Ranier Bragon / Folha de S. Paulo
Dias após receber a visita de Sergio Moro, pré-candidato do Podemos à Presidência da República, o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), 61, afirmou em entrevista à Folha que petistas que o criticaram pelo gesto agem com arrogância e como “guardiães da pureza ideológica”.
PT e PSB tentam firmar uma federação que seja a principal base de apoio à candidatura de Lula (PT), um de seus principais adversários políticos de Moro, mas esbarram em divergências em algumas alianças estaduais, entre elas no Espírito Santo.
“Eu tenho 34 anos de PSB. O que me assusta é o autoritarismo de algumas pessoas que reagem de forma arrogante e prepotente devido a uma conversa. É preciso ter humildade, saber que o diálogo faz parte, é base da democracia”, afirmou Casagrande.
O governador disse que ainda é cedo para declarar apoio a candidaturas presidenciais, mas que seguirá a decisão que seu partido tomar.
Casagrande diz que recebeu Moro por um gesto de elegância, já que o Podemos faz parte de seu governo, e que, como gestor, tem o dever de conversar com todos —ressalta, inclusive, que só não foi a um evento de Jair Bolsonaro (PL) no estado porque não foi convidado.
“Parece que algumas lideranças são guardiãs da pureza ideológica. Essa polarização, essa forma como estamos na política brasileira, isso está fazendo mal, está tóxico para quem faz política dialogando com quem pensa diferente”, acrescentou o governador, que se colocou também contrário às federações.
Ele afirma que a nova regra —que exige atuação conjunta das siglas por ao menos quatro anos— podem se tornar uma “carnificina” entre PT e PSB nas eleições municipais de 2024.
Vou fazer a primeira pergunta sobre essa polêmica… Muito trovão e chuva nenhuma [risos]…
…Qual é a sua posição em relação aos palanques nacionais, vai apoiar Lula ou Moro? Não estou apoiando ninguém, a eleição vai começar ainda. Não sou candidato a nada e o PSB não tomou sua decisão final ainda. O partido ainda não fechou questão em relação à política nacional. Eu vou apoiar e estar junto com a decisão do meu partido. Sempre foi assim.
Agora, no projeto que nós temos aqui no Espírito Santo, se eu vou ser candidato [a reeleição] ou não, se vai ser outra candidatura, se vai ser outro para representar o projeto… há diversos partidos que têm candidatos à Presidência da República.
Tem o PDT do Ciro Gomes, tem o [André] Janones, que é do Avante, tem o Podemos, do Moro. Estamos conversando com o PSDB, que tem o [João] Doria. Cada partido faz campanha com seu candidato à Presidência da República.
O PSB não definiu, mas qual é a posição do sr.? Eu vou debater internamente no partido, não tenho uma posição não. O PSB vai tomar uma decisão e eu vou acompanhar a decisão do partido, na hora certa.
Agora, eu sou contra federação de um modo em geral. É um pedaço do passado que carregaram para o futuro. Se proibiu a coligação [para eleição de vereadores e deputados], não tinha que ter inventado a federação. Os partidos têm que ter a capacidade de se organizar, de eleger deputados estaduais e federais.
Agora, o fato de um eu receber um candidato da República, é mais do que natural. Já recebi Ciro, Eduardo Leite, Doria, Cabo Daciolo, vou receber o Janones, que vem em março aqui. Eu não sou candidato a governador ainda. Eu sou governador do estado e tenho conversar com todas as lideranças do Brasil que queiram conversar.
Eu não fui na agenda do presidente da República [Bolsonaro] porque ele não me convidou. Mas hoje [14] passei a manhã toda e parte da tarde com o ministro do Meio Ambiente [Joaquim Alvaro Pereira Leite].
Minha tarefa como governador é fazer esse debate. E parece que algumas lideranças são guardiãs da pureza ideológica. É preciso que a gente compreenda o que é hoje a política brasileira.
Essa polarização, essa forma como estamos na política brasileira. Isso está fazendo mal, está tóxico para quem faz política dialogando com quem pensa diferente. Meu diálogo é aberto, com todas as forças políticas, independente de eu concordar ou não com as pessoas que venham me visitar.
O sr. citou que já encontrou com Doria, Moro… [interrompe] Jaques Wagner [senador do PT] esteve aqui e eu conversei com ele, na semana retrasada, quando ele veio na filiação do [senador Fabiano] Contarato [ao PT]. Recebi ele no aeroporto ainda, conversei com ele. Então, é natural que a gente dialogue com as pessoas, com as lideranças, com os candidatos.
O sr, já conversou com o ex-presidente Lula? Não, mas na hora que ele vier aqui, se quiser conversar comigo, será uma alegria. Nós apoiamos o presidente Lula em todas as suas eleições. Então, a hora que ele vier, e se quiser dialogar conosco, vamos estar à disposição dele.
