O risco é leilão da cessão onerosa ser adiado novamente
Todo o sufoco vivido atualmente pelos ministérios – alguns deles não têm dinheiro para chegar a dezembro – poderia ser evitado se o Tribunal de Contas da União (TCU) concluísse a sua análise sobre o megaleilão dos excedentes de petróleo da cessão onerosa e sobre a revisão do contrato feito entre a União e a Petrobras.
Uma montanha de dinheiro está prevista para ingressar nos cofres do Tesouro até o fim deste ano, mas o governo não pode incluir os recursos em sua previsão de receita orçamentária por não saber quais serão as decisões do TCU. Já há dúvidas no alto escalão do governo se, efetivamente, o leilão será realizado em novembro, como programou a Agência Nacional do Petróleo (ANP), ou se será novamente adiado.
A área técnica do Ministério da Economia se queixa das perguntas intermináveis do TCU e algumas delas sobre questões que se achava já terem sido resolvidas em 2018. Para ter uma ideia, ontem, em consulta feita nos processos que tratam do assunto, o Valor verificou que houve novos pedidos de informações registrados no dia anterior.
A instrução normativa 81 do tribunal estabelece um prazo de 75 dias para a área técnica encaminhar sua proposta de mérito sobre o assunto analisado ao ministro relator do processo.
O problema é que o prazo só começa a contar depois que todos os documentos solicitados são recebidos. A questão é que os pedidos de informação feitos pela área técnica do TCU ao governo sobre a cessão onerosa e o leilão do excedente do petróleo não param.
Ontem, por exemplo, em decisão do plenário dos ministros, o tribunal passou a exigir que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) apresente justificativa técnica detalhada sobre as áreas que entrarem ou ficarem de fora dos leilões de partilha de produção. A nova regra já valerá para o megaleilão do excedente da cessão onerosa.
Para os técnicos do TCU, há “obscuridade” na forma de classificação das áreas que entram nos leilões de partilha, segundo reportagem do jornalista Rafael Bitencourt, publicada ontem à noite no Valor PRO. O problema maior, segundo os técnicos, ocorre quando uma área com forte potencial econômico é leiloada no regime de concessão, o que reduziria consideravelmente os ganhos da União.
Se pudesse incluir os recursos do megaleilão em sua programação orçamentária e financeira deste ano, o governo reverteria o contingenciamento de R$ 30 bilhões realizado nas dotações orçamentárias e cumpriria com folga a meta fiscal deste ano. O maior gasto da União neste resto de ano iria ajudar a estimular a atividade econômica, junto com as outras medidas que o ministro da Economia, Paulo Guedes, promete anunciar nos próximos dias.
O megaleilão do excedente de petróleo dos campos que foram cedidos de forma onerosa à Petrobras está marcado para o dia 6 de novembro. Pelo cronograma, as empresas vencedoras devem fazer o pagamento do bônus de assinatura no dia 27 de dezembro, segundo informou a ANP. Não há dúvidas no mercado sobre o sucesso deste leilão, pois as grandes companhias internacionais que atuam no setor já manifestaram interesse.
A exploração do petróleo excedente da cessão onerosa será feita sob regime de partilha de produção. As empresas vencedoras pagarão um bônus por ocasião da assinatura de cada contrato. Serão vencedoras do leilão aquelas que oferecerem uma maior participação à União no óleo extraído. O valor total do bônus de assinatura foi fixado em R$ 106,5 bilhões. Mas nem todo esse dinheiro entrará nos cofres do Tesouro.
A União aceitou pagar uma compensação à Petrobras no valor de US$ 9,058 bilhões, na revisão do contrato da cessão onerosa para exploração de 5 mil barris de petróleo no pré-sal, firmado em 2010. Ao câmbio de ontem, a compensação correspondia a R$ 34,06 bilhões. Isto significa que, depois de pagar a Petrobras, o Tesouro ficaria com R$ 72,4 bilhões.
Em abril deste ano, o deputado Paulo Pereira da Silva (Solidariedade-SP) ingressou com uma representação junto ao TCU solicitando que a União seja impedida de pagar a compensação à Petrobras, no âmbito da revisão do contrato da cessão onerosa, com o argumento de que não há prévia autorização orçamentária para a realização da despesa e que o pagamento fere o teto de gastos, instituído pela emenda constitucional 95/2016.
O pedido do deputado ainda não foi apreciado, pois, segundo explicações do TCU ao Valor, o governo federal se comprometeu a esperar uma solução legislativa para a questão, que veio por meio da proposta de emenda constitucional (PEC) 98/2019, já aprovada pela Câmara. Por esta PEC, a compensação paga à Petrobras pela União, no âmbito da revisão do acordo da cessão onerosa, fica excluída do teto de gastos. A proposta será agora votada pelo Senado.
A PEC 98/2019 determina também que 15% do valor arrecadado com o leilão do excedente, depois de deduzida a compensação à Petrobras, seja transferido aos Estados, e outros 15%, aos municípios. Assim, em termos líquidos, o Tesouro ficaria com R$ 50,7 bilhões, dinheiro mais do que suficiente para tirar os ministérios do atual sufoco.
A ANP abriu consulta pública sobre o leilão e a previsão é de que até o dia 6 de setembro o edital definitivo seja publicado. Se o TCU concluir a sua análise até essa data, uma autoridade do governo disse ao Valor que os recursos do megaleilão poderão ser incluídos na previsão de receita orçamentária. No dia 22 de setembro, o governo terá que enviar ao Congresso o relatório de avaliação de receitas e despesas relativo ao quarto bimestre do ano. A inclusão dos recursos do megaleilão seria feita no relatório.
O temor do governo é incluir os recursos do megaleilão na sua previsão de receita, reverter o contingenciamento, e, caso o leilão seja adiado por alguma questão levantada pelo TCU, correr o risco de não cumprir a meta de resultado primário deste ano, o que é considerado crime de responsabilidade.