canal, Felipe Neto virou uma pedra no sapato dos bolsonaristas acostumados a nadar de braçada no ambiente nas redes sociais. É por isso que, apoiados por robôs e falsos perfis, os deputados federais Carlos Jordy, Carla Zambelli e Daniel Silveira, do PSL, e Eduardo Bolsonaro batem em Felipe Neto da cintura para baixo.

Desde de o início dos ataques, ele já moveu sete processos contra seus detratores, quatro deles parlamentares. O deputado federal carioca Carlos Jordy foi o primeiro a ser condenado e agora recorre da sentença que o obrigou a pagar R$ 35 mil reais de indenização. Nada que uma cota entre amigos não resolva.


Ricardo Noblat: Não passará!

Ação de Bolsonaro foi só para afagar seus seguidores

Dá-se como certo entre ministros do Supremo Tribunal Federal ainda de férias que eles recusarão o pedido do presidente Jair Bolsonaro e da Advocacia-Geral da União (AGU) para suspender o bloqueio nas redes sociais de contas usadas por bolsonaristas de relevo para a publicação de fake news.

E por uma simples razão: a AGU, segundo dois ministros ouvidos por este blog no fim da última semana, advoga em favor dos interesses do governo, não dos interesses do presidente da República. E o governo nada tem a ver com o bloqueio das contas. Não eram contas do governo, tampouco do presidente.

Certamente a AGU deve ter sido pressionada por Bolsonaro a agir assim. Ele precisava dar uma satisfação aos seus parceiros, mostrar que um comandante não abandona soldados feridos em meio a uma batalha.
Outros parceiros dele, que não foram atingidos pelo bloqueio de contas, saíram em defesa do seu gesto.

Recentemente, ocorreu algo parecido com o ministro André Mendonça, da Justiça, que ao tomar posse se disse “um servidor fiel” de Bolsonaro. Mendonça entrou no Supremo com um pedido de habeas corpus para tirar do inquérito das fake news o então ministro Abraham Weintraub, da Educação.

O pedido foi considerado “uma bizarrice” jurídica por ministros do Supremo. E, por isso, rejeitado. Mendonça é forte candidato à vaga que se abrirá no Supremo até novembro com a aposentadoria do ministro Celso de Mello, o decano da Corte. Está empenhado em agradar Bolsonaro desde agora.

Depois da pílula do câncer e da cloroquina, o próximo passo de Bolsonaro

Fé e bons negócios
Não será surpresa para este blog se o presidente Jair Bolsonaro, a pretexto de qualquer coisa ou de nada, comece a duvidar dos efeitos das vacinas que vierem a ser lançadas para deter o avanço do coronavírus. Não o fará contra uma eventual vacina “made in the USA”, avalizada por seu ídolo Donald Trump. Mas até contra ela estará à vontade para se lançar caso Trump não se reeleja.

Nada de estranho haverá nisso. Os que duvidam da eficácia de vacinas chegam a milhões no mundo, muitos deles por motivos religiosos. Bolsonaro deve sua eleição, em parte, ao voto religioso, principalmente o evangélico. Natural, pois, para quem, como ele, batizou-se no rio Jordão interessado em ganhar apoios, que se rebele contra a aplicação de vacinas em quem prefira não tomá-las.

De resto, Bolsonaro não pensa em renunciar à sua devoção à cloroquina, da qual virou um presidente garoto propaganda. Deve ter lá suas razões confessáveis e outras não. A mais inocente delas seria o fato de que obrigou o Exército a produzir milhões de caixas da droga e agora tem de desová-las a qualquer custo. Mas essa não foi a primeira vez que ele apostou errado em um remédio.

Um dos únicos três projetos que Bolsonaro conseguiu aprovar em quase 30 anos como deputado federal foi o que regulamentou a produção de fosfoetanolamina sintética, conhecida como “pílula do câncer”. Embora jamais tenha provado sua eficácia em testes, a pílula ganhou fama após ser distribuída durante 20 anos pelo químico Gilberto Orivaldo Chierice, da Universidade de São Paulo.

