ativista
Morre Isabel, aos 62, ícone do vôlei brasileiro e ativista
Mônica Bergamo, Bruno Lucca e Josué Seixas*, Folha de S. Paulo
A jogadora de vôlei Isabel Salgado morreu na madrugada desta quarta-feira (16), aos 62 anos, no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. A ex-atleta foi acometida de uma pneumonia que se agravou, levando a um quadro de síndrome aguda respiratória.
"Confirmamos a partida de uma das atletas mais importantes que este país teve. No momento, a família está reunida, e não teremos nenhuma declaração. Pedimos a compreensão de todos. Isso será feito assim que possível", disse a assessoria.
Ela estava bem até a semana passada, segundo relato de amigos.
Na última segunda-feira (14), Isabel havia sido anunciada pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, como integrante do grupo de trabalho de esporte na transição para o governo Lula.
Isabel Salgado nasceu no Rio de Janeiro, no dia 2 de agosto de 1960. Ela começou a jogar vôlei no Flamengo aos 12 anos e foi campeã brasileira em 1978 e 1980. O destaque no clube a levou à seleção brasileira, e ela logo ganhou espaço no time. Defendeu o Brasil nos Jogos Olímpicos de Moscou (1980) e de Los Angeles (1984) —a primeira equipe da história do país a disputar grandes competições.
Mesmo tendo como medalha mais importante pela seleção um bronze nos Jogos Pan-Americanos de 1979, em San Juan, Isabel marcou história. Ela foi parte importante de uma geração que colocou o vôlei brasileiro no mapa do esporte mundial e abriu o caminho para as atletas que, na sequência, elevariam o país ao topo da modalidade.
Isabel também se notabilizou pelo pioneirismo. Ela foi a primeira jogadora brasileira de vôlei a atuar em uma liga do exterior, em 1980, quando foi para o Modena, da Itália.
A atleta migrou das quadras para a areia em 1992 e foi campeã mundial da etapa de Miami em dupla com Roseli, dois anos depois. A modalidade se popularizou e estreou nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, mas Isabel não competiu. Ela encerrou a carreira em 1997.
Em 2020, juntou-se ao ex-jogador Walter Casagrande Júnior, colunista da Folha, e outros esportistas para formar o movimento Esporte Pela Democracia. Isabel também participou do movimento das Diretas Já, onde conheceu o ex-atleta, quando a filha mais velha, Pilar, ainda era criança.
Em entrevista à Folha, em 2020, disse que "atletas não podem ficar neutros diante de injustiças" e que o posicionamento servia para "mostrar ao governo que também somos cidadãos".
"Vejo um grande avanço entre a classe esportiva. A gente tem, por exemplo, a participação da Democracia Corinthiana na época das Diretas Já, contra a ditadura, na figura do Sócrates, do Casagrande, e de outros que tiveram um papel muito importante. Eu me lembro de participar das Diretas Já com minha filha Pilar, que tinha quatro ou cinco anos, e são lembranças caras demais. O processo para nos tornarmos uma democracia foi muito duro, eu ficava emocionada na anistia de ver as pessoas voltando para o Brasil e reencontrando seus familiares", contou.
Ela é mãe dos atletas Maria Clara Salgado, Carolina Solberg e Pedro Solberg, além de Pilar e de Alisson, que adotou em 2015. Isabel formou dupla com Maria Clara e Carolina. Depois, dedicou-se a fazer parte da gestão das carreiras dos filhos atletas.
Carolina chegou a ser advertida pelo STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) por ter gritado "Fora, Bolsonaro!" em uma entrevista pós-jogo. Ela continua competindo em alto nível, enquanto Maria Clara já se aposentou.
"Tinha uma imagem solar! Uma brava guerreira", declarou a cineasta Helena Solberg, cunhada da ex-atleta, em mensagem enviada à reportagem.
O velório está programado para às 11h desta quinta-feira (17), no Crematório e Cemitério do Caju, no Rio de Janeiro. Às 14h será realizada uma cerimônia reservada a familiares e amigos e, em seguida, o corpo será encaminhado à cremação.
*Texto publicado originalmente na Folha de S. Paulo
Projeção em prédio da ONU em Nova York chama Bolsonaro de 'vergonha brasileira'
Fernanda Mena*, Folha de São Paulo
Horas antes de o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) chegar à sede da ONU em Nova York para o discurso de abertura da 77ª Assembleia-Geral, era possível ver imagens gigantescas suas projetadas na lateral do prédio ladeadas por expressões como "Brazilian shame" (vergonha brasileira).
A intervenção no edifício das Nações Unidas, de 39 andares e 155 metros de altura, foi iniciativa da US Network for Democracy in Brazil (Rede nos Estados Unidos pela Democracia no Brasil), que reúne acadêmicos de mais de 50 universidades americanas, ativistas e organizações da sociedade civil, como a Coalizão Negra por Direitos e a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entre outras.
As imagens projetadas nas primeiras horas desta terça (20) trazem palavras como "vergonha", "desgraça" e "mentira" em quatro das línguas oficiais da ONU —inglês, francês, espanhol e mandarim—, além do português.
