artigo

Brasil deve priorizar vacina e renda emergencial para quase 10 milhões de pessoas

Análise é do economista José Luis da Costa Oreiro, em artigo na revista Política Democrática Online

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O professor de economia da UnB (Universidade de Brasília) José Luis da Costa Oreiro afirma que o Brasil deve assumir como prioridade a vacinação contra a Covid-19 e um programa de renda emergencial. A análise dele foi publicada em artigo na revista Política Democrática Online de março.

Com periodicidade mensal, a revista é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

Confira a Edição 29 da Revista Política Democrática Online

“No presente momento, os problemas realmente urgentes no Brasil são dois”, afirma, para continuar: “Controlar a pandemia da Covid-19 por intermédio de um grande programa de vacinação e proporcionar uma renda emergencial para quase 10 milhões de brasileiros que perderam seus empregos ou saíram da força de trabalho por conta da pandemia”.

“Condição necessária”

Autor do livro “Macroeconomia do Desenvolvimento: uma perspectiva Keynesiana”, Oreiro diz que, uma vez contornados esses problemas, será necessário construir um verdadeiro programa de reformas estruturais para retomar o crescimento econômico. “Condição absolutamente necessária para reduzir o peso do endividamento público no longo prazo”. 

Em seu artigo na revista Política Democrática Online, ele analisa a tese de que, se o Brasil não voltar, de forma urgente, à “disciplina fiscal”, irá caminhar para uma espécie de abismo fiscal.

Nesse cenário, “o mercado irá exigir taxas de juros cada vez mais altas para a rolagem da dívida pública, e a taxa de câmbio continuará sua trajetória de desvalorização, aumentando a pressão inflacionária, levando, no limite, a um processo hiperinflacionário”, analisa.

“Abismo fiscal”

De acordo com a análise publicada na revista da FAP, não existem dúvidas entre os economistas de que não é possível que a dívida pública como proporção do PIB aumente indefinidamente. “A questão é saber qual seria o limite da relação dívida pública/PIB, a partir do qual o país cairia no abismo fiscal”, afirma.

Segundo ele, alguns economistas afirmam que o “número mágico” seria 100% do PIB. “Se assim fosse, a dívida pública brasileira estaria apenas 10 % abaixo do horizonte de eventos do abismo fiscal”, avalia. “Nesse caso, seria de se esperar que o custo médio de carregamento da dívida pública já estivesse apresentando sinais nítidos de elevação”, pondera.

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Em artigo na revista Política Democrática Online de março, cientista política analisa frustração de promessas liberais

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) intervém cada vez mais na economia e escanteia Paulo Guedes, de acordo com o cientista político Leandro Machado, que cursa mestrado em administração pública pela Universidade de Harvard, em artigo na revista Política Democrática Online de março.

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A revista tem periodicidade mensal. É produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

De acordo com o analista, a imagem de Bolsonaro como liberal foi construída no período eleitoral, apesar de seu histórico como deputado federal e o viés nacional desenvolvimentista comum entre militares.

“Com Bolsonaro, guiado pelo guru da economia Paulo Guedes, os caminhos seriam outros. Era tanta admiração por Guedes que o futuro presidente jamais ousaria contrariá-lo”, lembra. “Quase deu certo. Logo no começo de 2019, começaram as negociações pela Reforma da Previdência”, acentua.

Sonhos frustrados

No artigo da revista Política Democrática Online, Machado ressalta que Bolsonaro até aprovou a criação da carteira de trabalho verde e amarela, com benefícios aos empregadores. “Só que, com as crises políticas, a Reforma da Previdência sofreu derrotas no Congresso, frustrando os sonhos de Guedes e dos liberais”, observa.

Daí em diante, de acordo com o cientista político, “Bolsonaro só decepcionou a turma do Posto Ipiranga”. “Ao contrário da promessa, o presidente meteu o bedelho em tudo na Petrobras e, ao contrário das promessas de campanha, vetou qualquer iniciativa de vender três empresas estatais: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e, claro, Petrobras”, assinala.

Na contramão das promessas, conforme lembra Machado, Bolsonaro até criou uma nova estatal, a Nav. “Isso sem contar outros pontos defendidos por políticas liberais – Bolsonaro completa o bingo do que não deveria fazer. A começar por um princípio básico: o liberalismo se pauta pela liberdade política e moral. Bolsonaro defende a ditadura há anos e lotou os ministérios com outros militares que pensam como ele”, analisa.

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China tem investimentos em 25 estados brasileiros, diz Luiz Augusto de Castro Neves

Informação é do presidente do Conselho Empresarial Brasil-China, em artigo na Política Democrática Online

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

“No Brasil, os investimentos chineses estão presentes em 25 estados da federação”, diz o presidente do Conselho Empresarial Brasil-China, o economista Luiz Augusto de Castro Neves, em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de março.

Com periodicidade mensal, a revista é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

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“A China consolida-se como ator de primeira grandeza no cenário internacional, seu produto interno bruto já é o maior do planeta, se medido em paridade de poder de compra (e provavelmente será o primeiro a preços de mercado ainda nesta década), e sua presença já se faz sentir em todos os quadrantes do mundo”, afirma Neves.

