augusto aras
Aras diz que PGR pode ‘avançar’ na investigação contra políticos
Senadores entregaram material para procurador-geral da República nesta quarta-feira
O Globo
BRASÍLIA - Senadores da CPI da Covid entregaram nesta quarta-feira o relatório final ao procurador-geral da República Augusto Aras, que afirmou que o material permitirá avanços nas investigações contra políticos com foro privilegiado.
Reação: Após aprovação de relatório, Bolsonaro chama CPI da Covid de 'palhaçada'
“Esta CPI já produziu resultados. Temos denúncias, ações penais, autoridades afastadas e muitas investigações em andamento e agora, com essas novas informações poderemos avançar na apuração em relação a autoridades com prerrogativa do foro nos tribunais superiores", afirmou Aras, em comunicado divulgado pela PGR.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), o relator, Renan Calheiros (MDB-AL) e o vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), foram pessoalmente entregar o documento. Segundo a PGR, Aziz fez um breve relato do trabalho, lembrou o número de mortos em decorrência da pandemia e destacou a resistência do governo federal na compra de vacinas como um dos fatos mais graves apurados pela CPI.
Bela Megale: Aras submete relatório da CPI à análise prévia para ganhar tempo e se blindar com Bolsonaro e Senado
“Foram mais de 600 mil mortos. Nós não queremos vingança. Queremos justiça. Que as pessoas que contribuíram para isso possam ser responsabilizadas pela Justiça dos homens. Confiamos no trabalho da Procuradoria-Geral da República e de todo o Ministério Público Federal”, disse, de acordo com comunicado da PGR.
PGR pretende fatiar relatório da CPI da Covid para ações em curso no MPF
Equipe de Aras fez levantamento preliminar de procedimentos e procuradorias
Vinicius Sassine / Folha de S. Paulo
A PGR (Procuradoria-Geral da República) já tem um levantamento feito de procedimentos e áreas no MPF (Ministério Público Federal) para destinar fatias do relatório final da CPI da Covid no Senado, aprovado pelos senadores na noite desta terça-feira (26).
O relatório, que pede o indiciamento de duas empresas e 78 pessoas, entre elas o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), será entregue nesta quarta-feira (27) ao procurador-geral da República, Augusto Aras, segundo a previsão da cúpula da CPI.
A ideia dos congressistas é entregar o documento nas mãos de Aras.
O levantamento já feito pela PGR pressupõe que a CPI entregará o relatório final completo aprovado pelo colegiado.
Assim, além de decisões sobre investigações da atuação de Bolsonaro, de seus ministros e de parlamentares aliados na pandemia, Aras e sua equipe teriam a prerrogativa de definir para onde serão remetidos os demais apontamentos do documento.
A CPI também tem a intenção de enviar o relatório diretamente a procuradorias nos estados.
Caberá ao procurador-geral e à sua equipe tocar as investigações e diligências envolvendo as autoridades com foro especial junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Têm foro no STF Bolsonaro e seus quatro ministros com proposta de indiciamento: Marcelo Queiroga (Saúde), Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência), Walter Braga Netto (Defesa) e Wagner Rosário (CGU).
O mesmo ocorre com dois filhos do presidente —senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)— e parlamentares federais aliados.
O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), tem foro junto ao STJ. Acusações que podem ser entendidas como improbidade administrativa teriam como destino a primeira instância da Justiça Federal.
Até o momento, o entorno de Aras não prevê a formação de uma força-tarefa para a análise do relatório aprovado e para definições sobre futuras investigações.
Os pedidos de indiciamento, embasados por provas reunidas ao longo de seis meses de investigação parlamentar, serão analisados especialmente pela assessoria criminal de Aras e pelo Giac (Gabinete Integrado de Acompanhamento da Covid-19), um grupo em funcionamento desde o início da pandemia para acompanhar medidas administrativas e de coordenação do MPF.
A assessoria criminal é formada por subprocuradores-gerais da República da estrita confiança de Aras, em especial o vice-procurador-geral, Humberto Jacques, e a coordenadora do grupo de trabalho para operações criminais no STF, Lindôra Araújo.
Existem procedimentos abertos em diferentes procuradorias da República, em especial em Brasília e no Amazonas.
O MPF no DF já havia pedido compartilhamento de provas —cópias de depoimentos prestados na CPI—para embasar um procedimento de investigação criminal que apura suspeitas de corrupção no contrato da vacina indiana Covaxin.
Os senadores que controlaram a CPI durante os seis meses de existência —o chamado G7— temem arquivamentos automáticos de acusações por Aras, em razão de sua atuação a favor de Bolsonaro e do governo ao longo do exercício do cargo de procurador-geral.
Lindôra, a principal aliada de Aras na esfera criminal, chegou a colocar em xeque a eficácia do uso de máscaras na prevenção da infecção pelo coronavírus, na contramão de um consenso científico a favor do equipamento de proteção.
Em manifestação enviada ao STF, a subprocuradora afirmou não ver crime na prática de Bolsonaro de não usar máscaras e de promover aglomeração dia após dia na pandemia.
A ministra Rosa Weber apontou perplexidade com o parecer e pediu uma nova avaliação à PGR.
Lindôra é tida na PGR como a auxiliar mais bolsonarista de Aras, inclusive com interlocução com o filho mais velho do presidente, Flávio Bolsonaro.
Dentro do órgão, a avaliação é que o papel mais decisivo na análise do relatório final da CPI não caberá a Lindôra, mas a Humberto Jacques, o número dois na hierarquia da PGR.
Jacques tentou adiar para depois da conclusão dos trabalhos da CPI a análise sobre investigar ou não o presidente da República por prevaricação.
Dentro do Palácio da Alvorada, Bolsonaro teria sido avisado sobre irregularidades no contrato bilionário da Covaxin e dito que acionaria a PF para investigar a suspeita e não o fez.
Mais uma vez, a ministra Rosa Weber discordou da posição da PGR e cobrou uma análise da notícia-crime apresentada por três senadores ao STF. Jacques, então, pediu a abertura de um inquérito para investigar o presidente, o que foi autorizado pelo STF no mesmo dia.
Aras também relutou em providenciar a abertura de um inquérito para investigar as suspeitas de crimes por parte do general da ativa do Exército Eduardo Pazuello, quando ele exercia o cargo de ministro da Saúde.
Após o acúmulo de evidências de omissão do ministro na crise do oxigênio no Amazonas, onde pacientes morreram asfixiados nos hospitais por falta do insumo , o procurador-geral instaurou inicialmente uma notícia de fato.
Este tipo de procedimento preliminar é o preferido no modus operandi de Aras em relação ao governo Bolsonaro. Muitos ficam pelo caminho, ou são arquivados.
No caso de Pazuello, o inquérito foi aberto, a pedido da PGR e por decisão do STF. As investigações, porém, pouco avançaram e logo precisaram ser deslocadas para a primeira instância da Justiça Federal em Brasília.
Pazuello foi demitido do cargo de ministro da Saúde. Abrigado em um cargo de confiança no Palácio do Planalto, o general não tem mais foro privilegiado.
Aras terá de se posicionar diante de apontamentos de crimes comuns atribuídos ao presidente da República: epidemia com resultado de morte, infração a medidas sanitárias preventivas, prevaricação, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime e falsificação de documentos particulares.
A CPI concluiu ainda que Bolsonaro cometeu crimes contra a humanidade, o que levará a encaminhamento do relatório final ao Tribunal Penal Internacional, e crime de responsabilidade, cuja atribuição de apuração é do Congresso Nacional, por meio de uma ação de impeachment.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/10/pgr-pretende-fatiar-relatorio-da-cpi-da-covid-para-acoes-em-curso-no-ministerio-publico-federal.shtml
CPI da Covid: Após aprovação de relatório, o que acontece agora?
