O ex-ministro da Saúde e do Planejamento José Serra, senador pelo PSDB-SP, conversou com a Coluna sobras as crises na saúde e na economia provocadas pelo coronavírus. Segundo ele, é preciso “ampla coordenação com a política fiscal” e “fortalecer o SUS“
Alberto Bombig, O Estado de S. Paulo
Coluna do Estadão – Qual a avaliação do senhor da crise até agora?
José Serra – O cenário é, sem dúvida, grave. Creio que ainda estamos na primeira fase, experimentando o choque e caindo na real, tentando lidar com os preparativos para um surto de gripe que deve vir, segundo os dados da OMS e a experiência dos países asiáticos e europeus. Como vamos lidar com a saúde e a economia nas próximas semanas fará toda a diferença lá na frente. A contração econômica em escala mundial e os tropeços dos mercados de capitais e do sistema financeiro internacionais poderão gerar corridas bancárias e insolvência de grandes empresas e bancos de investimentos, refletindo-se em seguradoras e fundos de pensão. O mundo terá que se coordenar fiscal e monetariamente. Isso é imperativo. Inclusive, a autonomia dos BCs mundiais já vinha sendo revista desde 2008 e está sendo posta em xeque por esta crise, que requer ampla coordenação com a política fiscal. Logo, não devemos sequer voltar a discutir este tema antes de superá-la e conhecermos o novo arranjo econômico que se estabelecerá. No tocante à saúde, creio que só conseguiremos enfrentar essa pandemia com um fortalecimento a curto prazo do SUS, com ampliação emergencial do número de leitos em UTI e dos serviços de saúde, reforçando atendimento nas unidades básicas. Por isso também o decreto de calamidade é fundamental, para que se possa redirecionar recursos para o SUS.
Coluna do Estadão – Como o Legislativo pode contribuir para o enfrentamento?
Serra – O primeiro passo é reconhecer o estado de calamidade. Eu apresentei um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nesse sentido, antes de o governo anunciar o pedido ao Congresso. Mas, independentemente da paternidade desta ou daquela medida, é importante apoiar as iniciativas emergenciais do governo. Além disso, devemos suspender pautas que não sejam prioritárias, especialmente as que se chocam com medidas urgentes, como a PEC Emergencial, que vedaria a contratação de temporários, novas linhas de financiamento e subsídios, que nesse cenário devam ser necessárias. A reforma tributária, com um cronograma de 45 dias que já era inexequível, não pode ser discutida com esse cenário de crise. Após a crise precisaremos de propostas com potência imediata sobre a atividade e a produtividade, não as propostas que parcelam queda de arrecadação, aumento de carga, choque de preços, desemprego e complexidade adicional por 10 longos anos. O debate das propostas em discussão deveria ser arquivado dada a realidade desta crise e seus desdobramentos econômicos e fiscais.
Coluna do Estadão – O Brasil deve fechar as fronteiras?
Serra – Claro que não. Só devemos reagir contra a importação de fatores de crise, mas podemos usar nossa pauta de alimentos essenciais para barganhar melhores termos de troca para medicamentos, suprimentos médicos e outros insumos básicos essenciais para o enfrentamento deste momento. Para as pessoas, teremos de observar o avanço da pandemia aqui. Se houver um risco de propagação maior do vírus, seria recomendado.