Relações fundamentais

Ele, que é embaixador no Japão, na China e no Paraguai, afirma que as relações econômicas e comerciais sino-brasileiras têm sido fundamentais para evitar o agravamento da crise econômica. Segundo ele, o país asiático continua a crescer muito mais do que a média da economia mundial e sua demanda por produtos brasileiros não para de crescer.

“Nosso desafio, nesse contexto, é buscar aproveitar plenamente as janelas de oportunidade que se nos abrem na China”, assevera ele, analisando o contexto das relações econômicas entre os dois países.

De acordo com Neves, as relações entre o Brasil e a China podem ganhar outra dimensão quando se examina a parceria entre os dois países com um olhar de longo prazo. “Sobretudo quando se tem em mente que a demanda externa desempenhará um papel central na retomada do crescimento da economia brasileira”, afirma.

Arrocho fiscal

O profundo desequilíbrio fiscal em que o Brasil se encontra, de acordo com Neves, dificilmente será corrigido nos próximos anos, levando a um crescimento modesto da demanda interna.  Ele também é membro do Conselho de Administração do Grupo Pão de Açúcar.

O aproveitamento pleno das janelas de oportunidade requer do Brasil, segundo ele, aumento de competitividade internacional mediante investimentos em infraestrutura, em capital humano, bem como fortalecer o ambiente de negócios.

“Em suma, precisamos ter estratégia de longo prazo em nossas relações com a China e, sobretudo, fazer nosso ‘dever de casa’”, assinala ele, que é ex-secretário-geral adjunto das Relações Exteriores e ex-diretor-geral para as Américas no Itamaraty.

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Com armamento da população, Bolsonaro acena para guerra civil, diz Raul Jungmann

Em artigo na revista Política Democrática Online de março, ex-ministro analisa gravidade da política do presidente

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O armamento da população, como pretende o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), fere o papel constitucional das Forças Armadas, segundo o ex-ministro da Defesa e ex-ministro extraordinário da Segurança Pública Raul Jungmann, em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de março.

A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

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De acordo com ele, ao propor armar a todos, o presidente está, consecutivamente: quebrando o monopólio da violência legal, privativa do Estado Nacional, ferindo o papel constitucional da Forças Armadas e acenando com a hipótese de um conflito de brasileiros contra brasileiros, uma guerra civil.

Armamento massivo

“Isso nos motivou a redigir uma carta aberta ao Supremo Tribunal Federal, onde tramitam ações contrárias a política de armamento massivo, alertando para os riscos para a segurança pública e para a estabilidade democrática”, lembra Jungmann, que também é ex-deputado federal.

No curso da divulgação da carta, conta Jungmann, a repercussão superou expectativas na mídia tradicional, nas redes, colunas de opinião e junto a vários formadores de opinião. “O que talvez queira dizer da preocupação das pessoas com o tema e a percepção dos riscos envolvidos numa política armamentista. E existem razões concretas para tal”, assevera.

Em seu artigo na revista da FAP, o ex-ministro cita dados da Polícia Federal, segundo a qual, em 2020, o registro de armas de fogo cresceu 90% em relação ao ano anterior, o maior crescimento de um ano para outro já registrado pela série histórica.

Escalada de mortes

“Do outro lado da moeda, as mortes violentas, que iniciam uma queda em 2018 (ano em que éramos Ministro da Segurança Pública) e continuaram caindo em 2019, retomaram sua escalada em 2020”, pondera ele.

 Na revista Política Democrática Online, o autor lembra, ainda, que entidades diversas da sociedade civil e ongs se mobilizaram promovendo um abaixo assinado em apoio à carta aberta, que, segundo ele, já conta com mais de dez mil assinaturas. O documento deve ser entregue a ministros do STF em breve.

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“Governo Bolsonaro enfrenta dura realidade de manter regras fiscais importantes”

Afirmação é do economista Sérgio Vale, em artigo na revista Política Democrática Online de março

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O economista-chefe da AMB Associados, Sérgio Vale, afirma que o governo Bolsonaro falha ao enfrentar a realidade de manter regras fiscais importantes e, ao mesmo tempo, gerar a estabilidade necessária que acelere o crescimento econômico do país. O analista publicou artigo na revista Política Democrática Online de março.

Confira a Edição 29 da Revista Política Democrática Online

A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

“O governo Bolsonaro enfrenta, hoje, a dura realidade de manter regras fiscais importantes e, ao mesmo tempo, gerar a estabilidade necessária que acelere o crescimento”, diz o autor, no artigo da revista online da FAP.

Desconfiança

 Na avaliação de Vale, há muita desconfiança quanto à capacidade de o governo de entregar o ajuste fiscal reclamado pela população, assegurando espaço fiscal para o gasto de qualidade em educação e saúde, por exemplo.

“Desde as manifestações de junho de 2013, o Brasil tem passado por série ininterrupta de instabilidades de difícil solução, tanto mais porque as demandas da classe média continuam não sendo atendidas”, observa o economista.

Ele lembra que, em artigo na década de 70, Albert Hirschman criou o conceito de efeito túnel, segundo o qual a classe média ganhou terreno na aquisição de bens com o aumento da renda, mas a contrapartida de serviços públicos de qualidade não seguiu a mesma trajetória.