Em 2016, na tentativa de melhorar sua relação com o Congresso, a então presidente Dilma Rousseff sancionou o projeto de autoria de Bolsonaro. Logo depois, porém, por 6 votos contra 4, a pílula do câncer foi proibida pelo Supremo Tribunal Federal. Sim, parte do Supremo é capaz de acreditar em milagres. Mais da metade dos seus atuais integrantes foi cliente do falso médium João de Deus.

Uma vez eleito presidente, Bolsonaro voltou a cobrar que o Supremo reveja sua decisão. “Não dá para esperar”, disse ele à época. Ignorância apenas? Ou mais um sinal de desprezo pela Ciência em linha com uma fatia expressiva dos seus devotos? Ou Bolsonaro apenas antevê mais uma oportunidade de fazer bons negócios? Não se sabe. Possivelmente jamais se saberá.


Ricardo Noblat: Solidário, Bolsonaro sai em defesa dos bolsonaristas bloqueados

Liberdade de expressão não está ameaçada

São ralas as chances de sucesso da ação que pede ao Supremo Tribunal Federal a suspensão do bloqueio de perfis bolsonaristas nas redes sociais decretado pelo ministro Alexandre de Moraes. A ação é assinada pelo presidente Jair Bolsonaro e o advogado-geral da União José Levi Mello do Amaral Júnior.

“Em uma democracia saudável, a liberdade de expressão deve ser plena, assim como a liberdade de imprensa. Para decantar potenciais manipulações, a democracia exige fontes alternativas de informação para que os cidadãos tenham a necessária compreensão esclarecida acerca dos negócios públicos”, diz a ação.

O direito à livre expressão do pensamento nada tem a ver com o uso de contas nas redes sociais para a distribuição de falsas notícias com o propósito de destruir a reputação dos que se opõem ao governo, ao presidente e os criticam. Alexandre de Moraes não cassou o direito à livre expressão do pensamento de ninguém.

Mandou que o Twitter, o Facebook e outras plataformas bloqueassem contas utilizadas para o cometimento de crimes contra a honra de pessoas. Tanto que os titulares dessas contas investigadas continuam dizendo e escrevendo o que querem nas redes sociais. Na apuração de crimes, a lei autoriza até prisões.

O ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB, que apoia Bolsonaro, teve suas contas bloqueadas. Isso não o impediu de continuar falando mal do Supremo. Ele elevou o tom dos seus ataques aos ministros e passou a disseminar baixarias contra eles, a ponto de acusar alguns de serem sodomitas.

Bolsonaro saiu em defesa do restabelecimento das contas dos seus devotos para mostrar que é solidário a eles, que não os abandonou, e que eles, portanto, não precisam retaliar abandonando-o. Algo parecido com o que fez com a deputada Bia Kicis (PSL-DF). Tirou-a da vice-liderança do governo na Câmara e depois foi visitá-la.

Fossem outros os tempos, não estivesse preocupado com o cerco judicial aos seus filhos e a empresários que financiam atos hostis à democracia, a reação de Bolsonaro teria sido diferente. Partiria para cima de Alexandre de Moraes e do Supremo como já fez no passado. O medo explica a nova versão moderada de Bolsonaro.


Ricardo Noblat: Bolsonaro está à beira de um ataque de nervos

Sente-se censurado e teme a reação dos seus devotos

Até quando o presidente Jair Bolsonaro suportará calado o que considera um ataque direto ao que já chamou mais de uma vez de “minha mídia”? Ou foi a “minha imprensa”? Os que têm acesso a ele sussurram que Bolsonaro está indignado com mais uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que conduz ali o inquérito sobre as fake news.

