As previsões para o Brasil são ainda mais sombrias em comparação com as principais economias mundiais. O país deverá crescer apenas 2,9%, em 2021, de forma que o PIB brasileiro ao final desse ano ainda estará 6,25% abaixo do valor verificado no final de 2019, avalia José Luis Oreiro
A eclosão da pandemia do coronavírus no primeiro trimestre de 2020 está produzindo a maior contração coordenada do nível de atividade econômica em nível global, desde a grande depressão de 1929. A média das previsões do Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico e da Comissão Europeia aponta para uma queda de 6,5% da economia mundial, em 2020, com as economias avançadas apresentando recuo mais forte, de 7,5%. Ao passo que as economias em desenvolvimento devem apresentar retração mais suave, de “apenas” 3,0%. Claro está, contudo, que boa parte da queda mais suave das economias em desenvolvimento relativamente às economias avançadas se deve à projeção média de queda de 0,6%, em 2020, para a economia da China.
Quanto à economia brasileira, a média das previsões aponta para retração de 8,7%, configurando, assim, a mais rápida e intensa queda do nível de atividade econômica já registrada no país desde 1929.
Para o ano de 2021, a média das previsões das instituições internacionais listadas acima aponta para recuperação relativamente rápida da economia mundial, que deverá apresentar crescimento de 5,4%, em 2021. Mas a recuperação será extremamente desigual entre os países analisados. Enquanto a China deverá apresentar crescimento de 4,9%, em 2021, devolvendo toda a perda de produto ocorrida durante a crise do coronavírus, as economias avançadas deverão apresentar crescimento de 4,4% no próximo ano, insuficiente para recuperar a perda de produção e de renda ocorrida ao longo do ano de 2020. As previsões para o Brasil são ainda mais sombrias: a economia brasileira deverá crescer apenas 2,9%, em 2021, de forma que o PIB brasileiro ao final desse ano ainda estará 6,25% abaixo do valor verificado no final de 2019.
A teoria macroeconômica convencional apresenta os ciclos econômicos como oscilações de amplitude e periodicidade irregular em torno de uma tendência de longo prazo relativamente constante, determinada por fatores do lado da oferta da economia e independente das flutuações do nível de atividade. Dessa forma, períodos de forte contração do nível de atividade econômica deveriam ser seguidos por períodos de crescimento acelerado, caso a tendência de crescimento de longo prazo não seja alterada ao longo do processo. As previsões acima, contudo, parecem apontar para efeitos persistentes da crise do coronavírus sobre o nível de atividade econômica, pois as projeções de crescimento para 2021, para a maior parte dos países, indicam que suas economias chegarão ao final desse ano com um nível de atividade muito abaixo do nível prevalecente antes da pandemia.
O caso brasileiro é particularmente grave nesse quesito. Não só a economia brasileira ao final de 2021 estará operando muito abaixo do nível verificado no final de 2019, como ainda estará 9,4% abaixo do indicador verificado em 2014! Isso porque, no início de 2020, a economia brasileira sequer havia se recuperado dos efeitos da crise de 2015-2016, quando o nível de atividade apresentou contração de 6,81%. A perda de produto não recuperada ao longo do período 2017-2019 será somada à contração esperada de 9,10% (pelo FMI), no ano de 2020, totalizando queda de produto de 11,96% no período 2015-2020.
O cenário para 2021 é assustador. Os programas do Governo Federal, de manutenção de renda e de emprego, devem ser terminados no final do terceiro trimestre de 2020. Se nada for posto em seu lugar, teremos queda de renda significativa no último trimestre do ano, o que deverá produzir uma segunda contração do nível de atividade econômica e novo mergulho recessivo. Além disso, se o teto de gastos não for flexibilizado em 2020, com a exclusão dos investimentos públicos do teto a partir de 2021, então o Governo Federal será obrigado a recomeçar o ajuste fiscal, mas com uma economia que deverá registrar índices cavalares de ociosidade da capacidade produtiva.
Nesse contexto, parece pouco provável que a economia brasileira possa ter desempenho de crescimento superior ao que obteve no período 2017-2019, ou seja, um crescimento médio em torno de 1% a.a. Com esse ritmo, a economia brasileira só retornaria ao nível de PIB de 2014 em 2033! Se esse cenário se concretizar, a economia brasileira passará por período de estagnação de quase 20 anos. Não acredito que uma estagnação tão longa seja política e socialmente sustentável. Ou a sociedade brasileira se livra das amarras de um pensamento econômico obsoleto ou ela poderá trilhar o caminho da autodestruição.
José Luís Oreiro é professor Associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília. E-mail joreiro@unb.br