A economia está com nível de atividade bem diferente dependendo do setor. De 2014 a 2018, a construção caiu 28% e o agro teve alta de 13%
O crescimento tem sido muito assimétrico em qualquer comparação, seja entre regiões, entre setores, e até dentro de cada setor. Essa diferença é um dos problemas que impedem o economista José Roberto Mendonça de Barros de compartilhar do entusiasmo que, segundo ele, ocorre “em algumas áreas da Faria Lima”, referindo-se ao mercado financeiro, sobre o PIB. Sua consultoria continua prevendo 1,6% de alta para o ano que vem, e acha que isso só muda dependendo de algumas pré-condições.
— É como se três pessoas tivessem que descrever um elefante, com os olhos vendados, e cada uma pega numa parte do animal.
Sairão definições bem diferentes. Assim está a economia brasileira —disse.
A revisão que foi feita do PIB ano passado, pelo IBGE, de 1,1% para 1,3%, é derivada da mudança no PIB agrícola, que estava com 0,1% e foi para 1,4%, a indústria caiu de 0,6% para 0,5%, e o setor de serviços teve alta de 1,3% para 1,5%.
Dados plurianuais mostram essa assimetria. De 2014 a 2018, a queda do PIB está em 4,2%. Ou seja, já recuperou uma parte, mas ainda está negativo. Nesse período, a construção civil acumulou uma queda de 28,5%. Portanto, a alta que houve no dado do terceiro trimestre de 2019 é apenas uma pequena mudança nesse cenário de encolhimento. A indústria de transformação, que continua no vermelho, acumulou de 2014 a 2018 uma queda de 9%. O setor de serviços está com uma redução menor, de 2,7%, e a agropecuária contrasta com uma alta, nesses anos recessivos, de 13,3%.
São muitas as explicações para essa diferença, mas sem dúvida os acertos do setor agropecuário, com investimento em tecnologia de produção e aumento de produtividade, são parte fundamental do fato de o setor ter atravessado com dados tão positivos os anos de recessão.
—A surpresa positiva do PIB do terceiro trimestre foi a construção civil, mas ela está concentrada apenas no residencial. E muito mais
forte em São Paulo. A construção pesada continua de joelhos. A gente vê a concentração dessa recuperação até na distribuição das vendas da indústria de cimento —diz José Roberto.
Por isso, dependendo de onde se está, no setor da economia brasileira ou na região do país, a visão pode ser mais ou menos positiva neste momento em que há sinais de melhora no nível de atividade.
—A Faria Lima, principalmente uma parte dela, está muito animada. Vejo gente revendo o crescimento do ano que vem para até 3%. Nós aqui na consultoria avaliamos que não se pode dizer que estamos numa retomada, mas sim no meio da consolidação das condições que podem levar à recuperação. Por isso ainda estamos prevendo 1,6% para o PIB do ano que vem, e só vamos mudar se as condições forem alteradas —diz José Roberto.
Para ele são três essas pré-condições da retomada: primeiro, é preciso completar o trabalho de mudança no quadro fiscal do país, segundo, é preciso ter um avanço nas concessões, principalmente na área de saneamento, terceiro, consolidar a mudança que já está havendo no mercado de crédito:
— Pelo menos a PEC emergencial, que permite por dois anos um ajuste nas despesas correntes e de pessoal, precisaria estar aprovada no primeiro semestre do ano que vem. No segundo, não se aprova nada porque é ano eleitoral. Isso permitirá uma projeção de controle de gastos que hoje crescem quase de forma autônoma. Será preciso avançar nas concessões, já que não se espera muito das privatizações. Como eu aprendi quando estive no governo, privatização quando é bem-sucedida leva o dobro do tempo e vende a metade.
Espero que haja concessões e torço para que seja no saneamento, que tem enorme demanda de investimento e é uma forma de impactar a construção civil e o emprego de todos os níveis, do ajudante de pedreiro ao engenheiro. O terceiro evento está acontecendo, já que é a mudança rápida no mercado de crédito, reduzindo o custo dos financiamentos.
Mendonça de Barros acha que a reforma tributária está na fase em que a Previdência estava há dois anos e meio:
— Até as pedras sabem que é necessária, mas ainda não tem consenso. Alguns setores temem aumento de imposto e já estão estudando detalhadamente para formar opinião.
O economista diz, por fim, que a conjuntura internacional e a política interna, incluindo a maneira como o governo lida com a Amazônia, são fatores que vão dizer se o país terá ou não um crescimento sustentado.