Banco do Brasil
O Estado de S. Paulo: André Brandão coloca cargo à disposição e abre corrida política por sua vaga
Saída do presidente do Banco do Brasil, ainda não confirmada oficialmente, movimenta alguns dos principais grupos políticos em Brasília; Bolsonaro já havia ameaçado demitir o executivo após anúncio de plano de reestruturação
Adriana Fernandes, Marcelo de Moraes e Murilo Rodrigues Alves, O Estado de S.Paulo
O presidente do Banco do Brasil, André Brandão, avisou o presidente Jair Bolsonaro que colocou o cargo à disposição, o que deflagrou uma corrida política pela sua vaga. Brandão deu "carta branca" para a escolha do seu substituto, já que não houve entendimento entre ele e Bolsonaro desde quando o presidente criticou o plano de enxugamento de agências e corte de pessoal do banco. Nos bastidores, a "fritura" de Brandão continuou mesmo após Bolsonaro ter sido convencido pela equipe econômica em mantê-lo.
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Oficialmente, o banco afirmou a investidores que não houve pedido de renúncia de Brandão. Embora a saída não seja confirmada e não tenha ainda data para ocorrer, a disputa pelo posto movimenta alguns dos principais grupos políticos da Esplanada.
Integrantes da ala militar gostariam de ver no cargo o atual secretário-executivo do Ministério da Cidadania, Antônio Barreto Junior, que pode deixar o posto com a posse do novo ministro João Roma. Ele é funcionário de carreira do Banco do Brasil e também foi secretário-executivo da Casa Civil.
Na equipe econômica, a movimentação é em torno de deslocar o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, para o BB. Além de ter passado pela presidência do BNDES substituindo Joaquim Levi ainda no primeiro ano do governo, Montezano também é amigo do ministro Paulo Guedes e dos filhos do presidente Jair Bolsonaro.
Dentro do banco, o nome do vice-presidente de agronegócio e governo, João Rabelo Júnior, também é bem visto internamente e tem simpatia de integrantes da bancada do agronegócio. Outro nome que está no radar é o do presidente do Banco de Brasília, Paulo Henrique Costa, que tem apoio do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e de integrantes do Centrão.
Desde a semana passada, quando o presidente Jair Bolsonaro demitiu o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, e ameaçou com novas mudanças do tipo “tubarão e não bagrinho", os olhos se voltaram para André Brandão. O presidente do BB já tinha sido demitido extraoficialmente por Bolsonaro, que depois recuou da decisão. No rastro da Petrobrás, os aliados políticos do presidente aumentaram a pressão.
Segundo apurou o Estadão, uma nova movimentação em torno da saída de Brandão começou nessa sexta-feira, logo no início da manhã, depois que começaram a circular informações de que ele tinha sinalizou intenção de deixar o cargo ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O presidente do BC é amigo de Brandão e padrinho da indicação do seu nome para a presidência do BB.
Assessores de André Brandão no BB contam que a gestão dele banco ficou fragilizada desde o episódio com o presidente Bolsonaro por conta da política de fechamento das agências, que recebeu críticas de políticos bolsonaristas.
Fontes ouvidas pelo Estadão informaram que Brandão quer evitar um desgaste público como o ocorrido com o presidente da Petrobrás. Antes da gestão de Rubens Novaes, que antecedeu Brandão, o BB tinha duas vice-presidências das nove ocupadas por políticos. Novaes cortou esses cargos e alimentou a pressão contra o BB da ala política.
Além de Castello Branco, Bolsonaro já mandou demitir dois auxiliares de Guedes que bateram de frente com ele. No primerio ano de mandato, o presidente decidiu demitir o então secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, porque considerou que a discussão sobre a criação de um imposto nos moldes da CPMF se tornou "pública demais". Embora tivesse apoio da equipe econômica, o assunto gerou polêmica e não agradou os seus apoiadores.
Bolsonaro também influenciou na mudança de comando de outro banco público ainda em 2019. Ele disse que o então presidente do BNDES, Joaquim Levy, estava com "a cabeça a prêmio" durante conversa com jornalistas. No dia seguinte, Levy pediu demissão do cargo.
Fora da economia, os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich deixaram o cargo em razão de divergências com o presidente na estratégia para enfrentar a pandemia.
