RPD 35 || Valdir Oliveira: Retomada da economia na tempestade perfeita

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Equilíbrio no ambiente político, com democracia fortalecida, é fundamental para o país recuperar a estabilidade econômica e voltar a crescer

A economia é cíclica. Ela responde aos movimentos da vida. E os movimentos dessa pandemia, consequência da crise sanitária que estamos vivenciando, contribuíram para reforçar a já forte concentração de renda no Brasil, com a exclusão produtiva de muitos brasileiros. 

 Os pequenos negócios foram vítimas de seus limites de sobrevivência, e as ajudas na política compensatória, de complementação de renda, os excluíram, deixando-os sem condições de trabalho e de renda. As políticas de socorro por meio de crédito de fomento foram direcionadas para os que conseguiram se manter com um cadastro limpo, já que os caminhos foram trilhados para os bancos, e esses não podem fugir das regras do sistema financeiro, que não permite acesso aos que têm restrições cadastrais impostas pelo mercado. De forma simples, é essa a fotografia do momento, após ano e meio de pandemia, cujo resultado foi o empobrecimento dos mais pobres e o enriquecimento dos mais ricos. A estabilidade econômica, o crescimento e a distribuição de renda das últimas décadas foram perdidos em dois anos pandêmicos e de extremos políticos, na qual faltou a empatia de lideranças que os fizessem sentir a dor de seus liderados. 

 O período que antecedeu o Plano Real era de um Brasil de hiperinflação e de planos econômicos recheados de populismo, mas sem efetividade de suas propostas econômicas. As contas públicas vinham de um descontrole desde a construção de Brasília até fortes endividamentos públicos oriundos de estratégia estatizante dos governos militares. Esse cenário trazia a perda de renda dos mais pobres, com o esgotamento da capacidade de investimento estatal, levando a uma profunda crise, debelada apenas pelo Plano Real, que atacou a doença crônica da inflação e do desequilíbrio das contas públicas. A solução econômica só se tornou possível por conta de um ambiente político equilibrado, que fortaleceu a democracia, preparando o Brasil para a construção de um modelo de desenvolvimento inclusivo e com distribuição de renda. 

A transição proposta pelo Plano Real foi permeada de ações paralelas no intuito de ajustar a economia e socorrer os excluídos, empobrecidos, fossem pessoas físicas ou jurídicas. Soluções de crédito fora do sistema financeiro foram-se multiplicando com alternativas de microcrédito ou mesmo de atuação do varejo em sua ampliação do acesso ao crédito daqueles que não cumpriam as exigências do sistema. A busca pela formalização de informais, por meio da solução do Microempreendedor Individual (MEI), que deu condições para que o sistema pudesse enxergar aqueles que estavam produzindo à margem do sistema, foi outro passo importante para que os ajustes econômicos convivessem paralelamente com intervenções estatais no socorro dos excluídos. 

Na última década, tivemos a ascensão e queda de um governo de esquerda que iniciou um descontrole nas contas públicas. Esse caminho levou o ambiente político a ser duramente atingido pela credibilidade de seus protagonistas, levando o país a um sentimento de anarquia, em que a desqualificação das instituições e seus representantes substituiu as sugestões de solução à crise. Esse ambiente favoreceu o nascimento de uma proposta liberal, de redução do Estado. A pauta era inverter a lógica do Estado para fortalecer as realidades municipais e enfraquecer o comando central, o chamado de Menos Brasília e Mais Brasil. 

 Foi nesse momento que entramos na pandemia. A crise sanitária levou, inicialmente, à paralisia econômica dos pequenos negócios e à perda de renda da base da pirâmide. A atividade econômica estagnou-se. O ambiente político acirrou disputas, nas quais líderes trocaram a empatia com seus liderados por influências ideológicas ou de retórica construída para o caos. As soluções saíram do campo econômico ou da saúde, e passaram para o campo ideológico, político. Entramos na tempestade perfeita. 

 Os indicadores de desemprego e inflação, somados ao descontrole das contas públicas, nos remetem ao início da chamada Nova República. O crescimento econômico e a distribuição de renda foram perdidos pelos impactos da crise que vivemos, potencializados pelo destempero do momento político em que as disputas ideológicas se sobrepõem à pauta de sobrevivência do povo brasileiro. O aprendizado das últimas décadas nos ensinou que a retomada da economia precisará do equilíbrio no ambiente político, com o fortalecimento da democracia. Serão necessárias medidas de intervenção do Estado para inclusão dos brasileiros excluídos com alternativa de crédito e complemento de políticas compensatórias. Mas o custo dessa intervenção deverá ser acompanhado de um projeto de organização das contas públicas. Só assim retomaremos o caminho do desenvolvimento com a distribuição de renda que colocará o Brasil novamente na rota do desenvolvimento. 


*Valdir Oliveira é superintendente do Sebrae no DF 

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de setembro (35ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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