Confinado no Palácio da Alvorada depois de testado três vezes positivo para o coronavírus, sem ter com o que se distrair a não ser correr atrás de emas com uma caixa de cloroquina na mão para ser fotografado, Bolsonaro reagiu como de costume com palavrões quando soube que contas de seus devotos no Twitter e no Facebook foram tiradas do ar por ordem do ministro.

Bons tempos aqueles em que se sentia à vontade para enfrentar de peito aberto o Congresso e o Judiciário – e quantas vezes não o fez provocando crises? Em 30 de abril último, por exemplo, baixou o cacete em Alexandre por ter impedido a posse como diretor-geral da Polícia Federal de um delegado que ele indicara. Bolsonaro chegou a ameaçar, furioso e desafiador:

– Tirar em uma canetada, desautorizar o presidente da República dizendo em impessoalidade… Ontem, quase tivemos uma crise institucional, quase, faltou pouco.

O crescente cerco judicial ao governo e o envolvimento dos seus três filhos Zero com fake news fizeram Bolsonaro moderar suas falas. Não se sabe até quando. Nem ele mesmo faz ideia do quanto ainda será capaz de engolir calado. Sente-se tolhido, vigiado, censurado, sem poder de fato dizer o que pensa sobre tanta coisa que vê e que o contraria. Cancelaram sua natureza rebelde.

Receia que, em breve, seus seguidores nas redes sociais e, principalmente, os titulares de contas, remuneradas ou não, que sempre o defenderam, acabem por se revoltar. Poderão se achar abandonados por ele, ou sacrificados no altar da Velha Política onde Bolsonaro tenta cada vez mais atrair parceiros com a oferta de cargos no governo, liberação de verbas e outras sinecuras.

Enquanto isso, Alexandre de Moraes não dá o mais pálido sinal de que possa reduzir o seu empenho de ir em frente na tarefa que lhe deu o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo. E conta com o apoio unânime ou quase unânime dos demais colegas. Um deles, Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, bateu duro nos fabricantes e distribuidores de notícias falsas:

– São milícias, gangues que precisam ser neutralizadas, e estamos fazendo todo o possível para enfrentá-los dentro da lei.

Jogo jogado antes mesmo de começar

Inquérito contra Bolsonaro será arquivado
Só não se sabe ainda a data, mas dez entre dez cabeças coroadas da República dão como certa a decisão de Augusto Aras, Procurador-Geral da República, de arquivar o inquérito que apura se o presidente Jair Bolsonaro tentou ou não intervir na Polícia Federal, o que provocou a demissão de Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça.

É jogo jogado. Ou melhor: é jogo jogado desde antes de ter começado de fato a ser jogado. Bolsonaro sempre soube disso sem que Aras precisasse lhe dizer com todas as letras. Moro também. E o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, que preside o inquérito. A decisão cabe unicamente a Aras. E ele já a tomou.

O vídeo da reunião ministerial de 22 de abril último mostra que Bolsonaro ameaçou demitir Moro se ele não substituísse o superintendente da Polícia Federal no Rio. E deixa claro por que Bolsonaro queria a substituição. Mas, e daí? Aras deve o cargo que ocupa a Bolsonaro. E somente a ele. E não será mal agradecido.


Ricardo Noblat: Nada mal que os militares se rendam em definitivo à democracia

O partido verde oliva deverá crescer nas eleições

Mal na foto, ameaçado de não se reeleger por ter feito uma administração considerada desastrosa até aqui, o prefeito do Rio Marcelo Crivella está à procura de um general que aceite ser vice na sua chapa. Só assim poderá então se apresentar aos eleitores em novembro como o candidato mais próximo do presidente Jair Bolsonaro, quando nada por amor à farda.

Há generais disponíveis, nos quartéis ou em suas casas, capazes de aceitar um convite do prefeito. De repente, no país onde um ex-capitão afastado do Exército por conduta antiética se elege presidente da República, os militares afinal descobriram que a política pode lhes fazer muito bem. E que a democracia não é um regime tão ruim assim quanto lhes pareceu no passado.