O sr. tem alguma inclinação por algum nome ou perfil que o partido deva apoiar nacionalmente? O PSB trabalha só com duas alternativas, é Lula ou Ciro. Está muito mais para a alternativa do Lula hoje, mas trabalha essas duas alternativas. É onde o PSB discute seu projeto nacional.
E o sr. será dissidente nessa posição? Eu tenho 34 anos de PSB. O que me assusta é o autoritarismo de algumas pessoas que reagem de forma arrogante e prepotente devido a uma conversa. É preciso ter humildade, saber que o diálogo faz parte, é base da democracia forte.
Isso é um comportamento muito importante para a gente poder ter instituições fortes no país e saírmos dessa miudeza da política, dessa pobreza da política.
O sr. está se referindo especificamente à fala da Gleisi Hoffmann [ao jornal O Globo, a presidente do PT disse que o encontro azedou a negociação PT e PSB e que não dá para servir a dois senhores]? Não, de todos que falaram nesse formato, que condenaram uma conversa, que condenaram um diálogo.
Pelo que entendi, não há então uma possibilidade de o sr. apoiar Moro na eleição. A minha história é uma história de estar alinhado ao PSB. O PSB não discute a hipótese de presidente Moro. Nem por isso preciso ser deselegante com ele. Até porque o partido dele está comigo aqui no governo, O senador Marcos do Val é meu aliado, o secretário Gilson Daniel, que é presidente do partido aqui no estado, é meu secretário.
Prefeitos e deputados estaduais são meus aliados. Então, o PSB não estará com ele, mas nem por isso tenho que tratá-lo de forma deselegante. É preciso ter maturidade e humildade para compreender isso.
Do ponto de vista do simbolismo político o sr. não considerou um problema, tendo em vista a rivalidade de Moro e PT, um partido aliado, tendo em vista que Moro foi o juiz que condenou Lula? A população vai julgar o Moro agora, na eleição, e a Justiça está dando as decisões nos processos do ex-presidente Lula. Não sou eu que vou ser o árbitro desse assunto, isso está na Justiça, a eleição vai colocar o Moro para ser julgado positivamente ou negativamente de acordo com as decisões que ele tomou.
Não sou que tenho que fazer isso, não sou o árbitro ou juiz de todas as causas do mundo
O que foi tratado na conversa com o ex-juiz? Tratamos de segurança pública, de meio ambiente, de relações internacionais. Falei do Espírito Santo para ele. Ele é candidato a presidente da República, vai debater o Brasil por aí afora. É bom que ele conheça o Espírito Santo. Não é todo mundo que conhece profundamente o Espírito Santo não.
É um estado equilibrado, organizado, que está conquistando posições boas porque tem capacidade de fazer grandes frentes partidárias, de dialogar com quem pensa diferente. O Espírito Santo hoje, modéstia à parte, é um estado organizado, com capacidade de investimento. É bom que todos os candidatos possam vir aqui e a gente possa falar um pouco do Espírito Santo.
O sr. acha que em uma possível federação o PSB ficaria refém do PT? Não sei, vai depender daquele conselho que gerencia a federação [o PT defende que a divisão seja feita com base no tamanho das bancadas na Câmara, o que lhe daria 27 das 50 cadeiras de uma federação com PSB, PC do B e PV]. Eu acho que a federação é meio que você ficar… Você faz uma federação por quatro anos. Vai chegar em 20224, vai ser mais uma guerra.
São dois partidos grandes. Não é um partido pequeno que não vai atingir a cláusula de barreira. Se não quer colocar o PSB como grande, coloca como médio. Mas é um partido médio, que não está sob risco por causa da cláusula de barreira, com um partido grande.
Então, pode fazer a federação agora e chegar em 2024 e ser uma carnificina, uma guerra. É preciso compreender que estrategicamente pode ser bom agora, por algum motivo ou outro, mas pode não ser bom nem para o PT nem para o PSB em um médio prazo.
O sr. recebeu a filiação do senador Fabiano Contarato ao PT com reserva? Não, sem nenhuma reserva, recebi com naturalidade. O Contarato pode ser filiar aonde ele quiser. O PSB fez o convite a ele, o PDT fez o convite a ele, o PT fez, e ele fez a opção pelo PT. Eu liguei para ele e dei os parabéns. Não tem problema nenhum, zero de problema com isso.
Mas ele pode ser um eventual adversário na disputa pelo governo do estado. Pode, mas ele tem total legitimidade para concorrer ao governo.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/02/petistas-sao-arrogantes-e-agem-como-guardiaes-da-pureza-diz-governador-do-psb.shtml