Kevin Tschierse / DW Brasil
Maya Angelou lutou ao lado do ativista Martin Luther King pela igualdade de direitos civis para os negros nos Estados Unidos. Agora, uma moeda de 0,25 dólar será dedicada a essa americana que morreu em 2014. Ela é a primeira mulher negra a ser homenageada dessa forma.
A peça especial faz parte de uma série que será colocada em circulação pela casa da moeda dos EUA até 2025, e há muitos outros marcos importantes no American Women Quarters Program: com a astronauta Sally Ride, pela primeira vez uma lésbica declarada será retratada em dinheiro nos EUA. E com a ativista dos direitos civis Nina Otero-Warren, uma hispano-americana.
O que esses tributos a grupos minoritários nos dizem sobre a sociedade americana?
Mulheres são retratadas em moedas há 2.500 anos
A decisão de retratar “minorias” em moedas de 25 centavos de dólar mostra que os EUA “desenvolveram uma consciência da diversidade da sociedade, pela qual a América só pode ser parabenizada”, comenta o professor Bernhard Weisser, do Gabinete de Numismática dos Museus Nacionais de Berlim.
A apresentação de “minorias” em moedas é um fenômeno novo: historicamente, os objetos serviam para “transmitir os ideais e virtudes do governante aos usuários – isto é, à sua população e aos soldados”.
Figuras femininas em moedas, por outro lado, existem desde a existência do dinheiro de metal. De deusas da Antiguidade a governantes da Renascença e líderes dos tempos modernos, muitas foram imortalizadas no vil metal.
É verdade que as peças mais antigas conhecidas são adornadas com rostos masculinos: “Já em 525 a.C., o rei da Pérsia era retratado em moedas”, diz Weisser. Mas as mulheres também estiveram presentes desde cedo: uma das primeiras figuras de peso histórico imortalizada assim foi a rainha egípcia Arsinoe 2ª, do Reino Ptolemaico, no século 3º a.C..
Efígies como um símbolo de poder
Desde então, muitas moedas nacionais retrataram mulheres, em vida ou postumamente. Líderes políticas são, até hoje, as mais frequentemente representadas em dinheiro.
De Cleópatra 7ª (69-30 a.C), no Egito, à rainha Naganika, uma das primeiras mulheres da história indiana a dirigir assuntos de Estado, no século 1º a.C, à imperatriz do Sacro Império Romano-Germânico Maria Theresia (1717-1780), todas emitiram moedas com suas efígies.
Esta última “criou um táler [moeda de prata adotada na Europa por quase 400 anos] que gozou de grande popularidade na África”, conta Weisser, “e foi reemitido em Viena até o século 20”.
Com suas efígies nas moedas, as governantes buscavam legitimar seu domínio e afirmar sua influência sobre nações e impérios, como faziam seus colegas homens. O exemplo mais conhecido é provavelmente a imagem da rainha Elizabeth 2ª, que ainda é retratada hoje em dia em inúmeras moedas na Commonwealth, a comunidade internacional que reúne antigas colônias britânicas).
Deusas ou alegorias nacionais
Mas não só a realeza tinha seu rostos cunhado: impérios antigos, como a Grécia ou o Kushana, na Ásia Central, foram os primeiros a retratar divindades femininas em suas moedas.
Enquanto os governantes gregos retrataram a deusa Atena em várias poses, os Kushana imprimiam as deusas Sri Lakshmi ou Ardoksho em suas moedas. Na Índia, a deusa Lakshmi tem sido a divindade mais comum representada nas moedas.
Deusas raramente são encontradas em moedas hoje em dia, mas outras figuras femininas fictícias que servem como alegorias nacionais, sim. Entre elas, a francesa Marianne, representando a República, e também presente nas cédulas de real) a peruana Madre Patria e a americana Lady Liberty.
Mulheres fortes no dinheiro moderno
Desde o século 20, registra-se a tendência a reconhecer mulheres por sua contribuição para a sociedade. Exemplos são a popular ex-primeira-dama da Argentina, Eva Perón (1919-1952), cuja efígie ainda em circula em moedas comemorativas, ou a ex-primeira-ministra indiana Indira Gandhi (1917-1984). Ambas foram homenageadas postumamente, visando relembrar os papéis de liderança política das mulheres e consolidar seu lugar nas respectivas histórias nacionais.
Nos últimos anos, no entanto, os governos também passaram a homenagear mulheres de fora da política. Cada vez mais rostos femininos são reconhecidos por suas contribuições às artes e ciências. Além disso, como no caso de Maya Angelou, passou-se a valorizar mais o papel das ativistas.
“Recentemente, as homenageadas em cunhagem costumavam atuar no setor beneficente ou na educação infantil. Mas esses eram retratos femininos bastante unilaterais. Isso está mudando aos poucos”, explica Weisser.
As peças especiais americanas correspondem aos sinais dos tempos. No entanto, as ativistas e cientistas retratadas ainda precisam compartilhar a moeda com um homem: primeiro presidente dos EUA, George Washington (1732-1799) é quem está na outra face da moeda de Angelou.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/mulheres-nas-moedas-de-deusas-a-ativistas-pol%C3%ADticas/a-60416587