Até a ditadura militar foi mais branda com Lula
Era uma questão humanitária e também de boa vontade, o que não faltou nem à ditadura militar de 64 quando Lula, preso em maio de 1980 por ter liderado greves de metalúrgicos no ABC paulista, ainda assim foi autorizado a comparecer ao velório de sua mãe.
A Lei de Execução Penal não obriga, mas prevê no seu artigo 120 que os condenados poderão obter permissão para sair do local onde estão presos, sob escolta, em razão de “falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão”.
Lula pediu para ir , esta manhã, ao velório do seu irmão Vavá, em São Bernardo do Campo, que morreu vítima de câncer. Depois de consultar a Polícia Federal e o Ministério Público, a juíza Carolina Lebbos, da Vara de Execuções Penais de Curitiba, disse não.
“A ordem jurídica é, por sua natureza, sistêmica. Os direitos, nessa perspectiva, encontram limitações recíprocas”, escreveu a juíza. “E, por vezes, a mitigação de alguns dos aspectos de determinado interesse legitimamente tutelado é justificada”.
No final de dezembro último, Lula quis ir ao enterro em Brasília do seu amigo e ex-deputado federal Sigmaringa Seixas. O juiz plantonista Vicente de Paula Ataíde Júnior negou, argumentando que isso só seria possível em caso de cônjuge, filho ou irmão.
Agora sob o comando do ex-juiz Sérgio Moro, ministro da Justiça, a Policia Federal alegou que não tinha condições de garantir a segurança de Lula, pois a presença dele no velório atrairia um grande número de petistas interessados em se aproximar dele.
De resto, segundo informou, sua frota de helicópteros está ocupada com o resgate de corpos da tragédia de Brumadinho, e o único avião disponível levaria muito tempo para voar de onde está até Curitiba e, de lá, a São Paulo. Lula acabaria perdendo o enterro.
Pura perversidade! Quando Moro mandou prender Lula e ele resistiu dois dias a se entregar sob a proteção de milhares de petistas em São Bernardo, a Polícia Federal foi lá buscá-lo. Estava pronta para levá-lo para Curitiba por bem ou por mal, do jeito que fosse.
Quanto a falta de meio de transporte, o PT se ofereceu para fretar um avião que conduziria apenas Lula e agentes federais. A oferta, sequer, foi considerada. O parecer do Ministério Público foi na mesma linha do parecer da Polícia Federal. Falou até em risco de fuga.
O presidente da República em exercício, o general Hamilton Mourão, deve ter ficado chocado com a decisão da juíza Lebbos. Na tarde de ontem, ele disse que se tratava de “uma questão humanitária” a ida de Lula ao velório: “Eu já perdi um irmão e sei o que é isso”.
Deposto pelo golpe de 64, preso na Ilha de Fernando Noronha, ao ex-governador Miguel Arraes, de Pernambuco, foi permitido comparecer ao casamento de sua filha mais velha. A cerimônia ocorreu na Base Aérea do Recife. Só os padrinhos puderam estar presentes.
Terminada a cerimônia, Arraes foi devolvido à ilha. A filha dele, Ana Arraes, é hoje ministra do Tribunal de Contas da União. O filho dela, Eduardo Campos, governou Pernambuco, foi candidato a presidente da República em 2014 e morreu em um acidente aéreo.
Quem manda é o “mercado”
E nem o capitão tem peito para enfrentá-lo
Pôr em dúvida a culpa da Vale no que ocorreu em Brumadinho, e antes em Mariana, simplesmente é criminoso. O governo do capitão está cansado de saber disso, mas falta-lhe coragem para enfrentar uma entidade mítica de nome “mercado”. Que vem a ser: os donos do dinheiro e seus agentes.
O ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, disse que o governo carecia de competência para forçar a demissão da diretoria da Vale, uma empresa privada. Lorota! Empresa alguma por aqui, muito menos as que dependem da boa vontade do poder público para realizar mais lucros, resistiria a um pouco de pressão.
O “mercado” foi um grande eleitor do capitão. Convenceu políticos a apoiá-lo, pagou muitas de suas despesas – inclusive o tratamento médico no hospital Albert Einstein – e dita o sobe e desce das ações e do dólar. Seu poder de retaliação não é pequeno. O capitão depende dele para ser bem-sucedido. Daí…
Daí é aguentar o tranco da tragédia de Brumadinho, cuidar por algum tempo das famílias dos mortos, prometer fiscalizar as barragens em perigo embora não disponha dos meios necessários para isso, e apostar no esquecimento. Quantos museus neste país já não pegaram fogo e tudo ficou por isso mesmo?