O relatório final foi aprovado por 7 votos a 4 em sessão nesta terça-feira (26/10)
Mariana Schreiber / BBC News Brasil
O texto, votado pelos membros titulares da comissão, recomenda que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado e, eventualmente, responsabilizado em três frentes devido à gestão do seu governo na pandemia de coronavírus: por crimes comuns, por crimes de responsabilidade e por crimes contra a humanidade.
Com o resultado, essas acusações contra o presidente serão analisadas em três órgãos.
Além do presidente, o relatório pede o indiciamento de 77 pessoas - incluindo ex-ministros, ministros, políticos, servidores públicos, empresários, membros do chamado "gabinete paralelo" - e duas empresas, a Precisa Medicamentos e a VTCLog.
Entre os que tiveram o pedido de indiciamento mencionado no relatório estão o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o atual titular da Pasta Marcelo Queiroga, Ernesto Araújo (ex-chanceler), Walter Braga Netto, ministro da Defesa, Onyx Lorenzoni (ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência), Mayra Pinheiro (secretária do Ministério da Saúde conhecida como "capitã cloroquina"), Roberto Dias (ex-diretor de Logística do ministério), Francisco Maximiano (sócio da Precisa), Flavio, Eduardo e Carlos Bolsonaro (filhos do presidente e respectivamente senador, deputado e vereador), Bia Kicis e Carla Zambelli (deputadas governistas), os empresários Carlos Wizard, Luciano Hang e Otávio Fakhoury e os médicos Nise Yamaguchi, Paolo Zanotto e Rodrigo Esper, entre outros (veja o relatório completo da CPI aqui; o nome do senador Luis Carlos Heinze, do PP gaúcho, foi retirado na reta final das discussões).
Os pedidos de indiciamento serão encaminhados a outros órgãos.
No caso de Bolsonaro, as suspeitas de crime comum serão encaminhadas à Procuradoria-Geral da República (PGR), que avaliará uma possível denúncia criminal contra Bolsonaro. Já as de crime de responsabilidade vão para análise da Câmara dos Deputados, para possível abertura de processo de impeachment.
Por fim, as acusações de crimes contra a humanidade serão enviadas ao Tribunal Penal Internacional (TPI), onde o presidente poderia sofrer um processo.
No entanto, juristas ouvidos pela BBC News Brasil consideram que os três caminhos oferecem obstáculos hoje para que o presidente de fato venha a ser punido por possíveis crimes durante a pandemia de coronavírus, doença que já matou mais de 606 mil pessoas no Brasil desde março de 2020.
Durante viagem ao Ceará, enquanto Calheiros lia seu relatório na CPI, na semana passada, Bolsonaro negou qualquer responsabilidade nas mortes.
"Como seria bom se aquela CPI tivesse fazendo algo de produtivo para nosso Brasil. Tomaram tempo de nosso ministro da Saúde, de servidores, de pessoas humildes e de empresários", criticou o presidente.
"Nada produziram, a não ser o ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas sabemos que não temos culpa de absolutamente nada, fizemos a coisa certa desde o primeiro momento", disse ainda.
Entenda a seguir o que pode acontecer concretamente contra o presidente nos três tipos de crimes que Bolsonaro é citado no texto de Calheiros.
1) Acusações de crimes de responsabilidade
Calheiros ressalta em seu relatório que, entre os crimes de responsabilidade previstos na legislação brasileira, está o ato de atentar contra o exercício dos direitos sociais e contra a probidade na administração.
Além disso, ele destaca que o direito à saúde é previsto como um dos direitos sociais no artigo 6º da Constituição, enquanto o artigo 196 estabelece que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".
Na avaliação de Calheiros, porém, a investigação da CPI mostrou que a gestão de Bolsonaro agiu em sentido contrário: ao invés de proteger a vida dos brasileiros da covid-19, o presidente teria contribuído para o agravamento da pandemia ao demorar a comprar vacinas, incentivar o uso de medicamentos sem comprovação científica, promover aglomerações, entre outros comportamentos.
"A minimização constante da gravidade da covid-19, a criação de mecanismos ineficazes de controle e tratamento da doença, com ênfase em protocolo de tratamento precoce sem o aval das autoridades sanitárias, o déficit de coordenação política, a falta de campanhas educativas sobre a importância de medidas não farmacológicas, o comportamento pessoal contra essas medidas, e, por fim, a omissão e o atraso na aquisição de vacinas e a contratação de cobertura populacional baixa do consórcio da OMS foram algumas das condutas do chefe do Poder Executivo Federal que incontestavelmente atentaram contra a saúde pública e a probidade administrativa", diz trecho do relatório.
Apesar das duras acusações do relator, porém, hoje parece pouco provável que elas gerem abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro. O único que pode iniciar esse procedimento é o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que atualmente mantém boa relação com presidente.
E, a partir dessa aliança com Lira, o Palácio do Planalto construiu uma base de apoio entre os deputados do chamado Centrão (siglas de centro-direita de comportamento mais fisiológico), sustentada pela distribuição de cargos para indicados desses parlamentares e pelo envio de verbas federais para investimentos em seus redutos eleitorais. Com isso, hoje o presidente parece reunir o mínimo de 172 votos na Câmara necessários para barrar a aprovação de um processo de impeachment.
Outro elemento que reduz as chances desse processo ser iniciado é o fato de os protestos de rua realizados ao longo desse ano pedindo a cassação do presidente não terem reunidos um público tão grande quantos os atos que pressionaram pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.
Já as pesquisas de opinião têm indicado que o governo Bolsonaro é reprovado pela maioria da população, mas ainda é bem avaliado por cerca de um terço dos brasileiros — patamar de aprovação superior ao que Dilma tinha quando foi cassada.
2) Acusações de crimes comuns
Para Calheiros, as condutas de Bolsonaro também podem ser enquadradas em sete crimes comuns, previstos no Código Penal.
São eles: epidemia com resultado de morte (por suspeita de propagar o vírus); infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia), incitação ao crime (por incentivar aglomeração e o não uso de máscara); falsificação de documento particular (por ter apresentado uma falsificação como sendo um documento oficial do Tribunal de Contas da União que provaria haver um excesso na contabilização de mortes por covid-19); emprego irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes); e prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).
Caso o relatório seja aprovado, os elementos que baseiam essas acusações serão encaminhadas à PGR, pois o procurador-geral da República, Augusto Aras, é a única autoridade que pode apresentar uma denúncia criminal contra o presidente no Supremo Tribunal Federal (STF).
Aras é visto como aliado de Bolsonaro e hoje parece improvável que o denuncie, já que a PGR tem arquivado diversas queixas-crimes que já foram apresentadas solicitando a investigação criminal de Bolsonaro por sua conduta na pandemia.
A PGR, por exemplo, já arquivou pedido de investigação devido ao não uso de máscara por entender que isso configura infração administrativa, sujeita a multa, e não um crime.
O órgão também recusou pedido de investigação por causa das aglomerações provocadas pelo presidente. Segundo a PGR, Bolsonaro só poderia ser processado por disseminar coronavírus se estivesse contaminado com a doença e contrariasse ordem médica para se isolar.
Por outra lado, a PGR já abriu inquérito para investigar se Bolsonaro prevaricou ao não tomar providências após ser informado pelo deputado Luiz Miranda (DEM-DF) de supostas ilegalidades no contrato para compra da vacina indiana Covaxin. A investigação está em andamento.
Quanto a suspeitas de crimes pelo incentivo de Bolsonaro ao chamado "tratamento precoce" (uso de medicamentos sem eficácia contra covid-19), Aras informou ao STF em junho que havia iniciado uma apuração preliminar para avaliar a abertura de investigação. Críticos de Aras, porém, o acusam de usar esse tipo de procedimento para responder a pressões para investigar Bolsonaro sem de fato adotar medidas concretas contra o presidente.