“É como se, depois das conquistas materiais individuais, tivesse caído a ficha da população quanto à necessidade de demandar serviços públicos de qualidade do governo”, afirma. “Esse foi o grande tema das manifestações de 2013, depois de anos de forte crescimento de renda e do consumo da classe média e da ascensão de parte da classe mais baixa de renda para a classe média”, avalia.

Descontentamento

De acordo com o artigo publicado na revista Política Democrática Online, como a classe média não foi atendida de maneira satisfatória, o descontentamento dela fez crescer a pressão sobre o setor público no sentido da qualidade da prestação dos serviços.

“Só que a conjunção de incerteza, que afugentou investimento e diminuiu o ritmo de crescimento, com a necessidade de responder à população via mais gastos públicos colaborou para agravar a crise fiscal que já se avizinhava. Seria difícil naquele momento de descontentamento da população para um governo de esquerda fazer um ajuste fiscal”, diz.

De acordo com Vale, o país vive no dilema desde então, “com diversos graus de incerteza que foram se acumulando na economia, diminuindo de forma duradoura o ritmo de crescimento, com a população cada vez exigindo respostas eficazes do governo”. 

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Novas relações do Brasil e EUA estão “apenas no início”, diz Rubens Barbosa

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online, presidente do Irice analisa relação diplomática entre os dois países

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e embaixador aposentado, Rubens Barbosa, diz que o presidente dos Estados Unidos, o democrata Joe Biden, adotou atitude de não confrontação com o governo Jair Bolsonaro (sem partido). A análise foi publicada em artigo que produziu para a revista Política Democrática Online de março.

A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. A versão flip, com todos os conteúdos, pode ser acessada gratuitamente na seção de revista digital do portal da entidade.

Confira a Edição 29 da Revista Política Democrática Online

Biden e Bolsonaro, segundo Barbosa, iniciaram conversas sobre diversos temas das relações bilaterais. Entre os assuntos estão diferenças em relação a clima, direitos humanos e democracia podem prejudicar o Brasil.

De acordo com o artigo publicado na revista Política Democrática, a divulgação de uma série de documentos cobrando medidas duras contra o Brasil procurou influir na política externa do governo Biden.

Crítica à política ambiental

“O documento assinado por ex-altos funcionários e negociadores norte-americanos critica a política ambiental brasileira e reclama medidas contra o Brasil, caso não haja mudança nas políticas de proteção à Amazônia e de mudança de clima”, escreve o presidente do Irice.

Segundo ele, o trabalho “Recomendações sobre o Brasil para o Presidente Biden e Para a Nova Administração”, encaminhado por professores norte-americanos, brasileiros e diversas ONGs, faz duros reparos a política ambiental, direitos humanos e democracia.

Além disso, de acordo com Barbosa, o documento pede a suspensão da cooperação com o Brasil em diversas áreas como Defesa, comércio exterior, meio ambiente e outras.

O autor do artigo na revista da FAP lembra que o presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado também enviou carta ao presidente Bolsonaro e ao Ministro Ernesto Araújo, pedindo explicações e retratação de declarações, julgadas favoráveis a invasão do Congresso de Washington.

Correspondência ao Senado

Por fim, segundo o embaixador, um grupo de deputados norte-americanos enviou correspondência ao Senado requisitando a suspensão de alguns programas de cooperação na área de defesa pelos problemas com os quilombolas no Centro de Lançamento de Alcântara.

“O conteúdo dos documentos e dessas correspondências, combinado com a divulgação da política ambiental do presidente Biden, com referência específica à Amazônia, gerou preocupação pelos eventuais impactos sobre o Brasil”, observa o presidente do Irice.

Na avaliação de Barbosa, “as relações com os EUA, que começaram tranquilas, terão muitos outros capítulos em 2021”. “Estamos apenas no início”, analisa.

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RPD || Sérgio Vale: Os desafios da economia brasileira

Governo Bolsonaro falha ao enfrentar a realidade de manter regras fiscais importantes e, ao mesmo tempo, gerar a estabilidade necessária que acelere o crescimento econômico do país

Desde as manifestações de junho de 2013, o Brasil tem passado por série ininterrupta de instabilidades de difícil solução, tanto mais porque as demandas da classe média continuam não sendo atendidas.  

Em artigo seminal da década de 70, Albert Hirschman criou o conceito de efeito túnel, segundo o qual a classe média ganhou terreno na aquisição de bens com o aumento da renda, mas a contrapartida de serviços públicos de qualidade não seguiu a mesma trajetória. É como se, depois das conquistas materiais individuais, tivesse caído a ficha da população quanto à necessidade de demandar serviços públicos de qualidade do governo. Esse foi o grande tema das manifestações de 2013, depois de anos de forte crescimento de renda e do consumo da classe média e da ascensão de parte da classe mais baixa de renda para a classe média. 

Não tendo sido atendidas de maneira satisfatória, o descontentamento da classe média fez crescer a pressão sobre o setor público no sentido da qualidade da prestação dos serviços. Só que a conjunção de incerteza, que afugentou investimento e diminuiu o ritmo de crescimento, com a necessidade de responder à população via mais gastos públicos colaborou para agravar a crise fiscal que já se avizinhava. Seria difícil naquele momento de descontentamento da população para um governo de esquerda fazer um ajuste fiscal. 

Vivemos nesse dilema desde então, com diversos graus de incerteza que foram se acumulando na economia, diminuindo de forma duradoura o ritmo de crescimento, com a população cada vez exigindo respostas eficazes do governo.  

