O ano de 2020 terminou melhor do que se temia, o ano de 2021 começou pior do que o esperado. Esse é o resumo dos números de ontem do PIB que mostraram uma recessão de 4,1% no ano, e uma alta de 3,2% no último trimestre. Houve dados que foram aleatórios, como o crescimento de 20% no investimento, mas que subiu principalmente pela importação de plataformas da Petrobras. O cenário de 2021 começou muito mal. A economia do país entra em 21 caindo e se existe alguma esperança é de que melhore no segundo semestre. Dependendo da vacinação.
Há dados realmente positivos, como a força da agricultura, único setor a crescer. A MB Associados acha que o choque positivo do agro foi até pouco captado pelo IBGE. “O crescimento da renda real do setor foi de 9,3%”, diz um relatório da consultoria. Mas, ao mesmo tempo, os números, quando olhados em conjunto, mostram uma economia desencontrada. A indústria cresceu bastante no fim do ano, mas os serviços têm grupos fortemente negativos e são justamente os que empregam mais.
Foi um ano difícil marcado pela crise global do coronavírus, e os erros de uma liderança nefasta no país. O presidente da República foi o pior fator complicador da crise de saúde, e também da economia. Ontem estava de novo dizendo “criaram o pânico”. Mesmo com 1.840 mortos num dia, ele mantém a mesma atitude criminosa que tem tido desde o início.
O Brasil paga, em todas as frentes, o preço da péssima liderança que tem. A ideia da dicotomia entre saúde e economia, sustentada por Bolsonaro, agravou a situação econômica. Ao combater todos os esforços de distanciamento social, colocou um país num círculo vicioso de medidas de proteção tomadas pela metade, que criaram instabilidades e tiraram o horizonte da economia. Isso é o pior ambiente para qualquer investimento. Outro erro econômico, derivado do seu negacionismo, foi o atraso na compra de vacinas que nos deixa agora sem perspectivas para o PIB de 2021.
Na equipe econômica, o primeiro trimestre deste ano já é dado como perdido. Ele será negativo, até pela retirada de todos os estímulos, como o auxílio emergencial, e pela piora da pandemia. Mas em centros de estudo, como a FGV, a previsão é de que o primeiro semestre inteiro será de queda. É o que projeta a economista Silvia Matos, por exemplo.
Como 2020 foi de recessão, pode haver um efeito estatístico que leve o número de 2021 a ser positivo. Mas na maior parte do ano o clima recessivo continuará, com alta taxa de desemprego, queda da renda e do consumo.
A intervenção na Petrobras, em momento em que o Brasil tem dívida alta e muito vencimento de títulos da dívida pública, concentrado no primeiro quadrimestre, aumentou a percepção de que o Brasil é um país arriscado. Isso vale tanto para o investidor internacional quanto para o interno. Um sinal disso é o mercado de câmbio, que está na tendência oposta do que deveria estar, explica Silvia Matos:
— Sempre que as commodities estão em alta, o dólar cai, porque o Brasil é grande exportador desses produtos. O real é o que eles chamam de commodity currency. Neste momento, as cotações do que exportamos sobem, mas o real, em vez de se valorizar, está em queda.
O Banco Central, como informado no blog, dobrou a venda de contratos futuros de dólar, de US$ 35 bi para US$ 70 bi para segurar o câmbio. Um dos pontos de incerteza é a situação fiscal brasileira e por isso os bancos amanheceram ontem de olho na PEC emergencial. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) propôs tirar o Bolsa Família do gatilho que congelas despesas. Alguns parlamentares então propuseram tirar o programa do cálculo do teto. Isso deixaria quase R$ 75 bilhões no extrateto. As cotações oscilaram ao sabor desse entra e sai de gastos do teto. O relatório não abrigou essa proposta.
O dado de 2020 também marca, lembra o economista Sérgio Vale, o fim de uma década particularmente infeliz no país. De 2011 a 2020, o país cresceu apenas 2,7%, e o PIB per capita caiu 5,5%. “Foi de fato uma década perdida no Brasil”. Em 2021, infelizmente, o quadro econômico permanece nebuloso, porque o governo continua gerindo da pior forma a crise sanitária que tem produzido uma mortandade sem precedentes no país.