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Foto: José Cruz/Agência Brasil

Revista online | Economia: Cenários para 2023

Nelson Tavares Filho*, especial para a revista Política Democrática online (49ª edição: novembro/2022)

1) O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, através de um de seus representantes no Legislativo, protocolou um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que exclui do Teto de Gastos R$ 198 bilhões durante o período de quatro anos. Os recursos seriam utilizados em projetos sociais.

2) Todos sabemos que se inicia agora um processo de negociação para aprovação do projeto. Dificilmente, um projeto desse impacto é aprovado integralmente, tal qual elaborado.

3) Além do corporativismo dos legisladores, cada um tentando impedir impactos negativos nos setores que representam, este projeto apresenta justos motivos para não ser aprovado tal como está.

4) 2022 foi um ano melhor do que os últimos cincos que o procederam. A perspectiva de um aumento mais significativo do PIB (2,7%) e a queda do desemprego, retornando à casa de um dígito, cerca de 8%, são elementos que diferenciam este ano.

5) A dívida pública situava-se no início deste ano na ordem de R$ 5,6 trilhões. Ao longo do ano, sua relação com o PIB, que estava na casa de 90%, apresentou certa diminuição, basicamente devido ao crescimento do produto e da inflação, que permitiu ao governo maior arrecadação.

6) Este cenário não deve permanecer em 2023. Neste ano, a economia dos 20 maiores países – G20 – deverá apresentar taxas menores de crescimento, devido à crise energética e a guerra no continente europeu. Os Estados Unidos também passam por um processo de ajustamento, que dificultará o crescimento. Alguns analistas preveem uma recessão mundial.

7) No Brasil, a maior arrecadação obtida pelo governo no ano de 2022 não foi suficiente para zerar o déficit. A relação dívida pública/PIB diminuiu mais pelo crescimento do denominador.

8) O cenário de 2023 indica, sem contar os efeitos da PEC, um déficit público de R$ 200 bilhões. A aceitação integral da PEC significará elevar o déficit em quase 100%.

9) Teremos um cenário de crescimento da dívida, que deverá superar o montante de R$ 6 trilhões.

10) A elevação do déficit de R$ 400 bilhões anuais (R$ 200 bilhões da PEC mais R$ 200 bilhões de gastos correntes e outros) significará a necessidade de um esforço anual de R$ 40 bilhões, se calculada uma taxa média de juros de 10%.

Confira, a seguir, galeria:

Inflação Brasil economia | Imagem: Andrii Yalanskyi/Shutterstock
Baixo crescimento econômico | Imagem: motioncenter/Shutterstock
Brasil em baixa econômica | Imagem: Poring Studio/Shutterstock
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil | Imagem: Marciobnws/Shutterstock
Inflação de mercado no Brasil | Foto: FJZEA/Shutterstock
Inflação real no Brasil | Imagem: rafastockbr/Shutterstock
Regressão econômica | Imagem: eamesBot/Shutterstock
Economia 2023 | Imagem: xalien/Shutterstock
Inflação Brasil economia
Baixo crescimento econômico
Brasil em baixa econômica
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil
Inflação de mercado no Brasil
Inflação real no Brasil
Regressão econômica
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Baixo crescimento econômico
Brasil em baixa econômica
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil
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11) Para uma receita corrente que deve se situar perto de R$ 3 trilhões, significa que, a cada ano, teremos que arrecadar, no mínimo, 13% a mais do que o ano anterior, mantida as demais despesas constantes. Hoje R$ 40 bilhões significam 1,6% do orçamento, verba maior que a de muitos ministérios.

12) Não haverá outra solução sem que, além do maior esforço de arrecadação, diminua-se a verba orçamentária de outros ministérios. Corre-se o risco de tentar resolver um problema criando outro maior.

13) Ninguém discute a necessidade de, pelo menos para o próximo ano, fazer maior esforço para combater a miséria. Mas a busca de recursos para os demais anos deveria ser proveniente de uma análise aprofundada e revisão dos gastos do orçamento.

Sobre o autor

*Nelson Tavares Filho é economista, especialista em planejamento estratégico.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de novembro/2022 (49ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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Cacá Diegues: A vida ao vivo

Este ano não vai conseguir ser pior do que o que foi embora

Joca, meu amigo que mora nos altos do Rio, numa casa cercada por trecho preservado da Mata Atlântica, me telefonou outro dia. Me preparei para aceitar mais um convite para fim de semana no meio do mato, almoçando o que ele mesmo cozinha (Joca é especialista em peixe). Mas havia na voz de meu amigo um certo pânico, vi logo que não se tratava de nada divertido.