"Somos opositores ferrenhos desse governo brasileiro por todas as atrocidades que ele representa", diz Mariana Adams, organizadora nacional do US Network for Democracy in Brazil. "Nossa ação comunica ao mundo que Bolsonaro está apoiado em um sistema de fake news para avançar seu projeto pessoal de poder e de enriquecimento, não um projeto nacional de desenvolvimento do Brasil."
Segundo ela, as aparições internacionais de Bolsonaro "desmantelaram, de maneira sistemática, a imagem do Brasil no exterior, seja pela desastrosa política externa brasileira, seja pelas aparições internacionais que visam benefícios políticos eleitorais".
Exemplo recente, afirma ela, foi a passagem do presidente pelo Reino Unido para participar do funeral da rainha Elizabeth 2ª. Em meio às cerimônias solenes, o brasileiro usou a viagem para fazer campanha eleitoral, discursando a apoiadores.
"A ideia é retomar e subverter o palanque de que ele tem feito as instituições internacionais. Para nós, isso é vergonhoso", diz Adams, que afirma que os integrantes da rede atuam de forma voluntária e não são ligados a partidos políticos ou a ONGs. O grupo coletou fundos para a ação a partir da doação coletiva de seus membros.
Os ativistas elaboraram as combinações de imagens com palavras e contrataram um projetor capaz de lançá-las na empena cega do edifício a cerca de 1 quilômetro de distância.
"No momento em que o Brasil está sendo discutido de maneira tão fervorosa no cenário internacional, queremos que a comunidade internacional e os brasileiros que vivem fora do país não sejam enganados pelas tentativas de legitimação que Bolsonaro faz de seu projeto, que não é de país."
A menos de duas semanas das eleições presidenciais, em um momento em que aparece em segundo lugar nas pesquisas, Bolsonaro passará menos de 24 horas em Nova York. Ele chegou à cidade pouco antes das 20h, no horário local (21h em Brasília), desta segunda (19).
Nesta terça, o presidente abre os discursos da Assembleia-Geral antes de almoçar, em uma churrascaria brasileira, com apoiadores que viajaram em esquema de caravana de outras cidades americanas.
Além da intervenção desta madrugada, os arredores do prédio da ONU —projetado pelo arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer e pelo franco-suíço Le Corbusier e inaugurado em 1952—, podem virar campo de batalha entre bolsonaristas e ativistas, que devem protestar contra a passagem e o discurso de Bolsonaro.
Passagens anteriores de Bolsonaro por Nova York para o evento das Nações Unidas também contaram com intervenções com críticas ao presidente. No ano passado, um caminhão com telões o chamou de criminoso climático.
*Texto publicado originalmente no portal da Folha de São Paulo.
Folha de S. Paulo: Primeira biografia de Sueli Carneiro narra vida de lutas em prol da mulher negra
Obra de Bianca Santana sobre uma das maiores intelectuais brasileiras ganha data de lançamento
A Companhia das Letras marcou o lançamento da primeira grande biografia de Sueli Carneiro, uma das mais importantes ativistas do movimento de mulheres negras no Brasil. “Continuo Preta” sai daqui a um mês, em 11 de maio.
Escrita pela jornalista Bianca Santana, a obra mostra como a vida da intelectual, que é doutora em educação pela Universidade de São Paulo e fundadora do Geledés, o Instituto da Mulher Negra, se confunde com a história da luta contra o racismo e o machismo estrutural no país desde, pelo menos, os anos 1970.
Santana conta que, se dependesse de Carneiro, o livro seria todo sobre o ativismo político e a produção intelectual da época “e não falaria nada sobre ela”. “Além de não ter vaidade, a Sueli preza muito por dizer que tudo é coletivo, que mudanças só acontecem de forma coletiva, e que uma visão personalista reforçaria uma perspectiva neoliberal que não nos interessa.”
Em tom de brincadeira, Carneiro definia sua vida à biógrafa da seguinte forma —“entre uma luta e outra, eu comia um pouco, bebia um pouco...”. Mas prevaleceu a ideia de que narrar a própria existência é construir a memória e, conforme argumenta Santana, um meio de combater o racismo.
Afinal, a biógrafa acabou gravando mais de 160 horas de depoimento de Carneiro e ouviu companheiros e familiares da ativista para desenterrar histórias que ela insistia em guardar —como de quando passou anos abrigando um casal que fugia clandestinamente da ditadura.
RENASCIMENTO NEGRO
E a editora Escureceu, criada em novembro passado com projetos de financiamento coletivo para resgatar clássicos de autores negros, já tem confirmados seus dois primeiros lançamentos. Em maio, sai a primeira edição brasileira de “Não Tão Branca”, obra da americana Jessie Redmon Fauset escrita em 1928.
O TRISTE VISIONÁRIO
No mesmo mês, sai uma edição especial de “Clara dos Anjos”, de Lima Barreto, com capa dura e textos de apoio da crítica Fernanda Silva e Sousa, doutoranda em teoria literária e literatura na Universidade de São Paulo. Ao longo deste ano, a editora planeja ainda uma antologia de fábulas e lendas africanas e outras traduções do movimento conhecido como “Renascimento do Harlem”, do qual Jessie Fauset faz parte.