Jornalista, escritor, dramaturgo, apresentador de TV, comentarista de rádio, tradutor. Xexéo foi bem em tudo o que fazia, mas foi como cronista que deixou sua marca registrada, escreve Henrique Brandão
No jargão futebolístico, quando se diz que um jogador “brinca nas onze” quer dizer que ele joga bem em qualquer posição. Poucos têm talento para se sobressair em várias funções. Não é para qualquer um: o cara tem que ser craque.
Artur Xexéo era assim, um craque. Fazia bem tudo em que se metia. Jornalista de formação, foi também escritor, dramaturgo, apresentador de TV, comentarista de rádio, tradutor. Por onde esteve, deixou sua marca, virou referência.
O jornalismo não foi sua primeira escolha, na hora de entrar para a faculdade. Como era bom em Matemática, Xexéo achou que daria um bom engenheiro. “Quando eu cheguei na Engenharia, levei um susto, porque não gostava de nada. Fiquei apavorado, era inteiramente entediante para mim aquilo”, disse, em depoimento ao projeto Memória Globo. Para não desapontar os pais, seguiu na faculdade: foi fazer Jornalismo. O erro de cálculo do jovem bom em Matemática, revelou-se um acerto. Perdeu a Engenharia, mas ganhamos, todos, um brilhante jornalista.
Xexéo começou a trabalhar na imprensa em 1975. Passou pelos principais jornais do Rio – “Jornal do Brasil” e “O Globo” –, onde foi colunista e editor, e pelas revistas “Veja” e “IstoÉ”. Além da imprensa escrita, Xexéo participou do programa Estúdio i, da Globo News, e foi comentarista da entrega do Oscar na TV Globo. No rádio, participou de programa semanal na CBN.
Tinha vasta cultura cinematográfica e teatral. Em suas colunas, estava sempre comentando filmes e peças, e não apenas as estreias do circuito nacional. Viajava com frequência para Nova York ou Londres, cidades que conhecia como a palma da mão, onde acompanhava os lançamentos cinematográficos e as novidades da Broadway e do West End londrino.
Sua paixão pelo teatro acabou por levá-lo a arriscar-se como dramaturgo. Sempre na linha dos musicais, escreveu “A Garota do Biquini Vermelho”, “Nós Sempre Teremos Paris”, “Cartola – O Mundo é um Moinho” e “Minha Vida Daria um Bolero”.
Mas foi como cronista que Xexéo deixou sua marca registrada. O estilo coloquial o aproximava do leitor. A leveza do texto e o humor das sacadas transformavam as observações que fazia nas colunas, em animados papos nas esquinas, mesas de botequim, nas rodas de praia e nos almoços de família.
Costumava dizer, com bom humor, que tinha “17 leitores”. Tinha muito mais, claro. Uma gigantesca legião de ávidos leitores acompanhava semanalmente suas crônicas. O concurso de “Mala do Ano”, por exemplo, criado por ele, mobilizava o Rio de Janeiro no fim de ano.
E as intermináveis fitas banana, polêmicas que surgiam por uma referência de filme, música ou peça que ele citava em um artigo e os leitores contestavam? Passava semanas dialogando na coluna com seus seguidores, sempre acrescentando informações, de tal forma que, ao fim da discussão, estávamos todos “especialistas” no assunto. Criou também o troféu “Zum de Besouro”, uma referência à música Açaí, de Djavan, conferido a letras que considerava herméticas.
Mesmo não sendo um apaixonado por futebol, cobriu quatro Copas do Mundo. Suas crônicas foram reunidas no livro “O Torcedor Acidental”, que aborda o mundo das Copas para além dos campos. Observando o dia a dia das cidades por onde passou a Seleção Canarinho, os costumes, a comida, o vestuário, a dificuldade com os idiomas, os personagens e as situações inusitadas com as quais se deparava – nada escapava ao olhar crítico do jornalista.
Frank Sinatra, por exemplo, o abordou na sala VIP do estádio Rose Bowl, em Pasadena, na Califórnia, em 1994, para perguntar onde era o banheiro. “Logo ali”, respondeu o cronista, apontando para o banheiro químico. Em outra ocasião, recebeu luxuoso auxílio em uma esquina de São Francisco, quando teve dificuldades com a máquina de jornais automática que engolira sua moeda. Foi socorrido por Mel Brooks, que, após socos e pontapés, fez com que a geringonça expelisse um exemplar do “San Francisco Chronicle”. Essas e muitas outras histórias deliciosas revelam os bastidores de várias Copas do Mundo.
Aos 69 anos, no dia 27 de junho, Xexéo sucumbiu a um linfoma descoberto duas semanas antes. Iniciou a quimioterapia, mas não resistiu ao tratamento. Teve uma parada cardíaca. O jornalismo perdeu um de seus melhores profissionais. Foi-se um craque.
Saiba mais sobre o autor
*Henrique Brandão é jornalista e escritor.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto (34ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
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