Luiz Carlos azedo | Nas entrelinhas
A pesquisa Ipec, divulgada ontem, não foi nada boa para o presidente Jair Bolsonaro, que vinha em uma exitosa ofensiva para encurtar a distância em relação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na semana passada. Realizado entre sábado e ontem, com margem de erro de dois pontos para mais ou para menos, o levantamento mostra uma estabilização da campanha em relação à pesquisa anterior, de 17 de outubro, mantendo-se em 50% dos votos totais para Lula e 43% para Bolsonaro. Ou seja, o chefe do Executivo não conseguiu reduzir a diferença em uma semana de campanha. O gráfico de chegada no dia da eleição, a chamada “boca de jacaré”, mostra linhas paralelas.
A pesquisa Atlas, divulgada ontem, também apresenta um cenário desfavorável, porque as linhas se distanciam ligeiramente em relação à semana passada: Lula avançou de 51,1% para 52% dos votos válidos, enquanto Bolsonaro tinha 46,6% e caiu ligeiramente para 46,2%. A margem de erro da pesquisa é de 1%. Foram entrevistados 4,5 mil eleitores, de 1.404, municípios. O mais relevante na pesquisa não são as pequenas oscilações de Lula, fora da margem de erro, e a de Bolsonaro, dentro da margem, mas o fato de que o cenário se manteve estável durante uma semana de campanha, com o tempo correndo contra Bolsonaro.
O levantamento da Atlas captou a transferência de votos de Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) majoritariamente para o ex-presidente Lula. Na pesquisa anterior, 54,2% dos eleitores de Simone declararam voto em Lula, o percentual subiu para 69,9%, em consequência da intensa campanha que a senadora do MDB vem fazendo em favor do petista. Simone se tornou uma estrela no segundo turno, com uma agenda intensa, focada na conquista do voto feminino, com duros discursos contra o presidente da República. Na pesquisa anterior, 29,2% dos eleitores de Simone votavam em Bolsonaro, agora são apenas 18,2%. A vantagem de Lula aumentou de 25% para 51,4% desses eleitores.
Mesmo sem engajamento do candidato do PDT, os eleitores de Ciro Gomes também derivaram para Lula, que na pesquisa anterior perdia para Bolsonaro, de 53,9% a 39,1% desses eleitores. Agora, a situação se inverteu, Lula tem 51,3% e Bolsonaro 41,6%. A vantagem de Bolsonaro nesse segmento, que era de 14,8%, se tornou uma desvantagem de 9,7%, o que é um desastre, porque o presidente da República, para se reeleger, precisava conquistar esses votos da chamada “terceira via” para reverter a vantagem obtida por Lula no primeiro turno. Isso quer dizer que a eleição está decidida? Nada disso, ninguém ganha a eleição de véspera. Significa apenas que a ofensiva de Bolsonaro no segundo turno, ameaçando ultrapassar Lula, foi contida até aqui.
Factoide
Um fato que já pode ter influenciado as pesquisas é o caso do ex-deputado Roberto Jefferson, que roubou a cena eleitoral ao resistir à prisão, com tiros de fuzil e granadas de efeito moral, contra agentes da Polícia Federal, na manhã de domingo, em Comendador Levi Gasparian, no interior fluminense. Em prisão domiciliar, Jefferson havia gravado um vídeo agredindo a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármem Lúcia, o que resultou na revogação de sua prisão domiciliar pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso das fake news, que emitiu o mandado de prisão.
O episódio gerou uma agenda negativa para Bolsonaro. Jefferson feriu um delegado e uma agente da Polícia Federal. O envolvimento do governo na negociação da rendição de Jefferson ficou escancarado na conversa do policial que negociou diretamente com o ex-deputado. Registrada em vídeo e divulgada, a conversa viralizou nas redes sociais, o que desgastou ainda mais o governo. Nos bastidores, Bolsonaro teria prometido o indulto a Jefferson para que ele se entregasse. A campanha do presidente da República havia se organizado para um rush em São Paulo, com objetivo de criar uma vantagem eleitoral robusta no maior colégio eleitoral do país, que neutralizasse a esmagadora vantagem de Lula no Nordeste. Jefferson, que disparou cerca de 50 tiros contra os policiais, foi indiciado em quatro tentativas de homicídio, mas roubou a cena e ofuscou toda a programação de campanha de Bolsonaro nos últimos dois dias.
No começo da noite de ontem, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, tentou retomar a iniciativa política da campanha de Bolsonaro, anunciando bombasticamente o que seria uma denúncia gravíssima. Na entrevista coletiva, disse que uma auditoria realizada por seu próprio ministério, após denúncia, levantou que várias rádios publicaram mais inserções do PT do que de Bolsonaro. De 7 a 21 de outubro, após dupla checagem, segundo Faria, foram 154 mil inserções a menos para a campanha do presidente. Diante da denúncia, o presidente do tribunal Superior Eleitoral, ministro Alexandre de Moraes, exigiu apresentação de provas no prazo de 24 horas, sob pena de configuração de crime eleitoral.