Míriam Leitão: O erro na Caixa

A Caixa foi o assunto numa reunião ontem em Brasília de todos os órgãos de controle: TCU, MPF, CGU, Banco Central e auditoria da CEF. Concordaram que não basta afastar quatro vice-presidentes, e que é preciso mudar radicalmente a forma de seleção de dirigentes. Vão dar um voto de confiança ao Conselho de Administração, que começa semana que vem a implantar a nova estrutura de governança.
Foto: Caixa/Divulgação
Foto: Caixa/Divulgação

A Caixa foi o assunto numa reunião ontem em Brasília de todos os órgãos de controle: TCU, MPF, CGU, Banco Central e auditoria da CEF. Concordaram que não basta afastar quatro vice-presidentes, e que é preciso mudar radicalmente a forma de seleção de dirigentes. Vão dar um voto de confiança ao Conselho de Administração, que começa semana que vem a implantar a nova estrutura de governança.

O presidente Temer sabia que estava errando na Caixa. Tanto que estabeleceu outros critérios na direção da Petrobras e Eletrobras. Para as duas estatais de energia escolheu gestores sem ligação política e concedeu a eles liberdade de atuação. Entre as grandes estatais, a Caixa ficou como o enclave podre. Nas outras muitas estatais o padrão também é o fatiamento político.

A situação no banco começou a mudar esta semana. Após o MP pedir a substituição dos vice-presidentes, o Banco Central fez o mesmo. O Conselho de Administração, que é presidido pela secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, havia contratado a auditoria do escritório Pinheiro Neto, depois que a Price aprovou com ressalvas o balanço de 2016. O que a auditoria descobriu confirmou tudo o que fora investigado em quatro operações do Ministério Público. O cerco começou a se fechar.

A Caixa tem sido vítima do uso político abusivo. A operação Sepsis exibiu como acontece. No dia primeiro de julho de 2016, quando Temer ainda era interino, a operação foi estourada. Lá se contava como acontecem as indicações para a Caixa. Lúcio Funaro, com uma folha corrida de crimes investigados em três operações — Banestado, Satiagraha, Mensalão —, foi a “autoridade” que decidiu quem seria o vice-presidente de Loterias e Fundos Públicos. Funaro indicou o nome de Fábio Cleto ao deputado Eduardo Cunha, no governo Dilma, em 2012. Foi explícito a Cleto sobre o fato de que ele tinha que fazer o que “nós quisermos”. O “nós” era ele e Cunha. O ministro Guido Mantega chamou Cleto em seu gabinete e o nomeou.

Imaginemos, apenas por hipótese, que em meados de 2016 o presidente Temer não soubesse o risco das indicações políticas. Se tivesse lido o que ficou público pela Sepsis naquele primeiro de julho, saberia que a distorção é tal que um criminoso, réu confesso do mensalão, na prática havia indicado a pessoa responsável, entre outras coisas, pelo FGTS.

Na Eletrobras, Wilson Ferreira fez uma mudança na organização para cortar os excessivos cargos administrativos. A Caixa permaneceu tendo uma dúzia de vice-presidentes, abaixo deles os diretores e depois os superintendentes. Para que ter 12 vice-presidentes? Elementar. Para melhor dividir o bolo, ocupar a máquina, ordenhar o banco no qual está depositada a poupança de milhões de brasileiros.

Quando Pedro Parente foi convidado para a Petrobras ele recebeu a informação de Temer de que teria liberdade para nomear a diretoria. Na Caixa manteve-se a rotina de dividir o comando em sesmarias e entregálas aos capitães políticos para as práticas extrativas.

Quando Temer assumiu, as análises da situação das empresas indicavam que tanto a Petrobras quanto a Caixa precisavam ser capitalizadas. A Petrobras se ajustou sozinha, cortou custos, vendeu ativos, reduziu endividamento, aumentou a receita. A Caixa, desenquadrada nas normas bancárias internacionais, vem tentando se capitalizar com o dinheiro do FGTS.

O erro na Caixa foi a repetição do pecado original: usar as empresas estatais para o repasto político. Não basta tirar quatro vice-presidentes, ou mesmo todos. É preciso mudar a forma de recrutamento de gestores. Alguns dos atuais dirigentes da Caixa estão sendo investigados. “Não podemos dizer que eles são culpados, mas podemos garantir que o sistema que os levou é. O corrupto é apenas o fruto. Se a árvore não for extraída, o crime continuará”, diz um integrante de órgão de controle.

Temer sabia o que aconteceria na Caixa ao reserva-la aos políticos. Quando o Ministério Público pediu a saída dos vice-presidentes, fingiu não ouvir. Foi preciso que o Banco Central usasse seu poder de fiscal do sistema financeiro para que quatro deles fossem afastados. Sanear a Caixa vai demorar anos. Mas esta semana pode ter sido um ponto de inflexão na longa história de abusos sofridos pelo banco público.

 

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