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Deputado baiano propõe criação de mês de combate ao racismo religioso

Só nos primeiros nove meses deste ano, 19 casos de intolerância religiosa foram denunciados na Bahia

Dindara Ribeiro / Agência Alma Preta

Com objetivo de implementar políticas públicas que garantam o respeito e direito à liberdade religiosa, o deputado baiano Hilton Coelho (PSOL) acaba de apresentar um projeto de lei (PL) estadual que propõe a criação do "Janeiro Verde", mês voltado para o combate ao racismo religioso na Bahia.

O texto sugere que, durante todo o mês, o Governo da Bahia e demais órgãos estaduais realizem ações de combate, prevenção e conscientização sobre o racismo religioso através de palestras, rodas de conversa, campanhas publicitárias, debates, além de produções artísticas e culturais. O PL também destaca os direitos constitucionais da liberdade religiosa no país e sugere que a Secretaria da Educação fique responsável por promover ações educativas nas escolas a fim de valer as estratégias do ensino da história e cultura africana, afro-brasileira e índigena e o desenvolvimento de um regime de proteção à liberdade religiosa e à laicidade na educação pública.

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"Queremos, com esse projeto, provocar que as instituições públicas dos três poderes se comprometam com diversas formas de contribuição com o debate público sobre o racismo religioso, que é um crime de ódio e fere a liberdade e a dignidade humana. Mas, mais do que isso, queremos também que nesse compromisso institucionalizado o foco seja o protagonismo dos povos de religião de matriz africana na luta por sua memória ancestral. Então uma lei como essa, que determina a difusão do conhecimento sobre esse tema, ajuda a fissurar, de alguma forma, o racismo institucional, quando obriga as próprias instituições a promoverem ações refletidas e políticas públicas de combate a esse crime", disse Hilton à Alma Preta Jornalismo.

Na Bahia, as vítimas de intolerância religiosa e racismo são acompanhadas pelo Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado (Sepromi). Só nos primeiros nove meses deste ano, 19 casos de intolerância religiosa foram registrados pelo Centro. Em 2020, foram 29 ocorrências em todo o ano. No total, já são 270 casos de intolerância religiosa acompanhados desde a implementação do Centro, em 2013.

O preconceito religioso é considerado crime, conforme previsto no artigo 20 da Lei 7.716/1989. A pena para o crime varia de um a três anos, além da aplicação de multa. Em junho deste ano, a justiça da Bahia teve a primeira condenação em segunda instância por crime de intolerância religiosa contra uma evangélica. De acordo com a denúncia do Ministério Público, Edneide Santos de Jesus hostilizava candomblecistas do Terreiro Oyá Denã, localizado na região Metropolitana de Salvador, com sucessivos abusos racistas e expressões preconceituosas como a atribuição dos orixás à satanás. A mãe de santo do terreiro, ialorixá Mildredes Dias, conhecida como Mãe Dede de Iansã, morreu em 2015 e familiares atribuem a piora na saúde da religiosa aos constantes ataques feitos pela evangélica.

Um dos casos mais fatídicos de intolerância religiosa na Bahia e que se assemelha ao caso da Mãe Dede de Iansã foi a morte da ialorixá Gildásia dos Santos e Santos, mais conhecida como Mãe Gilda de Ogum e fundadora do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, em Salvador. Mãe Gilda também teve a saúde agravada por causa de ataques verbais, morais e físicos causados por membros da igreja Universal.

Em um dos ataques, evangélicos chegaram a invadir o terreiro dizendo que iriam "exorcizá-la". Mãe Gilda morreu no dia 21 de janeiro e a sua morte marca o Dia de Luta Contra a Intolerância Religiosa, data nacional em vigor desde 2007.

Diante do caso, o Supremo Tribunal de Justiça condenou a Igreja Universal a indenizar os familiares da ialorixá por danos morais e uso indevido de imagem, já que os evangélicos também usaram fotos e notícias falsas para difamar Mãe Gilda.

"Estamos num momento de acirramento do ódio e da efetivação de necropolíticas. E isso não está somente no plano nacional. Aqui na Bahia temos visto várias ações do governo Rui Costa que contribuem com o racismo estrutural. Então com tudo que o projeto poderá acionar, do ponto de vista do debate público e da conscientização sobre o racismo religioso, ações como a privatização dos parques públicos e áreas de proteção ambiental, como quer o governo do Estado, ou ainda a construção do elevatório de esgoto na Lagoa do Abaeté, por exemplo, com certeza serão temas colocados em pauta nessa agenda pública pelos movimentos populares contra o racismo religioso", completa o deputado.

