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Afonso Benites: Congresso antecipa debate por sucessão de Maia e Alcolumbre

Articulação pelas eleições das Casas, que só acontecem em fevereiro de 2021, está a todo vapor, sob desafio de manter independência do Governo. Apesar do apoio, deputados centristas estão divididos, à espera dos efeitos da pandemia sobre a popularidade do presidente no próximo ano

Mesmo com sessões à distância por causa da pandemia do novo coronavírus, congressistas brasileiros têm intensificado a discussão para a sucessão dos comandos da Câmara e do Senado Federal. A votação ocorrerá na primeira semana de fevereiro de 2021. A escolha dos presidentes das duas Casas legislativas marcará a segunda metade do Governo Jair Bolsonaro (sem partido), quando se saberá exatamente qual o impacto humano, social e econômico da pandemia do coronavírus que, até lá, terá ultrapassado a marca dos 100.000 óbitos. São as mesas diretoras de Câmara e Senado que definem a pauta de votação dos projetos de lei, das medidas provisórias e das propostas de emendas constitucionais. E é o representante dos deputados quem tem, inclusive, o poder de dar o pontapé inicial em processos de impeachment contra o chefe do Executivo.

Entre os opositores, há quem aposte que uma espécie de “bola de neve” deve ser formada e que acabará pressionando o Governo. Os argumentos dessa corrente é que a economia deve degringolar com uma queda acentuada do Produto Interno Bruto (PIB) de até 9%, e um aumento exponencial do desemprego o que, consequentemente, deve desgatar a popularidade do presidente – hoje oscila entre 25% e 33%, de acordo com o instituto de pesquisa. Com menor apoio popular, o que deve segurar um mandatário no poder deve ser o Legislativo, onde tramitam mais de 40 pedidos de destituição presidencial. Aqui consta apenas o cálculo político, não o jurídico-criminal, onde, no Tribunal Superior Eleitoral, Bolsonaro enfrenta ao menos mais seis processos que pedem a cassação da chapa que ele compôs com o general Hamilton Mourão (PRTB) na eleição de 2018.PUBLICIDADE

Ciente do risco que corre principalmente na Câmara, Bolsonaro já cedeu espaço em seu Governo ao Centrão, grupo fisiológico de cerca de 200 deputados de centro direita. Além disso, deu mais poder a esse grupo ao destituir sua fiel aliada Bia Kicis (PSL-DF) da vice-liderança do Governo na Câmara após ela votar contra o novo Fundeb e deixar a vaga reservada para um membro do Centrão. Mas o apoio desses parlamentares não é a garantia de terá uma viagem em céu de brigadeiro. A razão: o Centrão está dividido. Uma parte considerável ainda apoia Rodrigo Maia (DEM-RJ) e defende uma maior independência com relação ao Executivo. Maia é o mais longevo presidente da Câmara, tem três mandatos seguidos, sendo um tampão. Ele não pode mais disputar a reeleição, mas a sua bênção a um nome tem certo peso na Casa.

Entre os possíveis nomes na disputa pela Câmara estão ao menos cinco do Centrão, o que reforça essa divisão. Estão no páreo Arthur Lira (Progressistas-AL), Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), Marcos Pereira (Republicanos-SP), Marcelo Ramos (PL-AM) e Capitão Augusto (PL-SP). Os três primeiros estariam entre os favoritos do Centrão para a disputa. Os dois últimos buscam deixar seus nomes em evidência para possivelmente concorrerem a outras funções dentro da Mesa Diretora ou para presidente de comissões permanentes, por onde tramitam os projetos de lei antes de chegarem ao plenário. Algo que Ramos refuta. “Não é hora de antecipar a eleição porque a superação dos efeitos sanitários, econômicos e sociais depende de união da Câmara. Antecipar o processo gerará uma divisão que prejudicará o país”.

