A poucos dias do início do quarto ano do mandato presidencial, confirmam-se, um a um, todos os prognósticos pessimistas acumulados nos três últimos anos. Embora a crise sanitária aparente uma trégua, apesar da omissão e dos erros consecutivos do governo federal, a economia segue em prostração, enquanto prossegue a marcha da destruição das instituições.
O quadro inspira cuidados e demanda clareza e coragem do conjunto das forças de oposição democrática. A tarefa primeira é, sem dúvida, enfrentar a engenharia eleitoral de 2022. Articular com eficácia os momentos da campanha, já em curso, do primeiro e do segundo turnos das eleições. Preservar os espaços de manifestação legítima das diferenças programáticas, sem deixar de apontar os inimigos da democracia, a serem enfrentados de forma unitária no segundo turno das eleições.
O sucesso nessa tarefa não eximirá, contudo, o conjunto dessas forças, em qualquer circunstância, mesmo que separadas nos campos futuros de governo e oposição, de trabalhar de forma conjunta na implementação de uma agenda básica comum à frente democrática. O desafio é grande. Trata-se, afinal, de uma agenda de reconstrução democrática do país.
Sua faceta mais evidente é a reconstrução do conjunto de políticas públicas construído paulatinamente, nas últimas três décadas, ao amparo da Carta de 1988. Urge reerguer, primeiro, e fazer avançar, a partir da terra arrasada, as políticas de defesa dos direitos humanos, de proteção ao meio ambiente, de educação, saúde, segurança pública, mobilidade urbana, entre outras, todas indispensáveis ao exercício da cidadania consciente.
É preciso também enfrentar os pontos cegos institucionais do nosso sistema representativo. Está claro que o desenho de nossa regra eleitoral estimula um ordenamento peculiar de prioridades políticas, que erige, em primeiro lugar, a reprodução eleitoral dos mandatos, acima de quaisquer compromissos firmados com partidos e eleitores. Essa é a chave para compreender a resiliência institucional do governo, assim como certas pautas, aparentemente não razoáveis, dos legisladores. Alguma reforma política, que injete responsabilidade no sistema, se impõe.
Finalmente, a recuperação de uma cultura política plenamente democrática – que valorize o respeito aos adversários, a legitimidade da divergência e a alternância no poder – deve ser um objetivo perseguido de forma permanente por todas as forças integrantes desse campo. O apoio que parte importante dos eleitores empresta a um governo abertamente autoritário só é compreensível a partir da rejeição aguda a todas as alternativas restantes. Ou seja, o processo de deslegitimação da política, que erode desde 2013 a confiança da população na ordem democrática, precisa ser revertido desde já, a partir de um acordo mínimo em torno das regras de interlocução e decoro que devem vigorar na esfera pública.