Fote: Agência Alma Preta
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Zulu Araújo: Primeira prefeita negra de Cachoeira (BA) é ameaçada de morte

Considerada uma joia do Patrimônio Cultural Brasileiro, desde 1971, com belos casarões e igrejas e com bens tombados pelo IPHAN desde 1940, Cachoeira, cidade histórica do Recôncavo Baiano, vive hoje momentos de terror. A prefeita Eliana Gonzaga, primeira mulher e primeira negra eleita para governar a cidade está sendo ameaçada de morte por milicianos políticos. O caso é tão grave que o Governo do Estado da Bahia determinou que a mesma tivesse escolta militar dia e noite.

O drama da prefeita e da cidade começou no dia 15 de novembro de 2020, quando ela, juntamente com sua vice Cristina Pereira, venceram as eleições para a prefeitura com mais de 2.500 votos de vantagem, num universo de 18 mil votos, numa vitória histórica. O derrotado que concorria pela quarta vez a prefeitura foi um grande empresário da região e que continua inconformado. Por conta dessa vitória, Cachoeira não teve mais sossego desde então.

Para quem não sabe, a cidade tem uma importância histórica para a Bahia e o Brasil. Em 25 de junho de 1822, por meio da Câmara Municipal de Cachoeira foi declarada a verdadeira Independência do Brasil e o inicio das sangrentas batalhas que culminaram com a expulsão dos portugueses da Bahia e a declaração de sua independência no dia 2 de Julho de 1823. Por conta dessa atitude corajosa a Cachoeira é conhecida como “Cidade Heroica”.

Se não forem adotadas medidas urgentes e rigorosas contra esses milicianos, Cachoeira pode viver mais uma tragédia. Pois as ameaças não são de brincadeira. Dois dos apoiadores da campanha eleitoral da prefeita já foram assassinados em plena luz do dia sem que até o momento se tenha conhecimento dos autores. São eles, Ivan Passos (morto dois dias após as eleições e Gerolando Silva, assassinado com 10 tiros, em frente à delegacia local.).

Importante dizer que Cachoeira é uma cidade eminentemente negra, com mais de 80% da população de origem africana. Onde os terreiros de candomblés tem uma forte presença, assim como a famosa Irmandade da Boa Morte que é liderada por negras sexagenárias da cidade e encanta o mundo inteiro. Ainda assim, nunca uma mulher negra havia sido eleita para dirigi-la. Ao que parece o racismo e a misoginia se juntaram para impedir que a vontade da população seja respeitada.

“Eu não vou renunciar. Eu não tenho medo. Junto com os meus ancestrais, aqui também pulsa a veia sindical, e muito forte e não sou covarde. A veia do sindicalista não recua”, disse a prefeita, que já foi feirante, líder sindical e vereadora na cidade por dois mandatos. Ela também tem recebido apoios importantes, tanto de entidades do movimento negro baiano, a exemplo da Unegro, do Movimento de Mulheres e de parlamentares de todas as matizes, como a deputada federal Lidice da Mata, que denunciou as ameaças durante audiência na Procuradoria da Mulher da Câmara Federal. Enfim, essa luta também é nossa, afinal, não podemos permitir que uma nova Marielle Franco se materialize na nossa querida Cachoeira.


Pacificar para quem?

Nós, Tupinambá, nos dirigimos ao Governo brasileiro e pedimos: ou devolvam as nossas terras ou mandem nos matar e coloquem o branco em nosso lugar. Mas tomem uma decisão já. Nem os adultos, nem as crianças podem viver neste inferno.

No dia 5 de abril, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do Superior Tribunal de Justiça, proferiu uma decisão suspendendo a demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Dada a gravidade desse acontecimento, nós, os Tupinambá da aldeia Serra do Padeiro, uma das comunidades que vive nesse território, apresentamos esta denúncia e solicitamos ao Governo brasileiro e aos organismos internacionais que tomem as medidas necessárias para impedir que nossos direitos continuem sendo violados. Apenas nos últimos anos, mais de 30 Tupinambá foram mortos. Há violência maior que vermos nossos parentes assassinados, ninguém responsabilizado, e ainda nos negarem o direito a nossa terra?