Para o criminalista Pierpaolo Bottini, professor da Universidade de São Paulo (USP), é difícil cravar que Aras não dará qualquer encaminhamento as acusações do relatório da CPI.
"Não é só uma avaliação política, tem uma avaliação jurídica que ele terá que fazer. Ele vai ter que motivar (justificar juridicamente) seja qual for a decisão dele. Se tiver muito subsídio (sustentando as acusações), também é difícil ele deixar de dar qualquer encaminhamento", acredita.
Segundo Bottini, há um outro caminho jurídico para Bolsonaro ser denunciado no STF. Em caso de omissão da PGR, ou seja, se o órgão demorar para dar alguma resposta ao relatório da CPI, as próprias vítimas da pandemia poderiam processar o presidente por meio de uma ação penal privada subsidiária da pública.
A Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) disse à BBC News Brasil que de fato analisa essa possibilidade. A organização apresentou em junho à PGR um pedido de investigação contra Bolsonaro, mas a análise desse pedido tem transcorrido em sigilo e a própria Avico enfrenta dificuldades para obter informações sobre seu andamento.
Eventual apresentação de uma ação contra Bolsonaro pelas vítimas da pandemia seria algo inédito. Segundo Bottini, provavelmente o STF faria uma primeira avaliação de admissibilidade (decidir se a ação está dentro dos requisitos jurídicos necessários) e depois encaminharia a denúncia para análise da Câmara dos Deputados.
O professor ressalta que a Constituição só permite que o Presidente da República seja processado após aval de 342 deputados (mesmo número necessário para abertura de um processo de impeachment).
3) Acusações de crimes contra a humanidade
Calheiros também defende em seu relatório que Bolsonaro seja investigado no Tribunal Penal Internacional (TPI), Corte sediada em Haia, na Holanda, que julga graves violações de direitos humanos, como genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra.
No entanto, são poucas as denúncias recebidas pelo Tribunal que de fato geram investigações - e, quando isso ocorre, os casos se alongam por muitos anos, explicou à BBC News Brasil o juiz criminal e professor da USP Marcos Zilli, estudioso do funcionamento do Tribunal Penal Internacional.
Em tese, diz ele, o TPI pode condenar criminosos a penas de 30 anos de prisão e até a prisão perpétua, mas essas punições máximas nunca foram aplicadas pela Corte.
A intenção inicial de Calheiros era acusar o presidente de crime de genocídio contra populações indígenas, mas essa ideia foi abandonada devido à oposição de outros membros da CPI. Com isso, a proposta do relator é enviar ao TPI duas acusações de crimes contra a humanidade por parte do presidente.
Esses crimes estão previstos no Tratado de Roma, incorporado ao direito brasileiro desde setembro de 2002.
Uma das acusações propostas por Calheiros sustenta que Bolsonaro cometeu crime contra a humanidade a praticar "ato desumano que afete gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental". Isso teria ocorrido, segundo o senador, quando vidas humanas foram usadas como "cobaias" em estudos fraudulentos para aplicação de tratamentos sem eficácia contra covid-19.
Ele cita, por exemplo, a promoção do "tratamento precoce" pelo Ministério da Saúde durante a crise de falta de oxigênio em Manaus, no início de 2021. Outro argumento usado pelo senador foi o uso em massa de hidroxicloroquina pelo plano de saúde Prevent Senior. Resultados de um suposta pesquisa da empresa atestando a eficácia do remédio contra covid foram divulgados por Bolsonaro - no entanto, o estudo não havia sido autorizado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e ex-médicos da Prevent Senior acusaram o plano de fraudar os resultados.
A outra acusação é de crime contra a humanidade devido à postura do governo Bolsonaro em relação aos povos indígenas. O relatório destaca a decisão do STF de determinar em julho de 2020 a adoção de um plano emergencial pelo governo de apoio a essas populações durante a pandemia "diante das muitas falhas na política de enfrentamento à pandemia junto aos povos indígenas e da preocupação com a rápida interiorização da doença, que prenunciavam um desastre".
Ainda segundo o parecer de Calheiros, "esta CPI identifica o Presidente da República Jair Messias Bolsonaro como o responsável máximo por atos e omissões intencionais que submeteram os indígenas a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição dessa parte da população, que configuram atos de extermínio, além de privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa, que configura atos de perseguição".
Segundo o professor Marcos Zilli, essas acusações, caso sejam realmente apresentadas pela CPI ao TPI, passarão por um longo processo de análise e não necessariamente vão gerar investigações internacionais contra o presidente brasileiro.
Todas as representações criminais feitas ao TPI são analisadas pela Procuradoria da Corte, órgão responsável por realizar investigações de forma independente. Um filtro inicial da procuradoria descarta casos em que os crimes denunciados claramente não são de competência do Tribunal.
Se a representação passar dessa etapa, ela é submetida a um exame preliminar, em que a Procuradoria avalia a presença dos elementos necessários à instauração de uma investigação formal. Nesse momento, é analisado, por exemplo, a gravidade dos crimes apontados na representação e se há omissão da Justiça nacional em apurar esses delitos.
"A experiência que nós temos no Tribunal Penal Internacional revelam que os casos demandam muitos anos de investigação, caso uma investigação seja instaurada, e muitos anos de processo também, caso o processo seja aberto", explica Zilli.
Na sua avaliação, a acusação envolvendo populações indígenas é a que teria mais potencial de prosperar no TPI, devido ao contexto mais amplo de ações da gestão Bolsonaro relacionadas a esses povos, como a redução da proteção aos seus territórios e falas recorrentes do presidente defendendo a exploração econômica das terras indígenas.
O TPI, inclusive, já recebeu algumas acusações contra Bolsonaro, envolvendo tanto os povos indígenas como a conduta na pandemia. Por enquanto, apenas uma relacionada aos indígenas, apresentada em 2019, avançou para a etapa de análise preliminar pela procuradoria.
Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59057279
Em sua manifestação, Aras defende posse de terra para etnia Xokleng
Procurador-geral da República defendeu o exame da matéria caso a caso. O julgamento prosseguirá na próxima quarta-feira (8)
O procurador-geral da República, Augusto Aras, foi o último a se manifestar, nesta quinta-feira (2), no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365. Após as sustentações orais de 39 representantes das partes, da Advocacia-Geral da União, das entidades admitidas no processo e da Procuradoria-Geral da República, a discussão sobre a definição do estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena e do chamado marco temporal (desde quando essa ocupação deverá prevalecer) será retomado na próxima quarta-feira (8), com o voto do relator, ministro Edson Fachin.
Na sua manifestação, Aras se posicionou em favor do provimento do recurso, a fim de assegurar a posse da etnia Xokleng sobre a área indígena disputada. Aras concorda com o afastamento do marco temporal quando se verificar, de maneira evidente, que houve apossamento ilícito da terra dos índios, como avalia ser o caso.
Ele sustentou que, mesmo não havendo posse por parte dos índios em 5/10/1988, data da promulgação da Constituição Federal, a terra poderá ser considerada como tradicionalmente ocupada por eles. “Em alguns casos, os índios só não estavam na posse da terra exatamente porque haviam sido expulsos em disputas possessórias e conflitos agrários”, afirmou. “Nestes casos, não seria justo exigir o contato físico com a terra daqueles que foram removidos por invasores e lutavam para reconquistá-la”.
Segundo o procurador-geral, a Corte Interamericana de Direitos Humanos reafirmou que a aplicação da tese do marco temporal contradiz as normas internacionais de direitos humanos porque não leva em consideração os casos em que os povos indígenas foram deslocados à força de suas terras, muitas vezes com violência, razão pela qual não estariam ocupando seus territórios em 1988. “Daí a importância de se admitir o esbulho como exceção ao marco temporal”, salientou.
