aldo rebelo
Aldo Rebelo: ‘Brasil tem governo fraco e uma oposição desorientada’
Ex-presidente da Câmara dos Deputados lança pré-candidatura e diz que sua agenda 'não é identitarismo nem da guerra cultural'
Marcelo Godoy e Pedro Venceslau, O Estado de S.Paulo
O que unifica o País não é a agenda identitária ou guerra cultural, mas a necessidade de retomar o desenvolvimento, combater a desigualdade e valorizar a democracia. Com essa bandeira, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Aldo Rebelo (sem partido) decidiu lançar sua pré-candidatura à Presidência da República. Ex-integrante do PCdoB e do Solidariedade, ele lançou o livro O Quinto Movimento, onde expõe suas ideias para o País. Eis trechos da entrevista.
O sr. lançou a candidatura mesmo sem estar em um partido. Pode explicar esse projeto?
Atendi um apelo de amigos que me acompanham na vida política, que me pediram para participar do debate nacional em função do livro que escrevi. A ideia é lançar uma pré-candidatura independente. Depois, pensamos no partido. Essa agenda se volta para três questões decisivas: a volta do desenvolvimento, combater as desigualdades e valorizar a democracia, que eu respondo três, quatro vezes por dia se vai ter golpe, se não vai ter golpe. São esses os grandes desafios.
O que o sr. responde às pessoas quando elas perguntam se vai ter golpe?
Que não, evidentemente. Só alucinados imaginam que podem instalar uma ditadura para chamar de sua no Brasil. Qual a corporação que vai reunir forças, energias políticas e materiais para impor uma ditadura no Brasil? Não estamos em 1964. Em 1964 o golpe reuniu um amplo apoio social, econômico, diplomático e militar.
O sr. apoia a PEC Pazuello?
É preciso separar as funções técnicas que são próprias dos militares de funções que são de confiança do presidente da República. Você primeiro tem de ter uma quarentena, para não fazer a campanha usando a farda e a sua função de militar. O que o Eduardo Pazuello fez no Rio? Um comício. Na ativa isso não pode. Você quer correr o risco e concorrer? Tudo bem, mas depois você não volta, pois vai voltar pensando na próxima eleição. E aí não tem inocente. Quem começou com a politização das PMs foi o PT porque queria usar a influência política nas Polícias Militares contra os governos nos anos 1990. Isso depois foi se transferindo para todos os partidos. E a PEC também não pode tratar só dos militares. Tem de tratar de todo mundo.
O sr. acha que essa quarentena deve servir também para magistrados e procuradores?
Principalmente eles. Você tem corporações de Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal em que o sujeito fica ali e já transforma o uso da toga e da procuradoria e das prerrogativas de Policial Federal para fazer campanha. Não pode. O indivíduo tem o poder de prender e soltar como candidato.
O sr. é muito crítico da ação de ONGs na Amazônia e da política indigenista. Como o sr. acredita ser possível fazer a ocupação sem devastar a Amazônia?
A Amazônia é ao mesmo tempo a região mais rica do Brasil em biodiversidade, em recursos naturais e em minérios. Isso é uma promessa de riqueza e ao mesmo tempo ela é uma promessa de confusão. Porque o mundo resolveu tratar a Amazônia como se fosse uma espécie de Antártida verde submetida a considerações de interesses comerciais, econômicos e geopolíticos que são antigos. É preciso ter um programa que reúna em primeiro lugar a soberania brasileira. Isso não está em negociação. Segundo: o direito ao desenvolvimento econômico da agricultura, da indústria da biotecnologia. Terceiro: a proteção das populações indígenas. Elas devem receber a assistência do Estado brasileiro. Elas vivem hoje manipuladas por essas ONGs. E quarto, a proteção da biodiversidade, da floresta, das águas.
Como as ONGs manipulam a questão indígena?
Chega uma ONG europeia e abre um escritório na Faria Lima e começa a vender para o exterior que a Amazônia vai ser destruída em breve e que precisa de dinheiro para protegê-la. Esse é um tipo de manipulação explícita e mais clara. Deixa eu fazer um reparo: há também ONGs humanitárias.
De que forma atacando as ONGs, o governo Bolsonaro fortalece essas ONGs?