Um outro possível candidato é da oposição ao Governo Bolsonaro, Alessandro Molon (PSB-RJ). Outro nome cogitado é o de Fábio Ramalho (MDB-MG), que ora circula entre os independentes, ora entre os governistas. Por fora ainda aparece o nome de Baleia Rossi (MDB-SP). O que pesa com relação ao nome de Rossi é o fato de ele ser o presidente do partido e líder da legenda na Câmara, além de uma tentativa dos emedebistas de focar no comando de apenas uma das Casas do Legislativo, o Senado. “Quem muito quer, nada tem. O acordo é costuramos entendimentos com deputados e senadores para conseguirmos retomar o comando do Senado, não o da Câmara”, disse um parlamentar do MDB que participa das negociações.

Rodrigo Maia tem bom relacionamento com todos os concorrentes, mas ainda não deu sua palavra a nenhum porque ainda aguarda os movimentos do bolsonarismo. Uma coisa é certa. Ele não quer Lira por entender que o parlamentar é muito próximo a Bolsonaro – as indicações para cargos no Governo tiveram o seu aval – e porque seria uma versão 2.0 de Eduardo Cunha (MDB-RJ), o ex-presidente da Câmara que recriou o Centrão e acabou preso condenado por corrupção. “Lira é herdeiro do Cunha. É o político do baixo clero que faz de tudo para chegar ao poder”, afirmou um deputado governista. O que pesa a favor dele é que, atualmente, lidera um grupo de nove legendas que, juntas, somam 221 dos 513 parlamentares.

Interlocutores de Maia afirmaram que ele estaria propenso a apoiar Marcos Pereira, um membro da Igreja Universal e representante da bancada evangélica, ou Aguinaldo Ribeiro. A opção Pereira, que é vice-presidente da Câmara, só seria conveniente caso ele demonstrasse independência com relação a Bolsonaro e um descolamento de Lira. Já Ribeiro seria uma espécie de estepe, caso seja possível rachar o Centrão ao meio. Para onde Maia apontar deverá haver um apoio quase automático de um grupo de 106 parlamentares do MDB, DEM, PSDB, Cidadania e PV. As lideranças dessas siglas comprometeram-se a caminhar juntas na disputa pela Câmara.

Senado e o feudo do MDB

No Senado, o cenário deve ter menor influência do Governo, onde ele não tem base e o Centrão tem pouca interferência no plenário. Bolsonaro tenta costurar apoio ao seu atual líder no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO). Ele, no entanto, enfrentará resistências dentro do próprio MDB, que está empenhado em retomar o comando, mas minimamente descolado do Governo. Desde o fim da ditadura militar, há 35 anos, o Senado só não foi comandado por emedebistas em sete anos, durante duas gestões de Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), um mandato tampão de Tião Viana (PT-AC) e a atual, de Davi Alcolumbre (DEM-AP). Era quase um feudo do MDB.

Desde 2019, o Senado está sob a batuta de Alcolumbre, que travará uma batalha judicial para disputar a reeleição. A Constituição impede que um presidente de uma das casas do Legislativo dispute a reeleição dentro de uma mesma legislatura. O entendimento até aqui era de que a legislatura se encerrava a cada quatro anos e o mandato de presidentes da Casa é de dois anos. Mas Alcolumbre tentará que o Supremo Tribunal Federal declare que a metade de um mandato de um senador é aos quatro anos, já que o mandato de senadores é de oito anos. E, portanto, poderia disputar a reeleição. A tese encontra resistência dentro do próprio Senado, entre quem o ajudou a acabar com a hegemonia emedebista e derrotar Renan Calheiros (MDB-AL) em 2019.

Internamente, no MDB, a bancada se decidirá por Eduardo Braga (MDB-AM) ou Simone Tebet (MDB-MS). Ela tem maior simpatia do grupo independente Muda Senado, formado por 21 dos 81 parlamentares, que estuda também a viabilidade de lançar Álvaro Dias (Podemos-PR). O sentimento entre de três dos 13 senadores emedebistas é que Simone une, enquanto qualquer um dos Eduardos, divide.

Por fora, também circula o nome de Antonio Anastasia (PSD-MG), que deixou o PSDB para ter mais apoio no Legislativo. Vice-presidente do Senado e visto como um técnico, Anastasia ainda estuda o terreno para lançar seu nome. Não gostaria, por exemplo, de disputar com Simone, de quem é amigo, ou de não ter o apoio do grupo Muda Senado. Limitada a cerca de 15 senadores, a oposição ao Governo pode lançar um nome apenas para marcar presença na disputa. Em caso de segundo turno, deve apoiar quem menos se identificar com Bolsonaro.


