Lilia Lustosa*, especial para a revista Política Democrática online (44ª edição: junho/2022)
Recentemente, uma sequela (sequel, em inglês) vem arrasando quarteirões e dando o que falar justamente por despertar na plateia aquela sensação gostosa de reviver o passado, de voltar no tempo, de reencontrar ídolos ou crushes da juventude. Top Gun: Maverick é uma explosão de nostalgia, com direito a Tom Cruise, Val Kilmer, Danger Zone (música de Kenny Loggins) e aquele sentimento de anos 1980 que invade por completo tela e mente.
Trinta e seis anos depois do sucesso de Top Gun: Asas Indomáveis (1986), longa-metragem que lançou Tom Cruise ao estrelato e garantiu seu lugar na cultura pop mundial, o novo Top Gun veio ainda melhor, mostrando que o tempo, às vezes, pode aprimorar uma obra, assim como faz com bons vinhos.
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Para dirigir essa sequela de peso, Joseph Kosinski foi o escolhido. Conhecido por sua aptidão no uso da computação gráfica – Tron: O Legado (2010) e Oblivion (2013) –, desta feita, o diretor americano optou por manter a estética e o estilo de seu predecessor, Tony Scott, filmando in loco, sem fundo verde. As cenas de abertura são exatamente como as do primeiro filme, incluindo a fonte utilizada para apresentar os créditos. Kosinski parece não ter querido deixar dúvidas sobre a filiação de seu Top Gun, prestando, ao mesmo tempo, bela homenagem ao diretor britânico que tirou sua própria vida em 2012. Kosinski agrega, porém, verniz de modernidade ao filme, aliando o que há de melhor na tecnologia atual ao realismo do cinema daqueles tempos. Em Top Gun: Maverick, os atores voam mesmo! Não é CGI. E mais, eles filmam também, já que nem diretor nem cinegrafista podiam acompanhá-los nos voos.
Para que os atores pudessem enfrentar tantos desafios, o próprio Maverick – ops! Tom Cruise – preparou um boot camp de três meses para deixar todos no ponto para subir nos aviões. Kosinski, por sua vez, instalou quatro câmeras dentro de cada jato, duas viradas para os atores e duas para fora, e ainda lançou mão de drones e aviões com a equipe de filmagem voando ao lado dos protagonistas. Uma proeza de realização e, sobretudo, de montagem, ponto alto do filme. As sequências de voos são de tirar o fôlego. Super-realistas e editadas à perfeição para fazer os espectadores voarem junto naqueles caças supersônicos.
O roteiro, talvez, seja o ponto mais fraco do longa. Mas isso já era no original. Afinal, a trama de Top Gun 1 é bem simples: piloto rebelde, com muito talento, mas que não gosta de obedecer às ordens. Entra para a equipe de elite da Marinha americana, a Top Gun. Por seu temperamento, vai acumulando inimigos e perdendo oportunidades na carreira. Para piorar a situação, em um momento de rebeldia aérea, acaba perdendo seu melhor amigo e parceiro de voo, Nick “Goose” Bradshaw (Anthony Edwards). Uma ferida difícil de cicatrizar e que vai apagar um pouco a chama de rebeldia de Pete “Maverick” Mitchell.
No filme atual, o capitão Maverick é um piloto de testes, estagnado na carreira e na vida. Ele é chamado para treinar a equipe escolhida para uma missão quase impossível. Os seis pilotos selecionados da Top Gun terão que eliminar um inimigo que não tem cara (russos, chineses?). Entre eles está Bradley “Rooster” Bradshaw (Miles Teller), filho de seu amigo Goose. Maverick vai viver um dilema: treinar o rapaz para que ele participe dessa missão suicida ou eliminá-lo do grupo, protegendo sua vida, mas impedindo-o, com isso, de alcançar seus sonhos?
Top Gun 2 traz à tona velhos sentimentos, fantasmas e medos, além de propor uma reflexão sobre a maturidade e a passagem do tempo. Não que Maverick tenha perdido a rebeldia, mas agora ela é mais pensada, contida, controlada. As transformações físicas também têm destaque. Nesse quesito, um momento especial é a aparição de Tom “Iceman” Kasansky (Val Kilmer), antigo inimigo de Maverick, que, por seu talento e conformação às regras, chega à diretoria da Top Gun. Na vida real, sabe-se que Val Kilmer passa por um momento difícil, tendo perdido a voz depois de um câncer de garganta. Mas a tecnologia do século 21 torna sua participação possível e emocionante.
Quem ficou de fora mesmo foi a música-tema do primeiro Top Gun, Take My Breath Away, interpretada pela banda Berlin. Para seu lugar, Hold My Hand foi especialmente composta, interpretada por ninguém mais, ninguém menos que Lady Gaga. Será que ela também leva o Oscar, como fez sua predecessora?
Mas o melhor de Top Gun: Maverick é que ele prescinde de conhecimento prévio do filme de 1986, sendo assim um excelente entretenimento também para os jovens de hoje. As explicações necessárias estão todas ali, permitindo que todos desfrutem dessa aventura banhada de sol oitentiano. Mas, se der, vale assistir ao primeiro Top Gun e, também, ao documentário Val (2021), dirigido por Ting Poo e Leo Scott. Eles podem acrescentar um tom de sépia às emoções do presente, fazendo tudo ganhar mais alma e sentido.
Sobre a autora
*Lilia Lustosa é crítica de cinema e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), Suíça.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de março de 2022 (44ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.
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