Em resposta à decisão do ministro, apresentamos um relato histórico sobre o que nosso povo vem enfrentado nestes 500 anos. Ao contrário do que disseram os fazendeiros e empresários na ação acolhida pelo ministro, apesar de toda a violência, nunca saímos de nossa terra. Em 1500, quando aqui os europeus chegaram, logo declararam que os Tupinambá eram inimigos da Coroa portuguesa e tinham que ser exterminados e expulsos de seus territórios.

Na Capitania de São Jorge dos Ilhéus, fomos escravizados nos engenhos de cana-de-açúcar, reagimos e sofremos a retaliação da Coroa portuguesa, no massacre comandado por Mem de Sá, em 1559. Então, nosso povo teve que lutar contra os franceses, na Confederação dos Tamoios. Depois, tivemos que lutar contra os holandeses, para expulsá-los da Bahia. E sempre nos eram negados os nossos direitos.

Em 1680, criaram o aldeamento jesuítico de Nossa Senhora da Escada, para aprisionar os Tupinambá. No aldeamento, eles se esforçaram para tirar a nossa língua, a nossa crença, a nossa religião - para nos tirar tudo. Mas os Tupinambá sempre tiveram a rebeldia de lutar para não deixar que os outros ocupassem completamente o nosso território. Quando o Governo percebeu que, apesar do aldeamento, continuávamos crescendo, decidiu que ele teria que ser extinto e elevado à situação de vila, o que aconteceu em 1758. Nesse período, os Tupinambá passaram a ter alguns direitos, como o de eleger vereadores para a Câmara de Olivença, que chegou a ser presidida por um indígena, Nonato do Amaral. Porém, os brancos mandaram destituí-lo. Os índios resistiram e mataram os homens enviados para assumir a Câmara.

Pinheiro Costa [juiz federal] diz que precisamos entrar em acordo e ceder parte de nossa terra. Ele diz que nossa terra tem que ser demarcada em "ilhas", deixando a praia do lado de fora. Como é que os Tupinambá da praia ficarão sem praia? O juiz afirma que é preciso "pacificar" a região.

Nós perguntamos: pacificar para quem? Porque quem está morrendo somos nós, quem está sendo enterrado ao longo da história somos nós.

Assim, nos dirigimos ao governo brasileiro, em suas diversas instâncias, e pedimos: ou devolvam as nossas terras ou, simplesmente, parem de dizer que nós não somos Tupinambá: mandem nos matar, em menos de um ano, e coloquem o branco em nosso lugar. Mas tomem uma decisão já. Nem os adultos, nem as crianças podem viver neste inferno. Estamos em nossa terra, trabalhando, e, quando menos esperamos, a polícia chega para nos expulsar. Nos últimos anos, a polícia tentou nos matar dezenas de vezes. Vejam a gravidade do que dizemos: nós não estamos nos referindo a ações de fazendeiros ou empresários; é o governo brasileiro, através de sua polícia, que vem tentando acabar com a comunidade a qualquer preço. Como vamos enfrentar uma luta desta? Qual é a chance que nós temos de vencer?

Vocês não têm para onde nos levar, porque nós nunca fomos de outro lugar. Os fazendeiros e os empresários dizem que nós não somos os ocupantes tradicionais desta terra. Não são eles que têm que dizer, somos nós, que habitamos aqui, são os velhos que ainda vivem na terra em têm histórias, muitas histórias, com o branco sempre infernizando a vida deles. O ministro que mandou suspender a demarcação da nossa terra nunca veio aqui, nós não sabemos quem ele é. O que sabemos é que o Judiciário brasileiro tem sempre uma desculpa para manter tudo na mão dos invasores. Sempre. Que vocês fiquem sabendo: ninguém nunca governou e nem vai governar os Tupinambá da Serra do Padeiro.

Queremos que este governo decida logo. E pedimos também que a comunidade internacional e a Igreja Católica se posicionem. Ninguém pode viver mil anos nestas circunstâncias, nas circunstâncias em que já vivemos mais de 500 anos.

Rosivaldo Ferreira da Silva é o cacique Babau, que representa a organização política dos Tupinambá da Serra do Padeiro (BA) e Rosemiro Ferreira da Silva é pajé, que representa a organização religiosa dos Tupinambá da Serra do Padeiro.