O Estado de S. Paulo: Bolsonaro acha que Maia ligou 'bomba relógio' e Congresso prepara troco

Bolsonaro iniciou uma rodada de conversas com dirigentes do Centrão; as negociações do Planalto com o Congresso, a partir de agora, serão feitas com deputados e senadores

Vera Rosa, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - O mais duro ataque público do presidente Jair Bolsonaro a Rodrigo Maia (DEM-RJ), na noite de quinta-feira, 16, pode custar caro ao governo. O novo capítulo do duelo entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, após a demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem como pano de fundo o programa de socorro a Estados e municípios, no valor de R$ 89,6 bilhões. A briga, no entanto, vai muito além dessa cifra.

Convencido de que Maia quer não apenas derrubá-lo como fazer uma manobra para ser reeleito ao comando da Câmara, em 2021, Bolsonaro iniciou, nas últimas semanas, uma rodada de conversas com dirigentes do Centrão. No novo modelo de articulação política planejado pelo presidente, as negociações do Planalto com o Congresso, a partir de agora, serão feitas com deputados e senadores.

Antes carimbados como “velha política”, líderes de legendas como PP, PR e PSD foram chamados para encontros reservados com Bolsonaro. Isolado, o presidente pediu ajuda a todos eles para a votação de projetos que possam amenizar a crise social e econômica provocada pela pandemia do coronavírus.

Na avaliação de Bolsonaro há uma “bomba-relógio” fiscal em curso, armada por Maia, com o objetivo de ferir de morte sua gestão. “Parece que a intenção é me tirar do governo. Quero crer que eu esteja equivocado”, disse o presidente, na noite desta quinta-feira, em entrevista à CNN Brasil. “Qual o objetivo do senhor Rodrigo Maia? Ele quer atacar o governo federal, enfiar a faca. (...) Está conduzindo o País para o caos”, emendou.

Dois dias antes, Maia já havia reclamado dos “coices” dados pelo governo. Desta vez, porém, mudou o linguajar e falou em pedras. “Ele joga pedras e o Parlamento vai jogar flores”, afirmou o deputado.

Apesar do discurso, o troco pode vir a cavalo. O governo teme, por exemplo, que a Medida Provisória instituindo o contrato verde e amarelo perca a validade. A MP flexibiliza o pagamento de direitos trabalhistas e contribuições sociais para facilitar a contratação de jovens e funcionários com mais de 55 anos. Foi aprovada pela Câmara, mas, se não for votada até segunda-feira, 20, caduca. Ao que tudo indica, há mais uma derrota no horizonte para o Planalto.

Bolsonaro está especialmente irritado com Maia porque, em videoconferências com banqueiros e investidores, o deputado tem alfinetado sua administração. O presidente da Câmara chegou a dizer, num desses encontros virtuais que, se não fosse a crise do coronavírus, o Congresso já teria rompido com Bolsonaro.

A demissão de Mandetta azedou de vez um relacionamento que já era ruim. A exemplo de Maia e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (AP), Mandetta é filiado ao DEM, partido que também integra o Centrão.

Na prática, Bolsonaro aproveitou o bate-boca desta quinta para desviar o foco negativo da dispensa de Mandetta, o ministro que era mais popular do que o chefe. Ao anunciar a saída, o presidente foi, novamente, alvo de panelaços em várias capitais do País.

O confronto entre Bolsonaro e Maia, no entanto, vem de longe. Tanto que o presidente da Câmara nem fala mais com o ministro da Economia, Paulo Guedes, sob a alegação de que não quer se aborrecer. A queda de braço ganhou contornos mais nítidos após a disputa pelo controle do Orçamento e chegou ao ápice recentemente, com a aprovação do programa de socorro a Estados e municípios.

