Enquanto Bolsonaro aspira ruptura institucional, establishment e oposição tentam criar condições para o impeachment
O jogo parece travado. Bolsonaro gostaria de atropelar as instituições, mas não tem força para fazê-lo; o establishment e a oposição gostariam de impedir o presidente, mas não têm apoio popular nem voto no Congresso.
Enquanto nenhuma ação definitiva é tomada, as tensões vão escalando.
Bolsonaro parece cercado. As investigações sobre as rachadinhas no Ministério Público do Rio, as investigações sobre a máquina de propaganda do gabinete do ódio no Supremo e o depoimento de Moro a pedido da PGR podem vir à tona a qualquer momento. Em todas essas frentes podem emergir evidências que façam Bolsonaro perder apoio e subsidiem um pedido de impeachment mais robusto.
Para reagir ao cerco, Bolsonaro está fazendo três movimentos simultâneos. O primeiro é tentar controlar a Polícia Federal, primeiro com a indicação de Alexandre Ramagem e, agora, com a indicação de Rolando de Souza. Com tanto escrutínio e com tanta oposição na PF, pode ser que o presidente não consiga exercer bem esse controle.
O segundo movimento de Bolsonaro é comprar apoio no Congresso para impedir um processo de impeachment. Para reduzir a insatisfação na sua base de apoio, Bolsonaro está oferecendo apenas cargos do segundo escalão, que são menos visíveis.
A aliança com o centrão tem tudo para durar pouco. Esse é o mesmo centrão que dava sustentação ao governo Dilma e que, ao primeiro sinal de fraqueza, saltou para o barco do impeachment.
Além de aliado naturalmente instável, o partido do fisiologismo tem motivos para não confiar em Bolsonaro. O presidente não apenas descartou Sergio Moro, que parecia pilar do governo, como descartou sem pudor aliados outrora fundamentais, como Magno Malta, Gustavo Bebianno, Joice Hasselmann e o general Santos Cruz. Regina Duarte e mesmo Paulo Guedes podem estar a um passo de sair.
O terceiro e último movimento é preparar uma ruptura institucional tentando fazer crescer as carreatas antigovernadores e aliciando lunáticos para o acampamento paramilitar, “dos 300”, que se estabeleceu em frente ao Congresso.
Um dos motivos que fazem a situação ainda mais confusa é o apagão de informações. Com o isolamento social, os institutos de pesquisa que faziam entrevistas presenciais, consideradas mais sólidas, migraram para as entrevistas telefônicas, utilizadas pelos institutos menores. Os dados dos diferentes institutos divergem um bocado entre si, e não sabemos dizer com certeza se com a crise do coronavírus Bolsonaro perdeu, manteve ou ampliou o apoio ao seu governo.
Pablo Ortellado é professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.