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Folha de S. Paulo: Bolsonaro planeja reforma ministerial a conta-gotas para testar fidelidade de centrão
Presidente foi aconselhado a nomear agora dois indicados de siglas aliadas e a deixar mais mudanças para o segundo trimestre
Gustavo Uribe, Daniel Carvalho e Thiago Resende, Folha de S. Paulo
Com a vitória de dois aliados para comandar o Senado e a Câmara, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) discute agora fazer uma reforma ministerial a conta-gotas para testar a fidelidade dos partidos do centrão à pauta governista.
O presidente ouviu de ministros que participam da articulação politica que, neste primeiro momento, a abertura de um espaço amplo para a base aliada na Esplanada dos Ministérios pode ter efeitos indesejados no futuro.
O primeiro deles é o risco de sofrer traições em votações de projetos, já que hoje a ocupação de espaços não está vinculada diretamente à pauta governista.
Para evitar surpresas negativas, a estratégia defendida é a de que o presidente só entregue os cargos prometidos após a aprovação de propostas prioritárias.
O segundo efeito é a possibilidade de que um pagamento integral da fatura estimule os partidos do centrão a exigir mais espaço no primeiro e no segundo escalões em um futuro próximo, obrigando o presidente a entregar mais cargos do que o pretendido inicialmente.
Para evitar esses efeitos colaterais em médio prazo, a ideia avaliada por Bolsonaro é, neste primeiro momento, nomear indicados dos partidos aliados em apenas duas pastas: Cidadania e Desenvolvimento Regional.
A primeira seria usada para fazer um aceno à Câmara, e a segunda, uma sinalização ao Senado.
Na segunda-feira (1º), Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e Arthur Lira (PP-PI) venceram com grande vantagem seus adversários no Senado e na Câmara, respectivamente, após intervenção do Palácio do Planalto, que ofereceu emendas e cargos.
Apesar das vitórias expressivas, o Planalto ainda não sabe o tamanho real de sua nova base aliada, já que os 302 votos recebidos por Lira (de 513 deputados) e os 57 que elegeram Pacheco (de 81 senadores) não são, necessariamente, de parlamentares bolsonaristas.
Para abrir espaço na pasta da Cidadania, como a Folha noticiou no mês passado, a ideia é transferir o ministro Onyx Lorenzoni (DEM) para a Secretaria-Geral, que desde o início do ano está sem ministro efetivo.
Para acomodar Onyx, a pasta deve ser desidratada, perdendo o comando da SAJ (Subchefia para Assuntos Jurídicos), que passará a ser vinculada diretamente ao gabinete presidencial.
Para o comando da Cidadania, o favorito é o deputado federal Márcio Marinho (Republicanos-BA), que integra a bancada evangélica e é próximo do presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira (SP). A legenda se alinhou a Lira após indicações de cargos na máquina federal.
Marinho foi líder do partido em 2016, quando o Republicanos, na época ainda chamado de PRB, desembarcou do governo Dilma Rousseff (PT) e anunciou apoio ao impeachment da petista. Um dos pontos de discordância alegados era a política econômica.
No ano passado, ele defendeu a ampliação do auxílio emergencial para atender também a profissionais do setor cultural, o que sofreu resistência da equipe econômica.
O Ministério da Cidadania foi responsável pelo pagamento do auxílio financeiro e cuida do programa Bolsa Família, que, no planos do governo, deve ser reforçado.
Já o comando de Desenvolvimento Regional foi oferecido ao agora ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP), que recusou o convite. Ele, porém, quer indicar um aliado para o posto.
O principal nome avaliado por ele para a posição é o do líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
A nomeação dele serviria como uma compensação ao MDB, partido com a maior bancada do Senado, e que, após pressão do Palácio do Planalto, abriu mão do apoio à candidatura da senadora Simone Tebet (MDB-MS) ao comando da Casa.
Pela nova estratégia do governo, as demais mudanças em pastas ministeriais ficariam para o segundo trimestre deste ano, período em que o Planalto pretende aprovar a reforma administrativa, formulada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
O segundo pacote de mudanças pode envolver, por exemplo, a recriação do Ministério do Esporte e a alteração no comando da Saúde. Para o primeiro posto, a principal cotada é a deputada federal Celina Leão (PP-DF), aliada de Lira.
Para o segundo, é defendido desde o ano passado o nome do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), que foi ministro da pasta durante o governo de Michel Temer (MDB). O nome dele já foi citado em reunião recente promovida na Casa Civil.