O governo Bolsonaro enfrenta, hoje, a dura realidade de manter regras fiscais importantes e, ao mesmo tempo, gerar a estabilidade necessária que acelere o crescimento. Há muita desconfiança quanto à capacidade de o governo de entregar o ajuste fiscal reclamado pela população, assegurando espaço fiscal para o gasto de qualidade em educação e saúde, por exemplo. Parece contraditório, mas, de certa forma, o ajuste de privatização e o fim da corrupção foram temas prioritários das plataformas eleitorais de Bolsonaro, que sensibilizaram os eleitores no tocante ao desempenho eficiente futuro da máquina pública no setores. A pauta de 2013 afinal ainda vivia, mesmo que de forma extremada ao se apostar em um presidente com o perfil de Bolsonaro. 

A situação brasileira torna-se ainda mais desafiante, porque investir depende de horizonte estável de longo prazo. Para isso, demanda-se do ordenamento político uma configuração mínima de respeito às regras econômica, capazes para dar confiança a investimentos mais agressivos. Esse foi o cenário que existia no primeiro mandato do presidente Lula, em que as regras econômicas do governo FHC foram mantidas em sua maioria e os investidores viram um país amadurecido em que a troca de centro direita (FHC) pelo centro esquerda (Lula) não tiraria o país do rumo. 

Os excessos fiscais do final do governo Lula, todo o governo Dilma e a atual polarização são prejudiciais para quem quer investir em contratos de concessões de longo prazo, por exemplo. O recente encampamento da linha amarela pelo governo carioca, ainda em discussão no STJ, e a troca agressiva do presidente da Petrobrás mostram como o investimento no Brasil ainda está à mercê de baixa qualidade regulatória. 

Isso não significa que o país não vai crescer. As commodities, que, embora não se reconheça, envolvem grande inovação tecnológica industrial, seguirão sendo o carro-chefe do crescimento brasileiro nos próximos dois anos, pelo menos. Espera-se forte incremento nos preços de commodities por questões tanto de demanda quanto de oferta, além da taxa de câmbio depreciada pelos riscos fiscais que nos acompanham há muitos anos. Estamos falando de cerca de 35% a 40% do PIB brasileiro que terá forte expansão e que precisamos aproveitar para entender seu importante papel no crescimento de regiões dependentes delas. Por exemplo, a região que mais teve queda na desigualdade de renda nos últimos anos foi o Centro Oeste pelo avanço do agronegócio, do qual todos acabam ganhando. Reforço que as commodities – o setor mais aberto da economia brasileira – são justamente o que tem trazido mais resultados positivos para o país e assim seguirá sendo. 

Repito: o governo precisa gerar crescente estabilidade política com eficiência fiscal para que os investimentos nos outros setores não dependentes do setor externo voltem a acontecer. Resgatar a pauta de 2013 de forma coerente é o melhor que os governos poderão fazer para viabilizar condições de crescimento para o país. 

*Economista-chefe da MB Associados 


RPD || Rubens Barbosa: Biden e o Brasil

De forma pragmática, Biden adotou uma atitude de não confrontação com o governo Jair Bolsonaro, iniciando conversas sobre diversos temas das relações bilaterais. Diferenças em relação a clima, direitos humanos e democracia podem prejudicar o Brasil 

A divulgação de uma série de documentos cobrando medidas duras contra o Brasil procurou influir na política externa do governo Biden. O documento assinado por ex-altos funcionários e negociadores norte-americanos critica a política ambiental brasileira e reclama medidas contra o Brasil, caso não haja mudança nas políticas de proteção à Amazônia e de mudança de clima. O trabalho “Recomendações sobre o Brasil para o Presidente Biden e Para a Nova Administração”, encaminhado por professores norte-americanos, brasileiros e diversas ONGs, faz duros reparos a política ambiental, direitos humanos, democracia e pede a suspensão da cooperação com o Brasil em diversas áreas como Defesa, comércio exterior, meio ambiente e outras.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado também enviou carta ao presidente Bolsonaro e ao Ministro Ernesto Araújo pedindo explicações e retratação de declarações, julgadas favoráveis a invasão do Congresso de Washington. Por fim, um grupo de deputados norte-americanos enviou correspondência ao Senado requisitando a suspensão de alguns programas de cooperação na área de defesa pelos problemas com os quilombolas no Centro de Lançamento de Alcântara. O conteúdo dos documentos e dessas correspondências, combinado com a divulgação da política ambiental do presidente Biden, com referência específica à Amazônia, gerou preocupação pelos eventuais impactos sobre o Brasil.

Do lado do governo brasileiro, houve três ações concretas para tentar evitar medidas contra o Brasil. A carta do presidente Bolsonaro a Biden em que manifesta “disposição a continuar nossa parceria em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente, em especial a Amazônia, com base em nosso Diálogo Ambiental, recém-inaugurado”. O telefonema do Ministro Araújo com o Secretário de Estado Blinken e a reunião telefônica entre o Chanceler e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, com John Kerry. O setor privado também se manifestou com Nota da Câmara Americana de Comércio e da US Chamber sobre as perspectivas favoráveis para o intercâmbio comercial.  

