DNA fala mais alto
Bem-sucedido prefeito de Salvador por oito anos e forte candidato a governador da Bahia em 2022, ACM Neto haverá de recordar para sempre o tiro que deu no próprio pé ao deixar suas impressões digitais na disputa entre Baleia Rossi (MDB-SP) e Arthur Lira (PP-AL) pelo comando da Câmara dos Deputados.
Na condição de presidente nacional do DEM, sob forte pressão de deputados divididos entre Rossi e Lira, ele concordou em deixá-los à vontade para que votassem como quisessem, embora o partido fizesse parte do bloco de apoio a Rossi montado por Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em cima da hora, tirou o partido do bloco.
Sua decisão beneficiou Lira, candidato do Centrão e de Bolsonaro, e selou a derrota de Rossi e de Maia. Desde então, diante do anúncio feito por Maia de que abandonará o DEM e que levará com ele para outro partido um numeroso grupo de aliados, ACM Neto tenta reparar o estrago que produziu. Não será fácil.
No primeiro momento, ainda chegou a admitir que daria passe livre para a saída de Maia do DEM antes da abertura, no próximo ano, da janela partidária – um período às vésperas de eleições em que parlamentares podem trocar de partido sem risco de perder o mandato. Recuou, depois, com medo de uma fuga em massa.
Para completar sua infelicidade, em entrevistas que concedeu esta semana, embora tenha insistido em dizer que o DEM é um partido independente, antecipou que na eleição presidencial do ano que vem não descarta a hipótese de apoiar a reeleição de Bolsonaro. Foi uma afirmação desastrosa a essa altura do jogo.
O DEM nasceu de uma costela da ARENA, partido que apoiou a ditadura militar de 64. Com a redemocratização do país, passou a se chamar PFL (Partido da Frente Liberal) e fez parte dos governos José Sarney, Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso. Como estava se desmilinguindo, foi rebatizado de DEM.
Muito devido à atuação de Maia e de outros poucos nomes, o DEM parecia descolar-se da direita extrema para uma posição futura de centro-direita. A essa altura, graças a ACM Neto, tudo indica que o futuro pode ter sido abortado. Com genética não se brinca.
Lula nada aprendeu de novo e nada esqueceu
Cheiro no ar de 2018
Saibam desde já os interessados em buscar entendimento com o PT sobre a eleição presidencial do ano que vem que o partido terá candidato próprio no primeiro turno. E que só em caso de derrota, uma vez aceitas suas condições, apoiará o nome que no segundo turno enfrente Jair Bolsonaro. Estamos conversados.
Foi assim que soou, aqui fora, a decisão de Lula de reunir-se no último sábado com o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e de orientá-lo a pôr na rua o “bloco” de sua candidatura. Uma vez autorizado pelo xamã do PT, ao qual todos do partido reverenciam, é o que fará Haddad em breve. Missão dada, missão cumprida.
Certamente pesou na decisão de Lula, que não consultou as instâncias do partido para tomá-la, informações dos seus advogados sobre a tendência do Supremo Tribunal Federal de anular sua condenação no processo do triplex do Guarujá, mas ignorar por ora sua condenação no processo do sítio de Atibaia.
O alvo do Supremo é o ex-juiz Sérgio Moro, que usou o triplex para condenar Lula, retirando-o da disputa pela presidência da República em 2018 e impulsionando a eleição de Bolsonaro. Há farto material que fortalece a convicção dos ministros de que Moro foi parcial. Mas da segunda condenação, Moro pouco participou.
Os demais partidos de esquerda e da centro-esquerda imaginaram que Lula teria aprendido alguma coisa com o fato de o PT ter concorrido praticamente sozinho na eleição vencida por Bolsonaro. O partido só admitia aliança no primeiro turno em torno de Haddad, que mal teve tempo para fazer campanha.
Preso em Curitiba, Lula acreditou até a última hora que o candidato poderia ser ele, e que se fosse, como apontavam todas as pesquisas de intenção de voto, a vitória seria certa. Desde então nada parece ter aprendido com o que aconteceu, e nada esqueceu do tempo em que dava as cartas e acumulava fichas.
Vozes lúcidas da oposição defendem que a escolha de um nome capaz de derrotar Bolsonaro fique para depois. Para depois que todos com igual propósito discutam um projeto de novo país a ser oferecido aos eleitores e tentem aparar suas diferenças. Quando nada, isso facilitaria a união no segundo turno.
Pelo jeito, não será assim. Ou no que depender do PT e do xamã que se recusa a sair de cena, não será.