Bolsonaro ainda não decidiu se irá recriar a pasta de Indústria e Comércio, desmembrando a estrutura da Economia. Caso ele leve adiante a proposta, mesmo a contragosto de Guedes, a ideia é que ela seja entregue também ao Republicanos.
Apesar da pressão pela saída do ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o presidente tem sinalizado que não fará mudanças por ora. Bolsonaro, contudo, não descarta trocá-lo a qualquer momento caso o desgaste da imagem dele se agrave.
Para o Itamaraty, três nomes são avaliados, sendo dois embaixadores: André Corrêa do Lago, hoje na Índia, e Nestor Forster, nos EUA.
O primeiro é neto do diplomata Oswaldo Aranha e ajudou a destravar o transporte das vacinas da Índia. O segundo tem o apoio do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).
Com a indicação, além de nomear alguém de sua confiança para o cargo de ministro, o presidente sinalizaria ao governo do novo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, uma mudança de postura ao escolher um novo chanceler.
Uma terceira opção em análise é o nome do atual secretário de Assuntos Estratégicos, almirante Flávio Rocha. Além de falar cinco idiomas, o militar já foi enviado pelo presidente para missões diplomáticas no Líbano e na Argentina.
Maílson da Nóbrega: Como Bolsonaro prejudica o Banco do Brasil
É o primeiro presidente a interferir na gestão administrativa do BB. Isso tem consequências
Dias atrás noticiou-se que o presidente Jair Bolsonaro iria demitir o presidente do Banco do Brasil (BB), André Brandão, no cargo havia apenas quatro meses. Motivo: sua irritação com o anúncio, pelo BB, de um programa de demissão voluntária, que estimava a adesão de 5 mil funcionários, e o fechamento de 112 agências. As ações do banco despencaram na B3.
Bolsonaro já havia interferido na gestão do BB. Em 2019 mandou o banco suspender a veiculação de um comercial de TV que buscava atrair grupos jovens, até mesmo com apelo a questões de raça e gênero. O vídeo recebeu elogios de especialistas, mas irritou um presidente sensível a pautas de costumes e ignorante da realidade do banco.
Nesses dois casos, o BB seguia estratégia para se manter competitivo no sistema bancário. Essa realidade foi iniciada a partir de 1986, quando o banco perdeu o acesso à “conta de movimento”, um mecanismo que lhe conferia suprimento automático, ilimitado e sem custos de recursos do Banco Central (BC).
Com o tempo, a “conta de movimento” tornou-se insustentável. Ela provocava emissões de moeda, que precisavam ser neutralizadas pelo BC, mediante venda de títulos públicos federais. Os empréstimos do BB impactavam o endividamento da União e eram fonte de pressões inflacionárias. A “conta de movimento” foi extinta em 1986.
Essa mudança criou um desafio para o BB, o de sobreviver sem o acesso fácil e grátis a recursos do BC. O risco de falência foi evitado mediante injeção de capital da União, nos anos 1990. De lá para cá, o banco modernizou-se, adotou novas práticas gerenciais e ajustou sua estrutura à nova realidade.
Hoje, o novo desafio é adaptar-se a um ambiente crescentemente competitivo. O BB tem de se preparar, via eficiência, para concorrer com seus pares no setor privado. Seus concorrentes têm reduzido quadros de pessoal e fechado agências. As medidas do BB eram coerentes com essa realidade.
Nada disso foi inteiramente absorvido por grande parte da classe política, que ainda enxerga o BB pelas lentes dos tempos da “conta de movimento”. De tempos em tempos surgem pressões para que o banco amplie seus empréstimos a juros abaixo do mercado ou para que seja utilizado para forçar os bancos privados a reduzir suas taxas de juros, como se continuasse a obter recursos no BC, sem custos. Dilma Rousseff deu ordens ao banco para emprestar mais a juros camaradas, impactando sua rentabilidade. Bolsonaro parece ter a mesma visão ultrapassada. Pior, vem mostrando não entender os poderes do acionista controlador. É o primeiro presidente a interferir na gestão administrativa do banco.
A demissão do presidente do BB, ao que se diz, foi suspensa por conselho dos que alertaram Bolsonaro sobre os riscos da imprudência. Acionistas minoritários nacionais e estrangeiros poderiam buscar a responsabilização administrativa ou judicial do presidente, alegando o crime de abuso do controlador.
