Trajetória depende da aprovação das reformas
Até o próximo dia 15 de abril, o ministro da Economia, Paulo Guedes, terá que encaminhar ao Congresso Nacional o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para o próximo ano, com a meta fiscal a ser perseguida pelo governo. Com as atuais incertezas, Guedes não tem como fixar uma meta de resultado primário para 2020 que seja minimamente crível ou que possa indicar o tamanho real do esforço fiscal a ser realizado pelo setor público.
As variáveis que ajudariam Guedes a determinar uma trajetória fiscal mais consistente para 2020 ainda dependem da aprovação pelo Congresso de medidas que ele mesmo já propôs, como a reforma da Previdência Social. Outras, como a revisão e redução dos subsídios e desonerações tributárias, também serão submetidas neste ano ao Congresso, de acordo com o ministro.
Todas as medidas, se aprovadas, tenderão a reduzir as despesas e a elevar as receitas da União, ou seja, terão impacto sobre o resultado primário. Mas o PLDO, a ser enviado pelo ministro da Economia em abril, não poderá levar em consideração o efeito fiscal das propostas, simplesmente porque elas ainda não foram aprovadas.
Qual será, por exemplo, a redução de despesas a ser obtida com a reforma dos sistemas previdenciário e assistencial em 2020, se ela for aprovada nos termos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019, do Executivo? Guedes ainda não revelou a informação.
Quando apresentou a proposta de reforma, o governo estimou que ela permitiria uma economia de R$ 161 bilhões em quatro anos e de R$ 1,072 trilhão em dez anos, sem considerar os ganhos com o projeto de reforma das regras para os militares. Mas não foram divulgadas projeções sobre a economia a ser obtida em cada ano.
Apenas a mudança no abono salarial, que limita o pagamento do benefício aos trabalhadores que ganham até um salário mínimo, daria uma economia de R$ 15 bilhões aos cofres públicos por ano, de acordo com cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), entidade do Senado. Hoje, têm direito ao benefício os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos.
Qual será a diminuição das despesas com as mudanças nas regras do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e do Regime Próprio de Previdência dos Servidores (RPPS) da União em 2020? O governo deve apresentar esta estimativa durante os trabalhos da Comissão Especial que analisará a PEC.
A redução de despesas resultante da reforma abrirá espaço para o cumprimento do teto de gastos da União nos próximos anos, embora este não seja, no curto prazo, exatamente um problema. Nos seus dois primeiros anos de vigência, o teto foi cumprido com muita folga, como mostram os dados do Tesouro (veja tabela acima).
É interessante observar que as propostas orçamentárias de 2017 e 2018 foram enviadas pelo governo ao Congresso com as despesas no teto, ou seja, sem margem. Mesmo assim, a execução ficou bem abaixo do limite de despesas, indicando que está ocorrendo um fenômeno nas contas da União ainda não devidamente explicado.
Haverá ganhos também de receita, caso a PEC 6/2019 seja aprovada, pois ela prevê mudanças nas alíquotas de contribuição previdenciária dos servidores públicos, que passariam a ser progressivas, nos moldes do Imposto de Renda da Pessoa Física, com alíquota máxima sendo de 22%.
A proposta do governo para a redução dos subsídios também terá repercussão no próximo ano, caso seja aprovada. Guedes já disse que quer acabar com desonerações e cobrar tributos de quem não paga. Nada disso poderá ser quantificado no PLDO.
O ministro da Economia anunciou ainda um ambicioso plano de privatização de empresas estatais federais e venda de ativos da União, com o objetivo de reduzir o endividamento público. Em quase todos os seus pronunciamentos, Guedes critica o atual montante da dívida pública, lembrando que o setor público brasileiro paga um Plano Marshall por ano em juros, indicando sua intenção de reduzir fortemente essa despesa.
Até agora, no entanto, nenhuma estatal foi vendida nem foi divulgado um cronograma de privatização das 134 empresas pertencentes à União. Há também o interesse do governo em vender imóveis e participações da União em empresas privadas.
Saber o tamanho da redução do endividamento público que o governo pretende realizar é importante para estimar uma meta de resultado nominal para 2020. Este é o critério fiscal com o qual o ministro da Economia parece preferir trabalhar, em substituição ao resultado primário.
A diminuição da dívida é igualmente importante para o cumprimento da chamada “regra de ouro”, que continuará sendo um problema para o governo em 2020. A Constituição estabelece que as operações de créditos não podem exceder o montante das despesas de capital (investimentos, inversões e amortizações da dívida).
Todas essas indefinições tornam a meta de resultado primário do próximo ano irrelevante, principalmente diante da existência do teto de gastos. O governo Bolsonaro não pode, no entanto, repetir o que fez o governo Michel Temer, que estabeleceu uma meta de déficit primário de R$ 139 bilhões para o setor público neste ano, quando o déficit de 2018 foi de R$ 108,2 bilhões. Ou seja, a meta de déficit para 2019 é superior ao déficit registrado no ano passado. Qual é o sentido disso?