Míriam Leitão: Pontos de azul

Pela primeira vez em mais de três anos, o IBGE fez uma divulgação da produção industrial com todos os números no azul. Os indicadores têm sempre várias leituras, dependendo da comparação que é feita. Mas o dado de setembro mostra alta seja qual for a base. O crescimento foi tímido, apenas 0,2% quando o cálculo é feito contra agosto, mas no acumulado em 12 meses é a primeira alta em 39 meses.
Foto: Divulgação/Cherry/Investe São Paulo
Foto: Divulgação/Cherry/Investe São Paulo

Pela primeira vez em mais de três anos, o IBGE fez uma divulgação da produção industrial com todos os números no azul. Os indicadores têm sempre várias leituras, dependendo da comparação que é feita. Mas o dado de setembro mostra alta seja qual for a base. O crescimento foi tímido, apenas 0,2% quando o cálculo é feito contra agosto, mas no acumulado em 12 meses é a primeira alta em 39 meses.

O quadro permanece ruim apesar das notícias positivas colhidas aqui e ali. A crise permanece, principalmente nesse setor, apesar de o país estar saindo devagar, e de forma hesitante, da crise que tem vivido desde 2014. A produção industrial ainda está 17% abaixo do pico e só 5,4% acima do pior momento da recessão, em fevereiro de 2016. A indústria é, e continuará sendo, o segmento da economia onde a crise é mais profunda, porque ela foi a primeira a começar a encolher e há razões estruturais que tem levado à queda da sua participação no PIB.

Toda vez em que se tem expectativa de que a indústria vai engrenar, ela decepciona. Este ano, houve vários meses de crescimento em relação ao mês anterior, mas em agosto caiu 0,7%. A expectativa do mercado financeiro era de crescimento de 0,6% em setembro. E cresceu bem menos. Em períodos de recuperação frágil, como o atual, os números ficam sempre mistos. Alguns vão para o azul em um mês, enquanto outros voltam para o vermelho. Tem sido assim com a indústria.

A alta foi tímida e além disso foi pouco espalhada pelos setores. Apenas oito dos 24 setores que o IBGE pesquisa foram positivos, os outros 16 caíram. Na comparação com o mesmo mês do ano passado, a produção industrial aumentou 2,6%. E nesse cálculo já vinha crescendo há vários meses.

Ontem, a FGV divulgou o índice de confiança empresarial e houve nova alta em outubro, para 90,3 pontos, o maior patamar em mais de três anos, desde abril de 2014. Esse indicador mede a confiança de empresários da indústria, dos serviços, do comércio e da construção. Pelo terceiro mês seguido, houve aumento maior no sentimento de situação atual do que nas expectativas em relação ao futuro. Também melhorou o indicador de emprego previsto, que ficou acima de 100 pontos, o que significa mais empresas pensando em contratações do que em demissões. Isso não ocorria desde novembro de 2014.

Notícias boas estão começando a aparecer na economia quando se analisa qualquer indicador, mesmo na indústria. Ainda assim, não é possível ver a luz no fim do túnel. A indústria encolheu e tende a continuar à deriva por motivos de sempre, nunca enfrentados, como o do peso dos impostos, o custo logístico, a produtividade estagnada. O governo e o próprio setor quando pensam em política industrial defendem proteção, benefícios localizados, barreiras ao produto internacional, remédios tão velhos quanto ineficientes. A indústria só terá futuro se os nossos gargalos forem enfrentados de frente e o país se integrar ao mundo. O projeto insular nunca funcionou.

A produção de bens de capital caiu 0,3%, mas no ano tem crescimento de 4,5%. Mesmo assim, o nível de produção de máquinas e equipamentos, hoje, está mais baixo do que o pior momento de 2008, na entrada da crise financeira internacional. É um sinal claro de que a economia não está investindo.

O grande problema continua sendo a incerteza política e a crise fiscal. É isso que trava os investimentos e impede a queda da “parte longa” da curva de juros. Ou seja, contratos com vencimentos para daqui a 5 ou 10 anos. Enquanto a taxa Selic caiu para 7,5%, os contratos que vencem em 2028 ainda pagam 11% de juros. Isso afeta setores importantes da economia, como a construção civil e o setor imobiliário, explica o presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Gilberto Duarte.

— Os juros caíram, é verdade, mas para o setor imobiliário o que conta são os contratos de longo prazo. As taxas com vencimento em 10 anos caíram de 16% para 11% desde janeiro de 2016. Não é o mesmo patamar de 7,5% da Selic. É preciso votar as reformas no Congresso e resolver a crise fiscal para que a curva longa caia ainda mais — explicou.

Na indústria, o peso do dever de casa não feito é mais difícil de superar.

 

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