O BB tem naturalmente dificuldades de competir com os bancos privados, dados os custos que lhe são inerentes. Entre eles, pode-se mencionar a sede em Brasília, que desconsidera as características de sistemas financeiros em todo o mundo, qual seja, a concentração em certas cidades, o que propicia economias de aglomeração. Os bancos se agregam em Nova York, São Francisco, Londres, Frankfurt, Zurique, Amsterdã, Paris, Roma e outras praças relevantes. No Brasil, isso ocorre em São Paulo.
Além disso, o Banco do Brasil está sujeito a outros ônus, como o de submeter-se às regras de concorrência pública para adquirir equipamentos e serviços, bem como à volatilidade administrativa derivada da substituição de sua diretoria ao sabor das mudanças de governo, ou mesmo antes, como já aconteceu na atual administração.
O mercado financeiro identifica e precifica os riscos da interferência do governo no BB. As ações do banco sofrem um desconto em relação aos seus principais pares do sistema bancário. O desconto médio tem oscilado em torno de 30%, mas costuma subir em momentos de intervenção governamental. Passou de 50% em 2015-2016, quando a presidente Dilma Rousseff deu ordens para o banco aumentar empréstimos e reduzir juros. Agora chegou perto disso, com o voluntarismo inconsequente de Bolsonaro. No começo do governo Lula, o BB chegou a exibir um prêmio sobre as ações de seus concorrentes privados, quando a percepção era de que não havia ingerência externa na sua gestão.
A demissão do presidente do BB foi evitada, mas a possibilidade de sua ocorrência neste governo pode ter deixado consequências. O presidente do BB, detentor de uma carreira bem-sucedida em importantes bancos privados, deve ter-se dado conta de que não dispõe da autonomia que lhe fora assegurada quando do convite para dirigi-lo. Doravante terá de pensar duas ou mais vezes quando tiver de tomar decisões, avaliando quais delas poderiam excitar os instintos intervencionistas e autoritários do presidente. É um novo custo. O mal está feito.
SÓCIO DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA, FOI MINISTRO DA FAZENDA
Míriam Leitão: BB e a relação com o governo
Presidente do conselho do Banco do Brasil garante que desde que assumiu não houve interferência do governo em decisões do banco
O presidente do Conselho de Administração do Banco do Brasil, Hélio Magalhães, garante que desde que ele assumiu “não houve nenhum evento de influência do controlador do banco”. Muitas polêmicas têm cercado a administração do BB, principalmente na área de marketing, várias vezes criticada, inclusive aqui na coluna de ontem. A explicação que ele dá para a publicidade em sites de fake news, ou bolsonaristas, é que a escolha é feita aleatoriamente pela “ferrramenta” do Google. Hoje, está sob o controle de qualquer empresa escolher não anunciar em determinados sites.
A polêmica em torno da publicidade do Banco do Brasil surgiu por bons motivos. Teve o alerta de que os anúncios estavam em sites que divulgavam fake news e discurso de ódio. O primeiro movimento do banco foi de recuo, mas, depois de ser criticado por Carlos Bolsonaro, o BB manteve os anúncios:
— Infelizmente as notícias foram distorcidas. Não houve ingerência alguma, posso garantir como presidente do conselho. O que aconteceu foi que a notícia chegou, o analista da área de marketing tentou tirar do ar, mas aí se viu que nem tem como tirar do ar.
Na verdade, o TCU mandou, em 27 de maio, que o BB suspendesse a publicidade em determinados sites, blogs, portais e redes sociais. O plenário do tribunal referendou uma medida cautelar proposta pelo ministro Bruno Dantas a pedido do procurador de contas Lucas Furtado, que apontava suspeita de interferência do secretário de comunicação do Planalto, Fábio Wajngarten. O secretário chegou a postar — depois da reclamação do filho do presidente — que iria atuar para que o banco voltasse atrás. E o banco de fato recuou.
Magalhães tem uma longa carreira no mercado bancário, tendo se aposentado no Citibank. Ele disse que, quando foi chamado pelo ministro Paulo Guedes para presidir o conselho de administração, recebeu três tarefas:
— A melhor governança possível, preparar o banco para “desinvestimentos”, e maior eficiência para aumentar o valor dos ativos do banco.