Em razão da segurança jurídica, o procurador-geral ressaltou que a identificação e a delimitação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios deve ser feita, a cada caso, mediante a aplicação da norma constitucional vigente a seu tempo. Ele propôs fixação de tese de repercussão geral para definir que o artigo 231 da Constituição Federal impõe o dever estatal de proteção dos direitos das comunidades indígenas antes mesmo da conclusão do processo demarcatório, tendo em vista sua natureza declaratória.
Fonte: STF/Secom
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=472341&ori=1
Recondução de Aras foi aprovada pela direita, pelo centro e pela esquerda
Competição é dura, mas PGR foi a instituição que menos funcionou no Brasil de Bolsonaro
Celso Rocha de Brarros / Folha de S. Paulo
Na semana passada, o Senado aprovou a recondução de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República. A recondução de Aras foi aprovada pela direita, pelo centro e pela esquerda. Não teve terceira via, não teve nem segunda: foi uma consagração.
Para quem não se lembra, o PGR é o sujeito que poderia ter processado Bolsonaro pelo assassinato de centenas de milhares de brasileiros, mas não o fez; poderia ter processado Bolsonaro por suas ameaças reiteradas à democracia, mas não o fez. A competição é dura, mas a PGR foi, com certa vantagem, a instituição que menos funcionou no Brasil de Bolsonaro.
A CPI da Covid existe porque Augusto Aras não denunciou Bolsonaro enquanto havia tempo de salvar vidas. O número de brasileiros mortos durante a pandemia não seria, em hipótese alguma, 570 mil sem a contribuição de Augusto Aras. Alguns milhares destes cadáveres são seus, Augusto, é com você que alguns milhares de viúvas e órfãos têm que reclamar. Você só tem menos brasileiros mortos nas costas do que Jair Bolsonaro e Osmar Terra.
Esse golpe marcado para 7 de setembro também está na sua conta, Augusto. Se Bolsonaro tivesse medo de você, como teria se você tivesse cumprido a Constituição e lhe dado motivos para tanto, esse golpismo todo teria morrido no primeiro semestre de 2020. Mas você não fez nada, fez, Augusto? E agora a República está parada esperando para contar quantos PMs vão aderir ao golpe no dia 7.
Nada disso pesou na decisão do Senado, nem os que já morreram na pandemia nem os que podem morrer em caso de golpe. O que pesou foi que Aras não “criminalizou a política”. Cumprindo ordens de Bolsonaro, Aras matou a Lava Jato.
Por não ter “criminalizado a política”, Augusto Aras recebeu do Senado o direito de não criminalizar o assassinato em massa de brasileiros, o roubo de vacina ou a conspiração contra a democracia. Na verdade, a única coisa que Aras mostrou-se disposto a criminalizar foi o professor Conrado Hübner Mendes, que vinha denunciando todos esses crimes e vem sendo vítima de perseguição sistemática pelo PGR.
Em um artigo publicado no site Poder 360 no último dia 23, o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, defendeu a recondução de Aras porque o PGR matou a Lava Jato, “que pariu e embalou esse governo nazifascista”.
Kakay, não há dúvida de que a Lava jato de Curitiba ajudou a eleger Bolsonaro, mas quem matou a operação foi o governo nazifascista a quem Aras serviu 100% do tempo. Foi o fim da Lava Jato que comprou o não impeachment de 2020. O cadáver da Lava Jato foi o que Bolsonaro entregou ao sistema político em troca de não ser preso enquanto matava, roubava vacina e perseguia opositores.
Não estou discutindo que a Lava Jato cometeu erros gravíssimos, em especial no julgamento de Lula. Estou inteiramente conformado em aceitar a liderança da velha política no enfrentamento de Bolsonaro. Mas, se o antilavajatismo começar a absolver fascistas, ele serve para quê?
O mais triste é saber que a recondução aconteceu poucas semanas antes das manifestações golpistas convocadas para 7 de setembro. Espero que, se a ofensiva fascista de Bolsonaro ganhar força, apareça alguém para defender a democracia. Na sessão do Senado que reconduziu Aras, não apareceu ninguém.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/celso-rocha-de-barros/2021/08/reconducao-de-aras-foi-aprovada-pela-direita-pelo-centro-e-pela-esquerda.shtml
Senado aprova recondução de Augusto Aras à PGR para o próximo biênio
Após 6 horas de sabatina, procurador-geral da República teve o nome aprovado por 55 votos a favor, 10 contrários e uma abstenção
Marcelo Montanini / Metrópoles
O plenário do Senado Federal aprovou, nesta terça-feira (24/8), por 55 votos a favor, 10 contrários e uma abstenção, a recondução do procurador-geral da República, Augusto Aras, ao cargo para o próximo biênio (2022-2023). O primeiro mandato do procurador-geral termina no próximo mês.
Para ser aprovado, Aras precisava de maioria absoluta – ou seja, ao menos 41 votos favoráveis dos 81 senadores. Agora, o Senado enviará um comunicado ao presidente da República para que assine a nomeação.
Após 6 horas de sabatina, o nome de Aras foi aprovado, na tarde desta terça-feira, por 21 votos a 6, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa Alta.
O PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA AUGUSTO ARAS
Na ocasião, o procurador-geral respondeu a perguntas sobre: CPI da Covid-19, possíveis omissões dele em relação aos atos do presidente Jair Bolsonaro, Operação Lava Jato, prisões do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) e do presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, entre outros assuntos.
Aras foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro fora da lista tríplice da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR) para ser reconduzido ao cargo de procurador-geral da República, com mandato para o biênio 2021-2023. Ele ocupa o posto desde setembro de 2019.
Perfil
Nascido em Salvador, na Bahia, Antônio Augusto Brandão de Aras, de 62 anos, é doutor em direito constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, mestre em direito econômico pela Universidade Federal da Bahia e bacharel em direito pela Universidade Católica de Salvador. Aras ingressou no Ministério Público em 1987.
Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/senado-aprova-reconducao-de-augusto-aras-a-pgr-para-o-proximo-bienio
Por 21 a 6, CCJ do Senado aprova recondução de Aras à frente da PGR
Nome de Augusto Aras, atual procurador-geral da República, ainda precisa ser validado pelo plenário
Julia Lindner e Paulo Cappelli / O Globo
BRASÍLIA - Por 21 votos a seis, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou nesta terça-feira a recondução do procurador-geral da República, Augusto Aras, para um novo mandato. Durante a sabatina, que durou cerca de seis horas, ele criticou a Operação Lava-Jato e defendeu o Supremo Tribunal Federal (STF) de críticas relacionadas ao inquérito das Fake News. O nome do procurador ainda precisa ser apreciado em plenário, o que deve acontecer ainda nesta terça-feira, em regime de urgência.
Na sessão da CCJ, Aras também fez uma série de acenos aos parlamentares, que serão responsáveis por sua recondução ao cargo. Em referência ao seu antecessor, Rodrigo Janot, o atual procurador disse que "poderia distribuir flechadas, criminalizando a política", mas não o fez.
O PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA AUGUSTO ARAS
Sabatina na CCJ: Colunistas do GLOBO analisam sabatina de Augusto Aras no Senado
Aras foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para permanecer no posto até setembro de 2023. Durante a sabatina, ele buscou rebater críticas de suposta omissão em relação ao governo. O procurador-geral afirmou que adotou as medidas cabíveis para apurar uma possível tentativa de interferência de Bolsonaro na PF, além de apurações envolvendo ministros da Educação, da Saúde e do Meio Ambiente.
Ele reforçou, ainda, que o Ministério Público "não é de governo nem de oposição", e sim um órgão constitucional.
