Deixada para trás a segunda denúncia do ex-chefe da Procuradoria Geral da República, Rodrigo Janot, contra o mandato do presidente Michel Temer, e superados os maiores riscos institucionais por ela gerados, temos à frente – daqui até às eleições do próximo ano – um complexo e tenso cenário dominado pelo confronto em torno de medidas e propostas para enfrentamento da aguda crise fiscal do país e para reformas da economia entre seus apoiadores e forças corporativas e populistas (de apelo esquerdista ou direitista), com reações agressivamente contrárias.
Tais reações à agenda reformista (corretamente reassumida como prioritária pelo presidente da República), que vão juntar grande parte da elite do funcionalismo com os autointitulados “movimentos sociais”, a rigor antissociais, terão seus alcance e legitimidade esvaziados pela crescente evidência do imperativo de respostas – duras mas essenciais – à dramática crise fiscal legada pelo lulopetismo ao atual governo: de uma dívida pública bruta que aumenta R$ 50 bilhões, a cada ano, até a explosão da criminalidade (sobretudo mas não só no Rio de Janeiro) como um dos múltiplos efeitos dessa crise nos governos das três esferas político-administrativas.
A cobrança das referidas respostas vai passando a ser feita não apenas pelo conjunto do empresariado mas também por muitos segmentos da população, de par com um progressivo reconheci- mento dos ganhos já conseguidos: o fim da recessão com um PIB positivo, a queda da inflação e dos juros básicos, reversão do desem- prego, o desmonte do custosíssimo e corrupto gigantismo estatal, com o saneamento da Petrobras e a privatização da Eletrobras.
Ignorando os enormes custos econômicos, sociais e éticos da desastrosa herança dos governos petistas e na contramão dessa cobrança, o ex-presidente Lula, em suas caravanas de “perseguido do juiz Sérgio Moro”, propõe um referendo para anulação das medidas de ajuste fiscal, como o teto de gastos estatais, e das reformas já institucionalizadas e em tramitação no Congresso, como a do Ensino Médio, a Trabalhista, a Tributária, a da Previdência. Anulação também proposta por Ciro Gomes e outros igualmente empenhados em substituir Lula como candidato após sua esperada condenação em 2ª instância, entre eles o ultrarradical Guilherme Boulos.
O conflito entre uma agenda modernizadora do país e a de uma volta ao populismo estatizante e inflacionário passará a configurar-se como predominante eixo de polarização no embate presidencial de 2018. Num contexto em que a convergência, conclusiva, em favor do candidato mais competitivo do campo reformista se dará num processo tenso e demorado, sujeito a influências e desdobramentos das investigações da Lava-Jato. E envolvendo legítimas disputas internas nos principais partidos e entre estes e movimentos de setores empresariais, de forte teor reformista, fortalecidos pelo elevado déficit de credibilidade que afeta significativamente os primeiros. Os quais, porém, deverão prevalecer, apoiados sobre- tudo nas regras partidárias e eleitorais estabelecidas.
A configuração (do referido eixo) começa a evidenciar-se no intenso debate sobre as MPs publicadas no Diário Oficial da União, de 31 de outubro (que vão garantir ao Tesouro Nacional R$ 12,6 bilhões de recursos extras, com economia de despesas e aumento de receita) e a retomada da PEC da Previdência (na tentativa da aprovação de pontos básicos do relatório produzido no Senado, meses atrás).
O enfrentamento decidido da crise fiscal, de par com a proposta do Executivo dos critérios de privatização da Eletrobras, motivarão, de um lado, agressivas reações corporativas e esquerdistas. E, de outro, deverão favorecer a reafirmação de posturas reformistas de grande parte da bancada de deputados do PSDB, bem como da do PPS e de parlamentares de outros partidos com posturas similares que – a meu ver, compreensivelmente mas equivocada- mente – posicionaram-se pelo acolhimento da denúncia da PGR de Janot contra o presidente.
Quanto ao oposicionista Jair Bolsonaro certamente tentará, nesse debate, combinar a capitalização do aumento da criminalidade (que é seu forte) com votos contrários às MPs restritivas de ganhos da elite do funcionalismo.