Ele acha que o que aconteceu, a entrada do TCU, as notícias, as idas e vindas do banco não tiveram a conotação que todo mundo entendeu:
— Hoje, com o mundo digital, o banco tem que estar presente nas redes. Como funciona? Escolhe o público alvo e a sua agência, faz um contrato com o Google. A ferramenta do Google é que analisa as páginas e os sites — disse Hélio Magalhães.
Toda a atuação de páginas como Sleeping Giants, por exemplo, tem sido a de indicar às empresas onde os anúncios delas estão. E inúmeras empresas brasileiras já atuaram para decidir onde não anunciar, exatamente para proteger sua imagem. Portanto, essa escolha não é aleatória e fora de controle da empresa. Ninguém quer hoje estar vinculado a páginas que têm discursos de ódio. Essa virou uma campanha mundial. O Stop Hate for Profit.
Ontem surgiu outro problema. O subprocurador-geral de contas, Lucas Furtado, fez uma representação para o TCU apurar a venda de uma carteira de crédito do Banco do Brasil para o BTG. O valor nominal era de R$ 2,9 bilhões, e o BB a vendeu por R$ 371 milhões, ou seja, 13% do valor. Furtado apontou falta de transparência sobre os critérios.
Magalhães explicou que, como toda instituição financeira, o Banco do Brasil tem que lançar a prejuízo dívidas não pagas depois de um certo tempo. Essa carteira era, segundo ele, de dívidas de mais de cinco anos:
— Essa cobrança é mais dura. Há empresas especializadas nisso. E foi mandado para três delas. A proposta é que ela paga na frente um valor e depois divide com o banco o sucesso da cobrança. Quando se consegue vender por 5% já é bom. Foi um excelente negócio para o banco, talvez tenha faltado explicar direito.
As empresas que participaram da disputa foram a Enforce, do BTG, que venceu, a Jive, a Canvas e a Ativos. Essa última uma subsidiária integral do BB. No mercado, os analistas não acharam o valor pequeno, levando-se em conta que já era dívida antiga, mas faltou de fato transparência.
Magalhães repetiu várias vezes que o modelo de governança não permite interferência do acionista controlador. O ideal seria então que houvesse menos sinais explícitos de ingerência por parte do presidente da República, seu filho e seu secretário de imprensa na publicidade do Banco do Brasil.
Míriam Leitão: Do liberalismo ao antiliberalismo
Não há méritos na gestão Rubem Novaes no Banco do Brasil, mas sua saída revela que há planos no governo de aumentar a influência estatal sobre a instituição
O problema da equipe econômica do governo Bolsonaro não é se está ou não havendo debandada ou que a pauta liberal está sendo arquivada. É pior. Agora segue-se uma pauta antiliberal. A Caixa Econômica virou um braço do bolsonarismo e parte da propaganda oficial. O Banco do Brasil já fez concessões que deveriam corar qualquer liberal, porque a instituição de economia mista passou a ter ingerência direta do governo até nas decisões de marketing. E tem ainda os ensaios de pedaladas. O governo consultou o Tribunal de Contas da União (TCU) se pode fazer investimento em infraestrutura contornando o teto de gastos, e na semana passada o Congresso evitou que o teto fosse burlado.
A saída de Rubem Novaes tem que ser vista de duas formas. Ele permitiu a interferência do governo na instituição, mas quando ele sai revela-se que há mais tentativa de intervenção. Não há mérito em sua gestão, mas a saída mostra que há planos de entrar mais fundo nesse modelo que impõe ao banco a presença governamental.
A Caixa foi beneficiada com o monopólio da distribuição do auxílio emergencial, fez um trabalho cheio de falhas e aproveita cada espaço para afirmações de exaltação bolsonarista como “nunca na história da humanidade”. É a figurinha mais repetida do álbum das lives presidenciais. Uma coisa é o presidente Bolsonaro fazer o seu marketing, outra é usar os bancos públicos como parte dessa estratégia ou como tentáculos do governo. É uma estratégia claramente antiliberal.
