Plano de Bolsonaro para ajudar trabalhadores é cruel até em comparação com o de Donald Trump
Não há mais dúvidas de que a crise do coronavírus vai gerar uma recessão. No Brasil, as medidas sanitárias levaram ao fechamento do comércio, ao isolamento da força de trabalho e a uma redução do consumo das famílias. Teremos encolhimento da atividade econômica, diminuição da arrecadação e forte incremento dos gastos de saúde. Se não agirmos logo, além dos doentes e dos mortos teremos também milhões de desempregados e desassistidos passando fome.
O Brasil tem hoje 18,6 milhões de trabalhadores sem carteira assinada, 4,5 milhões deles ocupados como trabalhadores domésticos; temos também 19,3 milhões de trabalhadores por conta própria sem CNPJ. Nosso comércio varejista, que está quase todo fechado, emprega outros 5,6 milhões de trabalhadores, já excluído o setor de supermercados e alimentos.
A tudo isso se somam 11,9 milhões de trabalhadores que já estavam desempregados. São dezenas de milhões de brasileiros que precisarão de apoio para alimentar suas famílias.
Em todo o mundo, governos têm abandonado temporariamente os preceitos de equilíbrio fiscal e adotado medidas de economia de guerra. Setores duramente atingidos estão recebendo apoio financeiro, a folha de pagamento das empresas está sendo parcialmente subsidiada pelo Estado para evitar demissões e trabalhadores informais estão recebendo auxílio na forma de uma renda básica de cidadania.
Enquanto isso, o plano de Bolsonaro é psicótico, não sabemos se motivado por cegueira ideológica ou por uma brutal insensibilidade social. Mesmo se comparadas às do plano de Donald Trump, as medidas de Bolsonaro são cruéis.
Embora as negociações no Congresso americano ainda estejam em curso enquanto esta coluna é escrita, tudo indica que os Estados Unidos devem dar US$ 1.200 por adulto e mais US$ 500 por criança para as famílias americanas com renda menor do que US$ 75 mil (para sobreviverem por cerca de três meses); enquanto isso, Bolsonaro quer dar aos trabalhadores informais que estão no cadastro único para programas sociais R$ 200 de auxílio, por três meses.
Enquanto Trump vai ajudar 57% das famílias americanas, Bolsonaro vai ajudar 36% das famílias brasileiras; enquanto Trump vai dar cerca de 80% de um salário mínimo americano por mês, Bolsonaro vai dar 20% de um salário mínimo brasileiro; enquanto Trump quer empregar nesse auxílio 1% do PIB americano, Bolsonaro quer empregar apenas 0,2% do nosso PIB.
O programa de Bolsonaro, mesmo em termos relativos, é apenas um quinto do que o de Trump, seu mentor.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.