— Posso citar decisões que não foram concordes com o governo, mas com a Constituição. A manifestação do PGR foi pela obrigatoriedade das vacinas. Foi pela constitucionalidade do inquérito das fake news. Este procurador-geral da República também requereu o inquérito dos atos antidemocráticos e manteve esse inquérito na via da primeira instância porque não foram constatadas ações de parlamentares nos atos referentes a organizações e financiamento. Isso não significa dizer que num futuro próximo parlamentares ou pessoas com prerrogativa de foro não venham a ser investigadas — disse.
Ao ser indagado sobre um eventual alinhamento com Bolsonaro, Aras respondeu que não cabe a ele ser "censor" de autoridades, mas sim agir de forma técnica como "fiscal das condutas que exorbitem a legalidade".
— O procurador já demonstrou que se tivesse alinhamento, o único alinhamento é com esta Carta (Constituição). Já demonstrou que contraria, sim, posicionamentos de governos, mas também este procurador não é procurador da oposição.
Leia: Governistas aumentam pressão sobre Alcolumbre por andamento de indicação de André Mendonça ao STF
O procurador também declarou que não permitiu que o Ministério Público "quisesse se substituir ao Legislativo, ao Judiciário ou ao Executivo" e defendeu a separação dos Poderes:
— Cumprir a Constituição é compreender a separação dos Poderes, é poder saber que o dever de fiscalizar condutas ilícitas não dá aos membros do Ministério Público nenhum poder inerente aos poderes constituídos, harmônicos e independentes entre si.
'Houve ameaças reais aos Ministros do Supremo'
Aras também saiu em defesa do Supremo Tribunal Federal (STF) e disse que "houve ameaças reais" a ministros da Corte nos casos das prisões do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) e do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB). De acordo com ele, "a ameaça direta e frontal já não poderia ser ignorada" nas situações mencionadas, pois a liberdade de expressão não estaria contemplada propriamente na fake news.
— No momento posterior da prisão, tanto do Daniel Silveira, quanto do Roberto Jefferson, houve ameaças reais aos Ministros do Supremo, de maneira que, se, em um primeiro momento, a liberdade de expressão era o bem jurídico constitucional tutelado mais poderoso que existe dentro da nossa Constituição e da Constituição americana, que é o primeiro dos princípios. Em um segundo momento, já se abandonou a ideia da liberdade de expressão para configurar uma grave ameaça — disse.
CPI
Questionado sobre qual será a sua postura em relação ao relatório final da CPI da Covid, Aras evitou entrar no mérito da decisão. Ele se limitou a dizer que pretende agir de acordo com a Constituição e dentro do prazo legal. Segundo ele, cabe ao procurador-geral se manifestar "em respeito às leis".
— Tenham certeza que o PGR, qualquer que seja ele, à época do recebimento do relatório, já terá uma equipe estudando todos os elementos coligidos. E assim será muito mais fácil em 30 dias examinar as milhares de páginas que hoje já compõem a CPI.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/reconducao-de-aras-pgr-aprovada-pela-ccj-do-senado-25168810
Comissão do Senado sabatina Augusto Aras para recondução à PGR
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado sabatina nesta terça-feira (24) o procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado por Jair Bolsonaro para mais dois anos à frente da PGR.
O processo acontece em meio a uma crise institucional provocada por falas golpistas do presidente.
O relator da recondução, Eduardo Braga (MDB-AM), divulgou parecer favorável à permanência do PGR no cargo.
Aras é alvo constante de críticas por seu alinhamento a posições de Bolsonaro.
Assista!
Fonte: Folha de S. Paulo
https://aovivo.folha.uol.com.br/poder/2021/08/24/6049-comissao-do-senado-sabatina-augusto-aras-para-reconducao-a-pgr.shtml
Votação de Aras é com Bolsonaro no ataque, variante Delta e economia piorando
Sabatina, marcada para a próxima terça-feira, 24, atirará o procurador geral da República numa fogueira
Eliane Cantanhêde / O Estado de S. Paulo
O Senado marcou para a próxima terça-feira (24/08) a sabatina do procurador geral da República, Augusto Aras, atropelado para uma vaga no Supremo e indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para um segundo mandato na PGR. Muito bem. E daí? Daí que Aras será atirado numa fogueira, com Bolsonaro jogando álcool de um lado, o Supremo de outro e a CPI da Covid abanando as labaredas.
Numa conversa um tanto enviesada, ontem, com a cúpula da CPI da Covid, que é de oposição, Aras deixou no ar um toma-lá-dá-cá: se for reconduzido para a PGR pelo Senado, ele dará seguimento às conclusões do relatório final da CPI que, como todo mundo sabe, será duríssimo com Bolsonaro. Os senadores Omar Aziz, presidente, e Renan Calheiros, relator, ficaram animados com o aceno de Aras. Randolfe Rodrigues, o vice, nem tanto.
Contra Aras há a acusação da oposição, do STF, dos próprios procuradores e de boa parte da opinião pública de que ele, enquanto PGR, age como advogado de defesa do presidente. A favor, há o fato de que batalhou contra a Lava Jato, que tanto ameaçava os políticos, inclusive senadores que irão sabatinálo na Comissão de Constituição e Justiça e votar a sua recondução no plenário. Ele precisa de 41 dos 81 votos. Os ex-alvos da Lava Jato vão retribuir?
Aras tem também a seu favor o histórico do Senado, que nunca, ou quase nunca, derruba indicações de presidentes para PGR, Supremo ou embaixadas. Jair Bolsonaro, porém, é o presidente do atrito, do confronto, da guerra. Cria e alimenta a tensão entre as instituições e quem paga o pato são seus indicados. Que o diga o ex-ministro da Justiça e ex-AGU André Mendonça, indicado para uma vaga no STF (que Aras, aliás, almejava).
A sabatina de Aras será uma semana depois de os senadores e delegados Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Fabiano Contarato (Rede-ES) entrarem com denúncia-crime contra ele por omissão diante das atitudes e erros de Bolsonaro na pandemia. Depois, também, de 29 subprocuradores cobrarem que Aras reaja “enfaticamente” aos “estarrecedores ataques” ao Supremo e ao TSE.
O autor desses ataques estarrecedores, aqui sem aspas, é Bolsonaro, que ameaça a realização das eleições, xinga ministros e insiste em pedir o impeachment de Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. Logo, deixa falando sozinhos, e fazendo papel de bobos, o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que se arvoram bombeiros.
O que eles prometeram ao presidente do STF, Luiz Fux? Restabelecer o “diálogo institucional”? Remarcar a reunião de presidentes dos três Poderes? Faltou combinar com o adversário do diálogo. No dia seguinte, Bolsonaro continuava atacando os ministros.
Foi nesse clima que a subprocuradora Lindôra Araújo descartou investigar Bolsonaro por não usar máscaras. Braço direito de Aras, contra a Lava Jato e principal bolsonarista da PGR, ela argumentou que “não é possível comprovar a medida exata da eficácia das máscaras”. Deveria dizer isso para OMS, Alemanha, França, EUA, Chile, Japão, China... Ou seja, para todo o mundo desenvolvido.
E Bolsonaro não é um cidadão qualquer, é o presidente e precisa dar o exemplo, adotar as boas práticas, trabalhar contra e não a favor do vírus. Apesar disso, são muitas e irritantes as suas imagens em aglomerações sem máscara e nenhuma se compara àquela em que ele retira a máscara de uma criança na rua. Espantosa.