Deveriam agradecer a Bolsonaro pela lição. Deputado federal durante quase 30 anos, ele se elegeu baixando o cacete na política e negando que fosse político. Prometeu jogar no lixo a Velha Política, para em menos de dois anos começar a distribuir cargos com políticos que possam apoiá-lo. Mas não só com eles. Dobrou o número de militares em cargos antes destinados a civis.

Natural que vez por outra, um militar que melhorou de vida graças ao ex-capitão enfrente aborrecimentos. Como aconteceu com o general Braga Neto, ministro e chefe da Casa Civil. Quis empregar uma filha na Agência Nacional de Saúde Suplementar com um salário de 13 mil reais, uma ninharia, por suposto. Desistiu. Configuraria um caso de nepotismo, previsto em lei.

O general Hamilton Mourão, vice-presidente, teve mais sorte. Seu filho era funcionário de carreira do Banco do Brasil quando foi promovido logo no início do governo, passando a ganhar três vezes mais. O general Eduardo Villas Boas saiu do comando do Exército direto para um cargo de assessor do Gabinete de Segurança Institucional. E sua filha foi assessorar a ministra Damares Alves.

O vento sopra fortemente a favor de quem veste ou vestiu farda. Quando novembro chegar, o partido verde oliva deverá eleger um número expressivo de prefeitos e vereadores. E daí? Nada mal se isso pudesse significar a rendição definitiva dos militares à democracia. A prova final da rendição está marcada para 2022 quando o benfeitor da caserna tentará se reeleger.

Reforma tributária: por uma consulta ampla, geral e irrestrita

Empresários dizem não a Paulo Guedes
O ministro Paulo Guedes, da Economia, pediu, ontem à noite, a empresários do setor de serviços que pressionem o Congresso Nacional para que aprove o novo tributo sobre transações, que deverá financiar a desoneração da folha.

Das muitas perguntas que se poderia fazer a propósito, escolha uma, ou mais de uma:

  • Se o novo tributo fará bem a todo mundo, e não somente aos empresários, por que Guedes não se dirige indistintamente aos brasileiros e pede que pressionem o Congresso?
  • Por que de fato só beneficiará aos empresários?
  • Por que Economia é assunto que só deve ser discutido com quem é do ramo?
  • Por que Guedes não sabe falar uma língua que todos entendam?
  • Por que o Congresso é insensível à pressão popular, mas não é a dos donos do dinheiro?

Descarte-se parte da última pergunta. A prorrogação do Fundeb, o fundo que financia a educação básica, foi mais uma prova de que o Congresso é também sensível à pressão popular. O governo é que não foi, e tentou sabotar a prorrogação até quando não deu mais.

Aprovada a prorrogação, Bolsonaro ainda teve a cara de pau de celebrar como se tivesse alguma coisa a ver com ela. Da mesma maneira procedeu quando só queria conceder o auxílio emergencial de 200 reais e o Congresso acenou com um de 500.

De volta as Guedes: os empresários do setor de serviços, alvos do apelo feito pelo ministro, se disseram radicalmente contrários ao novo tributo proposto por ele. Querem apenas a desoneração das folhas de pagamento. E segue o baile!


Ricardo Noblat: Alcolumbre agrada Bolsonaro com o Congresso mantido à distância

O pesadelo da CPMI das fake news

Se dependesse só de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, começaria em breve a contagem regressiva para a volta do Congresso à normalidade com a retomada das sessões de corpo presente. Mas se depender de Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, isso tão cedo acontecerá.

Alcolumbre argumenta que a média de idade dos senadores é muito mais alta do que a média de idade dos deputados, e que por isso muitos deles enfrentam problemas de saúde. A pandemia ainda está aí e autoridades médicas advertem para a hipótese de ela recuperar força em regiões onde, hoje, está mais fraca.