Evidente que fortaleceu e deu protagonismo que elas não tinham mais. O Brasil é um país isolado, sem aliados no mundo e nem nos vizinhos. Não é protagonista nem na América do Sul. Vai desembarcar por esses dias uma autodenominada internacional progressista, dirigida por celebridades americanas e europeias, ao qual está vinculada o ex-candidato à presidência do Partido Democrata Bernie Sanders e recebeu apoio de intelectuais e líderes progressistas? Tem coisa mais desorientada do que isso? Você acolher para barrar a Ferrogrão. Eles nem sabem o que é a Ferrogrão. Você imagina os EUA, a China, a Rússia, a França permitir que personalidades estrangeiras entrassem no país para dizer que ferrovia pode ser construída ou deixar de ser construída? A China que construiu 30 mil quilômetros de ferrovias nos últimos dez anos? Não. Isso é uma fragilidade do Brasil e mostra um governo fraco e uma oposição desorientada. O Brasil virou palco de disputa entre a agenda do Partido Republicano e a agenda do partido Democrata.
A oposição Bolsonaro está desorientada?
Completamente e essa caravana da internacional progressista é exemplo disso. O documento que enviaram aos EUA pedindo sanções comerciais contra o Brasil. Então porque eu sou contra o Bolsonaro eu vou pedir sanções comerciais contra o Brasil. Esse pessoal perdeu o juízo.
O senhor quer ser uma candidatura de terceira via?
Não. Terceira via não tem mais vaga. Minha pré-candidatura é de uma agenda que pode unir amplamente o País. Não é da esquerda nem da direita. Não é identitarismo nem da guerra cultural.
O sr. diz que o momento atual deve marcar uma nova época no País. Por quê?
Porque ainda dispomos dos recursos materiais e do conhecimento para retomar a reconstrução do país interrompida recentemente O Brasil voltou as suas energias para construir seu território, sua base física, mas hoje nós nos voltamos contra os principais responsáveis por isso, que foram os bandeirantes e alguns se dedicam em queimar as suas estátuas e vilipendiar a sua memória. Nós nos perdemos. Vivemos da guerra identitária – abandonamos a ideologia pela biologia – e da guerra cultural. E o que o País necessita, que é voltar a crescer e ser mais socialmente equilibrado e valorizar a democracia, ficou à margem do País. Você terá gente conservador nessa agenda? Não tenho dúvida nenhuma. Muita gente conservadora quer isso e muita gente progressista, de esquerda também quer. O que unifica o País e atrai as energias materiais e espirituais para remover os obstáculos ao nosso desenvolvimento não é a agenda identitária e nem da guerra cultural.
Por que não estar com Lula, que foi seu aliado?
Tenho um grande apreço pelo presidente Lula e gratidão pela confiança que recebi. Mas eu também tive alianças com o PT e disputas. O problema que eu vejo no PT é outro. Os pobres elegem os governos do PT para melhorar a vida, a educação, saúde e segurança e a classe média petista da Vila Madalena acha que o presidente foi eleito para fazer a agenda identitária, que é minoria na sociedade. Esses grupos organizados e articulados dentro do partido acham que devem governar o País com a agenda identitária e com a agenda das ONGs na Amazônia. Essa é a questão. Como é o caso do Bolsonaro também. Como é que Bolsonaro foi eleito? Naturalmente porque o povo queria uma renovação, alguém que não fosse acusado de corrupção, que tivesse a imagem do militar e aí ele se elege presidente. E ele pensa que foi eleito para fazer a guerra cultural, para brigar com os chineses, com os americanos, com os franceses, com os argentinos, com os venezuelanos, com bolivianos e peruanos. Esse é o problema. Um grupo mais articulado na grande frente que elege os governos acha que a agenda que foi eleita foi a dele, que geralmente é minoritária na sociedade. Bolsonaro não foi eleito para fazer guerra cultural. Essa é a questão. E acho que a agenda do PT não vai mudar. É a ideia de que pode governar o Brasil com o programa econômico da Faria Lima, com o programa social do Banco Mundial e a agenda do meio Ambiente das ONGs e da embaixada da Noruega. Isso pode até ganhar a eleição, mas isso não tira o País do lugar.
O sr. fala sobre pauta identitária. Como o sr. avalia o incêndio da estátua do Borba Gato?
