Hoje, um ano depois da identificação dos primeiros sinais da pandemia em território nacional, as perspectivas que se desenham para os brasileiros nos próximos meses são sombrias. Do ponto de vista sanitário, assistimos à segunda onda da doença, transportada por novas variedades do vírus, mais perigosas que seu antepassado comum, algumas gestadas em nosso país. Do ponto de vista econômico, é de se prever o agravamento da crise, com a redução da atividade e as dificuldades evidentes de manter o necessário auxílio emergencial por períodos maiores que o previsto inicialmente. Finalmente, do ponto de vista político, observa-se a consolidação da base parlamentar do governo, com o afastamento, provisório ao menos, dos riscos de abreviação do mandato presidencial.
Não é possível subestimar a responsabilidade do governo federal pela situação de vulnerabilidade crescente em que os cidadãos brasileiros se encontram hoje. Todos os itens da agenda negacionista foram por ele perseguidos com empenho. Na contramão de toda evidência fornecida pela ciência, houve campanhas, que perduram até hoje, em favor de aglomerações e contra o uso de máscaras. A política de testagem massiva, chave do sucesso de muitos países, aqui foi simplesmente ignorada. Insiste-se ainda entre nós na falsa dicotomia entre economia e saúde, como se o controle da pandemia não fosse requisito da retomada econômica. Finalmente, todas as oportunidades de contratação de vacinas na quantidade necessária foram desperdiçadas, o que nos condenou a retardar o passo da imunização por falta de imunizantes.
Para coroar a sucessão de erros, uma consequência inesperada, apesar de previsível, da situação de caos que se criou. A circulação do vírus por grandes concentrações de pessoas, sem vacina e sem distanciamento social, parece ter propiciado o surgimento das novas variantes, capazes de infectar novamente pacientes já curados. A ilusão da imunidade natural da população ao preço alto de milhares de óbitos evaporou-se. Os óbitos aconteceram, mas nenhum benefício perdurou, e o Brasil é hoje potencial fonte de risco para os países que lograram êxito no enfrentamento da pandemia.
O governo errou de forma contumaz e persiste nos seus erros. É tarefa de todas as forças democráticas, nos estados, nos municípios, em todas as instâncias do Legislativo, persistir na resistência: suprir a omissão e a oposição do governo para trabalhar em prol do distanciamento social, do uso de máscaras, da obtenção no número suficiente de doses das vacinas disponíveis, assim como do acesso ao auxílio emergencial por parte daqueles que dele necessitam.
Com o sucesso da campanha de vacinação nos Estados Unidos, corremos o risco de ver em pouco tempo nosso país como número um no mundo em número absoluto de óbitos. Tentar evitar esse resultado é premente para nós. Igualmente importante, contudo, é deixar claro, para o conjunto dos cidadãos, os verdadeiros responsáveis pelo percurso trágico que estamos a seguir.