O que Alcolumbre esconde é que há outro motivo para retardar a volta dos senadores e deputados a Brasília: quanto mais tempo ficarem em seus Estados, melhor para o governo. O retorno significaria também o prosseguimento dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das fake news.

A CPMI é um pesadelo para Jair Bolsonaro, seus filhos, e parte do rebanho que os apoia. Da mesma forma que o inquérito conduzido no Supremo Tribunal Federal pelo ministro Alexandre de Moraes que investiga a distribuição de notícias falsas nas redes sociais e o financiamento de manifestações antidemocráticas.

É mais do que certo que a CPMI e o inquérito apontarão os três filhos Zero de Bolsonaro, e assessores do presidente com gabinetes no Palácio do Planalto, como envolvidos diretamente com a produção e disseminação de notícias falsas que já atingiram a honra de ministros do Supremo e de adversários do governo.

Alcolumbre é sensível a tudo que incomoda Bolsonaro. Ele se elegeu presidente do Senado com o apoio do governo à época em que Onyx Lorenzoni era ministro da Casa Civil. No cargo, comporta-se como aliado de Bolsonaro, ora o aconselhando, e na maioria das vezes se rendendo docemente às suas vontades.

E tem mais uma coisa: Alcolumbre aspira a um novo mandato de presidente do Senado. O regimento interno da Casa não permite, mas ele alimenta a esperança de driblá-lo. Para Bolsonaro estaria de bom tamanho. A festa será mais ruidosa se ele emplacar na presidência da Câmara um nome do Centrão.

A obra ficará completa com a indicação por Bolsonaro de alguém “terrivelmente evangélico” para a vaga que se abrirá no Supremo com a aposentadoria do ministro Celso de Mello. Então ele poderá comemorar um ano quase perfeito. O “quase” é por conta dos milhares de mortos e dos milhões de infectados pelo Covid-19.

Nada, porém, que uma versão mais generosa do Bolsa Família não possa dar um jeito. Pela primeira vez, ontem, o presidente Donald Trump recomendou aos americanos que usem máscara. Trump corre o risco de não se reeleger em novembro. Bolsonaro ainda tem mais de dois anos pela frente.

Governo se prepara para jogar dinheiro fora

Mais fácil fazer o dever de casa
Sem que ainda tenha tido tempo para mostrar serviço, o ministro Fábio Faria (PSD-RN), das Comunicações, genro do apresentador de televisão Silvio Santos, teve pelo menos uma ideia.

Para melhorar a imagem do Brasil no exterior, pretende investir em anúncios de televisão a serem veiculados em canais internacionais de notícias, de preferência em países da Europa.

Os tais anúncios defenderiam a tese de que o agronegócio brasileiro nada tem a ver com o avanço do desmatamento na Amazônia. E que a Amazônia não está tão desmatada assim.

Não daria mais certo se o governo adotasse medidas convincentes de proteção da Amazônia? Nada custaria, por exemplo, demitir o ministro do Meio Ambiente.

Que governo estrangeiro ou que grande investidor passaria a olhar com mais boa vontade para o Brasil só por conta de um comercial de televisão? Dinheiro jogado fora.


Ricardo Noblat: Às vésperas de nova derrota, o governo reforça a aposta no fisiologismo

Dinheiro do vírus para deputados amigos

Está marcado para logo mais o início da votação pela Câmara dos Deputados da prorrogação do Fundeb, o fundo que financia a educação básica no país. Ali, o assunto vem sendo discutido há pelo menos cinco anos e, finalmente, chegou-se a um acordo.

Mas apenas no último sábado, transcorrido um ano e quase 7 meses da tumultuada gestão de Jair Bolsonaro, e quatro ministros da Educação depois, foi o que o governo acordou e disse que amadureceu algumas ideias a respeito. Resultado?