Com estardalhaço e a certeza de que estava sendo injustamente prejudicado, Joca desabafou, antes mesmo de um boa-noite regulamentar: ele havia assistido a um programa culto da televisão em que se dizia que o macaco-prego tinha o hábito de devorar o caule das palmas. E Joca sabia, por informação de um desses ecologistas palpiteiros que o frequentavam, que era justamente pelo caule que as palmas se multiplicavam. Como o que mais havia no mato em torno de sua casa eram macacos daquela família, tão numerosos quanto vorazes, Joca entrara em pânico. Se a notícia se confirmasse, a casa, passado algum tempo, poderia se tornar uma ilha de barro cercada de mato seco sem graça, por terrenos baldios sem verde algum.

Eu ia lhe dizer que, mesmo que por absurdo viesse a perder para sempre as palmas da vizinhança, lhe sobrariam folhas e flores, plantas e árvores, verdes infindáveis no entorno da propriedade. Não lhe faltariam mato e bichos de toda espécie para viver nele. Mas, antes que eu pudesse dizer alguma coisa, Joca adivinhou a direção de meu discurso em construção e berrou que ia ler em voz alta, no seu celular, cópia do que eu havia escrito há umas semanas na coluna, depois de um almoço ao ar livre em sua casa.

Tratava-se de um elogio generoso a aves e animais que da mata nos observavam a devorar a peixada que nosso anfitrião nos havia preparado. Entre tucanos e estranhas borboletas, maracanãs e maritacas, eu destacava os encantadores macaquinhos, bravos e simpáticos, moradores da floresta. Alguns até traziam às costas membros de sua prole que assim aprendiam o caminho das palmas, uma cena tornada inesquecível por minha filha Flora, apaixonada pelo lugar. E, com malícia, Joca se dirigia a mim como se eu fosse, em qualquer circunstância, um aliado daqueles animais. Como quem já sabia que, por velha amizade e parceria, eu ia defender os bichinhos gulosos e irresponsáveis, mesmo que estivessem acabando com o planeta.

Fora de si, Joca me anunciou que ia ler o final de meu artigo. Ele aumentou o volume da voz e leu sem respirar, sem respeitar pontos e vírgulas: “Os bichos andam sempre em grupos homogêneos sem a participação indesejável dos que são diferentes. Foi o ser humano que inventou a solidariedade e somente nós a praticamos sobre a face da Terra. Se não a praticássemos, a natureza se reduziria a uma constante guerra entre todos, pelo melhor abrigo e alimento”. Joca suspirou e completou a leitura: “Por que temos que nos submeter ao mal natural, se podemos inventar outro mundo, a partir de um pensamento solidário?”.

Pensei na utopia que a frase propunha, mas fiz silêncio e nem me ocorreu argumentar que todo macaco era um ser irracional, sendo aquele um pensamento muito sofisticado para um ser irracional. Joca também fez silêncio do outro lado, mas ainda suspirava, parecendo extenuado por tão pouco. Depois de algum tempo sem que nenhum dos dois dissesse qualquer coisa, ele mudou de tom e me convidou para dar um pulo com Renata em sua casa para tomar um vinho. Fui. Quase que como se a rápida conversa no telefone me impedisse de não ir.

A caminho de sua casa, meu celular tocou e Renata atendeu. Era ele. Depois de ouvi-lo, Renata, divertindo-se muito, ligou o viva-voz para que eu também ouvisse o que ele dissera: “Diga a ele para não se esquecer de trazer o raio X, que é pra gente ver o calo ósseo”. Eu ainda ria de seu inesperado humor negro, quando Joca retomou o tom anterior da conversa. “Que sujeitinho, né não? Esse cara não consegue dizer nada que seja construtivo, nada que nos ajude a viver”. Imediata e peremptoriamente, Renata respondeu por mim e por ela: “É isso aí, Joca. É isso mesmo”.

Não sei por quê, me vieram ao coração as dores de 2020, com a certeza de que este ano não vai conseguir ser pior do que o que foi embora. Há meses que não vejo meus amigos em pessoa. Estou de saco cheio de lives e encontros virtuais, agradeço o esforço que a ciência contemporânea faz para que não percamos o sinal dos outros, mas quero vê-los ao vivo, a elogiar a vida mesmo que eventualmente infelizes. Quero sobretudo abraçá-los muito nessa entrada de 2021.