Isso é resultado da nossa desorientação. A impotência para construir o futuro leva os desesperados a tentar o passado. Você não sabe como construir o futuro, então você se volta para o passado, que deve ter alguma responsabilidade pela sua desorientação, pelas suas frustrações, pelo seu fracasso. Outros procuram no passado a inspiração no que foi feito de bom. Não existe um passado apenas coberto de defeitos, de mazelas e de morbidez ou somente de virtudes.
Fonte: O Estado de S. Paulo
El País: “Não se sabe se quem manda no país é um juiz ou o presidente”, diz Aldo Rebelo
Aldo Rebelo promove agenda de crescimento como pré-candidato presidencial pelo Solidariedade. Após 40 anos de PCdoB, ex-ministro diz que mudou de partido "para não mudar de convicções"
Por Rodolfo Borges, do El País
Ex-presidente da Câmara e ex-ministro multitarefa, Aldo Rebelo deixou uma militância de 40 anos no PCdoB no ano passado e migrou para o PSB. Sete meses depois, em outro movimento tão surpreendente quanto, trocou o partido socialista pelo Solidariedade e apresentou uma pré-candidatura à presidência da República. Deixou de ser comunista? "Eu me considero portador dos mesmos valores, das mesmas ideias, dos mesmos objetivos. Sou socialista desde menino", responde ao EL PAÍS, sentado numa cadeira de balanço em seu apartamento, em São Paulo. O que mudou, para Aldo, foi a esquerda. “Mudei de partidos para não mudar de convicções. Para não mudar de ideia, de rumo. A agenda da esquerda foi mudando, foi abraçando esses temas do identitarismo, do multiculturalismo, que são temas importantes, mas que eu não julgo que sejam os temas essenciais e decisivos para o país retomar o desenvolvimento, o crescimento, a luta contra as desigualdades".
O convite para migrar para o Solidariedade veio quando o PSB embarcou de forma reticente na ainda não anunciada pré-candidatura à presidência do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa. "Já havia uma afinidade com o Solidariedade, principalmente com a base sindical, que me apoiou durante o debate do relatório Código Florestal, quando eu fiz um manifesto em defesa da questão nacional, dos direitos sociais e da democracia", conta. Nem todo mundo entendeu o movimento, contudo, e o ex-deputado foi vaiado durante celebração do 1º de maio em Curitiba. Ao contrário de Aldo, o Solidariedade do deputado Paulinho da Força (SP) apoiou o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. "São coisas da política", minimiza o pré-candidato. "Estou habituado a esse tipo de enfrentamento desde a época em que fui presidente da UNE [União Nacional dos Estudantes]. Acho que é parte do jogo, o que mostra também a dificuldade de unir forças mais amplas em torno de projetos comuns".
Polarização
Em nome de unidade nacional, o ex-ministro da Defesa, do Esporte e da Ciência que presidiu a Câmara dos Deputados de 2005 a 2007 e coordenou as relações institucionais do Governo Lula em 2004 e 2005 propõe uma "agenda que rompa essa polarização do país entre esquerda e direita". "Há uma agenda comum que pode reunir forças amplas, como o próprio Lula fez. Ele não tinha um governo de esquerda, o vice dele [o falecido José Alencar] era um homem da indústria, líder empresarial. Vários dos ministros estavam longe de ser de esquerda, como Roberto Rodrigues [da Agricultura] e [Luiz Fernando] Furlan [do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior]. O que se buscava era unir o país em torno do crescimento, da construção do país".
Mercado e Estado
Para voltar a crescer, defende o pré-candidato, o país precisa dar fim ao "falso conflito entre mercado e Estado. "O primeiro passo é criar um ambiente favorável ao investimento privado e os instrumentos favoráveis ao investimento público. A China não conhece esse conflito. Talvez seja a principal economia estatal do mundo, e a economia de mercado mais dinâmica do mundo", argumenta. Mas como replicar a experiência chinesa em um ambiente democrático? "Provavelmente a China não está interessada em copiar o nosso modelo político, e é muito provável também que o Brasil não vai adotar o modelo político chinês. Mas o Brasil tem de procurar o seu caminho", responde.