Perdeu. Suas ideias, quase todas, foram rejeitadas pelos líderes dos partidos, e mais a relatora do projeto, e mais o presidente da Câmara. Para evitar, porém, que o governo arroste com uma derrota acachapante, pequenas concessões lhe serão feitas.

Educação nunca foi tema do agrado do presidente da República, basta ver os ministros escolhidos por ele para cuidar da área. O primeiro, o professor Ricardo Vélez, falava português com sotaque. O segundo, Abraham Weintraub, escrevia português errado.

O terceiro, Carlos Alberto Decotelli, que falava e escrevia português muito bem, não era pós-doutor, como apregoava em seu currículo, nem mesmo doutor. Sequer oficial da Marinha, como se dizia. O quarto, Milton Ribeiro, pastor, pegou o Covid-19.

Bolsonaro nada parece ter aprendido nos seus quase 30 anos na Câmara, nem esquecido tampouco. E agora que descobriu que sem o Congresso não governará, decidiu aplicar a única forma que conhece de atrair apoios: oferecer dinheiro em troca de votos.

No início deste mês, o Ministério da Saúde anunciou a liberação de 5,7 bilhões de reais em verbas de combate ao coronavírus para prefeituras indicadas por deputados aliados do governo, ou simpáticos a ele, ou suscetíveis de serem arrebanhados.

Como toda essa grana não chegou ainda ao seu destino e a confiança no governo é mínima, muitos deputados se sentiram enganados. Então, ontem, o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, prometeu liberar mais 1 bilhão.

Os deputados querem ver antes de crer e de empenhar seus votos na defesa de projetos de interesse do governo. Tenebrosas transações como essas se davam antigamente às escondidas – e, se descobertas, se negava. No governo Bolsonaro está sendo às claras.

Deve ser prova de transparência ou do que ele chama de Nova Política. Usar dinheiro do combate ao vírus para contemplar prefeituras sob o controle de parlamentares é também uma maneira de tentar influenciar no resultado de eleições.

Sem partido, porque abandonou o que tinha e ainda não conseguiu montar outro, Bolsonaro diz que ficará de fora das eleições de novembro. Pura conversa fiada. Por debaixo do pano, age para beneficiar os que poderão vir a beneficiá-lo no futuro.

O general e seu inferno astral

Em disputa, a coordenação política do governo
O aniversário do general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria do Governo, passou. Foi em 12 de junho último quando ele completou 64 anos. O que não passou foi seu inferno astral.

Depois de muito resistir, Ramos cedeu a pressões dos seus colegas de farda e pediu passagem para a reserva. Um general da ativa no governo daria impressão que os militares apoiam o governo.

E eles não apoiam, como estão roucos de dizer. Não é mesmo?

O problema de Ramos, agora, é outro, e novo não é. Por mais que o general adule e tente saciar seu apetite por cargos, dinheiro e demais sinecuras, o Centrão está insatisfeito com ele. Quer mais.

E como na política não existe espaço vago ou a vagar…

Quem se insinua para tomar do general a função de coordenador político do governo é o deputado Fábio Faria (PSD-RN), novo ministro das Comunicações e genro de Sílvio Santos, dono do SBT.

Militar não abandona outro em apuros. O ex-capitão Bolsonaro não abandonará o general. Os dois foram paraquedistas. Bolsonaro está cercado de generais paraquedistas.

Nem por isso, Ramos está a salvo de perder a coordenação política.


Ricardo Noblat: Por que Bolsonaro defende mais armas para todos

Um exército particular para correr em seu socorro

Deitados em berço esplêndido, por leniência ou cumplicidade, os militares assistem o presidente Jair Bolsonaro armar o país, pois é disso que se trata. Em 2009, segundo levantamento do jornal GLOBO, 8.692 armas foram registradas por cidadãos comuns.