Rosivaldo Ferreira da Silva é o cacique Babau, que representa a organização política dos Tupinambá da Serra do Padeiro (BA) e Rosemiro Ferreira da Silva é pajé, que representa a organização religiosa dos Tupinambá da Serra do Padeiro.

ENTENDA O PROBLEMA

O povo Tupinambá aguarda desde 2004 a conclusão do processo de demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Localizada no sul da Bahia, Brasil, ela tem cerca de 47 mil hectares e é habitada por aproximadamente cinco mil índios. No último 5 de abril, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu medida liminar determinando a suspensão do processo de demarcação, acatando mandado de segurança impetrado em 2013 pela Associação dos Pequenos Agricultores, Empresários e Residentes na Pretensa Área Atingida pela Demarcação de Terra Indígena de Ilhéus, Una e Buerarema. A demora na demarcação tem agravado ainda mais a situação de conflito da região, com a morte de indígenas, como acontece em outras áreas do país, como Mato Grosso do Sul.

Fonte: El País


359 municípios sem aterro sanitário na Bahia

Há pouco o que comemorar na data consagrada mundialmente ao Meio Ambiente, quando o assunto é a eliminação dos lixões na Bahia

Por Albenísio Fonseca - Tribuna da Bahia

Há pouco o que comemorar nesse domingo (5/6), data consagrada mundialmente ao Meio Ambiente, quando o assunto é a eliminação dos lixões na Bahia.

Conforme a legislação contida na Política Nacional de Resíduos Sólidos, criada em 2010, foi estipulado um prazo de quatro anos para adequação dos municípios brasileiros, cuja data foi encerrada em 2 de agosto de 2014 e sem que fosse adotada, até agora, qualquer prorrogação nesse prazo.

Nesse sentido, o cenário dos lixões na Bahia sinaliza um quadro bastante dramático. De acordo com dados da Sedur-Secretaria Estadual de Desenvolvimento Urbano os “lixões, ou vazadouros a céu aberto, permanecem como meios adotados pela maioria dos municípios do estado”.

Nada menos que 359 dos 415 municípios baianos, o correspondente a 86,09%, continuam sem atender à legislação, enquanto outros 22, ou 5,28%, adotam, também de modo inadequado, o descarte dos resíduos sólidos em aterros convencionais.

Vale salientar que alguns desses aterros acumulam resíduos sólidos provenientes de outras municipalidades dentro de ações regionalizadas. Em apenas 32 municípios (11,51%) baianos a disposição final de resíduos sólidos é realizada de modo correto em algum tipo de aterro sanitário.

Tendo em vista a redução de investimentos para solucionar o problema, a Conder-Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia desenvolveu o ASC-Aterro Sanitário Simplificado, sob tecnologia de baixo custo, para facilitar a implantação, quando comparada às demais, em municípios de pequeno porte.

De modo geral e de acordo com parecer do engenheiro sanitarista e ambiental, Mateus Almeida Cunha, “nesta tecnologia são realizadas obras menos complexas, a exemplo da utilização do próprio solo da área escolhida para disposição final, como atenuador do lixiviado ou chorume, efluente líquido do aterro, sem barreira sintética inferior para impermeabilização de base, diferentemente do aterro sanitário convencional.

Sua implantação representa um custo na ordem de R$ 180 mil a R$ 260 mil por município, enquanto um aterro convencional demanda investimento da ordem de R$ 1.358.000.

Reintegração

Até 2007, o Governo do Estado construiu 55 aterros sanitários em todo o estado, utilizando, inclusive, o regime de compartilhamento entre municípios vizinhos nos aterros implantados.

No caso da Bahia, em que pese a situação crítica de alguns aterros, segundo o engenheiro sanitarista e ambiental da Sedur, é “imprescindível que passem por avaliação da capacidade de revitalização e de expansão, em alguns casos, considerando que possuem aproximadamente 15 anos de vida útil”.

Ainda de acordo com avaliação da Sedur, “a possibilidade de reintegrar os aterros sanitários a um plano regional de gestão não deve ser ignorada, uma vez que houve área desapropriada, recursos investidos e obtidas licenças ambientais”.

Sob outro aspecto, “devem ser incentivadas ações com foco na não geração de resíduos sólidos, minimização, reutilização e reciclagem  economicamente autossuficiente, de modo a buscar a melhor sustentabilidade ambiental do sistema empregado”.