Qualquer que seja a solução, defende, ela terá de passar pela política. “Não se sabe se quem manda mais no país é um juiz de primeiro grau ou o presidente da República. O poder dança entre as corporações. Não temos um Executivo forte, capaz de liderar”, critica, lembrando que na eleição de 2014 "a corrente política derrotada resolveu que não devia esperar a próxima eleição, em 2018, e iniciou uma jornada de tentativa de obstrução do Governo eleito, que já enfrentava dificuldades na economia, agravadas por erros políticos". "[O presidente Michel] Temer é pessoa boa e respeitável, mas o processo pelo qual ele chegou à presidência é carente de legitimidade".
Lava Jato
Questionado sobre o que pensa em relação à Operação Lava Jato, Aldo Rebelo elogia o combate à corrupção, mas enxerga problema "quando as instituições encarregadas de uma tarefa específica se julgam na pretensão ou no direito de ser protagonistas da política". "Mais do que isso, de substituir a política como atribuição do destino da sociedade. No mundo antigo, persa ou grego, o destino era uma atribuição dos deuses. Quando Roma inventou a política, deu o destino — e a tragédia — nas mãos dos homens. Às vezes eu fico com a impressão de que essas corporações querem substituir os deuses antigos", critica, referindo-se a instituições como o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União.
Militares
E os militares, com quem Aldo conviveu entre 2015 e 2016, enquanto ministro da Defesa, que papel têm em sua planejada retomada do país? "Não vejo nenhuma razão para receio em relação ao papel dos militares. Eles querem, como a maioria dos brasileiros, um país melhor, mais justo, mais honesto, mais desenvolvido. Eles dão opinião como mais um brasileiro de classe média, e não como candidato a tutor, como muita gente interpreta". Segundo ele, a preocupação do militares é com o país, não com a política. "Eles não querem tomar conta dessa agenda difícil da crise fiscal, da Previdência, de segurança pública", comenta, lembrando que, quando ministro, mobilizou "200.000 homens para combater o mosquito da zika" e que sargentos, tenentes e comandantes das Forças Armadas se reuniram para salvar quatro milhões de sertanejos da seca em outra operação à época.
"Essas instituições têm essa dupla missão: defender e ajudar a construir o país", resume. O que ele condena é a tentativa de se apropriar do prestígio dos militares, que poderia esta acontecendo na intervenção federal no Rio de Janeiro. "O risco é transferir o desgaste do Governo para as Forças Armadas", alerta. "As Forças Armadas podem ajudar a reconstruir o aparelho de segurança publica do Rio de Janeiro. A presença ostensiva pode inibir o crime, mas há uma coisa que dará errado: tentar usá-las na repressão ao crime comum. Elas não dispõem dos meios, inclusive de inteligência. Isso é com Policia Civil e Militar".
Alianças
O pré-candidato à Presidência diz que ainda é cedo para discutir acordos partidários, apesar de seu nome ser especulado para chapa com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Enquanto não fecha parcerias, ele viaja pelos quatro cantos do país para promover sua agenda de retomada do crescimento, de aldeias indígenas ao Agrishow de Ribeirão Preto (SP). Com seu eclético histórico de alianças, que vão do PT ao DEM, há algum concorrente ao Palácio do Planalto com que Aldo Rebelo não aceite conversar? “Não tenho lista de vetos”, responde. Nem o deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ), que tem sido alvo de tantas críticas? "Eu passei a vida inteira na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional [da Câmara] conversando com Bolsonaro. Com as nossas diferenças, mas com respeito. Sempre respeitei e fui tratado com muito respeito. Dei projetos para ele relatar quando presidi a comissão. Era um deputado como qualquer outro. É candidato à presidência pelas regras do jogo. É preciso respeitá-lo e as pessoas que votam nele", diz.
Crítico da prisão do ex-presidente Lula, o ex-ministro faz um chamado ao diálogo a partir do incidente com tiros na passagem da caravana do petista pelo Paraná. "Imagine quem está seguro no país se uma caravana com dois ex-presidentes da República é vítima de um atentado a bala. No Rio de Janeiro, recentemente, um general da reserva ia participar de um debate e foi agredido por um militante de esquerda. É inconcebível. A política faliu como alternativa de solução dos problemas se você não permite que seu adversário circule, faça campanha. Amanhã alguém pode dizer que você também não pode. Como resolver divergências sem conversar? Pode continuar discordando, mas não pode obstruir os meios de debate.”