No ano passado, o número saltou para 61 mil. Este ano, até abril, 33.776. A manter esse ritmo, o ano fechará com mais de 100 mil novas armas registradas. Dos 27 Estados brasileiros, incluindo o Distrito Federal, só houve queda no Amazonas.

Tantas armas nas mãos de civis para quê? Segundo o candidato Bolsonaro, para que defendam a própria vida. Seria uma obrigação do Estado, como está escrito na Constituição… Mas, e daí? Como o Estado falha e o crime avança, cada um que se vire.

Bolsonaro presidente passou a dizer que o povo deve se armar para defender sua liberdade. Mas liberdade de quê? Liberdade de expressão, que Bolsonaro invoca quando se fala das fake news que rolam nas redes sociais? Ora, existem leis que asseguram isso!

Na célebre reunião ministerial de 22 de abril último, o presidente alegou que o povo precisa armar-se para desobedecer ordens absurdas como a de um soldado que algemou uma mulher porque ela se recusou a respeitar o isolamento social em São Paulo.

Quer dizer: no entendimento de Bolsonaro, a mulher poderia ter reagido ao policial informando-o de que também estava armada. Ou sacando o revólver para que não restasse dúvida de que estava armada. Ou, no extremo, atirando no policial, sei lá.

Bolsonaro seria apenas ignorante ou maluco se pensasse que de fato uma população armada estaria menos sujeita à violência. Ele mesmo, à época de deputado, foi assaltado por dois bandidos no Rio. Entregou tudo que tinha sem reagir, até uma pistola.

Deu sorte. As estatísticas mostram que um civil armado corre mais risco de morrer do que um civil desarmado. O fator surpresa está sempre do lado do bandido. É por isso que um policial armado, por mais bem treinado que seja, nem sempre reage a um assalto.

Então Bolsonaro pensa no quê ao pregar mais armas para todos? A tal pergunta, ele já ofereceu a mesma resposta em pelo menos duas ocasiões – a primeira, no ano passado, ao discursar em um quartel do Rio Grande do Sul; a segunda, na reunião ministerial de abril.

Bolsonaro quer armar os brasileiros para que eles evitem a implantação de uma nova ditadura no país. Ditadura de esquerda, naturalmente. Imagine se Lula viesse com a história de armar o povo para impedir a instauração de uma nova ditadura no país…

Na verdade, o que Bolsonaro gostaria é que os brasileiros que o seguem peguem em armas para defendê-lo em caso de necessidade. Por caso de necessidade, entenda-se: a ameaça de impeachment. Ou a ameaça de derrota nas eleições de 2022.

Por ora, Trump recusa-se a dizer se reconhecerá os resultados das eleições de novembro próximo se for derrotado. Outro dia, Bolsonaro disse ter provas de que houve fraude na eleição de 2018, e que por isso foi obrigado a disputar o segundo turno.

Cadê as provas? O gato comeu!

Nem Haddad salvaria o PT da derrota para prefeito de S. Paulo

PSOL escolhe Boulos e Erundina
Melhor o PT já ir se acostumando com a ideia de colher mais uma derrota na eleição para prefeito de São Paulo. O PSOL indicou, ontem à noite, Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), para disputar a sucessão de Bruno Covas (PSDB). A deputada federal Luiza Erundina será sua vice.

Salvo Jilmar Tatto, o candidato do PT a prefeito, ninguém mais no partido acredita em suas chances de vencer a eleição. Dá-se de barato nas vizinhanças de Lula que o próprio PT acabará votando em massa em Boulos. E que a história só poderia ser diferente se Fernando Haddad, ex-prefeito, concordasse em concorrer.

Hipótese descartada. Haddad está convencido de que seria derrotado. Prefere guardar-se para a eleição presidencial de 2022. Diz que apoiará Lula para presidente, mas sabe que ele não será candidato. Está impedido pela Justiça. De resto, Lula insiste em dizer aos amigos que quer mais é cuidar do resto da sua vida.