Assim, a sabatina e a votação de Aras no Senado não vão ser só para cumprir tabela, mais uma burocracia. Estarão no ar as faíscas e a fumaça da fogueira institucional, com Bolsonaro e Supremo mantendo o fogo alto e o Congresso dividido. Enquanto isso, a variante Delta espreita e as previsões da economia só pioram. O Brasil em chamas.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,votacao-de-aras-e-com-bolsonaro-no-ataque-variante-delta-chegando-e-economia-piorando,70003816171
Conrado Hübner Mendes: Augusto Aras não é Geraldo Brindeiro
Seu dadaísmo jurídico, em vez de protestar contra a brutalidade, chancela Bolsonaro
Conrado Hübner Mendes / Folha de S. Paulo
Augusto Aras está para Geraldo Brindeiro como Jair Bolsonaro está para Fernando Henrique Cardoso. Mas essa síntese não é suficiente para expressar a magnitude do equívoco dessa comparação apressada, incompleta e benevolente.
Brindeiro foi PGR pelos oito anos do governo FHC e se celebrizou como engavetador-geral da República. Não sem razão. Dizia examinar as representações que lhe chegavam "com a cautela que a matéria requer". Costumavam terminar mesmo na gaveta.
Por pressão de FHC, recuou e não pediu intervenção federal no Espírito Santo pelo colapso de segurança pública. Miguel Reale Jr., então ministro, demitiu-se por isso. Sua apuração sobre compra de votos para emenda da reeleição (a "pasta rosa") e os casos contra autoridades do governo também ilustram sua deferência.
Não foi pouco. Apesar disso, Brindeiro nunca foi inimigo do Ministério Público, nunca lutou contra a instituição a pretexto de combater o "facciosismo"; nunca perseguiu ou desqualificou colegas de MP, nunca saiu em defesa gratuita e performática do presidente, nunca disputou publicamente corrida ao STF. Nunca perseguiu críticos do presidente e de si próprio. E não tinha sobre sua mesa a delinquência de Bolsonaro.
O Senado, prestes a reconduzir o PGR para novo mandato, precisa de um balanço que faça justiça a Aras. Um balanço que não o diminua. A omissão de Aras, diferentemente da de Brindeiro, requer muito trabalho (como descrevi em outra coluna). Seu primeiro mandato foi uma enormidade.
AUGUSTO ARAS E BOLSONARO
Esses dois anos de gestão foram dedicados a três tarefas principais: garantir tranquilidade ao bolsonarismo; implodir a Lava Jato sem fazer as distinções que importam (entre Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo; entre combate à corrupção e a corrupção do combate à corrupção); conflagrar e definhar o MPF.
A primeira tarefa exerceu de forma tão espalhafatosa que resultou em inéditos escrachos públicos por ministros do STF, solicitando que faça algo, cumpra prazos; e culminou em duas representações por crime de prevaricação feitas por ex-subprocuradores e senadores.
A segunda, ao generalizar os graves vícios da Lava Jato de Curitiba para as forças-tarefas de São Paulo e Rio de Janeiro, bloqueou, abruptamente, avanços contra a corrupção. A cúpula dos governos de SP e RJ respirou aliviada. Aproveitou a onda e desmontou a Força Tarefa da Amazônia. À arbitrariedade do lavajatismo respondeu com mais arbitrariedade.
A terceira tarefa é extensa. Mas pode ser ilustrada pelas muitas manchetes que narram a guerra interna. Como esta: "Corregedora da PGR aponta manobra de Aras para blindar aliados e perseguir adversários". E esta: "Subprocuradores querem que MPF oficie MEC por censura a manifestação política".
Quando se defende das críticas, Aras surfa na hermenêutica declaratória. Autoafirmação é seu critério de legalidade. Vale qualquer coisa que saia de sua boca ou caneta: "existe alinhamento à Constituição", "vou me manifestar dentro do quadrado constitucional".
Vende silogismo jurídico e entrega dadaísmo. A premissa maior: o PGR deve obedecer a Constituição. A premissa menor: eu sou o PGR. A conclusão: Portanto, eu obedeço a Constituição. Inferências produzidas por fluxo de consciência, onde a lógica não entra.
Faz um dadaísmo troncho, para ficar claro. Abraça a contradição, recusa a racionalidade e se deleita com a sonoridade das palavras, mas ignora a parte do dadaísmo que combate a violência. Em vez do protesto contra a brutalidade, chancela Bolsonaro.
Esse dadaísmo também produz nonsenses ridículos. Diz, por exemplo, que Roberto Jefferson tem liberdade de expressão para incitar e ameaçar, mas cidadão não tem pra criticá-lo. Seu tratado sobre a liberdade nem precisa ser escrito, pois se resume à fórmula "acho que sim, acho que não". A fórmula não é lotérica nem jurídica. E nada ingênua.
Dia desses, citou em live corporativa o conceito de "sociedade aberta dos intérpretes da Constituição", de Peter Häberle. Concluiu que o MP não combina com eleições internas e listas tríplices, mas com mérito. Afora o palavrório, parecia crer que Bolsonaro o nomeou por mérito. A meritocracia bolsonarista, lembre-se, deixa brasileiro morrer sem vacina e oxigênio.
Brindeiro só não fazia. Era grave. Aras faz muito. É incomparável.
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e embaixador científico da Fundação Alexander von Humboldt.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/conrado-hubner-mendes/2021/08/augusto-aras-nao-e-geraldo-brindeiro.shtml
Aras desqualifica críticos e nega omissão diante de ataques de Bolsonaro
Procurador-geral se contrapõe ao presidente e faz defesa pública do sistema brasileiro de votação
Marcelo Rocha e Matheus Teixeira / Folha de S. Paulo
O procurador-geral da República, Augusto Aras, se contrapõe ao chefe do Executivo e faz uma defesa pública do sistema brasileiro de votação pela primeira vez desde que o presidente Jair Bolsonaro passou a insistir nos ataques às urnas eletrônicas e encampou o voto impresso como sua principal bandeira.
Em entrevista à Folha nesta quarta-feira (18), Aras demonstrou incômodo ao ser indagado sobre sua atuação à frente da Procuradoria-Geral da República e refutou a tese de que tem sido omisso em relação a Bolsonaro. "Não houve em nenhum momento nenhuma omissão do procurador-geral da República", afirma.O chefe do Ministério Público Federal disse que atenderia a Folha às 14h30 na PGR e, em seguida, teria compromisso às 15h. Eram quase 14h50 quando a entrevista começou. Aras encerrou a conversa após 13 minutos, sob a alegação de que tinha agenda a cumprir.
Ao final, questionado sobre como quer que seu nome entre na história, disse para conferir o seu currículo na plataforma Lattes e partiu sem se despedir.
A conversa ocorreu horas depois de os senadores Fabiano Contarato (Rede-ES) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apresentarem ao STF (Supremo Tribunal Federal) uma notícia-crime contra Aras para que ele seja investigado por prevaricação.Segundo Aras, a PGR nunca encontrou provas de fraude nas urnas e ainda atestou a legitimidade de todas as eleições. "O procurador-geral da República participou, na minha gestão em especial, de todos os atos pertinentes às eleições, legitimando as eleições", disse.
Para rebater as afirmações de que não age em relação às ameaças golpistas e aos ataques de Bolsonaro à Justiça Eleitoral e a ministros do Supremo, ele afirmou que as críticas vêm de pessoas que não conhecem as leis e que ele só pode se manifestar juridicamente.
"A diferença que pode estar surpreendendo o jornalismo é um procurador que não aceita fazer política, é um procurador que tem o compromisso de cumprir a Constituição e as leis."
O presidente Jair Bolsonaro tem afirmado que houve fraude nas últimas eleições e que também pode haver irregularidades no pleito de 2022. A PGR sempre liderou a defesa das urnas eletrônicas, mas o senhor tem evitado o assunto. O sistema de votação brasileiro é confiável ou pode ser fraudado? Todas as minhas respostas serão dadas juridicamente, já que não me é dado participar de discurso político.
Juridicamente, o procurador-geral da República participou, na minha gestão em especial, de todos os atos pertinentes às eleições, legitimando as eleições, todas elas, inclusive com a minha pessoa, eu presente fisicamente a todos os atos com o ministro [Luís Roberto] Barroso.