A forma como Biden no início de sua gestão vai tratar o Brasil foi definida pelas recentes declarações das porta-vozes da Casa Branca e do Departamento de Estado, segundo as quais “a prioridade é manter o diálogo e buscar oportunidades para trabalhar conjuntamente com o governo brasileiro em questões em que haja Interesse Nacional comum pois existe uma relação econômica estratégica entre os dois países e o governo Biden não vai se limitar apenas a tratar de áreas em que haja discordância, seja em clima, direitos humanos, democracia ou outros”.  

Nessa primeira fase do relacionamento com o Brasil, Washington decidiu adotar uma atitude de não confrontação, demandada pela ala progressista do Partido Democrata, e iniciar as conversas sobre diversos temas das relações bilaterais. Foi uma atitude pragmática, vista pelo governo brasileiro como um avanço positivo na relação bilateral. Durante os meses de março e abril, a convite do governo norte-americano, o Brasil deve participar, a nível presidencial, nas conferências sobre Clima e sobre Democracia (com forte ênfase nos Direitos Humanos), além da Cúpula das Américas, na Florida. Nesses encontros, todos os assuntos mais importantes no contexto das relações bilaterais e hemisféricas deverão ser tratados.

Dependendo das posições defendidas por Bolsonaro, começarão a aparecer as diferenças de políticas entre Brasília e Washington, em especial. Vão surgir, também, com força, nessa fase, as diferenças na área de mudança de clima e preservação da floresta Amazônica. Tudo vai depender da reação do governo brasileiro (defensiva ou com ajuste na retórica e em anúncios de medidas com resultados verificáveis). A posição defensiva – que tem mais chances de prevalecer – poderá ter “consequências econômicas”, como disse Biden.

No telefonema com John Kerry, Araújo e Salles concordaram em iniciar encontros regulares para examinar formas de colaboração mútua e como transferir recursos ao Brasil para preservação da floresta amazônica. O problema reside no fato de Bolsonaro e Ernesto Araujo acreditarem em que a situação está sob controle e que avançará “business as usual”, como mencionado na carta a Biden, o que não deverá acontecer, na minha visão. Assim, os desdobramentos das políticas de Biden devem começar pelo meio ambiente, em relação à preservação da Amazônia e das comunidades indígenas, passando para as questões de Direitos Humanos, comércio (SGP e restrições a produtos brasileiros), defesa (Alcântara) e outras áreas de cooperação. 

As relações com os EUA, que começaram tranquilas, terão muitos outros capítulos em 2021. Estamos apenas no início.  

*Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE).  


RPD || Raul Jungmann: Armamento, riscos à democracia e 2022

"A desconsonsolidação democrática não precisa envolver violações a constitucionalidade. E os governos reacionários têm desfrutado de um apoio popular consistente. A esperança de que cidadãos pudessem ameaçar governos que cometessem transgressões contra a democracia, impedindo-os, com isso, de seguirem esse caminho, infelizmente é infundada."

A citação é de Adam Przeworski, professor de política e economia da Universidade de Nova York, com vasta produção na área da ciência política. Ela bate com que estamos vivendo no Brasil e, especialmente, com o que vivenciamos na segurança pública. Uma população que se sente indefesa diante da violência e não vê da parte do poder público a prestação de serviços de segurança compatíveis com a sua a proteção da sua vida e família, sanciona atsques a democracia em nome da sua defesa. É o caso das mais de trinta normas editadas pela Presidência da República ou órgãos de controle do executivo, afrouxando as regrass ou visando a massificação do armamento pela população. Nesse ponto, o armamento da cidadania, cruzamos os limites da área da segurança pública, onde há duas décadas se travava o debate, e passamos a seara da política, e do ideológico.

Ao propor armar a todos, o Presidente está, consecutivamente: (i) quebrando o monopólio da violência legal, privativa do Estado Nacional, (ii) ferindo o papel constitucional da Forças Armadas, esteio e última ratio da integridade e da soberania e (iii) acenando com a hipótese de um conflito de brasileiros contra brasileiros, uma guerra civil.

Isso nos motivou a redigir uma carta aberta ao Supremo Tribunal Federal, onde tramitam ações contrárias a política de armamento massivo, alertando para os riscos para a segurança pública e para a estabilidade democrática. Lembrando, ao final, o ocorrido recentemente nos Estados Unidos, quando da invasão do Capitólio por vândalos. No curso da sua divulgação, a repercussão da carta superou nossas expectativas na mídia tradicional, nas redes, colunas de opinião e junto a vários formadores de opinião. O que talvez queira dizer da preocupação das pessoas com o tema e a percepção dos riscos envolvidos numa política armamentista. E existem razões concretas para tal.

Segundo a Polícia Federal, em 2020 o registro de armas de fogo cresceu 90% face o ano anterior, o maior crescimento de um ano para outro já registrado pela série histórica. Do outro lado da moeda, as mortes violentas, que iniciam uma queda em 2018 (ano em que éramos Ministro da Segurança Pública) e continuaram caindo em 2019, retomaram sua escalada em 2020. A ADIN impugnando os quatro decretos supracitados tem como relatora a Ministra Rosa Weber, que solicitou informações ao executivo e, nos próximos dias, decretos editados em 2019 sobre o mesmo tema e objetivo irão ao plenário do Supremo, tendo como relator o Ministro Edson Fachin.

