Míriam Leitão: O risco de uma reforma aguada

O ministro da Economia, Paulo Guedes, já começou a ceder na reforma da Previdência. Inicialmente, falou-se em uma economia de R$ 1 trilhão no período de 10 anos, que ficaria acima dos R$ 800 bi do projeto original do governo Temer.
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

POR ALVARO GRIBEL
(*A colunista está de férias)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, já começou a ceder na reforma da Previdência. Inicialmente, falou-se em uma economia de R$ 1 trilhão no período de 10 anos, que ficaria acima dos R$ 800 bi do projeto original do governo Temer. Diante da reação às medidas vazadas na última segunda-feira, Guedes disse que estaria disposto a chegar a esse valor em um período maior, de 15 anos. O problema é que, na prática, isso significa que o projeto já sairá do Executivo mais desidratado do que a PEC 287 elaborada pelo então secretário da Previdência Marcelo Caetano, que tinha uma transição suave e aumentava consideravelmente o valor economizado com o passar do tempo. Na hipótese mais conservadora, o projeto de Caetano pouparia R$ 1,2 trilhão em uma década e meia. Ao ceder logo de início, Guedes corre dois riscos: aprovar uma reforma mais branda do que a do governo anterior e em um prazo mais esticado, já que um projeto novo teria que passar pelas duas principais comissões da Câmara. Ontem, a bolsa teve a maior queda desde maio, com o mercado começando a colocar na conta as idas e vindas dessa tramitação.

‘AINDA ESTÁ MUITO CRU’

Na avaliação de um deputado do PSDB, o encaminhamento da reforma da Previdência ainda está muito no início por parte do governo Bolsonaro. Ele diz que o partido é defensor da reforma e tende a apoiá-la, mas ainda faltam os detalhes para se saber como será o ritmo de tramitação na Câmara e a adesão dos deputados. “Uma reforma dessa complexidade requer um amplo trabalho de convencimento, diálogo e liderança. É um processo e ainda está muito cru. São os detalhes que fazem a diferença, apesar de a aceitação à reforma ter aumentado bastante tanto no Congresso quanto na sociedade”, afirmou. Segundo ele, um projeto novo deve sim passar pelas comissões, e não tentar pegar carona na PEC do governo Temer. “Não tem como eliminar o debate e a possibilidade de emendas ao texto”, disse.

MARCHA À RÉ

O ano começou mal para a indústria. A produção de veículos encolheu para 196,8 mil unidades em janeiro, ou 10% a menos que um ano antes. O setor automotivo responde por mais de 20% do PIB da indústria, que já apresentava sinais de anemia no semestre passado. O mercado interno não compensou a queda nas exportações. Com a crise da Argentina, os embarques de veículos despencaram 46% na comparação com janeiro de 2018.

CANTEIRO DE OBRAS

A recuperação do mercado de trabalho depende muito do setor de construção civil, que é um dos maiores empregadores da economia. Pelos números da CBIC, a câmara da indústria, os canteiros empregam hoje cerca de dois milhões de pessoas. Em 2014, havia 3,4 milhões de empregados diretamente nas obras. José Carlos Martins, presidente da CBIC, conta que em dois anos é possível retomar esse patamar, se o segmento de construção deslanchar. O setor parou de demitir no ano passado, mas fechou o ano com saldo ainda modesto, de 17,9 mil contratações. O PIB da construção civil está em queda desde o primeiro trimestre de 2014. A aprovação da lei do distrato deixou as incorporadoras mais animadas este ano.

BOLSA REFLETE O RISCO

É ilusão achar que a alta da bolsa significa uma explosão de consumo ou de investimentos no país este ano, explica um empresário da indústria que também tem forte atuação no mercado de capitais. Segundo ele, a alta do Ibovespa reflete apenas a queda da percepção de risco no Brasil, com o fim da era petista e das políticas econômicas de curto prazo. “Ainda há muita ociosidade em todos os setores, o PIB está 5%, 6% abaixo de antes do início da crise. Até diminuir essa ociosidade, não tem explosão de investimento nem de contratação”, explicou. Segundo ele, a política liberal de Guedes é de longo prazo, e seus efeitos serão mais sentidos ao longo dos anos, e não em 2019.

COLESTEROL ELEVADO

Ivan Monteiro terá missão clara se confirmado na vice-presidência financeira da BRF: melhorar o perfil da dívida da gigante de alimentos. Espera-se que ele reduza o endividamento, aumente o prazo e diminua o custo das linhas. É algo parecido com o que ele já fez na Petrobras. A dívida líquida da BRF disparou 21% em um ano e chegou a R$ 16,3 bi no terceiro trimestre, ou 6,7 vezes a geração de caixa operacional.

(COM MARCELO LOUREIRO)

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