arrecadação
Reforma do IR pode custar quase R$ 30 bi no próximo ano, diz IFI
IFI alerta que o impacto fiscal negativo da reforma no IR pode exceder o volume total de investimentos do Poder Executivo previsto na LOA, que é de R$ 24,1 bi
Pillar Pedreira/Agência Senado
A reforma do Imposto de Renda pode custar R$ 28,9 bilhões aos cofres públicos em perda de arrecadação tributária já em 2022. Essa é a avaliação da Instituição Fiscal Independente (IFI) em nota técnica publicada nesta sexta-feira (3), um dia depois da aprovação do projeto pela Câmara dos Deputados (PL 2.337/2021). O texto agora será analisado pelo Senado.
“A não neutralidade da proposta, sob o aspecto fiscal, é preocupante, notadamente em um contexto de fragilidade das contas públicas, com deficit primário ainda elevado e dívida pública bastante superior à média dos países comparáveis”, conclui a IFI.
Apesar de a proposta trazer medidas com potencial arrecadatório, como a revisão de benefícios tributários e a criação do imposto sobre lucros e dividendos, o saldo final permanece no vermelho. Para efeito de comparação, o impacto fiscal negativo excede o volume total de investimentos do Poder Executivo previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2022, que é de R$ 24,1 bilhões.
O custo poderá ser maior caso as previsões do governo para a reversão dos gastos tributários (que é a revogação de benefícios) não se confirmem. Essa reoneração é projetada como o principal ganho arrecadatório da reforma. A sua frustração poderia, em último caso, agravar ainda mais o resultado já em 2023.
“Os gastos tributários são calculados sob metodologia que pode superestimar os valores informados. A reversão de certos benefícios poderá não produzir, automaticamente, um aumento de arrecadação nas proporções indicadas. Sem contabilizar a reversão do gasto tributário, o efeito da proposta em 2023 poderia chegar a R$ 33,3 bilhões”, alerta a nota técnica.
A reforma mexe em impostos que representaram, em 2020, cerca de 36% de toda a arrecadação federal. O projeto atualiza a tabela do imposto de renda da pessoa física (IRPF), aumentando a faixa de isenção e expandindo a declaração simplificada (que possibilita descontos), e reduz as alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Segundo os cálculos da IFI, que simulam as novas regras sobre números colhidos em nove bases de dados federais, essas medidas teriam um custo de R$ 87,5 bilhões em 2022. Esse custo se aproximaria de R$ 100 bilhões já em 2024.
Entre as medidas compensatórias do projeto estão a tributação da distribuição de lucros e dividendos, o fim da dedutibilidade de juros sobre capital próprio (que são uma forma de distribuição de rendimentos antes da aferição do lucro) no IRPJ e a revisão de benefícios tributários. Também está previsto um aumento na alíquota da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem).
A revogação de benefícios envolve os setores de gás natural canalizado, carvão mineral, produtos químicos, farmacêuticos e hospitalares. Ela é a medida mais significativa, com uma expectativa arrecadatória superior a R$ 20 bilhões. No entanto, os números reais são de difícil estimativa.
A cobrança sobre lucros e dividendos também pode gerar valores expressivos para os cofres públicos, segundo a IFI, mas apenas a partir de 2023, segundo a IFI. Essa modalidade de tributação é sujeita a práticas de elisão fiscal, que é o uso de manobras legais ou de brechas da lei para reduzir o imposto devido.
“É razoável supor que se o projeto de lei for aprovado em 2021, as empresas adaptarão seu comportamento. A resposta provável será distribuir o máximo possível de resultados ainda em 2021, sem o alcance da nova tributação”.
Fonte: Agência Senado
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/09/03/reforma-do-ir-pode-custar-quase-r-30-bi-no-proximo-ano-diz-ifi
Vinicius Torres Freire: Quem rouba o dinheiro dos impostos?
Na verdade, governo devolve diretamente 78% da receita que chega a seu cofre
O governo é um monstro que cobra impostos até esfolar os cidadãos, sem oferecer “serviços públicos de qualidade”. É a queixa cada vez mais gritante pelo menos desde 2013, quando o “gigante acordou”.
O sonho da razão produz monstros, já se disse e desenhou uma vez. O gigante desperto na monstruosa algazarra política brasileira faz contas sonháticas, se não delirantes, com receitas e despesas do governo.
Acha que o Leviatã tributário foge com o dinheiro, que não faltaria caso não houvesse corrupção ou marajás.
Mas o governo devolve a maior parte dos impostos diretamente para os bolsos do gigante, que acordou, mas ainda não se olhou no espelho. É o que mais uma vez mostram dados do Ministério da Fazenda, que publicou na semana passada a carga tributária e um detalhamento das “Transferências para Assistência Social, Previdência e Subsídios” (Taps) de União, estados e municípios em 2017.
Alguns cálculos com esses dados ajudam a explicar que a disputa pelos dinheiros públicos em 2019 será feia como a necessidade —é o conflito social que aparece sob o nome de “ajuste fiscal” e “reformas”. Sim, pode ser também que não se faça ajuste nenhum; então, quebraremos à moda do Rio ou teremos grande inflação.
Por falta de espaço, fiquemos nos dados federais.
A carga tributária federal era de 22,1% do PIB (22,1% da produção ou da renda nacional em um ano). Mas parte disso nem fica no governo federal. Por lei, vai diretamente para governos de estados e municípios. Sobra o equivalente a 18,6% do PIB (mais de R$ 1,2 trilhão, em 2017).
Desse dinheiro, o equivalente a 78% volta quase sem escalas para o bolso de algum cidadão. São aquelas despesas com Taps: Previdência geral (aposentadorias, pensões, auxílio-doença etc.), previdência dos servidores, saques de FGTS e PIS/Pasep, seguro-desemprego, abono salarial, benefícios para idosos e deficientes muito pobres, Bolsa Família e subsídios.
Sim, o equivalente a 78% do total da receita de impostos do governo viaja até Brasília e volta por meio desses pagamentos. E o resto? Por exemplo, quase 9% vão para despesas com saúde e educação. Cerca de 3,8%, para investimentos em obras. Para salários de servidores, 12,7%. Etc.
Embora parte menor dessas despesas “Taps” não entre na conta do Tesouro, a soma relevante dos gastos ainda resulta em enorme déficit: o governo gastava 14% além do que arrecadava em 2017 (o cálculo não inclui a despesa com juros).
O déficit ficou especialmente feio depois de 2013, quando a carga tributária caiu um pouco e o gasto da Previdência explodiu (quase todo o estrago recente das contas públicas está aí).
Isto posto, o que o “gigante” pretende fazer? Na verdade, o gigante é um corpo feito de classes sociais ou grupos de interesse, o nome que se dê, que recebe de volta, de modo desigual, 78% da receita do governo. Terá de receber relativamente menos, por muitos anos.
Quem vai perder? Essas transferências sociais já beneficiam menos os mais pobres (famílias em que a renda por cabeça não passa de R$ 400 por mês, 26% da população).
Não existe um “Outro” secreto e fantástico que leva a dinheirama para a Ilha do Tesouro. Boa parte do debate das “reformas” é a discussão de quem paga a conta.
Essa história de “quebrar o sistema”, “o mecanismo” e resolver o rolo sem dor, “acabando com a corrupção”, é ingênua ignorância ou picaretagem de governante demagogo.