O governo está em plena temporada de fazer mais concessões e renúncias fiscais a grupos empresariais. Uma parte, com o pretexto de aprovar a reforma da Previdência, o que é uma contradição. Outra parte é renúncia fiscal fora de hora e lugar, como as que subsidiam petrolíferas ou a que pode renovar o programa de subsídio às montadoras. O governo quer gastar ou economizar?
A lista das despesas tem sido enorme. O Refis que virou um quase perdão de dívidas tributárias acabou sendo aprovado para que o presidente Temer escapasse da segunda denúncia. Agora, foi o parcelamento das dívidas dos empresários rurais com o Funrural, o Refis dos que não pagaram o Simples, um regime tributário já muito favorecido. As medidas juntas terão impacto maior do que o ganho que se terá se houver a aprovação da reforma da Previdência. É um contrassenso gastar tanto para se economizar.
Mas há nessa farra dos gastos do governo com os empresários muito mais do que a tentativa de comprar a aprovação da reforma. Tanto que estão sendo negociadas ou propostas mudanças no sistema de tributação das petrolíferas e das automobilísticas que não têm relação com o que está sendo votado. É apenas o atendimento dos velhos e conhecidos lobbies que rondam qualquer governo e que encontram mais respaldo em alguns deles.
É o caso do Rota 2030. O programa é para substituir o Inovar Auto do governo Dilma que foi condenado pela Organização Mundial do Comércio. Agora foi refeito para que o incentivo dure até 2030. O argumento dos empresários em defesa do subsídio que custa R$ 1,5 bi é que eles precisam se ressarcir dos investimentos em pesquisa. Antes de tudo é preciso saber que pesquisas são essas, porque a última novidade que foi desenvolvida no Brasil foi o carro flex e isso faz muito tempo. A chamada MP do Bem já continha o incentivo à pesquisa e desenvolvimento. O país tem barreiras à entrada do carro importado e além disso dá anualmente recursos públicos para as montadoras. Isso nunca fez sentido e menos sentido faz agora em que o país está em dificuldades fiscais e a tecnologia do carro está transitando do motor à combustão para o veículo elétrico.
O desconto de impostos para que as empresas invistam em pesquisa pode terminar com o contribuinte ludibriado e em mais uma anistia governamental, como está acontecendo agora com o setor de eletroeletrônicos. E pior: essa indústria recebe muita dedução na Zona Franca de Manaus.
No setor de petróleo há um mistério. O governo enviou a MP 795 que dá isenção na produção e importação de máquinas e equipamentos para a exploração de petróleo nos campos do pré-sal até 2040. É o Repetro, feito no governo Dilma mas que expiraria em 2019. Agora está sendo postergado por mais 20 anos. A Consultoria Legislativa da Câmara soltou um estudo do consultor Paulo César Ribeiro Lima falando que essas renúncias fiscais poderiam passar de R$ 1 trilhão.
“Nos vários campos do pré-sal, a redução de receita tributária de IRPJ e CSLL poderia ser superior a R$ 1 trilhão”, diz o texto.
Pouco tempo depois, o número foi contestado pelos consultores Francisco José Rocha de Souza e Cesar Costa Alves de Mattos, também da Consultoria da Câmara, que afirmaram haver “dois grandes equívocos” no estudo de Paulo Lima.
“Os cálculos apresentados no estudo técnico em avaliação que apontaram perda tributária de R$ 1 trilhão com a aprovação da Medida Provisória nº 795, de 2017, estão incorretos.”
A Receita Federal afirmou à coluna que não comenta projetos em tramitação. Só faz as contas quando eles são aprovados, porque podem sofrer alterações antes das votações. Deveria fazer, porque isso ajudaria o debate. O deputado Júlio Lopes (PP-RJ), relator do projeto na Câmara, disse que o texto recebeu parecer favorável da Receita — em nota conjunta com o Ministério da Fazenda — e que não há renúncias fiscais à indústria de petróleo:
— Pelo contrário, o projeto vai atrair investimentos na área e aumentar a arrecadação do governo.
A divergência vai do zero ao trilhão. A questão é como aprovar renúncia fiscal quando falta dinheiro nos cofres públicos e ainda beneficiar a indústria de energia de origem fóssil. A soma de tantos benefícios aumenta o descontrole fiscal em momento de penúria.
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)