Entidades diversas da sociedade civil e ongs, se mobilizaram promovendo um abaixo assinado em apoio a nossa Carta Aberta, que já conta com mais de dez mil assinaturas. Devendo ser entregue aos dois ministros em breve.

Embora não se manifestem, as Forças Armadas, devem estar debruçadas sobre essa questão. Recentemente, o Departamento de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército teve duas portarias suas sobre rastreamento de armas e munições revogadas por ordem do Planalto, logo após o que o seu responsável desligou-se da sua direção. Pablo Ortellado nos diz que cansados de escândalos de corrupção e de uma elite política que apenas pensa na solução dos seus problemas e não dos seus representados, o eleitor em 2018 buscou um “ultradiferenciação”, votando naquele que rompia simbólica e retoricamente com o status quo.

Pode ser. Mas a questão é que essa opção do eleitorado veio a reboque de uma operação Lava Jato, que no combate a corrupção desestruturou a dinâmica política desde a redemocratização para cá, a tríade de partidos que organizava o jogo congressual e das alianças (PMDB, PT e PSDB) e suas lideranças nacionais. Se for incapaz de reconstruir uma narrativa que supere e incorpore soluções para o mal estar, desânimo e mau humor da população, decorrente da percepção da corrupção da política e da insegurança endêmica, a afirmação inicial de Adam Przeworki continuará valendo, para 2022 e além.

*Raul Jungmann é ex-deputado federal, foi Ministro do Desenvolvimento Agrário e Ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, Ministro da Defesa e Ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer.


RPD || Luiz Augusto de Castro Neves: Relações Brasil-China - Um olhar de longo prazo

Desde 1974, quando o Brasil reatou relações com a China, muita coisa mudou no país asiático, agora detentor do maior produto interno bruto do planeta e principal parceiro econômico brasileiro, com investimentos em 25 estados da Federação

O Brasil estabeleceu relações com a China em 1974, em plena vigência do regime militar, inequivocamente anticomunista. Examinando com alguma atenção as relações da China com a América Latina verificamos, em primeiro lugar, que a quase totalidade desses estabelecimentos de relações teve lugar a partir do ingresso da China nas Nações Unidas e da histórica viagem do presidente Richard Nixon a Pequim. Um exame mais acurado dá conta de que afinidades ideológicas tiveram pouco ou nenhum papel no relacionamento chinês com os países latino-americanos – a maior parte desses países estava, ao longo da década de 70, submetida a regimes militares de direita, adeptos de uma decidida retórica anticomunista. Houve duas exceções: Cuba, cujas relações foram estabelecidas após a ascensão de Fidel Castro, e Chile, logo no início do governo de Salvador Allende.

Mesmo em relação a Cuba, à época o único país marxista-leninista da região, as cubano-chinesas foram até 1995 marcadas por desacordos e distanciamentos, decorrentes em boa medida da controvérsia sino-soviética. Em 1966, Fidel Castro denunciou o governo chinês na abertura da conferência tricontinental de Havana e acusou a liderança chinesa de “senilidade”. A posição cubana refletia, na verdade, seu alinhamento com a política externa soviética, e sua reaproximação com Pequim só teve lugar a partir do desaparecimento da União Soviética. 

O reatamento de relações com a China em 1974 foi objeto de intensa controvérsia entre as autoridades militares brasileiras, boa parte das quais expressamente contrária ao reatamento. O então ministro do Exército, general Sylvio Frota, apresentou por escrito seu parecer, alegando que “a orientação político-ideológica do mestre do comunismo chinês, verdadeiros deus de uma religião sincretizadamente professada por mais de 800 milhões de amarelos ansiosos por expandirem-se e ocuparem os vazios do ecúmeno, hoje já carentes no globo terrestre, mas cobiçados, em especial, no Brasil e na África Negra”.  

Nos primeiros anos, o reatamento não levou a maiores iniciativas de parte a parte, por razões chinesas e brasileiras: a China estava imersa naquele momento no grande pandemônio político-ideológico, a chamada revolução cultural. Além disso, a saúde precária de Mao Zedong já propiciava o início de surda batalha por sua sucessão. No Brasil, por sua vez, o reatamento causara celeuma, sobretudo em meios militares que davam sustentação regime. O ministro do Exército dizia que o reatamento era uma iniciativa do Itamaraty (e não do presidente, como que a subtrair-lhe importância política). Além disso, o governo do general Geisel estava às voltas com o processo de abertura política, que acabou por levar, alguns anos mais tarde, à demissão do próprio ministro do Exército. Assim, não houve incialmente clima propício, nem de um lado, nem de outro, para iniciativas concretas de maior envergadura entre o Brasil e a China. 

Hoje vivemos em outro mundo. A China consolida-se como ator de primeira grandeza no cenário internacional, seu produto interno bruto já é o maior do planeta, se medido em paridade de poder de compra (e provavelmente será o primeiro a preços de mercado ainda nesta década), e sua presença já se faz sentir em todos os quadrantes do mundo. No Brasil, os investimentos chineses estão presentes em 25 Estados da federação. As relações econômicas e comerciais sino-brasileiras têm sido fundamentais para evitar o agravamento da crise econômica que atravessamos, na medida em que a China continua a crescer muito mais do que a média da economia mundial, e sua demanda por produtos brasileiros não para de crescer. Nosso desafio, nesse contexto, é buscar aproveitar plenamente as janelas de oportunidade que se nos abrem na China. As relações entre o Brasil e a China podem ganhar outra dimensão quando se examina a parceria entre os dois países com um olhar de longo prazo, sobretudo quando se tem em mente que a demanda externa desempenhará um papel central na retomada do crescimento da economia brasileira. O profundo desequilíbrio fiscal em que nos encontramos dificilmente será corrigido nos próximos anos, levando a um crescimento modesto da demanda interna. 