O TCU, que Novaes definiu como “usina de terror”, na verdade fez seu trabalho de órgão de controle que é. O relatório do ministro Bruno Dantas, referendado pelo Tribunal no dia 27 de maio, vai diretamente ao ponto. A gestão de Novaes na área da comunicação do banco foi considerada gravíssima pelo tribunal, que disse estar havendo por parte do acionista controlador, no caso o governo, ingerência sobre uma instituição financeira com ações em bolsa. O BB vinha anunciando em sites que divulgavam fake news. Suspendeu, depois do alerta, mas voltou atrás por pressão do vereador Carlos Bolsonaro. O TCU ressaltou a fragilidade da governança do banco e lembrou as orientações da OCDE, “no sentido de que as empresas estatais tenham liberdade para atuar e não se submetam a ingerências indevidas do governo ou mesmo de familiares do chefe do poder executivo, à mingua de orientação técnica que justifique essa interferência”. Esse episódio, ressaltado pelo tribunal, se soma ao veto do presidente a uma propaganda onde havia jovens negros e descolados e que já estava no ar. Novaes não apenas a tirou do ar, como defendeu a posição de Bolsonaro.
O TCU lembrou também que no primeiro ano de Novaes no Banco do Brasil, apesar da prometida austeridade, ele gastou R$ 119 milhões com publicidade na internet e com uma escolha muito controversa de sites, como se viu. Houve outras polêmicas na sua gestão. Ele nunca defendeu os ideais liberais, na prática aceitou a intervenção, mas dizia que seu sonho era privatizar o banco. Poderia ter começado evitando que a instituição fosse usada pelo governo de plantão.
Bolsonaro jamais defendeu uma única proposta liberal, mas Paulo Guedes e todos os outros economistas que trabalharam no comitê de campanha, como Rubem Novaes, transplantaram para dentro do programa vazio do então candidato do PSL um rio de promessas. Não as entregou. Isso não surpreende quem não cedeu ao autoengano. Mas agora o risco é fazer o exato oposto do prometido e seguir uma agenda antiliberal com o objetivo eleitoreiro. Naquela famosa reunião ministerial, o ministro Paulo Guedes falou claro: “vamos fazer todo o discurso da desigualdade, vamos gastar mais, precisamos eleger o presidente.”
Está sendo formatado o novo programa — que eles chamam de Renda Brasil — para preencher o vazio de política social na gestão de Bolsonaro. Pelo visto, é o passo final da politização da economia. A pandemia empobreceu os pobres, será necessário ampliar o Bolsa Família e fortalecer as políticas sociais, mas tem que ser com um debate contábil transparente, com limites fiscais definidos e sem o uso dos recursos públicos para um projeto político que, além de tudo, nunca escondeu sua convicção autoritária.
Bernardo Mello Franco: Saída à francesa
Rubem Novaes abriu a torneira do Banco do Brasil para financiar blogs bolsonaristas. A três semanas de deixar o cargo, vendeu uma carteira bilionária ao BTG
Rubem Novaes falou muito durante o ano e meio em que ocupou a presidência do Banco do Brasil. Na sexta-feira, escreveu apenas dez linhas para anunciar sua renúncia ao cargo.
Em nota, o BB informou que ele vai sair por entender que “a companhia precisa de renovação para enfrentar os momentos futuros de muitas inovações no sistema bancário”. Para dizer isso, era melhor não dizer nada. O banco economizaria duas linhas e deixaria de ofender a inteligência alheia.
Novaes é amigo de Paulo Guedes, com quem estudou em Chicago. A exemplo do ministro, tem a cabeça ultraliberal e a língua maior do que a boca. Na famosa reunião de 22 de abril, os dois fizeram um dueto de grosserias para defender a privatização do banco.
“Tem que vender essa porra logo”, pontificou Guedes. Em seguida, Novaes definiu os controles do Tribunal de Contas da União como uma “usina de terror”. “Se a gente faz alguma coisa, tá arriscado a ir pra cadeia”, disse. Faltou detalhar as coisas que ele pretendia fazer.
O economista também deu um palpite infeliz sobre a pandemia. “Minha sensação é de que esse pico já passou”, opinou. Naquele dia, o país contava 2.906 mortes pelo coronavírus. Ontem a conta fechou em 87.737.
Bolsonarista de carteirinha, Novaes permitiu que o banco usasse dinheiro dos correntistas para financiar sites acusados de difundir fake news. Em junho, o TCU mandou fechar a torneira. Ele recorreu da decisão, alegando prejuízos financeiros. Prejuízos ao banco, não aos blogueiros governistas.
Há três semanas, o BB vendeu, sem leilão, uma carteira de crédito de R$ 2,9 bilhões pela bagatela de R$ 371 milhões. O comprador foi o BTG, que teve Guedes entre os fundadores. O ex-ministro Ciro Gomes definiu a transação como “um negócio escandaloso”. A oposição quer obrigar Novaes a explicar o que fez.