Não há nenhuma prova do Ministério Público Eleitoral e, lá no TSE [Tribunal Superior Eleitoral], tem um vice-procurador-geral eleitoral que, por força de lei, é delegado pelo procurador-geral da República, fala em nome do procurador-geral da República, representa o procurador-geral da República. E esse vice-procurador, doutor Renato Brill de Góes, se manifestou em todos os instantes a favor do sistema de votação.
Então, do ponto de vista do Ministério Público Eleitoral, representado pelo procurador-geral da República, cujo cargo monocrático tem todos esses subprocuradores-gerais da República atuando em seu nome, se manifestou à sociedade positivamente ao sistema eleitoral.
Ademais, em relação ao mais recente projeto [proposta de emenda à Constituição do voto impresso], que foi rejeitado, como PGR, aí, sim, eu pessoalmente disse que esse assunto seria superado, como foi, com a afetação pelo plenário da Câmara. Dessa forma, não houve em nenhum momento nenhuma omissão do procurador-geral da República.
Ou seja, a PGR representada pelos subprocuradores-gerais da República, que são aproximadamente entre 20 e 30 que atuam na minha gestão e por força da lei complementar 7.593 falam em nome da Procuradoria-Geral da República, dessa forma, o procurador-geral da República se manifestou em todas as etapas.
Mas o sr. tem sido criticado no Congresso e também internamente por não tocar no assunto nem defender as urnas de maneira clara. Na verdade, tenho sido criticado por pessoas que não querem ler a lei complementar 7.593. Quando o vice-procurador-geral eleitoral se manifesta, quem está se manifestando é o procurador-geral da República, até porque ele age com independência funcional e, agindo com independência funcional, o procurador-geral não interfere.
O sr. considera saudável para a relação entre os Poderes e para a vida institucional do país o presidente Jair Bolsonaro ter anunciado que pedirá o impeachment de dois ministros do STF? Escrevi um artigo na Folha intitulado "O máximo do direito, o máximo da injustiça", para dizer que o PGR não é um agente político no sentido partidário. E assim tenho me comportado.
Eu tenho o dever de velar pela norma, pelo cumprimento da Constituição e das leis.
Todas as vezes que o procurador-geral da República sai do campo do direito para entrar no campo da política, a tendência é a criminalização da política. E isso ocorre de forma simples. A linguagem da política é a linguagem do diálogo permanente, da integração, da busca pelo consenso social numa democracia.
Quando o procurador-geral age ou um juiz age, age para cumprimento da lei. E nesse cumprimento da lei não existe esta situação, salvo quando autorizada por lei, de negociação, de articulação, de busca pelo consenso social mediante concessões recíprocas.
De regra existe sim um direito moderno em busca de equilíbrio de partes que estão em conflito. Mas de regra existe submissão do sujeito aos termos da lei, de maneira que, se o procurador-geral da República sai de seu lugar para fazer política, para se manifestar, como o senhor sugere, da política do Legislativo ou do Executivo ou de quem quer que seja, ele sai do discurso jurídico.
E passa a ser até um discurso desigual, porque ele tem a norma e, tendo a norma, o argumento que vai prevalecer é de uma autoridade que não é uma opinião política, é opinião da norma, e isso é até desigual no campo da política. Por isso que tem espaço público delimitado na Constituição para cada instituição.
Se há posicionamento da Procuradoria do ponto de vista da confiabilidade do sistema, cabe alguma providência da Procuradoria em relação às afirmações do presidente da República levantando dúvidas e lançando suspeitas sobre o funcionamento das urnas eletrônicas? O vice-procurador-geral eleitoral na época se manifestou em todos os procedimentos que ali tramitaram sempre em favor do sistema de votação da urna eletrônica.
E o atual vice-procurador-geral eleitoral, que acabou de assumir e que tem também plena independência funcional, abriu procedimento para acompanhar os trabalhos que o ministro Barroso já abriu de auditoria e de ampla abertura de fiscalização também pelo Ministério Público, facultando que técnicos, partidos e MP participem do processo.
A diferença que pode estar surpreendendo o jornalismo é um procurador que não aceita fazer política, é um procurador que tem compromisso em cumprir a Constituição e as leis.
AUGUSTO ARAS E BOLSONARO
Ministros do STF tomaram diversas decisões importantes, como no caso do ex-ministro Ricardo Salles e do ex-deputado Roberto Jefferson, sem ouvir a Procuradoria. O sr. acha que isso enfraquece o sistema de Justiça? O sr. se sente desrespeitado pelo STF? Não, pelo contrário. O diálogo é permanente com o Supremo, o diálogo com cada ministro é permanente, não há nenhuma dificuldade no relacionamento.
O que há é um entendimento em que eu respeito o entendimento da Suprema Corte. A Suprema Corte eu creio que, embora divirja do meu, também me respeita, e assim as instituições devem se movimentar. A dinâmica das instituições é essa, é de respeito à divergência.
A propósito, temos no CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público] um programa que é único no Brasil, respeito e diversidade, é um programa exatamente para que tenhamos maior tolerância, uma maior abertura para a divergência para dirimir e reduzir os conflitos, e esse programa é sucesso absoluto.
O sr. se manifestou ao Supremo em relação a prazos. O posicionamento do sr. em relação ao não uso de máscara pelo presidente da República é decorrente de um caso que foi enviado para análise da Procuradoria no mês de maio. Estou achando ótima essa sua pergunta. Primeiro, você está fazendo uma pergunta [sobre algo] que não fui eu. É preciso registrar que, talvez, 90% ou mais das matérias [jornalísticas] que saem com Aras não foi Aras. Foi um colega que tem independência funcional, foi um colega que age e responde pelos seus atos, pelos seus pensamentos.
Eventualmente, eu posso até reconsiderar a decisão de um colega, mas nem sempre vou poder fazê-lo. Eu posso muito mas não posso tudo.
Então, de certa forma, é preciso dizer o seguinte: eu preciso respeitar o espaço de cada colega, do primeiro ao último grau. O último grau é ser subprocurador-geral da República.
Mas o sr. se ancorar no Renato Brill e outros vice-procuradores-gerais da República em relação às urnas e não se vincular ao que a subprocuradora Lindôra Araújo falou em relação ao não uso de máscara facial pelo presidente da República.... Não teria aí alguma contradição? Não precisa ter contradição. Ela tem autonomia, tem independência funcional.
Eu posso dizer que eu tenho que respeitar a independência funcional de uma jovem procuradora ou de um jovem procurador em qualquer rincão do Brasil e devo não respeitar a posição de um subprocurador-geral?
Subprocurador é aquele que alcança o mais alto nível da carreira. A independência que vale para o mais simples vale para aquele que está no topo da pirâmide. E este procurador-geral da República respeita a independência funcional.
Vários estudos comprovaram a eficácia da máscara para evitar a propagação da Covid-19. O sr. não acha que colocar em xeque o equipamento a esta altura... A Procuradoria-Geral da República, seja através do procurador-geral, mas principalmente através de seus membros —é importante [dizer] que foram muitos membros, não [somente] o Augusto Aras, vários membros—, já se manifestaram à sociedade sobre essas questões. De maneira que, até pela grande produção de peças processuais, eu não preciso me manifestar sobre manifestação de colega.
Sobre o colunista da Folha Conrado Hubner Mendes. Não tenho o que me manifestar. A Justiça tem grau de jurisdição. Existe sempre recurso, né?
Do mesmo jeito que a Folha deu uma matéria em favor de um colunista seu [do jornal], tem jornalista que também teve queixa-crime recebida e é preciso que também, fora desta casa, não tenha espírito de corpo.
