Em ano eleitoral, país tem que debater seus problemas crônicos
O Brasil tem imensos problemas e nenhum momento é melhor do que o ano eleitoral para pensar neles. A população carcerária aumentou 707% em 26 anos e a segurança piorou. Mais da metade do esgoto do país não é tratado. Na educação, 55% das crianças com oito anos são analfabetas. A concentração de renda no Brasil é maior do que se pensava. Esses são apenas quatro dos temas principais.
Escolhi esses assuntos para dedicar os programas de junho na Globonews. Deles saíram dados tão interessantes que quis dividir aqui com os leitores da coluna. O sociólogo Sérgio Adorno, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, mostrou que em 1990 a população carcerária era de 90 mil brasileiros, em 2016 havia saltado para 726 mil. E quem são os presos? Jovens de 25 a 29 anos são 25%. Pretos e pardos são 64%.
— Precisamos oferecer proteção para os mais vulneráveis para que isso resulte na proteção da sociedade como um todo. Precisamos ir às áreas onde o conflito é mais intenso — diz Adorno.
No programa com ele estava o jornalista Edu Carvalho, de 20 anos, do site Favela da Rocinha. Diante desses dados e dos que mostram que jovens negros da periferia, como ele, são as principais vítimas de homicídio, Edu fez a seguinte reflexão:
— Diferentemente de uma pessoa que estuda esses dados e tem um certo distanciamento, eu me defronto com eles e tenho medo. A pergunta que me faço é em que curva eu “errei” para conseguir fugir da estatística?
A concentração de renda no Brasil é maior do que tem sido medida. Os novos estudos cruzam as pesquisas do IBGE com dados do Imposto de Renda dos mais ricos. Um dos pesquisadores é o jovem Pedro Ferreira de Souza, do Ipea. A conclusão dele é que o 1% mais rico no Brasil detém 23% da renda. Na França é 11%. Na maioria dos países é 15%. Katia Maia, da Oxfam, uma Ong inglesa que está no Brasil há 60 anos, disse que se for mantido o ritmo da diminuição da desigualdade de salários entre brancos e negros dos últimos 20 anos a paridade salarial ocorrerá em 2089. Como resolver isso? Os dois acham que é preciso ir nos impostos e ver de onde vêm os recursos públicos e para onde vão.
— O Brasil tem muito imposto sobre consumo, tributo indireto e pouco imposto sobre a renda e o patrimônio. E é preciso acabar com as exceções, os regimes especiais de tributação — sugere Pedro Ferreira.
— O Brasil estabeleceu um teto de gastos que vai comprimir despesas sociais e permanece com benefícios, isenções para quem está no topo — diz Katia Maia.
Naércio Menezes, coordenador do Núcleo de Políticas Públicas do Insper, e Priscila Cruz, do Todos pela Educação, foram entrevistados sobre educação e mostraram a conexão entre os temas.
— O Brasil ficou para trás no século XX, enquanto outros países avançaram, e isso resultou em desigualdade e criminalidade — diz Naércio.
Pedi à Priscila que dissesse por onde começar a atacar o problema. Ela apontou duas frentes: primeira infância e valorização do professor.
Há dados bons: em 1990, apenas 25% dos jovens chegavam ao ensino médio, agora de 75% a 80% chegam. De 2005 a 2014 triplicou o gasto por aluno no ensino médio. Há também muitos casos de sucesso que podem ser multiplicados. E há dados terríveis.
— A maior vergonha do Brasil é que 55% dos alunos de 8 anos são analfabetos — disse Priscila.
No último dos quatro programas entrevistei Paulo Barrocas, da Fiocruz, e Paulo Canedo, da Coppe, sobre saneamento básico. Mais da metade do esgoto brasileiro não é tratado e isso equivale a 5.556 piscinas olímpicas por dia de rejeitos, de acordo com o Trata Brasil. Os números são ruins e mostram desigualdade: 70% de esgoto tratado no Sudeste, de 10% a 20% no Norte. Mas o que os professores disseram é que pode ser pior. Mesmo quando há rede em toda a cidade, nem todas as casas e prédios estão ligados a ela. E dos que estão ligados nem sempre o esgoto vai para uma estação de tratamento.
Em segurança, desigualdade, educação e saneamento há muito fazer. Em época de eleição temos que discutir solução para esses e outros problemas brasileiros. Que nos próximos meses o país aproveite as eleições para se debruçar sobre tudo o que tem impedido o nosso desenvolvimento.