A bola está com Toffoli
Lula ganhou mais um aviso de arrumar as malas e preparar-se para deixar em breve o cárcere de Curitiba. Na pior das hipóteses, uma vez que já cumpriu um sexto da pena a que foi condenado no caso do tríplex do Guarujá, voltará a São Paulo e, ali, poderá trabalhar durante o dia, recolhendo-se à noite a algum presídio.
Na melhor das hipóteses, se confirmada a atual tendência do Supremo Tribunal Federal de acabar com a prisão em segunda instância, será libertado, podendo ir para onde quiser e fazer o que quiser. Lula planeja retomar as caravanas que, antes de ser preso, o levaram a viajar pelas principais regiões do país.
Falta apenas um voto para que isso seja possível desde que, ontem, a ministra Rosa Weber revelou o seu favorável ao fim da prisão de condenado em segunda instância. Se os próximos ministros a votarem o fizerem do modo como prometem, o placar será de 5 a 5. Caberá a Dias Toffoli, presidente do tribunal, o voto de desempate.
Outro dia, Toffoli acenou com a proposta de transferir para a terceira instância o direito de autorizar a prisão de um condenado. Aparentemente, a proposta murchou. A ser assim, Toffoli, que em outros julgamentos votou uma vez a favor da prisão em segunda instância e três contra, votará contra pela quarta vez.
Razoável. O ministro Gilmar Mendes já votou uma vez contra a prisão em segunda instância e três a favor. Agora, votará contra. Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello sempre votaram contra. Sempre votaram a favor Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Lula jamais perdoou Cármen. Foi ele que a indicou para o Supremo. Conta que ouviu dela que uma das virtudes do mineiro é ser grato. Cármen é mineira. E na hora em que Lula precisou do seu voto para ser solto, não teve. A queixa de Lula é injusta. Ministro não é nomeado para beneficiar quem o nomeou.
Que o diga também o ministro Luiz Fux. Antes de nomeado por Dilma, ele revelou a um interlocutor como votaria no processo do mensalão do PT: “Eu mato no peito”. Ou seja: votaria contra. Votou a favor. E agradeceu sua nomeação à advogada Adriana Ancelmo, mulher do então governador do Rio Sérgio Cabral.
Mas essa é outra história. E das mais esdrúxulas, digamos assim.
O fantasma de Queiroz volta a assombrar os Bolsonaros
Como desviar dinheiro público
O que uma coisa tem a ver com outra? O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) gravou um vídeo e soltou uma nota para dizer que não fala com seu ex-assessor Fabrício Queiroz há mais de um ano.
Foi em resposta a um áudio de junho último onde Queiroz ensina a um amigo como empregar pessoas em gabinetes do Senado e da Câmara sem ligá-las diretamente aos Bolsonaros.
Para Flavio, “o que fica bem claro nesse áudio é que ele [Queiroz] não tem nenhum acesso ao meu gabinete, tanto é que ele está ali fazendo uma reclamação de que não tem acesso”.
Diz Queiroz no áudio: “Tem mais de 500 cargos, cara, lá na Câmara, no Senado. Pode indicar para qualquer comissão ou, alguma coisa, sem vincular a eles [clã dos Bolsonaro] em nada”.
Diz mais: “20 continho aí para gente caía bem pra c**”. E mais: “Pô, cara, o gabinete do Flavio faz fila de deputados e senadores lá. É só chegar ‘nomeia fulano para trabalhar contigo aí’”.
Aqui, trata-se da nomeação cruzada. Um deputado pede a outro que empregue no seu gabinete quem ele não pode empregar para não chamar atenção. O favor é retribuído. Todos lucram com isso.
Como a de Flávio, também não faz sentido a resposta que deu o presidente Bolsonaro quando perguntado na China sobre o áudio de Queiroz: “O Queiroz cuida da vida dele, eu cuido da minha.”
Quem disse o contrário? O fato é que o fantasma de Queiroz voltou a assombrar a família Bolsonaro, posta em sossego desde que Dias Toffoli suspendeu a investigação sobre os rolos de Flávio.
Até os pombos que bicam as calçadas da Assembleia Legislativa do Rio sabem que Queiroz comandava um esquema de rachadinha quando mandava no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro.
Funcionava assim: o funcionário recebia seu salário no fim do mês e depositava parte na conta de Queiroz. O dinheiro pagava despesas do deputado. Queiroz embolsava algum.
Que deputado na Assembleia não sabia disso? Que deputado na Câmara não sabe que muitos dos seus colegas procedem assim? É prática usual. É também desvio de dinheiro público. Crime.
Desde 1991 quando Bolsonaro foi eleito deputado federal pela primeira vez, ele e seus filhos empregaram mais de uma centena de funcionários com parentesco ou relação familiar entre si.
Exatas 102 pessoas, segundo o jornal O Globo. Ou 35% do total de funcionários contratados no período. Entre elas, milicianos. Muitos jamais compareceram ao local de trabalho.
O advogado de Flávio Bolsonaro pôs em dúvida a gravação do áudio. É preciso, disse ele, comprovar que a voz é mesmo de Queiroz, que o áudio não foi editado, que isso e que aquilo outro.
Foi a mesma linha de defesa adotada pelo ex-juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato em Curitiba para desqualificar suas conversas hackeadas e entregues ao site The Intercept.
Terrorismo oficial
Presidente e ministro, feitos um para o outro
Se o presidente Jair Bolsonaro, sem prova ou indício algum, pode afirmar que foi ato terrorista a derrama de petróleo que empesteia as praias nordestinas, por que o ministro Ricardo Salles, do Meio ambiente, não pode insinuar que o petróleo foi derramado por um navio da organização internacional Greenpeace?
Pau que bate em Chico deveria também bater em Francisco. O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, criticou Salles, mas esqueceu de criticar Bolsonaro. Os males que vêm do alto costumam contaminar os que estão em baixo. Se Salles foi irresponsável e leviano, Bolsonaro foi o quê?
Lá atrás, quem primeiro falou em terrorismo? Bolsonaro falou quando lhe perguntaram sobre os incêndios na Amazônia. Tentou culpar as Ongs. Voltou a falar quando lhe perguntaram sobre o petróleo derramado. Repetiu a dose ontem. Salles é apenas um pau mandado do presidente. Um serviçal que quer manter o emprego.
Bolsonaro liga para a preservação do meio ambiente? Salles tampouco. Bolsonaro está mais preocupado com os garimpeiros que votaram nele. É candidato à reeleição. No passado, ainda cadete no Exército, meteu-se com garimpo e foi censurado por seus superiores que o consideraram ambicioso demais.
Se o chefe e seus influentes filhos são conhecidos por gostarem de notícias falsas e as disseminarem nas redes sociais, por que Salles não pode gostar e fazer a mesma coisa? Ele postou a foto de um navio do Greenpeace de onde o petróleo poderia ter saído. A foto é de 2016. O navio não transporta petróleo, só gente.
A verdade é que o governo não faz a mínima ideia sobre o que aconteceu há mais de dois meses. Primeiro porque não se interessou de início. Depois porque não conseguiu saber nada até agora – salvo que o petróleo, provavelmente, é venezuelano. Ou uma fração dele. A Marinha não se arrisca a ir além disso.
Mais de mil toneladas de óleo foi recolhida, parte por voluntários. Só há poucos dias militares entraram em cena para recolher. Onde todo esse óleo foi armazenado? A Marinha não sabe. O governo não sabe. É tudo feito de improviso. E quando voluntários aparecerem doentes, vítimas dos efeitos do óleo?
Governo de morte, este.