O sr. defendeu a liberdade de expressão quando se manifestou sobre o caso Roberto Jefferson. Não haveria uma contradição em relação a Conrado? Em hipótese alguma. Há uma diferença entre liberdade de expressão e crítica. Criticar e fundamentar a crítica.
Se eu disser que o fulano de tal é feio, a não ser que eu seja um artista, um fotógrafo, alguém com padrão estético profissional, é uma coisa subjetiva.
A crítica é amplamente admitida e se revela até no fato de que, sendo destinatário de uma campanha contra a minha recondução na imprensa, eu nunca processei jornalista por crítica fundamentada.
Agora, quando o indivíduo atinge a minha honra fora do meu cargo, aí o assunto não é mais de crítica. Crítica tem de ser fundamentada. Eu queria saber da população brasileira, se isso fosse possível, tecnicamente qual foi a decisão errada. Porque se alguém diz que o procurador-geral da República errou, tem de dizer assim: "O Supremo também errou", né? O Supremo acolheu todas as manifestações.
Como o sr. sonha que sua biografia entre para a história? Abra meu Lattes. Tem lá uma biografia de 400 palestras, livros, artigos.
RAIO-X
Antônio Augusto Brandão de Aras, 62
Ingressou na carreira do Ministério Público Federal em 1987. Entre outros postos, foi procurador regional eleitoral na Bahia e coordenador da Câmara do Consumidor e Ordem Econômica do MPF. Atuou em matéria penal perante o Superior Tribunal de Justiça. Desde setembro de 2019, é procurador-geral da República. Foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro à recondução para mais dois anos de mandato. Aras é doutor em direito constitucional pela PUC de São Paulo e mestre em direito econômico pela Universidade Federal da Bahia.
ANTECESSORES DE ARAS NO POSTO NOS ÚLTIMOS ANOS
- Geraldo Brindeiro (1995-2003)
- Cláudio Fonteles (2003-2005)
- Antonio Fernando Souza (2005-2009)
- Roberto Gurgel (2009-2013)
- Rodrigo Janot (2013-2017)
- Raquel Dodge (2017-2019)
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/aras-desqualifica-criticos-nega-omissao-diante-de-ataques-de-bolsonaro-e-diz-que-nao-aceita-fazer-politica-na-pgr.shtml
Parlamentares estudam apresentar representações contra Lindôra Araújo
Senadores e procuradores reagem a parecer negacionista de aliada de Aras em defesa de Bolsonaro
Raquel Lopes , Marcelo Rocha , Renato Machado , Washington Luiz e Julia Chaib / Folha de S. Paulo
Procuradores e senadores reagiram ao parecer negacionista publicado pela subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo no qual ela questiona a eficácia de uso de máscaras contra Covid-19, contrariando pesquisas que apontam a efetividade da proteção.
Em uma frente, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, anunciou nesta quarta-feira (18) que ele e outros parlamentares vão enviar representação contra a procuradora no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).
Em outra, os próprios pares de Lindôra, subprocuradores, estudam providências a serem tomadas. Uma opção é também apresentar uma representação, mas ao Conselho Superior do MPF.
As reações ocorrem após a PGR (Procuradoria-Geral da República) enviar manifestação ao STF (Supremo Tribunal Federal) na qual põe em xeque a eficácia do uso de máscara e afirma que não vê crime na conduta do presidente Jair Bolsonaro de não usar a proteção e promover aglomerações.
Segundo a Procuradoria, desrespeitar leis e decretos que obrigam o uso de máscara em local público é passível de sanção administrativa, mas não tem gravidade suficiente para ensejar punição penal.
O parecer é assinado por Lindôra, uma das pessoas mais próximas do procurador-geral, Augusto Aras, e foi enviado ao Supremo no âmbito das notícias-crime apresentadas pela presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), e por parlamentares do PSOL contra o chefe do Executivo.
Na primeira notícia-crime, Gleisi critica as aglomerações de Bolsonaro e diz que o presidente teria gastado verba pública de maneira indevida para custear a utilização de aeronaves militares e a mobilização de grande aparato de segurança em suas viagens.
Na segunda, o PSOL cita o fato de o chefe do Executivo ter retirado a máscara do rosto de uma criança.A PGR, porém, diz que não há crime de Bolsonaro nesses casos e que “os estudos que existem em torno da eficácia da máscara de proteção são somente observacionais e epidemiológicos”.
O texto de Lindôra foi visto como uma sinalização ao governo. Apesar da rejeição à nota, o clima no Senado ainda é majoritário para aprovar a recondução de Aras, que foi indicado para mais dois anos na chefia do MPF.
Nesta quarta, a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) assumiu a frente para rebater o posicionamento da procuradora e publicou nas redes sociais foto de um homem de máscara acompanhada do texto: "A máscara é uma barreira física que reduz significativamente o risco de contágio por Covid-19. Estudos de todo o mundo já concluíram que, se usada corretamente, o índice de proteção chega a 90%".
Alguns subprocuradores replicaram a mensagem e afirmaram que a posição de Lindôra não representa a opinião do MPF. No órgão, os procuradores estão cautelosos quanto ao envio de uma representação ao Conselho Superior do MPF por temerem o desgaste interno.
Isso porque só nesta semana eles já apresentaram dois processos: um para que Aras investigue Bolsonaro por texto compartilhado no WhatsApp em que o presidente fez menção a “contragolpe” e outro mirando o sertanejo Sérgio Reis.
Durante sessão da CPI da Covid nesta quarta, Randolfe disse que os atos de Bolsonaro são crime gravíssimo. Além disso, afirmou que a decisão de Lindôra contradiz outras tomadas por ela. Ele cita que a subprocuradora-geral da República pediu que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) investigasse o desembargador Eduardo Almeida Prado por aparecer sem máscara em uma praia de Santos (SP).
“Bom faria Vossa Excelência que mantivesse essa conduta correta que fez em relação ao comportamento do desembargador paulista. A decisão ontem da doutora Lindôra contraria totalmente a ciência, contraria as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde), contraria as recomendações da nossa Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), contraria toda a lógica da ciência.”, disse.
Os membros da comissão afirmaram que a PGR atrapalha os esforços de combate à pandemia do novo coronavírus, para tentar proteger o presidente Bolsonaro. “Acho que lamentavelmente a PGR não prestou um bom serviço ao enfrentamento da pandemia. A Procuradoria não pediu parecer específico sobre o uso de máscaras, não acompanhou a literatura existente. E além do mais isso já é lei”, afirmou antes da sessão o senador Humberto Costa (PT-PE).
“É uma decisão que vai gerar conflito, que vai confundir a população e vai dar argumento para as teses negacionistas”, acrescentou.
Apesar das declarações, membros da CPI se reuniram com Aras na noite de terça-feira (17).
Na ocasião, o procurador afirmou ter autonomia para levar adiante eventuais pedidos de providência contra o governo que a comissão venha a pedir. A senadora Simone Tebet (MDB-MS) também criticou a decisão de Lindôra.
"É absurdo que a PGR, que representa o Estado e não o governo, que tinha que estar investigando as autoridades sejam elas quais forem dentro dos limites constitucionais, esteja ali a serviço de um governo e não de um Estado, diante de uma situação em que há interesse coletivo, é um direito difuso do povo brasileiro de proteção sanitária", afirmou.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que acionou o STF para que Aras seja investigado por prevaricação, também criticou o parecer assinado pela subprocuradora.
“A Procuradoria-Geral da República, em vez de proteger a vida e garantir a saúde da coletividade, passa recibo no negacionismo do governo Bolsonaro e nega as medidas sanitárias que a Organização Mundial de Saúde recomendou ao mundo”, publicou em rede social.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/senadores-e-procuradores-reagem-a-parecer-negacionista-de-aliada-de-aras-em-defesa-de-bolsonaro.shtml