Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense
Candidato à Presidência da República pela quarta vez, Ciro Gomes nos lembra O Mito de Sísifo, o mais esperto dos mortais segundo a mitologia grega. Ex-prefeito de Fortaleza, ex-governador do Ceará, ex-ministro da Fazenda do governo Itamar Franco e da Integração Nacional do governo Lula, ex-deputado estadual e federal, é um dos políticos mais experientes do país, com reconhecida capacidade administrativa. Concorreu à Presidência em 1998 e 2002 pelo antigo PPS; e, em 2018, pelo PDT, mesma legenda que o abriga neste ano.
“Os deuses condenaram Sísifo a rolar incessantemente uma rocha até o alto de uma montanha, de onde tornava a cair por seu próprio peso. Pensaram (os deuses), com certa razão, que não há castigo mais terrível que o trabalho inútil e sem esperança”, escreveu o filósofo existencialista franco-argelino Albert Camus (1913-1960), ao explicar a condição humana no livro O Mito de Sísifo, publicado em 1942, em plena Segunda Guerra Mundial.
Enfurecido com os golpes que Sísifo aplicava contra os deuses, Zeus mandou Tânato, a deusa da morte, levá-lo ao mundo subterrâneo. Sísifo a presenteou com um colar e elogiou sua beleza. Na verdade, o ornamento era uma coleira, com a qual aprisionou Tânato. Deus dos mortos, Hades libertou Tânato e mandou-a novamente atrás de Sísifo. Antes de ser levado até Hades, Sísifo pediu à sua esposa, Mérope, que não enterrasse seu corpo. Quando encontrou o deus dos mortos, disse que precisava voltar pra casa, para ordenar à esposa que o enterrasse. Assim, enganou a morte pela segunda vez. Zeus e Hades consideraram Sísifo um revoltado e o sentenciaram à punição eterna: levar uma pedra ao alto da montanha e vê-la rolar, para novamente carregá-la até o alto, em um esforço sem fim.
Camus escolheu Sísifo por sua audácia diante da morte. Sua revolta consciente era negar os deuses e aceitar seu destino. Sua liberdade era encarar o absurdo sem nostalgia, salto ou apelo. Sua grandeza foi viver conhecendo todos os riscos. “Esse mito só é trágico porque seu herói é consciente. O que seria sua pena se a esperança de triunfar o sustentasse a cada passo?”, indaga Camus.
Emparedado
“O operário de hoje trabalha todos os dias de sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente. Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão de sua miserável condição: pensa nela durante a descida. A clarividência que deveria ser o seu tormento consuma, ao mesmo tempo, sua vitória. Não há destino que não possa ser superado com o desprezo”, ensina Camus.
Em 1998, Ciro rompeu com o então presidente Fernando Henrique Cardoso por causa da emenda da reeleição e deixou o PSDB. Explicitou divergências sobre a venda do patrimônio público, as dívidas interna e externa e valorização artificial do real. Seu programa de governo previa a redução drástica dos juros e a adoção de um câmbio flutuante. FHC foi reeleito no primeiro turno, com 53% dos votos, e Ciro ficou em terceiro, com cerca de 10% dos votos.
Com apoio de Leonel Brizola, em 2002 conseguiu formar uma frente com o PPS, PTB e PDT. Seu principal adversário era o tucano José Serra. Suas posições sobre a renegociação da dívida externa assustaram o setor financeiro, mas foi uma declaração infeliz sobre a atriz Patrícia Pillar, sua companheira na época, que pôs sua campanha a perder. No primeiro turno Lula venceu com 46% dos votos, Serra ficou em segundo com 23%, Garotinho em terceiro com 18% e Ciro Gomes em quarto com 12%.
Na campanha de 2018, Ciro disse que “quem estava sangrando o Brasil eram os brasileiros endinheirados”. Defendeu a renegociação e o alongamento da dívida interna, e a redução das taxas de juros. Prometeu limpar o nome de devedores no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Com 13,3 milhões de votos(12,47%), foi o terceiro colocado na eleição presidencial. Ciro, novamente, é candidato; de novo, foi emparedado por Lula. Realiza um esforço de Sísifo. Caiu de 9% para 6%% nas intenções de voto.