O aproveitamento pleno das janelas de oportunidade já mencionadas requer, de nossa parte, aumentar nossa competitividade internacional mediante investimentos em infraestrutura, em capital humano, bem como fortalecer o ambiente de negócios. Em suma, precisamos ter estratégia de longo prazo em nossas relações com a China e, sobretudo, fazer nosso “dever de casa”. As oportunidades são imensas, desde que saibamos aproveitá-las, o que me leva a concluir com a citação de Candide, personagem de Voltaire: “celà est bien dit, mais il faut cultiver notre jardin” (Está tudo dito, mas precisamos cultivar nosso jardim)

* Luiz Augusto de Castro Neves  é Presidente do Conselho Empresarial Brasil-China. Embaixador no Japão, na China, e no Paraguai. No Itamaraty, foi Secretário-Geral Adjunto das Relações Exteriores e Diretor-Geral para as Américas.  Presidente do CEBRI e atualmente é Vice-Presidente Emérito. Membro do Conselho de Administração do Grupo Pão de Açúcar, Cursou Ciências Econômicas na UFRJ e é Mestre em Economia pelo University College da Universidade de Londres.


RPD || Leandro Machado: A farsa mais previsível da história

Bolsonaro intervém cada vez mais na economia e escanteia Paulo Guedes. Imagem de liberal foi construída no período eleitoral, apesar de seu histórico como deputado federal e o viés nacional desenvolvimentista comum entre militares

O discurso liberal atendeu ao único interesse de Bolsonaro em 2018: vencer as eleições. Dois anos depois, as recentes intervenções do Presidente mostram a mudança de rota e a perda de poder do ministro da Economia Paulo Guedes desengavetou seu currículo lustroso, tirou o pó, mostrou a Jair Bolsonaro e disse: “toma, me chama de seu futuro ministro da Economia; me usa para afastar o medo que os grandes investidores têm do seu passado”. Bolsonaro engoliu em seco e passou a anunciá-lo como seu “Posto Ipiranga”. Aquele rosto conhecido, cofundador do Banco Pactual (vendido e rebatizado de BTG Pactual), com mestrado e doutorado na Universidade de Chicago, encantou as elites. Era o toque final para convencê-los a apoiar Bolsonaro nas eleições. 

O diálogo e a cena, tais como narrados, são fictícios, mas a essência não. O histórico de Jair Bolsonaro como deputado federal e o viés nacional desenvolvimentista tão comum entre militares acionavam o alerta. No fim dos anos 1990, Bolsonaro votou contra o fim do monopólio da União no controle de pesquisas, extração, refino, importação e exportação do petróleo da Petrobras, contra o Plano Real (acompanhando a bancada do PT, PDT e PCdoB) e contra a Reforma da Previdência. Uma certeza o mercado tinha: de liberal Bolsonaro não tinha nada. 

Em 2018, no entanto, o discurso mudou. Bolsonaro sugeriu a privatização da Petrobras e defendeu as reformas sugeridas por Guedes. As elites abriram os champanhes e se jogaram de olhos fechados no apoio a Bolsonaro. 

Era uma chance para curar o “trauma” causado por Dilma Rousseff. A ex-Presidenta havia mexido muito com os nervos das elites. Na base de canetadas, interferiu na Petrobras, cortou impostos dos produtos da cesta básica na tentativa de conter a inflação e barrou o reajuste das tarifas de luz. Um desastre; a população voltou a pagar caro pela energia elétrica, o preço dos alimentos voltou a subir, e a crise financeira só se agravou. 

Com Bolsonaro, guiado pelo guru da economia Paulo Guedes, os caminhos seriam outros. Era tanta admiração por Guedes que o futuro Presidente jamais ousaria contrariá-lo.  

Quase deu certo. Logo no começo de 2019, começaram as negociações pela reforma da Previdência. Bolsonaro até aprovou a criação da carteira de trabalho Verde e Amarela, com benefícios aos empregadores. Só que, com as crises políticas (tão pouco surpreendentes com um presidente turrão e autoritário), a Reforma da Previdência sofreu derrotas no Congresso - frustrando os sonhos de Guedes e dos liberais.  

Daí em diante, Bolsonaro só decepcionou a turma do Posto Ipiranga. Ao contrário da promessa, o Presidente meteu o bedelho em tudo na Petrobras e, ao contrário das promessas de campanha, vetou qualquer iniciativa de vender três empresas estatais: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e, claro, Petrobras. Na contramão das promessas, na verdade, Bolsonaro até criou uma nova estatal, a Nav, algo que não acontecia desde o governo de… Dilma. 

Isso sem contar outros pontos defendidos por políticas liberais - Bolsonaro completa o bingo do que não deveria fazer. A começar por um princípio básico: o liberalismo se pauta pela liberdade política e moral. Bolsonaro defende a ditadura há anos e lotou os ministérios com outros militares que pensam como ele.  

