Líder opositor quer saber em primeira mão até onde governo Bolsonaro está disposto a ir na ofensiva regional contra Maduro
Por Janaína Figueiredo e Eliane Oliveira, de O Globo
BRASÍLIA — A inesperada viagem de Juan Guaidó a Brasília tem dois objetivos centrais, confirmaram ao GLOBO fontes brasileiras e venezuelanas: encontrar-se com o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e mostrar que ainda conta com respaldo firme do governo brasileiro, e saber em primeira mão até onde o Brasil está disposto a chegar na ofensiva regional contra Nicolás Maduro.
Na reunião do Grupo de Lima de segunda-feira passada, em Bogotá, o bloco e o Brasil especialmente descartaram a possibilidade de uma intervenção militar na Venezuela. Isso deixou os Estados Unidos sozinhos ao lado de Guaidó, caso esse seja o cenário em algum momento em curto e médio prazo. Para colaboradores do presidente da Assembleia Nacional, autoproclamado presidente interino da Venezuela desde 23 de janeiro, “a atitude do Brasil decepcionou e surpreendeu”.
— Nós estamos pensando, eventualmente, numa cooperação internacional. Não falamos mais em intervenção, porque Guaidó é um presidente legítimo e pode ter acordos de cooperação, inclusive na área militar. Se for só com os EUA será assim. Queremos saber a real situação — assegurou uma fonte venezuelana.
Em Brasília, a visão é diferente. Fontes que presenciaram o encontro em Bogotá asseguraram que “o Brasil está fazendo a sua parte desde o início, não pode ser acusado de ter falhado”. Em conversas internas, funcionários do governo Bolsonaro apontam que “Maduro ainda tem a força bruta e Guaidó, o poder moral”. Quando são perguntados sobre a possibilidade de uma intervenção militar internacional, respondem enfaticamente que “essa consulta já se tornou cansativa, o Brasil e o Grupo de Lima já deixaram clara sua posição”.
Embora tenha garantido que retornará a Caracas, mesmo sob risco de prisão, Guaidó decidiu vir a Brasília para entender melhor a posição brasileira. Sua expectativa na Colômbia “era outra”. Pela manhã, o líder opositor, que chegou a Brasília com uma pequena delegação de deputados e com sua mulher, Fabiana Rosales, tem uma agenda privada que não foi revelada. Especulam-se reuniões em embaixadas, entre elas a dos EUA.
A visita foi organizada por sua “embaixadora” em Brasília, professora Maria Teresa Belandria, junto com altas autoridades do governo Bolsonaro, confirmaram fontes brasileiras. Um dos envolvidos na elaboração da agenda de Guaidó teria sido Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional. Itamaraty e Planalto têm trabalhado juntos na questão Venezuela. Inclusive, a participação em Bogotá do vice-presidente, Hamilton Mourão (ex-adido militar em Caracas), foi elogiada pela área diplomática.
Outras fontes brasileiras indicaram que houve um recuo na posição do presidente Bolsonaro no que diz respeito à Venezuela, entre outros motivos, pelas críticas que o chefe de Estado e seu governo receberam de congressistas da base aliada. Circularam nos últimos dias vídeos nos quais o governo é acusado praticamente de ter se tornado uma marionete dos Estados Unidos. Esses questionamentos, enfatizou a fonte, incomodaram Bolsonaro e outros, como o ministro Heleno, e teriam pesado na análise que o governo vem fazendo da crise venezuelana e levado à adoção de uma posiçãp mais cautelosa.
Os próximos passos de Guaidó ainda são uma incógnita. Fala-se em eventual encontro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ou até mesmo num retorno a Venezuela após a visita ao Brasil.