No sábado, o economista disse à CNN Brasil que não se adaptou à “cultura de privilégios, compadrio e corrupção de Brasília”. A declaração é típica de quem tem histórias a contar. Mais um motivo para que ele seja convocado pelo Congresso antes de sair à francesa.
Governo faz pressão para que bancos públicos reduzam taxas de juros
Avaliação é que, com o corte na Selic Caixa e BB devem capitanear a queda nos juros para forçar os bancos privados a fazerem o mesmo; estratégia já foi usada pela equipe de Dilma, mas governo diz que condições são diferentes
A equipe econômica e o Palácio do Planalto começam a pressionar os bancos públicos a iniciar um processo de redução das taxas de juros e fomentar a concorrência com os concorrentes privados. A avaliação é que esse movimento será respaldado pela queda dos juros básicos da economia, principalmente a partir de 2017, quando o Banco Central aumentar o ritmo dos cortes.
Além disso, o governo acredita que os bancos terão os custos reduzidos com ações que serão divulgadas hoje pelo BC, como a desburocratização na obrigatoriedade de cumprimento do depósito compulsório – dinheiro que os bancos são obrigados a deixar no BC remunerado à taxa Selic.
O uso de bancos públicos para ajudar na política econômica recebeu muitas críticas nos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, quando Banco do Brasil e Caixa financiaram o aumento do consumo e capitanearam uma queda forçada nas taxas de juros. Uma das consequências dessa estratégia foi o aumento da inadimplência dessas instituições, principalmente na Caixa.
Mas, segundo fontes da área econômica, a redução das taxas de juros que será feita pelos bancos oficiais se diferenciará da que ocorreu em 2012, no governo Dilma, porque desta vez o governo não adotará medidas intervencionistas, como obrigar as instituições a tocar programas que a própria área técnica condenava, a exemplo do “Minha Casa Melhor” – linha destinada a financiar móveis para os mutuários do Minha Casa Minha Vida.
Também está descartada a criação de um programa específico como o “Bom Para Todos”, do Banco do Brasil, que promoveu redução de juros em várias linhas para pessoas físicas no sentido de aumentar o consumo das famílias.
Para um integrante da equipe econômica, os bancos oficiais precisam resolver a equação entre proteger os balanços – ainda mais neste momento em que o Tesouro Nacional não tem como aportar recursos – e evitar que a “seletividade” em ofertar crédito e as altas taxas cobradas prejudiquem ainda mais a retomada da economia e, consequentemente, o próprio setor.
Para o governo, a pressão é importante para obrigar esse movimento e os bancos públicos não podem se furtar a esse papel. “É bom os bancos privados ficarem espertos porque vamos para o jogo”, disse uma fonte do governo.
Balanço. Mas, segundo Roberto Troster, sócio da Troster & Associados, esse tipo de pressão no passado recente aumentou a inadimplência dos bancos oficiais e obrigou as instituições a adotar medidas para limpar o balanço, como a venda de carteiras de crédito podre. “No curto prazo, você dá um gás, mas a conta vem lá na frente”, afirma. “A rentabilidade do sistema está caindo e a margem dos (bancos) estatais está baixa.”
O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, diz que a taxa Selic caiu um pouco, mas o spread cobrado pelos bancos aumentou. “Isso mostra que os bancos não estão querendo emprestar. Nem para reestruturar dívida”, diz.
A Caixa já repassou o corte de 0,25 ponto porcentual da Selic para as taxas dos financiamentos à casa própria e deve acelerar o movimento acompanhando o BC. O Banco do Brasil é mais resistente. O presidente do BB, Paulo Caffarelli, disse, na sua primeira entrevista, ao Estado, que procura aumentar a rentabilidade do banco para patamar semelhante ao dos privados.
De acordo com dados do BC, os bancos públicos não têm as taxas mais baratas em algumas linhas. O Santander, por exemplo, tem os juros mais baixos no financiamento de veículos (1,85%) e crédito pessoal sem desconto na folha de pagamento (4,25%), segundo informações do dia 29/11 a 05/12.
Por: Adriana Fernandes, Murilo Rodrigues Alves, Vera Rosa , O Estado de S.Paulo.
Fonte: economia.estadao.com.br