Toffoli já enviou 7 processos para cortes inferiores, após mudança no foro
Por André de Souza e Eduardo Bresciani, de O Globo
BRASÍLIA — Dos 74 inquéritos da delação da Odebrecht abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar parlamentares, ao menos 29 deverão ser enviados para outras instâncias. Isso porque eles tratam de crimes sem relação com o mandato dos congressistas investigados. A redistribuição de processos é consequência do julgamento do STF que definiu, na quinta-feira, restringir o foro privilegiado para deputados e senadores. Até a edição da nova regra, todo crime relacionado a parlamentares federais era obrigatoriamente analisado pela mais alta Corte do país.
Ontem, o ministro Dias Toffoli mandou para instâncias inferiores seis ações penais e um inquérito envolvendo sete deputados. Em todos os casos, os supostos crimes ocorreram antes do mandato ou não têm relação com o exercício do cargo. Toffoli determinou o envio de processos de crimes supostamente cometidos por parlamentares quando eles ocupavam, por exemplo, cargos de prefeito e deputado estadual.
O envio dos processos para outras instâncias não será automático. Vai depender da análise, caso a caso, de cada ministro encarregado de relatar processos contra congressistas no Supremo. Dos 74 casos analisados pelo GLOBO, sete devem continuar no tribunal. Eles dizem respeito à atividade parlamentar, como a atuação de deputados e senadores pela aprovação de projetos de interesse da Odebrecht. Há ainda 38 inquéritos restantes que levantam dúvidas: dependendo da avaliação particular de cada ministro, podem ou não permanecer na Corte.
As ações penais dos deputados federais Takayama (PSC-PR) e Helder Salomão (PT-ES) foram enviadas respectivamente para a primeira instância em Curitiba e Cariacica (ES). Mas as constituições paranaense e capixaba dizem que cabe ao Tribunal de Justiça (TJ) local julgar crime de deputados estaduais e prefeitos. Assim, ao não enviar os processos para o TJ, Toffoli indicou que tudo deverá ser encaminhado para a primeira instância, mesmo que o investigado ou réu tenha passado por um cargo que garanta foro em alguma corte. Toffoli também mandou ações penais dos deputados Alberto Fraga (DEM-DF), Roberto Góes (PDT-AP), Marcos Reategui (PSD-AP) e Cícero Almeida (PHS-AL) para a primeira instância, assim como o inquérito contra o deputado Wladimir Costa (SD-PA).
No julgamento do STF, prevaleceu a proposta do ministro Luís Roberto Barroso: manter no tribunal apenas os processos de parlamentares abertos em decorrência de crimes cometidos durante o mandato e, ainda assim, se tiverem relação direta com o exercício da função. O próprio Barroso, no entanto, reconheceu que em alguns casos será difícil definir se essa relação existe ou não. Ele disse não haver decisão sobre o que ocorre, por exemplo, com deputados e senadores que cometeram crimes em mandatos anteriores e foram reeleitos. Há vários inquéritos da Odebrecht nessa situação.
VÁRIOS PARTIDOS
Os 29 inquéritos da Odebrecht que devem ser mandados para outras instâncias investigam parlamentares de vários partidos: DEM, PCdoB, PMDB, PP, PR, PRB, PSD, PSDB, PT e SD. Dois deles apuram irregularidades envolvendo o senador Aécio Neves (PSDB-MG) quando não era parlamentar. Um investiga, por exemplo, se houve pagamento de propina ao tucano por contratos da obra da Cidade Administrativa, quando Aécio era governador de Minas Gerais.
O senador Fernando Bezerra Coelho (PMDB-PE) também tem dois inquéritos que devem descer para a primeira instância. Eles tratam de crimes que teriam ocorrido em 2008 e 2010, quando não era parlamentar.
Alguns casos não devem ir para a primeira instância, mas para outros tribunais, porque envolvem outras pessoas com foro. Há um inquérito, por exemplo, aberto para investigar o senador Jorge Viana (PT-AC) e seu irmão, o governador Tião Viana (PT-AC). Sem foro para o parlamentar, vai prevalecer a regra de que cabe ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisar processos envolvendo governadores. A decisão do STF atingiu apenas senadores e deputados federais, mas não outras autoridades.
Eles tratam da atuação de parlamentares como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), os senadores Romero Jucá (PMDB-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL). Delatores da Odebrecht disseram ter feito pagamentos a ele em troca de sua ajuda no Congresso, onde havia projetos de interesse da empresa.
Dos cinco inquéritos da Odebrecht que investigam Jucá, por exemplo, quatro devem ficar no STF. Isso inclui um em que a Primeira Turma do STF aceitou denúncia, transformando Jucá em réu. O quinto é um caso em que há dúvida porque trata de supostas irregularidades de 2008, quando ele já era senador, mas em mandato anterior ao atual.
Assim como Jucá, há outros parlamentares nessa mesma situação. É o caso, por exemplo, do senador Fernando Collor (PTC-AL) e de outro processo de Rodrigo Maia. Outros processos que geram dúvidas tratam de pagamento de caixa dois em campanha pela reeleição, como um inquérito do ex-presidente da Câmara Marco Maia (PT-RS).
Dos 80 inquéritos em curso no STF, com base na delação da Odebrecht, seis não dizem respeito a parlamentares. Um investiga um suplente que já exerceu o cargo de deputado, mas ainda não foi enviado para outra instância. É apenas questão de tempo para que isso ocorra. Outros cinco apuram o envolvimento de ministros em irregularidades. Pela decisão do STF, que abrange apenas deputados e senadores, esses casos continuam na Corte.