O valor de R$ 89,6 bilhões que passou pelo crivo da Câmara é outro revés para o governo, que tenta mudar a proposta na votação no Senado, oferecendo uma transferência direta com valor fixo de R$ 40 bilhões. Guedes argumenta que “não se pode dar um cheque em branco a governadores de Estados mais ricos”, pois não é possível saber quanto tempo vai durar a pandemia.

Bolsonaro também usa essa justificativa para não ampliar os repasses a Estados que adotam medidas de isolamento social para enfrentar o coronavírus.

A avaliação ali é a de que, ao compensar por seis meses a perda na arrecadação de dois impostos (ICMS e ISS), o governo federal acabará bancando o prolongamento da quarentena em Estados administrados por adversários, como João Doria (São Paulo) e Wilson Witzel (Rio). Os dois são pré-candidatos à cadeira de Bolsonaro, em 2022.

“O que o povo tem a ver com a briga do presidente com o governador João Doria?”, provocou Maia, que é próximo do tucano. “Vamos deixar as brigas para o futuro”.

Maia tem dito que não fará qualquer movimento para conquistar novo mandato à frente da Câmara. Antes da pandemia, porém, Alcolumbre já havia consultado até mesmo juristas sobre o assunto.

A Constituição proíbe que presidentes da Câmara e do Senado sejam reconduzidos ao posto na mesma legislatura. Para alterar esse quadro, o Congresso precisaria aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e, ainda, alterar o regimento das duas Casas.

Diante da crise do coronavírus, no entanto, o Congresso pode adotar uma fórmula que permita a reeleição de Maia e Alcolumbre, para desespero dos bolsonaristas. Cresce, ainda, a possibilidade de adiamento das eleições municipais de outubro para dezembro.

Nas redes sociais, seguidores de Bolsonaro já comemoram com antecedência a saída de Maia e Alcolumbre de seus postos. No afã de ver a dupla pelas costas, eles erraram até mesmo a data do término da gestão no Congresso. Marcaram dezembro, quando, na realidade, é fim de janeiro. De 2021.


Leandro Colon: Qual é a de Alcolumbre ao silenciar sobre Bolsonaro e os protestos?

Silêncio se agrava quando integrantes do próprio Legislativo atuam pelo ato contra deputados e senadores

O espírito de baixo clero da política que encarnou por anos a vida pública do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), persiste após um ano de sua eleição para dirigir a Casa dos senadores.

Se Jair Bolsonaro não se comporta à altura do cargo que ocupa, o que dizer de Alcolumbre? Sua cadeira representa também a presidência do Congresso. O senador amapaense comanda um dos três Poderes.

Não se ouviu até agora um pio de Alcolumbre sobre o apoio de Bolsonaro aos protestos do dia 15 de março contra o Parlamento. Um silêncio que se agrava quando integrantes do próprio Legislativo atuam pelo ato contra deputados e senadores.

Um deles é a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS). “Eu estou nos bastidores e posso dizer com propriedade: não duvidem do general Heleno”, disse. O que Alcolumbre acha da colega que turbina a ameaça do chefe do GSI ao Congresso?

Nos bastidores, senadores dizem que o presidente do Senado está mais preocupado em eleger o irmão para a Prefeitura de Macapá, em outubro, do que com os assuntos de Brasília.

É fato que se esperava uma reação mais firme de Rodrigo Maia (DEM-RJ) ao episódio do vídeo compartilhado por Bolsonaro. O mesmo vale para o presidente do STF, Dias Toffoli.

Ambos divulgaram notas oficiais frias, burocráticas, como se estivessem cumprindo uma obrigação política de se manifestar (quase pedindo desculpas ao presidente da República). Mas ao menos eles fizeram o papel institucional de reagir a mais um descalabro do Planalto.

Alcolumbre não surpreende. Ao falar sobre os insultos de Bolsonaro à jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha, afirmou que eram “página virada”. A declaração foi seguida por frases anódinas, sem repudiar em nenhum momento o comportamento espúrio do chefe da República.

Além do Amapá, a prioridade de Alcolumbre tem sido operar uma manobra casuística na Constituição para permitir sua reeleição à presidência do Senado em 2021. Ele parece não estar nem aí para o resto.

*Diretor da Sucursal de Brasília.