A crença no poder inabalável de Paulo Guedes soa quase ingênua aos que conhecem a história de Bolsonaro. Se há uma palavra que não poderá jamais ficar de fora da biografia dele: a insubordinação. Nem mesmo no Exército, Bolsonaro segurou a onda. Revoltado com o salário, o capitão organizou uma revolta - o que é proibido dentro de instituições militares -, com direito a plano para explosões de bombas-relógios nos quartéis. Tomou um processo e foi expulso, mas recorreu ao Superior Tribunal Militar e terminou absolvido - uma absolvição típica daquela época, digamos assim. 

Se nem mesmo ao alto escalão do Exército, uma instituição tão defendida e admirada por ele, Bolsonaro obedece, como imaginar algo diferente em relação ao Posto Ipiranga do que atos de insubordinação? Ainda mais quando o chefe, ao contrário dos tempos de militar, é ele mesmo. O sonho dos liberais, de um Bolsonaro fiel aos desejos de Guedes, soa mais como um delírio.  

*Cientista político pela Universidade de Brasília e mestrando em administração pública pela Universidade de Harvard. 


RPD || André Amado: Há espaço para a criatividade

André Amado nos mostra, em seu artigo para a Revista Política Democrática, como os escritores discordam entre si quando atuam como críticos literários

A exemplo dos economistas e políticos, os críticos literários – ou, pior, os escritores que se debruçam sobre as obras de seus colegas – raramente concordam entre si. A maior evidência disso é a discussão entre a imaginação e a realidade como fonte alternativa da criação.   

Julio Cortázar afirma nunca ter escrito conto ou romance que se pudessem considerar exclusiva e totalmente realistas, porque, mesmo que assim fosse, o tema teria nascido da fantasia dele, inventado por ele. De sua parte, Julio Ramón Ribeyro iria mais longe e reconheceria que, ao descobrir a razão, se sentiu como um louco, pois foi quando abandonou os delírios e as fantasmagorias da imaginação, tornando a realidade insuportável. Não é outra a interpretação de Rosa Montero que elabora para a morte de Dom Quixote. Segundo ela, quando o fidalgo enfermo vislumbrou a luz da razão, isto é, raciocinou e concluiu que teria de renunciar à imaginação transbordante que o acompanhara toda a vida até então, preferiu morrer.   

Stephen King exploraria outro ângulo, mas na mesma linha. Comentaria que John Grisham escrevera sobre a Máfia, mas nunca trabalhou para ela, tudo não passando de pura invenção, na verdade o maior deleite do escritor de ficção. Vargas Llosa sofisticaria o debate ao identificar como o aspecto fundamental do método de Flaubert o roubo consciente da realidade real pela construção da realidade fictícia. E Jorge Luiz Borges encerraria este capítulo da discussão, com a sentença de que, em literatura, a realidade é o imaginado, na mesma toada, aliás, de Haruchi Murakami, que defenderia não ser o visível a única realidade.   

Mas, se, de um lado, Ernest Hemingway viria em apoio dos escritores acima citados, oferecendo a confissão de que inventara inventado cada palavra, cada incidente, de Adeus às armas e 95% de O sol também de levanta, Garcia Márquez, de outro, muito se divertia quando lhe dirigiam elogios por sua imaginação, porque, segundo o escritor colombiano, linha alguma de sua obra jamais deixou de basear-se na realidade.

Contemporizam esse confronto entre defensores da imaginação e do realismo aqueles que atribuíam ao escritor uma espécie de mediunidade. Rosa Montero chegou a afirmar que somos muitos dentro de nós, aforismo que P. D. James traduziria como a sensação de que os personagens e tudo que acontece com eles existem em algum limbo da imaginação, não cabendo, portanto, tentar inventá-los; antes, entrar em contato com eles e registrar sua história em preto e branco, um processo de revelação, não de criação.   

Stephen King terminaria, também, compartilhando à sua maneira desse ponto de vista. Para ele, não existe um Depósito de Ideias, uma Central de Histórias, uma ilha de Best-Sellers Enterrados. As boas histórias, segundo King, parecem vir quase literalmente de lugar nenhum, navegando até o escritor do vazio do céu, ideias, que, até então, podiam ser até dissonantes, mas que se juntavam e viravam algo sob o sol, faltando apenas não encontrar essas ideias, mas reconhecê-las quando aparecessem.   

Henry James simplifica a questão: a realidade já existe de antemão na consciência do criador, e Murakami poetiza: escondidas em uma tela branca, congelam-se várias possibilidades à espera daquele momento em que a mão e o talento do pintor haverão de reunir a existência e a não-existência. O nobelista espanhol acreditava que os livros se escrevem às vezes sozinhos, antes mesmo de serem escritos e até depois de receberem o ponto final. Como poeta, Mario Quintana poupa argumentos e considera que o verdadeiro criador se limita a mostrar tudo aquilo que os outros olhavam sem ver. E Michelangelo, embalado pela modéstia típica dos gênios, desmistifica: não faço esculturas, apenas retiro o excesso de pedras.   

Ah se os economistas e os políticos discordassem e convergissem com tamanha criatividade!   

*André Amado é embaixador aposentado e diretor da revista Política Democrática Online