Além disto, de acordo com a avaliação, “deverá ser observado um equilíbrio entre ações escolhidas e obtenção do beneficio de escala (que dependerá do número mínimo de municípios agrupados), princípio que deve ser compreendido como essencial para o processo de regionalização”.

O período para o envio de dados ao SNIS-Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento,  referentes a 2016, teve a prorrogação encerrada na última sexta-feira (3/6). O relatório nacional anual tem lançamento previsto para 15 de dezembro.

Já o relatório Desafio do Lixo, publicado pelo Ministério Público em 2007, sobre a condição de operação dos aterros sanitários implantados na Bahia, sejam convencionais ou simplificados, é apontada como “inadequada”.

Ou, seja, na maioria dos casos, permanecem funcionando como vazadouros a céu aberto. A Promotoria de Meio Ambiente do Ministério Público na Bahia não soube informar o número de ações movidas contra municípios que ainda não adotaram aterros sanitários.

Matéria publicada originalmente no jornal Tribuna da Bahia.


4° Encontro de Prefeitos promovido pela União dos Municípios da Bahia

“Construção coletiva do desenvolvimento das cidades” foi o tema do painel que contou com a participação dos membros do Conselho Curador da FAP George Gurgel e João Vitor durante o 4° Encontro de Prefeitos promovido pela União dos Municípios da Bahia sob o tema Desenvolvimento Local Sustentável. Cerca de 300 prefeitos, secretários e representantes de órgãos estaduais e federais participaram do evento realizado no Resort Villa Galé, em Camaçari, no período de 17 a 20 deste mês.

Como não poderia ser diferente na atual conjuntura, predominou entre os presentes a discussão sobre a profunda crise financeira por que passam as prefeituras, o que trouxe à tona uma detalhada pauta de reivindicações consubstanciadas na Carta do 4° Encontro – de medidas tópicas, como a criação de novos tributos, até uma maior participação dos municípios no bolo tributário já no contexto de um novo pacto federativo. Foi nesse contexto de preocupação com a crise financeira que foram apresentadas as principais características da governança democrática, ou nova governança pública, tema central do livro do catalão Josep Maria Pascual Esteve Governança Democrática: construção coletiva do desenvolvimento das cidades, editado pela Fundação, cuja terceira edição se acha em preparo.  Características que foram reforçados pela experiência concreta narrada pelo colombiano Jorge Melguizo em palestra sobre os desafios enfrentados pela cidade de Medellín e os excelentes resultados que alcançou nos últimos anos nas áreas de combate à violência e desenvolvimento humano.

O contraste entre governança democrática e as visões da crise (e de suas soluções) acaba se agigantando, particularmente porque torna evidente a impossibilidade de superação dos crônicos problemas de implementação das políticas públicas aqui e alhures através das abordagens já caducas de gestão municipal. Na perspectiva da governança, é preciso pôr em prática uma nova e radical maneira de governar os municípios, que guarde sintonia com a sociedade-rede, informacional, em que o prefeito se posicione como líder de projetos estratégicos para a comunidade que representa – e não como síndico -, em que as cidades disponham de estratégias e políticas compartilhadas entreíticas compartilhadas com compromissoicipais, privados ou comunitarios. os atores urbanos articuladas em projetos com recursos públicos e privados, em que a prefeitura tenha como principal tarefa garantir o direito de todos ao que a cidade proporciona, trabalhe para aumentar o capital social e potencializar a capacidade de ação do município, e não opere simplesmente como empresa prestadora de serviço – que não é –, em que a participação cidadã seja também corresponsabilização e compromisso com a cidade e não mera atuação pontual e episódica para opinar ou homologar esta ou aquela decisão.

Nesse sentido, a solução para a crise deveria passar por estratégias de investir e gerir os recursos públicos em função de ações coletivas nas quais se comprometam e cooperem os diferentes atores urbanos.  Daí deriva o papel essencial da política, pois cabe ao político eleito ser o promotor de programas e projetos, bem como o organizador do interesse geral que deve presidir a elaboração e gestão de políticas e projetos. A ele não cabe a função de um gerente ou CEO, mas a tarefa de construir cidadania, para o que é essencial a revalorização da política e dos políticos, o comportamento como expressão de valores éticos e a eficácia baseada no uso de novas metodologias e técnicas de governar.