RPD || Fernando Menezes: Os 60 anos da FAPESP

Foto: Leo Ramos Chaves/Pesquisa FAPESP
Foto: Leo Ramos Chaves/Pesquisa FAPESP

Fundação já financiou mais de 300 mil projetos sobre os mais diversos temas

Um dos exemplos brasileiros mais bem sucedidos de política pública consistentemente planejada e executada, com continuidade e sustentabilidade, é a criação de um sistema de produção e difusão de conhecimento científico no Estado de São Paulo. 

No contexto da Revolução Constitucionalista de 1932, que teve forte apoio nas instituições acadêmicas já consolidadas no Estado, mas ainda configuradas como instituições isoladas – destacando-se a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, a Faculdade de Medicina e a Escola Politécnica –, as lideranças políticas paulistas lançaram-se a um projeto que pode muito bem ser sintetizado no lema scientia vinces. 

Esse é o lema que foi adotado para a então nascente Universidade de São Paulo, primeira grande realização desse projeto de edificação de um futuro baseado em conhecimento para uma sociedade decidida a “vencer pela ciência”. 

Na sequência, as mesmas lideranças públicas, numa união de forças de todos os espectros políticos, decidiram incluir na Constituição Paulista de 1947 a seguinte regra: 

Artigo 123. O amparo à pesquisa científica será propiciado pelo Estado, por intermédio de uma Fundação, organizada em moldes que forem estabelecidos por lei. 

Parágrafo único. Anualmente, o Estado atribuirá a essa Fundação, como renda de sua privativa administração, quantia não inferior a meio por cento do total de sua receita ordinária. 

Essa diretriz constitucional foi concretizada em 1960, por meio da Lei n. 5.918, e efetivamente posta em prática pelo Decreto n. 40.132, de 1962, editado na significativa data de 23 de maio, pelo Governador Carvalho Pinto. 

Naquela ocasião, o governador tomou a decisão, própria de verdadeiros estadistas – vislumbrando o benefício das gerações futuras, e sem se preocupar com frutos político-eleitorais imediatos –, de aportar ao patrimônio da Fundação valores correspondentes àqueles que o Estado teria a ela destinado caso houvesse sido criada, como apontado pela Constituição, 15 anos antes. 

Desde sempre, portanto, a FAPESP pôde contar com reais condições financeiras para desempenhar, com autonomia, sua nobre missão. 

Com a Constituição Estadual de 1989, a regra especificamente voltada à FAPESP foi aprimorada, nos seguintes termos: 

Artigo 271. O Estado destinará o mínimo de um por cento de sua receita tributária à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, como renda de sua privativa administração, para aplicação em desenvolvimento científico e tecnológico.  

Parágrafo único. A dotação fixada no “caput”, excluída a parcela de transferência aos Municípios, de acordo com o art. 158, IV, da Constituição Federal, será transferida mensalmente, devendo o percentual ser calculado sobre a arrecadação do mês de referência e ser pago no mês subsequente. 

Foi assim dobrado o percentual que leva à formação do orçamento anual da FAPESP e foi acrescentada a regra das transferências mensais, o que – especialmente ao tempo de uma economia inflacionada – preserva o real valor do orçamento. 

Notável ainda na história da FAPESP é a estabilidade de sua governança, aliando plena sensibilidade às diretrizes das políticas de Estado a uma real autonomia decisória, pautada eminentemente por critérios de mérito científico. 

E essa autonomia é reforçada por uma sábia regra que limita os gastos da FAPESP com sua própria administração a 5% de seu robusto orçamento. Ou seja, ao menos 95% dos recursos são diretamente destinados à pesquisa científica e tecnológica, em todas as áreas do conhecimento. 

Aliás, sobre esse último aspecto, o professor Celso Lafer[1], presidente da FAPESP entre 2007 e 2015, lembrando que “o significado originário da palavra ciência (do latim scientia) é conhecimento” e que “até o século 19 a dicotomia cultura científica/cultura das humanidades não era de curso corrente”, destaca que “um dos muitos méritos da FAPESP é o de se ter convertido, no correr da sua exemplar trajetória, num local de encontro das duas culturas. Com efeito, o objeto do seu trabalho, graças a uma concepção ampla de pesquisa, é o avanço, com rigor e método, do conhecimento, em todas as áreas: ciência, tecnologia, artes, literatura, filosofia e ciências humanas”. 

Convido os leitores a aprofundarem seu conhecimento sobre os resultados da ação da FAPESP consultando as diversas publicações disponíveis em seu sítio de internet (www.fapesp.br), com destaque para seu último relatório anual (https://fapesp.br/relatorio2020). 

[1] “A Fapesp e as duas culturas”. O Estado de S. Paulo. Edição de 21.10.07. 


Fernando Menezes de Almeida é professor titular da Faculdade de Direito da USP e diretor administrativo da FAPESP 

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