Em fevereiro o próximo governo já será obrigado a bloquear R$ 12 bilhões esperados da privatização da Eletrobras, operação hoje paralisada
Ao fim de fevereiro, quando fizer o primeiro relatório de avaliação bimestral do cumprimento de metas fiscais, o governo terá que bloquear R$ 12 bilhões de receita e despesa. É o dinheiro previsto no Orçamento que viria da privatização da Eletrobras. A venda está paralisada, e sobre ela não há consenso dentro da administração Bolsonaro. O presidente eleito já se manifestou contra, certa vez, mas integrantes da equipe econômica se comportam como se a venda das ações da holding elétrica fosse favas contadas.
Este é apenas um dos vários momentos em que a realidade vai mostrar sua face para os que estão chegando ao poder. Depois dessa transição cheia de ruídos e com uma comunicação confusa, para dizer o mínimo, espera-se que os integrantes do governo Bolsonaro consigam aterrissar. Há alguns que permanecem em órbita, ou vociferando contra problemas inexistentes ou achando que tudo vai acontecer num passe de mágica após a posse.
O governo Bolsonaro poderá contar com várias boas heranças. O realismo orçamentário é uma delas. Esse é o primeiro Orçamento aprovado quase integralmente igual à proposta enviada pelo Executivo. Os congressistas costumavam puxar o crescimento do PIB para inflar a receita e assim abrir espaço para criar novas despesas. Isso obrigava o governo a contingenciar os gastos, logo no início de cada ano. A receita líquida do Orçamento é de R$ 1.299,7 bilhões e a despesa primária é de R$ 1.438,7 bilhões, os mesmos valores da proposta inicial.
Desta vez terá que bloquear o valor referente à venda da Eletrobras que estava prevista desde o projeto da LDO. Houve atrasos no processo de venda pelos mais variados motivos, mas também há visões antagônicas sobre os limites da privatização dentro da nova administração. O próprio presidente eleito disse que não a privatizaria e argumentou que quem vende a galinha do fundo do quintal fica sem os ovos quando precisa. Na equipe econômica prepara-se um plano de privatização, sem qualquer garantia de que isso terá a aprovação do presidente.
Ainda que todos se ponham de acordo sobre o caso da Eletrobras, e mesmo se forem ultrapassados todos os obstáculos judiciais, nada vai avançar muito até o fim de fevereiro. Portanto, o governo não poderá contar com essa receita e os técnicos aconselharão à nova equipe econômica a bloquear R$ 12 bilhões do Orçamento, o que vai apertar diversas áreas. Há também o custo da decisão do ministro Ricardo Lewandowski que impõe o aumento dos salários dos servidores federais.
Na economia, é preciso que o futuro governo encontre a realidade rapidamente, deixando o discurso de palanque e o voluntarismo da transição para trás. O tempo internacional está virando. Nos últimos dias houve quedas fortes das bolsas internacionais pelas muitas dúvidas em relação aos Estados Unidos.
As bolsas tiveram um pregão mais calmo, ontem, após o susto do dia 25. Tóquio abriu no Natal e seu principal índice afundou 5,01%. Na quarta-feira, subiu apenas 0,89%. Outras bolsas corrigiram seus preços no dia 26. China e Coreia do Sul tiveram quedas. Os índices americanos Nasdaq e o Dow Jones, por sua vez, subiam no fim do dia. O petróleo, após despencar nas últimas semanas, avançou e puxou as empresas do setor. O Ibovespa reduziu as perdas com a alta da Petrobras no final do pregão.
Esses ativos escaparam da queda do dia 25, mas o prognóstico é preocupante. O presidente americano continua sendo fonte de muitas incertezas na economia mundial. O ato mais recente foi dizer que o “único problema” da economia dos EUA é o banco central de lá, que indicou duas altas nos juros para 2019. O presidente ensaia uma impensável guerra aberta contra o Fed, uma instituição ícone de bancos centrais independentes. O diagnóstico de Trump, mais uma vez, está errado. As crises comerciais que ele alimenta e o aumento de gastos promovido pela sua gestão estão cobrando a conta. O importante para nós é que os efeitos disso atingirão os países emergentes.
Todo governo que começa recebe um voto de confiança, mas ele não dura para sempre. É preciso que esse capital político seja bem usado nos projetos mais importantes. Se a conjuntura internacional ficar mais volátil, esse tempo será encurtado.